21
Quando deixaram a mansão, Angélica parou o carro e agarrou Márcio. Beijou-o muitas vezes, até o repórter dizer brincado. “- Calma madame esmeraldina. Assim você gasta toda a minha boca e não sobrará nada para eu usar quando percorrer esse seu belo corpo que é a expressão do que lhe vai n’alma.
– Você sabia que a minha mãe te cantou? E não foi para você e sim para mim. Me disse que eu devia transar com você, por ela.
Márcio caiu na gargalhada e a motorista não conseguiu se conter. “- Acho que enquanto eu estava aprovando o cardápio, você passou o olho na mercadoria toda, sem ela perceber ou viu fingindo que nada enxergou. Se fez isso com a minha mãe, vou te capar neguinho.
“- Veja bem! Se eu falar que sua mãe não é interessante, estaria mentindo, mas fazer o que né, eu só tenho olhos para a filha”, explica-se o jornalista.
– Seu filho de uma puta. Deixou minha sem roupa também.
– Que papo macabro é esse tirar a roupa de sua mãe? Eu não fiz nada. Só conversamos e ela começou a me esmurrar, concluindo a trituração durante o jantar.
– Não se faça de sonso e nem mude o foco. Eu bem sei desse seu olhar sem mexer um músculo do corpo que encanta a mulherada. Elas sabem que você, de um jeito especial que é só seu, as olham.
– Está doida é? Que conversa essa de olhar diferenciado. Meu olhar é normal.
– Eu sei! Como o do jacaré quando está chocando o ovo. A pessoa pensa que ele está parado, mas há milhões de movimentos imperceptíveis. Mas deixa para lá. O que quero te falar é outra coisa.
“- Diga então. Sou todo ouvidos, olhos, bocas e cérebros”, Márcio tenta deixar a conversa mais leve.
– É sério! Desculpe-me pela minha mãe. Queria que fosse um jantar leve, descontraído e não um inquisitório como dona Eleanora o transformou.
– Minha mãe não faria diferente contigo. E sei que você e Eleanora ainda vão falar muito sobre o que lhe vai n’alma e impulsiona o coração bater mais serenamente. Com certeza vão conversar das dificuldades que tens em manter uma relação sexual comigo por conta de coisas pretéritas que ainda lhe ferem e não é por menos. Veja bem: não quero ficar contigo por conta da sua beleza, és bela, linda, maravilhosa, deliciosa, gostosa, mas sobretudo porque consegue me forçar a olhar de fora para dentro e depois de dentro para fora. Me faz ver não apenas a gostosona que ameaça ficar pelada em pleno terminal rodoviária para que eu volte com ela. O presente mais belo me destes nessa confusão toda, não foi a sua calcinha, mas a sua alma. E foi por isso que a conversa com a sua mãe não me peso em nada.
Angélica olhou para o seu acompanhante, deixando que este visse em seu rosto o quanto estava feliz por ouvir aquilo.
– Enfrentar a sua mãe não foi nada comparado a enfrentar os nossos fantasmas. Esses sim, se não forem compreendidos, poderão nos tornar infelizes. Seu ciúme exagerado e sei que os tenho também. Ambos precisaremos equacionar muitas coisas aqui dentro para passarmos bons momentos juntos. Alterar um pouco a rotina de cada um, começando pelas roupas. E é claro, assim que ficar oficializado que você será a nova manda chuva nas empresas da família, vai ser aquele deus nos acuda. Não quero que vivamos escondidos, mas que sejamos discretos e o nosso amor seja poupado, reservado só para nós dois.
– Amor, essa foi a melhor notícia que você me deu. Obrigado por ter paciência comigo e meus ataques infantis. Começo a entender o que há de errado entre eu e Rosângela. Posso estar equivocada, mas com você falando assim e vendo meu casamento, de forma bem apressada, percebo que ela nunca quis estar comigo ao meu lado. Ela sempre desejou me conduzir, como se tivesse me colocado numa coleira e, de certa forma, eu estava reproduzindo isso com vc.
– Como assim, patroa.
– Pode até ser uma coisa meio inconsciente, mas quando, num relacionamento uma pessoa perceber a outra insegura com relação a algumas situações, ela quer comandar, conduzir e fazer com que o parceiro entenda que precisa dela para tudo. Então é como se, ao entrarmos num ambiente público, ela estivesse me conduzindo. Eu fiz isso o tempo todo contigo, reproduzido o que ela tentava fazer comigo.
“- Continue”, disse Márcio.
– Você sempre se recusou a fazer isso, mesmo eu achando que eras a parte mais frágil que precisasse ser conduzida. Lá com minha mãe, achei que tivesse que te proteger dela, mas não. Ela te cantou na minha frente para me sacanear. Para me dizer que você é especial e para eu não deixá-lo escapar. Apesar de aparentar ser frágil, mas não é. É confuso, amalucado por conta dum passado ainda não resolvido, mas é uma pessoa esclarecida. Olha só sabe francês e italiano fluentemente e não fica dizendo, se vangloriando. E mostra isso como uma coisa normal e nada que o faça melhor do que ninguém.
“- Nossa! Chegou a essa conclusão rapidamente. O que foi que lhe deu, meu deus do céu?”, lhe pergunta o repórter.
– Você! Você é o responsável por isso. Eu achando que estavas incomodado com a minha mãe e tu jogando charme para ela. Seu cachorro! Ou achas que ela te cantou por quê?
– Querida! Não joguei charme para a senhora sua mãe. Só mostrei a ela que se eu quiser ficar contigo e a reciproca for verdadeira, iremos adiante, não por conta do teu dinheiro e eu esteja interessado nele, mas porque assim queremos. Eu disse a ela que tenho consciência de seus bloqueios provocados por coisas na sua pré-adolescência, mas vamos, juntos, percorrer todo o caminho. Não sei se conseguiremos, mas isso é outra história. O mais importante é estar ao e do seu lado nessa jornada. Agora, se optares pela Rosângela, entenderei, seguindo o meu caminho, como já havia tentado até hoje pela manhã. Agora vamos para casa, temos uma vida, aliás, três vidas para colocar nos trilhos a partir de amanhã. Sabia que estou com saudades do seu irmão?
– Sério?
– Percebi o quanto aquele lunático me virou do avesso sem eu perceber. Me fez ver você. Chama você de Rainha diaba e de fato é. Vai enfeitiçar assim na Lua.
– É! Meu irmão é um homem especial. Eu entendo porque Tarsila disse que vai amá-lo para sempre. Ela pode até ter outras pessoas, mas acho que carregará para sempre ele n’alma. Ele é um poeta nato que conversa com as estrelas e estou desconfiado que ele pediu um presente para me dar. Será que esse algo já chegou?
Ao perguntar isso, a arquiteta olhou toda amorosa para Márcio que respondeu. “- Não sou poeta, a exemplo do Amadeu. Ele consegue ver amor, paixão, vida, luz em tudo e eu sou apenas um repórter que ousou transpor para as páginas do jornal as viagens e sandices verbais deste poeta louco. Quereria eu poder versar com os verbos como ele faz. Subiria num monumento e diria coisas maravilhosas para e sobre uma certa arquiteta que percorreu os caminhos ditados por Dante na sua Divina Comedia. Ela passou do inferno, ficando um tempo no purgatório, mas agora lutarei para dar-te um pequeno pedaço do paraíso. Você me permite?
– E lá precisa ser poeta, bailarino dos verbos para me fazer feliz, meu neguinho que, além de belo, é meu gaguinho amado. Te amo moço. Não me deixe titubear diante das dificuldades que enfrentaremos para consolidar esse sentimento que começou numa briga por causa do poeta enlouquecido do meu irmão.
Angélica colocou o carro em movimento e, em pouco mais de meia-hora, chegaram na torre da Rainha diaba. Nem bem entraram no apartamento, a arquiteta já foi agarrando Márcio e o levando para o sofá. Ele tentava contê-la por saber que teriam que parar quando chegasse num determinado ponto. Já tinha sido assim a tarde. Ele que não queria que acontecesse novamente. Desejava esperar ela iniciar o tratamento. Então percebeu que era assim que poderia jogar água na fogueira dela.
– Querida! Vamos partir para os finalmente somente depois que começarmos um acompanhamento psicológico?
– O quê? Tratamento psicológico para nós dois? Por quê? Você não precisa.
– Quem disse?
Márcio pediu para ela se sentar e explicou que ambos teriam que passar pelo processo, pois afeta a ele também e com certeza teria que ajudá-la na transição. “-Acho que assim poderemos lidar melhor com as frustrações como a de hoje à tarde”.
Angélica abraçou-o novamente, agradecendo: “- Obrigado amor pela compreensão”.
– Não estou afim de morrer de fome na porta do açougue. Portanto, dormirei no quarto de hóspedes, pois Amadeu volta amanhã e deverá ficar contigo na cama.
– Nem pensar neguinho. Não quero Amadeu na minha cama e sim você. O meu irmão é quem dormirá no outro quarto. Existem coisas que podemos negociar, inclusive as roupas, agora essa história de quereres dormir no quarto de hospedes e eu sozinha naquela cama enorme? Nem pensar. Enquanto estiveres aqui na Torre da Rainha diaba, teu corpo me pertence e ficará do meu lado na cama.
Não restava mais o que fazer ao repórter. Angélica tinha cedido na roupa e que por sinal a deixou belíssima, conforme Márcio pensou durante o jantar todo. Ele se levantou para colocar uma música e a arquiteta não deixou. “- Agora não! Só quero ficar aqui com você ouvindo o som do seu coração e os seus suspiros, enquanto aquela lua nos faz companhia”. Márcio apenas cedeu e se deixou ficar ali com a mulher dos olhos esmeraldinos.
Lentamente foi fazendo carinho nela. Massagem nos glúteos, onde demorou uma eternidade e Angélica correspondia com beijos e passando a mão por dentro da camisa de Márcio, sentindo toda a musculatura e de como era rígida, firme para um homem que já passava da casa dos trinta anos. Quando sentiu mais a textura da pele do repórter, a arquiteta suspirou ficando com a pele toda eriçada. Abaixando a mão chegando na barriga sarada do repórter. Nesse ponto se lembrou a recomendação da mãe. “Ouse filhe! Avance. Toque lentamente no pau dele. Comece a senti-lo. Se ele te falou que estará contigo, saberá ajudar-te nessa transição. Não importe se não conseguir terminar. Mas nunca deixe de avançar, nem que seja um milímetro”.
O jornalista sentiu a sua intenção e não tentou conter a ereção, mas também não disse nada, se concentrando em continuar massageando a bunda dela. Abria bem a mão e conseguia abarcar as duas partes, depois passava lentamente o dedo no orifício que separava os dois lados. Ele também sentiu quando ela enfiou a mão por dentro da calça e ficou segurando o pênis do repórter, sentido toda a sua extensão, veias e temperatura. Ficaram assim em silêncio por um bom tempo, até que adormeceram.
Despertaram por conta de um movimento de pernas que Márcio fez e sentiu a mão dela dentro de sua calça. Ele a chamou para irem para a cama. Se levantaram. “- Obrigado meu amor, por ser paciente comigo. Quem sabe da próxima vez avançamos mais. Se não der, me espere. Te amo!”, disse Angélica se abraçando ao repórter e caminharam juntos até o quarto.
Enquanto ele foi ao banheiro se higienizar. Como ainda não havia conseguido dar um tempo e colocar as coisas nos lugares, usava sempre uma escova dental extra que havia no banheiro de Angélica ou no quarto de hóspedes. “Mais uma coisa para colocar em dia. Assim que voltar para o meu apartamento, providenciarei tudo isso. Espero que seja logo”.
Assim que entrou no quarto, surpreendeu Angélica vestindo uma camisola transparente, sem nada por baixo para dormir. Mas antes passou por ele e foi também fazer a sua higiene bucal. Quando voltou, encontrou o repórter já deitado só de cueca e com o olhar fixo no teto.
– O que foi? Está pensando em desistir?
– Só você quiser. Ai só resta procurar outro canto para me arranjar, como diz aquela música sobre saudades da maloca.
A arquiteta subiu sobre ele, dizendo que em hipótese alguma deveria pensar naquilo. Mas que, qualquer que fosse o pensamento, se quisesse dividir com ela, poderia fazer sem receio algum.
– Estava aqui pensando em tudo e, obviamente, em nós e em como essa vida é doida. Há um mês eu trabalhava num jornal, estando em plena decadência profissional por conta de bloqueios, não conseguia andar, só desejava fugir, mas não sabia para onde. Depois de um dia de trampo do caralho, eu topo com o seu irmão enchendo a cara numa espécie de bar-teia de aranha para fisgá-lo. Acho que vocês tentaram de tudo e o boteco foi a última chance.
– Meu querido! Você pode ter certeza disso. Pegamos Amadeu e um belo mosquito intruso. Deu trabalho. Ele só queria fugir da abelha-rainha. Ou melhor, da rainha diaba.
– Veja bem. Não faz um mês e a minha vida está sem rumo algum. Sei o que faremos amanhã, depois de amanhã no máximo. O resto não dá para prever nada. E agora estou aqui com uma mulher que não gosta de usar lingerie que marca o corpo, mas que se ajusta perfeitamente ao seu formato. Não usa roupas apertadas para não exibir os belos atrativos que tem. E eu, feito mosquito tonto, estou parado na teia dela. O que fazer?
– Apenas me amar pelo resto da eternidade.
Márcio ficou pensando e do nada, Angélica lhe diz: “- Está vendo como eu sei que tu sabes tirar a roupa de uma mulher sem colocar a mão. Nas duas ou três primeiras vezes que nos vimos, você me comeu com os olhos. Mas o que me deixou com a pulga atrás da orelha, é que eu sabia que tu me olhaste de fio a pavio, sem me encarar. Viu meu sapato, o tamanho do salto, minha calça, minha calcinha, minha blusa, meu sutiã, além disso, sentiu meu coração, abraçou minha alma num olhar profundo que durou poucos segundos. E não vem me dizer que eu estou vendo coisas, pois te vi fazendo isso outras vezes, por exemplo, a primeira vez que estivemos no bar. Um dia quando eu andava na sua frente, a sensação é que seu olhar me queimava a bunda de tão ardente que era”.
– Minha senhora. Eu não sou nada disso. Sou apenas um repórter num fundo de redação.
– Eu sei bem que tipo de repórter você é! Até minha mãe te cantou, o que dirá as outras se eu não esfregar na cara delas que você é meu. Ah! Não sou dada a protocolo, mas voltaremos da Alemanha com o senhorito com uma aliança nessa mão esquerda e enorme para que as mulheres vejam de longe que você tem nodo.
– Para que colocar essa coleira no dedo? O que importa é o que eu sinto e você.
– Você está vendo essa aqui? Pegarei a que está com Rosângela e mandarei fazer uns brincos e colocar para vender no bazar da pechincha que eu e minha mãe vamos organizar. Faremos outra bem maior do que essa.
– Não faremos nada. Eu não preciso de alianças para considerar-me “amigado” contigo.
Ao dizer isso, Márcio cai na gargalhada porque sabe que lá vinha chumbo. “- O que? Amigado comigo? E eu lá sou mulher de ficar amigado com homem ou com quem quer que seja? Você se casará comigo e pronto. Podemos apenas fazer um pequeno cerimonial no civil e pode ser arranjado lá na mansão.
– Meu deus do céu. Tu pensas em tudo e eu só tenho que assinar embaixo, mesmo que seja para colocar uma forca no dedo.
Ele deu outra gargalhada. “- Quer parar de rir desse jeito. Vai me deixar toda encharcada e precisamos dormir. Amanhã o dia será cheio. Traremos o Amadeu para cá”.
– Tudo bem amor. Dormimos então.
Assim que Márcio se posicionou para dormir, a arquiteta deitou em seu peito e suspirou. Ação que o repórter notou, mas optou pelo silêncio. Provavelmente era a alma de Angélica conversando com ela.
Acordaram com o sol já dentro do apartamento. A arquiteta olhou no celular e viu que tinha várias ligações, boa parte delas era do hospital e as outras eram da mãe. Resolveu ligar para Eleanora. “- Bom dia mãe! Está tudo bem?”
– Estou aqui no hospital, te aguardando. O Amadeu acordou e está dando um trabalho danado. E fica perguntando pelo Márcio. Falou que era para chamar a polícia. Diz que a Rainha diaba prendeu ele na torre gigante que só falta falar. Você sabe o que isso significa?
– Sei sim mãe. Estamos chegando. A Rainha diaba sou eu e a torre é o prédio onde moro. Ele cansou de falar para o Márcio tomar cuidado comigo, pois eu ia prendê-lo aqui. De certa forma, ele não deixa de ter razão. Tchau.
Chegaram rápido ao hospital. No caminho a arquiteta foi explicando ao jornalista que comprariam as roupas numa loja que só existe virtualmente. Você entra no site, escolhe as roupas, indica suas medidas, inclusive cor da pele e logo depois você vê na tela como ficará com aquela roupa. Depois é só pedir para entregar as peças lavadas e passadas. Segundo ela, se comprarem as roupas lá pelas 10h, às 16h eles entregam e se disser que tem urgência e por meio de pagamento de uma taxa extra, enviam antes.
Já dentro da unidade de saúde, Márcio foi direto para onde Amadeu estava. Quando o poeta o viu, fez a maior festa. “- Meu amigo. Deixe-me ver seus braços. Se não há marcas das correntes que aquela Circe colocou em você para não deixar me vir resgatar desse sanatório. Faz tempo que estou aqui. Eu abro os olhos e enxergo alguém de branco puxando meu braço e me enfiando uma agulha. Cruzes. Que povo louco. Vamos embora daqui. Você me trouxe para ver um amigo e eu fiquei trancafiado. Cuidado! Você veio para buscar um amigo e eles podem não deixar nós dois sairmos. Vamos fugir”.
– Amadeu, meu amigo! Não precisamos fugir, é só usar a porta. Vem comigo!
Quando deixaram o quarto, a dupla se depara com Angélica e Eleanora. O poeta cochicha no ouvido de Márcio. “- É isso mesmo que eu estou vendo: a Circe com a madrasta da Cinderela? Se for, melhor voltarmos para o quarto. Lá estaremos mais seguros.
– Não Amadeu, não é nenhuma das duas. É a Rainha diaba e a mãe dela. As duas te adoram muito e querem te dar um abraço.
– Elas sabem das cartas que estou escrevendo. Sabe que vou me casar com Tarsila e vamos passar a nossa lua de mel entre as estrelas?
– Eu ainda não falei nada, pois você não terminou as cartas. Vamos embora, você precisa termina-las.
Ambos passaram pelas duas e Amadeu mostrou a língua para a dupla dizendo: “- Tarsila vai vir me salvar de vocês duas e daquela torre doida que essa loura aí me mantem prisioneiro. Eu só preciso terminar as cartas que meu amigo aqui vai me ajudar”.
Todos entraram no carro de Angélica. No banco de trás ficou Amadeu entre a enfermeira e Eleanora e na frente Márcio, tendo a arquiteta como motorista. Antes de entrar no automóvel, a mãe de Amadeu dispensou Rodolfo dizendo que não precisaria dele pelo resto do dia, mas que era para ficar atento que poderia ser chamado a qualquer momento.
O misto de garçom e segurança anuiu com a cabeça, entrando no carro em que conduziu Eleanora até o hospital. Quando estava dentro do automóvel, e o veículo conduzido pela arquiteta já ia longe, Rodolfo pegou o telefone e ligou para uma pessoa. “- Está seguindo tudo conforme combinamos. Assim que ele voltar para o apartamento dele, daremos o bote. A grana vai ser boa e vamos botar esse neguinho no lugar dele. Beijos. Te adoro”.
Enquanto Rodolfo seguia o seu plano querendo colocar fim ao relacionamento de Márcio e Angélica, antes mesmo deste ser oficializado, embora seja oficioso para a família dela, já que Amadeu será o próximo a saber das proximidades do amigo com a irmã, no carro em que o poeta era conduzido para o apartamento de Angélica, Eleanora tentava desesperadamente se aproximar do filho. Ele se quer dava uma palavra com ela. Foi Márcio, apenas com um olhar, quem pediu calma para a mãe do poeta.
Ao chegarem na “torre da Rainha diaba”, como o amigo de Márcio dizia, Amadeu, ainda sonolento foi levado para o quarto de hóspedes, pedindo para ficar a sós com o jornalista. “- E ai! O que aconteceu na minha ausência? Você transou com a mandatária da família ou ainda está de frescuras, mas de pau duro por ela? Anda me fale!”
– Amadeu, aconteceram muitas coisas que, com o tempo, vamos conversar sobre isso. Agora, porque não descanse para que a noite possamos continuar as cartas para Tarsila? Quem sabe durante a escrita não falamos sobre isso.
– Está bem! Quando eu acordar você estará aqui?
– Se você me prometer conversar com a dona Eleanora, sim. Do contrário, voltarei para o meu apartamento.
– Eu só falo com ela se estiveres comigo. Já vai avisando a dona do pedaço que quero voltar para a minha casa. Minha terapeuta deve estar preocupada. Quanto tempo eu fiquei fora do ar, você sabe?
– Não sei ao certo, mas depois eu te digo, porque também fiquei fora do ar por um tempo e estou voltando agora. Eu tive uns probleminhas, mas já estão resolvidos. Coisas do coração.
– O quê? Você teve um colapso nervoso e precisou ser internado? Eu não te falei para fugir da loura de olhos esmeraldinos! Mas eles são encantadores, porém, piores que aquela teia de aranha lá do bar que gosta de pegar uns mosquitos. desavisados que ficam voando desligados, pensando em qual copo vai sentar aquela bunda regurgitadora.
Na sala, Eleanora estava irrequieta querendo entrar para falar com o filho, mas Angélica tentava acalmá-la. “- Mãe. Acalme-se. Ele está com o Márcio e depois falará com a senhora. Serene-se o filhão está seguro, o trouxemos de volta. Não era isso que queríamos? Então, agora tenha um pouco de paciência para que as coisas se ajustem”.
Mesmo assim, a mãe de Amadeu andava de um lado para o outro e a arquiteta, para não entrar no clima pilhado dela, fez uma solicitação. “-Mãe, preciso ir com o Márcio comprar umas roupas. Ele não tem nada. E está usando a última cueca. Deixou suas roupas por onde foi passado, por decisão minha. Ele só comprava roupas ensebadas. Então, enquanto eu vou às compras com ele, a senhora fica aqui com o Amadeu”, disse Angélica.
– O quê? Márcio está só com a roupa do corpo? E por sua culpa? Meu deus! Realmente esse homem vai para o céu. Primeiro por te aturar e depois te amar, pois fazer tudo o que você quer, só mesmo por muito amor. Arrastar o homem lá dos confins do estado só com a roupa do corpo, é coisa de gente doída.
– Ué! Ele não fugiu só com a roupa do corpo? Que voltasse do mesmo jeito.
Elas se entreolharam e deram risadas no momento em que o repórter deixava o quarto em que Amadeu estava dormindo. “-Dona Eleanora, eu falei com ele. Conversará com a senhora, mas quer que eu esteja presente. Como está ainda grogue de sono e dos medicamentos, pedi que dormisse e depois quando acordasse conversaríamos. Tudo bem?”
A mãe da arquiteta se conformou, mas afirmou à filha que não sairia dali de jeito nenhum. Angélica chamou a enfermeira, explicando tudo o que tinha que fazer, principalmente ficar atenta aos movimentos de Amadeu. “- Ele pode acordar e chamar pelo amigo. A senhora diga-lhe que Márcio foi buscar a corda para tirá-los do castelo e aí ele se acalmará”. Em seguida, pegou a cuidadora pelo braço levando-a a até porta do cômodo em que o irmão dormia, dando uma ordem: “-Não deixe minha mãe entrar no quarto em hipótese alguma. Se isso acontecer, você não conseguirá controlar o meu irmão”.
Voltando à sala, puxou o repórter pelo braço, chamando-o de meu amor. “-Vamos. Temos o dia cheio”. Ao entrar dentro do elevador em direção ao térreo Angélica disse que vai dispensar a enfermeira. “Por quê? Ela me parece ser competente!”
– Para cuidar do meu irmão ou para você ficar jogando charminho para ela? Pensa que eu não a vi conferindo a mercadoria, sobretudo olhando para o meio de suas pernas e também para a sua mão para ver se éramos casados? Vou providenciar uma aliança para esse seu dedo indicando que já tem dono.
Márcio caiu na gargalhada, deixando a arquiteta possessa. “- É neguinho eu te vi cobiçando o material dela. Você quem sabe? Se continuar o joguinho, mando ela embora levando o seu pau dentro dum saquinho e tu junto, só que eunuco”.
Chegando ao térreo, o repórter gargalhou mais ainda. “- Meu deus do céu, patroa. Eu nem percebi se ela usava calcinha que marcava ou não aquele par de bundas. Então pode ficar sossegada. Eu só tenho olhos para você e para mais ninguém”.
– Pode me enganar, eu finjo que acredito. E eu não conheço esse olhar que não enxergar que tu tens? Mas está avisado, meu neguinho!
Quando entraram no carro, por saber que de onde estavam tinha uma câmera que mandava imagens direto para o apartamento, Angélica lhe deu um beijo que o tirou do chão. Em função do equipamento de áudio e vídeo ligarem automaticamente quando o imóvel era aberto pelo som do elevador parando, a arquiteta tinha certeza que a enfermeira tinha visto o beijo que deu em Amadeu.
De fato, ao passar pela sala para conversar com a mãe de Amadeu, Janaina não pode deixar de ver. “Como ela conseguiu fisgar um homem desses? Só pode ser por conta do dinheiro. Deve ter colocado uma coleira para puxá-lo para aqui e para ali”, pensou a enfermeira que foi perguntar a dona Eleanora se estava tudo bem. “- Estou sim minha filha. Cuide bem do meu menino. Eu vou ficar aqui esperando minha filha voltar com o amigo dele. Esse rapaz é de ouro, conseguiu resgatar meu Amadeu do mundo de sandice”.
Janaina ouviu e perguntou a Eleanora qual era o nível de relacionamento da filha com o repórter. A mãe de Amadeu fitou-a, dizendo de forma muito serena: “-Quando eles chegarem aqui pergunte a eles. Você está aqui para cuidar do meu filho e não ficar sabendo da vida de seus patrões. Agora vá”, disse Eleanora.