Desencantamento político

Gilberto Barbosa dos Santos

 

Mais uma eleição, quase que geral, se aproxima e, como das outras vezes, o brasileiro continua assistindo a tudo, bestializado, como se estivesse vendo uma parada militar em que os soldados exibissem seus potenciais bélicos, todavia, no caso aqui, os soldados políticos apresentam suas pequenas e abjetas propostas governamentais, externadas atrozes verborragias marcadas pelos extremismos, seja de que lado for. Essa forma desenfreada de propalar programas em desalinho com a realidade social brasileira pode ser vista de diversas maneiras, como por exemplo, quando a presidente do PT, Gleise Hoffamann grita a plenos pulmões que se um determinado arauto partidário for preso, muita gente morrerá. Isso é um acinte à democracia, já que evidencia que os asseclas desse sujeito político acreditam que a lei só vale se aplicada contra os seus adversários.

Se não bastasse esse desatino de uma liderança política com assento no Congresso Nacional, há no outro extremo da peleja eleitoral um sujeito claramente alinhado com os horrores da ditadura militar (1964-1985) que marcou um quarto de século da história recente do Brasil. Existe uma vasta bibliografia sobre esse período, entre elas, os excelentes livros do meu amigo, o sociólogo e professor da UNICAMP, Marcelo Siqueira Ridenti: Em busca do povo brasileiro (2000) e O fantasma da revolução brasileira (1993). Há ainda as obras de John Dinges: Os anos do Condor e Lucas Figueiredo: Lugar nenhum: militares e civis na ocultação de documentos da ditadura. Como meus caros leitores podem observar, existe um riquíssimo material a ser analisado sobre as mazelas perpetradas pelos dois lados da peleja política e tudo em nome da democracia. Não pode-se esquecer os mensalões, petrolões e agora os merendões aqui no Estado de São Paulo, marcado, sobretudo pelos desvios na merenda escolar que somente agora a Justiça acatou a denúncia contra um grupo de malfeitores que se enriqueceram, segundo as acusações, desviando recursos da alimentação dos estudantes.

Esse é o quadro conhecido de todos, entretanto, porque ainda não se pode vislumbrar uma melhora no front da política nacional? Sabe-se que a democracia é recente no Brasil, fazendo com que seja possível indicar que os nossos antepassados não foram acostumados a viver em situações em que a livre manifestação do pensamento, seja em que esfera for, fosse moeda corrente nas relações humanas. Esse viés não é característico apenas da sociedade brasileira, pois, conforme nos relata o filósofo francês, Michel Lacroix em seu livro O culto da emoção (2006), o homem contemporâneo conseguiu romper com uma espécie de tabu inscrito na cultural ocidental há cinco séculos (LACROIX, Michel. Rio de Janeiro: José Olympio, p. 56-57). Se isso é fato, então, ainda se caminha em direção à liberdade de fato e não apenas no campo da verborragia. Desta forma, uma das grandes metas do indivíduo social é a conquista no campo das emoções – voltarei em outro momento sobre essa temática.

Só para não perder o foco da discussão de hoje, no universo político o sujeito também deve se tornar livre, porém, só poderá fazê-lo se for possuidor de determinadas objetividades pautadas por uma subjetividade conhecida de si mesmo, daí o título da reflexão de hoje, isto é, o desencantamento político. Por que será que o homem moderno está desiludido com essa área? A pergunta é ampla, não se restringindo ao Brasil, pois ao analisar os debates no orbe terrestre, o ser político compreenderá que a descrença total ronda o ser humano de um modo em geral, provocando o retorno de ideais nacionalistas, protecionistas e desejos atrozes de se verem longe do estrangeiro, numa espécie de xenofobia. Essa onda varre a Europa e, só não encontrou guarida aqui na terra de Machado de Assis (1839-1908) por conta da nossa cordialidade, conforme nos relata o historiador e pensador brasileiro, Sérgio Buarque de Holanda (1902-1982) em seu clássico Raízes do Brasil (2006 [1936]). Dito de outra forma: como pode a xenofobia fincar raízes num país que adora bajular o estrangeiro, que venera o que vem de fora, em detrimento das raízes nacionais? Talvez esse tipo de comportamento esconda as razões que não permitem o Brasil se tornar uma Nação de fato, fazendo com que o povo, ou melhor, um não povo, continue adotando a política do beija mão, perpetrada por D. Pedro II durante os mais de 40 anos de reinado.

Mas dentro do contexto de minha proposta para essa quinta-feira, a que se refere o desencantamento com a categoria política nacional? As leis que são brandas com os representantes da população estejam eles no Executivo ou no Legislativo? A deseducação política da sociedade, que não consegue compreender que o político é um funcionário do eleitor e que este tem o poder de demiti-lo a cada quatro anos ou quando suas ações assim definirem? Parece-me que a descrença se encontra no fato de que o Estado brasileiro não surge como vontade popular. Nessa chave, suas amarras burocráticas não condizem com o desejo do cidadão. A compreensão desse mecanismo seria o primeiro passo em direção à concretização e criação de um país diferente do que esse que ai está! Dessa simbiose entre governo e burocracia aristocratizada é que surge o famigerado “sabe com quem você está falando!” escudado pelo famoso “jeitinho brasileiro” – que permeia as repartições públicas, fazendo com que todos os benefícios que deviam ser revertidos para o povo sejam observados como concessões por parte daqueles que ocupam os postos governamentais através das mais diversas eleições. Isso pode ser visto nas verborragias perpetradas pelos políticos daqui e alhures para justificar seus desmandos e desobediências à legislação vigente, reforçando atrozes verborragias como a propalada pela presidente nacional de um partido político.

Entretanto, para não ficar somente nessa agremiação política e ser acusado, por muitos incautos, de ser partidário de um dos lados da refrega política, o descalabro é geral, seja em que lado for da peleja partidária. Se o leitor der uma olhadela lá pelos lados do Congresso Nacional compreenderá o que tento abordar aqui: os congressistas só são favoráveis ou contrários a alguma coisa se suas empadas bancárias forem azeitadas com muito dinheiro e emendas orçamentárias em seus currais eleitorais. Nesse 2018, muitas coisas começarão a aparecer, melhorias aqui e ali, recursos conquistados por tal deputado estadual, federal, senador, tudo graças ao seus cabos eleitorais assentados nos mais de cinco mil legislativos brasileiros. O mais engraçado que a história se repete, umas vezes como farsas e outras como tragédias, como dizia o pensador alemão Karl Marx (1818-1883), no entanto, sem que o eleitor consiga deter essa espécie de eterno retorno, como dizia o filósofo alemão Friedrich Nietzsche (1844-1900).

 

Gilberto Barbosa dos Santos, Sociólogo político, editor do site www.criticapontual.com.br, autor do livro O sentido da República em Esaú e Jacó, de Machado de Assis; professor do ensino superior e médio em Penápolis; pesquisador do Grupo de Pensamento Conservador – UNESP – Araraquara e membro do Conselho Editorial e Científico da revista LEVS (Laboratório de Estudos da Violência e Segurança) – UNESP – Marília; escreve às quintas-feiras neste espaço: e-mail:gildassociais@bol.com.br; gilcriticapontual@gmail.com. www.criticapontual.com.br.

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