Sobras de um amor … parte III

11.

         Durante as comensalidades, por mais que se tentasse mudar de assunto, a conversa foi uma só: Márcio defendendo a esposa e sua alma de preto. Ele tentava se desculpar, desconversar, mas a sogra olhava para ele e o admirava mais. Não iria demitir os diretores, mas os colocaria de férias para pensarem bem no que fizeram na casa dela, desrespeitando os seus convidados e a própria filha.

– Filho! Obrigado! Você lavou a honra de nós todos, principalmente porque o Tales enfatizou muito bem que o objetivo dele era de te humilhar, principalmente pela sua cor. Talvez acreditasse que tua sogra iria contra ti e favorável a eles em virtude de serem funcionários antigos das empresas dela.

– Pai, a questão extrapola, pois, além de tentar nos humilhar, quis desqualificar a própria Angélica. Então racismo não afetou somente nós, mas também minha esposa, minha sogra, patroa deles que namora um general preto.

Ao dizer isso, Márcio sentiu as mãos de sua senhora envolvê-lo pela cintura, recebendo um beijo no pescoço. “- Rogério, como seria minha vida sem esse meu super-herói”, perguntou Angélica ao sogro.

– Reduza esse seu ciúme, se bem que depois da surra que o Marzinho deu no seu diretor, não sei mais quem tem mais ciúmes: se é tu ou ele.

“- Como minha mãe disse: ele é cirúrgico. Esmurrou o médico sem muita conversa e do nada mostrou ao Tales em que terreno ele estava pisando. O general disse que o moleque aqui é porreta e é campo minado”, disse a esposa toda orgulhosa do marido ciumento.

Romualdo chegou para perto do pessoal e serviu pedaços de carnes a todos e olhando para o editor disse: “- Meu filho que não fique esperto com a noiva. Eu sinceramente não gostaria que Ricardo levasse as porradas que deu naquele diretor”. Todos deram risadas, porque se lembraram do que Roberto disse a Ricardo na terça-feira.

Alexandre chegou perto e abraçou Márcio e de forma provocativa, lhe perguntou; “- Meu amigo, me ensina como é esse negócio de ver sem ser olhado. Quero aprender porque se alguém tiver observando diferente para a minha Eleanora, me antecipo e o acerto antes mesmo de mexer um músculo do olho”.

Antes mesmo que Márcio respondesse a brincadeira, Angélica se antecipou dizendo que era segredo de família, passado de pai para filhos e estava com eles há séculos.  Nova gargalhada, mas Alexandre foi direto: “- Quero te parabenizar. Quando pessoas sem escrúpulos tentam nos fazer de idiotas em nosso território, temos que dar as boas-vindas a elas. Tenho certeza absoluta que ninguém vai tentar invadir os seus domínios. Angélica, tu tens um marido de ouro”.

No grupo de mulheres, Mariana completamente aborrecida, pois novamente o cunhado tinha socado um diretor das empresas da família da esposa e todos ficavam jogando confetes nele. Desta vez foi a sogra de Márcio quem falou. “- Mariana, vou chamar meu genro aqui e vocês dois conversam. Não é possível tanta marcação com ele. Desconfio que isso não é inveja, mas amor mal correspondido. Quer se declarar a ele”, perguntou a anfitriã.

– Por que a senhora está dizendo isso?

– Não sou eu, mas sim sua cara e os comentários que faz sobre meu genro. Se ele não defendesse a minha filha, como fez, não serviria para estar com ela. E se os diretores que fizeram apostas para humilhá-lo dentro de minha casa, não são dignos de minha confiança. Outra coisa, o que esse homem fez pela minha família, nem que eu lhe desse todo o meu dinheiro, estaria pago.

Judith olhou para a nora e ficou em silêncio, enquanto a sogra de Marzinho o chamava. “- Pois não Eleanora”.

– Meu caro genro, eu desconfio que sua cunhada está apaixonada por ti, pois desde ontem está só que tece comentários negativos de ti. Fizestes alguma coisa para ela? Prometeu-lhe casamento e fugiu com a minha filha?

Mariana ficou sem chão. Ela já tinha sido alertada pela sogra e pelo marido. Antes mesmo de falar alguma coisa, Angélica chegou perto do esposo para saber o que estava acontecendo. Eleanora explicou novamente a situação e a empresária disse: “- Nós já conversamos e sinceramente não sei o motivo dessa marcação sobre o meu marido. Você é apaixonada por ele e não quer assumir”, interrogou Angélica.

A nora de Judith permaneceu em silêncio. A conversa aconteceu na maior discrição. “- Eu acho ele pedante só isso”, falou Mariana. Todos ficaram em silêncio e Márcio pediu para ela explicar melhor. “- Talvez eu esteja fazendo algo que não estou observando, então uma visão de fora sobre nós é sempre importante. Então diga-me, por favor, se minha conduta está te maculando e por quê”.

– Todo mundo fica te paparicando e parece que esqueceram a merda que fez lá atrás, ferrando toda a sua família, nos levando quase a ruina e agora fica aqui dando uma de certinho, mas o ônus de sua estupidez quem teve que carregar fomos nós, enquanto você ficava aqui amoitado nessa cidade.

– Ah! Então a sua birra comigo é por conta dos perrengues que passaram por causa da surra que levei dos amantes de Márcia? Então faremos de modo bem simples: chamarei meu pai e pedirei o valor de quanto vocês perderam e na primeira oportunidade, eu devolverei tudo e farei questão que boa parte seja destinado a ti.

Todos se entreolharam, enquanto o editor continuava. “- Ninguém mais do que eu fiquei destruído com aquilo. Conversava com minha mãe as escondidas, enquanto todos aproveitavam o colo dela. Minha cara cunhada, não teve um só dia nesses últimos cinco anos em que não fui assombrado por aqueles momentos e, entendo que me penitenciei, sofri horrores, mas se ainda assim o seu problema é a parte financeira, podemos resolver isso sem problemas algum.

“- Marzinho! O que Mariana tem é despeito. De alguma forma, creio que ela gostaria que Léo fosse como tu, mas isso não é possível, pois cada um é o que a partir das escolhas que faz e tu, meu marido, tenho certeza que fez as melhores opções, inclusive abrir mão do meu dinheiro, de ocupar um cargo importante nas minhas empresas, para continuar sendo o que és: esse homem especial. Sendo assim, ou ela está despeitada ou apaixonada por ti. Se for a segunda opção, acho que Mariana deveria ter uma conversa antes com o marido dela e depois tentar medir forças comigo”, desafiou Angélica.

Mariana se levantou e caminhou apressada para dentro da mansão. Judith a acompanhou, justamente por saber um pouco mais o que ia n’alma da nora e talvez boa parte se devesse a gravidez. Márcio voltou para conversar com o pessoal aproveitando para se empanturrar de churrasco, pois se a mulher o visse comendo, com certeza falaria.

– Mãe! O que Mariana tem? Ela está muito estranha com o Márcio. Não é a primeira vez que dá umas caneladas nele. Porra! O cara comeu o pão que o diabo amaçou aqui, sozinho, assombrado pelo passado e agora que tudo caminha bem para ele, essa aí vem com essa mágoa.

– Filha! Acho que tem algumas coisas aí que Judith sabe. Observe como ela ficou em silêncio. Eu desconfio que, por ser a primeira gravidez de Mariana, a nora gostaria de ser paparicada por todos os parentes dele e acho que isso tem a ver com solidão e, o segundo é que talvez ela deseja que Leônidas seja o centro das atenções ou fiquei endeusando-a como Márcio faz contigo.

– Então a senhora não acha que é amor o que a cunhada sente pelo meu marido?

– Não! Eu quis cutucá-la e aí saiu com essa história para encobrir o real fato. Observe que Mariana quase não se mistura com as outras mulheres. Não conversa com quase ninguém e está sempre perto de Judith. Ela ficará uma semana aqui, tente trazer para junto de nós. Não seja arredia.

– O que você sugere?

– Convide-a para jantar contigo e o Marzinho amanhã. Isso se ela não querer ir embora hoje, mas duvido que a sogra a deixe fazer isso.

Enquanto Angélica e Eleanora conversavam, Leônidas entrava apressado na mansão. “- Está certo mãe. Combinarei com Marzinho. A senhora acha que deveria ser só nós ou devo chamar Roberto e Danisa. Afinal, ele e Leônidas tem muita coisa para conversar sobre o supermercado”.

– Uma boa ideia filha. Acho que vai ser bom ela sair um pouco daqui. De repente se solta mais contigo e deixe essa marcação com o teu marido.

O churrasco estava chegando ao seu final e todos já se acertando para a segunda-feira. Rogério se organizava para voltar ao trabalho em sua cadeia de supermercados, desta vez sem o seu braço direito, Leônidas que ficaria trabalhando na nova filial tendo a companhia de Esdras que, além desse trabalho, retomava os estudos no curso de administração na mesma instituição que Débora cursava arquitetura.

Naquele dia não foi realizada a ceia, pois todos teriam uma segunda-feira de muito trabalho. Nas Organizações Oliveira as reuniões começariam cedo e tinha ainda a situação dos três diretores que precisariam ser resolvidas. Eleanora gostaria muito que o pedido de demissão deles estivesse na pauta do encontro, mas ela não proporia nada.

Quando Márcio e Angélica estavam saindo, a empresária se dirigiu a Mariana e Leônidas dizendo que os esperariam na noite seguinte para jantar com o marido no apartamento do casal. Roberto e Danisa iriam e os cozinheiros seriam a dupla de amigos. A cunhada de Marzinho estranhou o convite, mas não disse nada, esperando que o marido se recusasse ou não.

– Nós vamos! Até porque tenho que passar os primeiros informes a Roberto como estarão as coisas no supermercado. Se precisaremos fazer mais aporte de dinheiro ou a aquisição de mercadorias. Se bem que tudo isso só saberemos ao certo no final da próxima semana.

Feitas as despedidas, Angélica e Márcio seguiram para o apartamento do casal, o general foi para sua residência e assim sucessivamente. Débora estava feliz com o desfecho do relacionamento com Esdras. Ricardo, depois do que assistiu Márcio fazendo com o diretor porque ele ousou passar a mão em Angélica, entendeu o recado que Roberto tinha lhe dado na terça-feira, estava todo animado com Fernanda. Sabia que não podia avançar um milímetro, pois colocaria tudo a perder.

Romualdo e Adélia aproveitaram para marcar um jantar na residência deles para a segunda-feira mesmo. Os convidados seriam os namorados de seus filhos: Fernanda e Esdras. Na mansão este último foi falar com o irmão Leônidas, enquanto Eleanora e Judith conversariam com mais calma com Mariana.

“- Filha! Me diga o que está acontecendo? Eu sei que Leônidas não se casaria com uma pessoa que tem mágoas n’alma e carregasse no coração um pingo se quer de ódio e ainda mais com relação ao irmão dele”, argumentou a sogra.

“- Menina! Meu genro tem manias, é esquisitão, como o chamaram lá no Pontal, mas creio que não é portador de dupla personalidade. Então tem algo aí dentro de ti que não está bem resolvido em relação a ele”, afirmou Eleanora.

– Eu já disse! É muito paparico em cima dele e não o vejo como esse santo que vocês o pintam. Também tem defeitos. Olha só! Ele esmurrou um dos seus diretores dentro de sua casa e parece que não cometeu equivoco algum.

– Primeiro: Mariana, eu estava presente e compreendo porque se comportou daquela forma e sei que se fosse com Jô, meu marido, ele teria feito da mesma forma. Tales faltou com o respeito para com minha filha dentro de minha própria casa, além de ofender o meu genro. E isso já vinha desde o casamento, vai lá se saber o que não falaram e tramaram contra Márcio!

– Está vendo! Eu e o Leônidas temos que sempre viver à sombra desse Marzinho. Parece que tudo é para ele. Meu marido fica atrás de Rogério o tempo todo. Já lhe disse para procurar outros caminhos para nós, mas ele parece colocado no traseiro do pai.

“- E o que Léo lhe dá não é suficiente? O que você gostaria? Que ele te desse o mundo ou que fosse como Márcio com Angélica”, perguntou Judith respondendo à pergunta que fez: “- Acho que tudo isso é ciúmes misturado com inveja. Eu já te falei o que isso provoca, sobretudo em quem sente e não a pessoa a que se dirige a inveja”, explicou a sogra.

“- Mariana, posso te fazer uma pergunta? Responda se quiser. Como é a sua relação com seus pais”, interpelou a anfitriã.

– Por que está me perguntando isso Eleanora?

– Amadeu estava perdido para nós por conta de uma ausência de comunicação coerente entre nós. Ele desejava muito viver das poesias dele e o pai querendo que ele fosse para as empresas. Então faltou algo de importante, inclusive o fato de Tarsila ser negra.

Mariana enrolou e não conseguiu dizer, mas foi socorrida pela sogra. “- Ela foi abandonada pela mãe e educada apenas pelo pai que a presentou quando fez 18 anos com uma casa e a vida, desaparecendo no mundo. Ela foi trabalhar em nossas lojas e conheceu meu filho, mas Léo seguia tudo o que o pai dizia, e ela estava insegura achando que ele iria abandoná-la depois de um tempo”, explicou Judith.

– Então vou lhe dizer uma coisa, menina. Judith é mais que uma sogra para ti. Ela é de fato a sua mãe. Talvez você seja a filha que ela nunca teve e por isso tu tem medo que Angélica a tire de ti. Por isso o medo de se mudarem para cá. Como não podes atacar a minha filha, agride a pessoa que a ama e, na sua cabeça, pode lhe tirar do coração de Judith.

Quando Eleanora disse isso, o mundo de Mariana veio abaixo e ela desabou em lágrimas. Sendo prontamente abraçada pelas duas que aguardou enquanto ela se recompunha. “- Desculpe-me dona Judith, mas tenho um medo terrível que a senhora prefira Angélica a mim. Ela tem dinheiro, todos aqui a paparicam e também o seu filho. É como se fossem o casal perfeito e todos os tivessem como exemplo a ser seguido”.

Judith cai na gargalhada. “- Menina. Não precisa fazer esse drama todo. Gosto de ti tanto quanto de Angélica e lhe tenho como minha filha por saber de tudo o que se passou contigo. Agora se você e Angélica fizerem meus filhos infelizes, a conversa é outra. Tranquilize-se, meu coração é gigante e há espaço para as três noras. Amanhã a senhorita vai jantar no apartamento dela e do Marzinho. Tudo bem”, perguntou a sogra.

“- Dona Eleanora, mil desculpas por agir como adolescente em sua casa, mas não estava sabendo lidar com essas coisas de achar que sua filha era o centro de tudo”, desabafou Mariana.

– Tudo bem minha filha. O mais importante é detectar a fonte do problema e solucioná-lo.

– Obrigado pela compreensão. Agora me dão licença que vou tomar banho e esperar Léo no quarto.

Enquanto a nora de Judith se encaminhava ao banheiro, ela dialogava com Eleanora informando que o jantar na segunda-feira à noite poderia deixá-los todos muito serenos. “- E você? Vai se encontrar com seu general no restaurante dele ou ficará aqui comigo segurando velas para Tarsila e Amadeu”, perguntou a mãe de Márcio.

– Farei uma surpresa para ele. Se eu avisar que vou, ficará cheio das nove horas. Então aparecerei lá assim de surpresa e, se tiver alguma sirigaita tentando tirá-lo de mim, rodo a baiana. Você sabia que Tarsila disse que ele é parecido com Marzinho, só que mais velho? As duas caíram na gargalhada. “- Se fossem pai e filho não se pareciam tanto”, disse Judith.

As duas amigas continuaram conversando por mais meia-hora com Eleanora prometendo auxiliar a nora de Judith no que fosse possível, mas a partir da narrativa de Mariana, entendia o comportamento dela e o medo de ficar sem a segunda mãe.

No apartamento da empresária, passado toda a adrenalina do dia e do pugilismo de Márcio e Tales, Angélica, na sala aguardava o marido que se banhava, enquanto ela já tinha se higienizado. Quando Márcio, já de pijama, chegou para chamá-la para a cama, a esposa estava toda eufórica, feliz porque as cenas de ciúmes do esposo superaram a do consultório médico e ele não pensou duas vezes: primeiro avisar e depois socar o diretor que estava extrapolando nos contatos com ela, justamente por conta de uma aposta que fizera com os outros dois diretores.

– Amor! Me explica isso! Eu ainda estou passada, pois você enxergou e ouviu coisas que jamais passariam pela minha cabeça que os meus diretores imaginavam isso de minha pessoa ou do meu esposo.

– Angélica! Já te disse isso uma quinhentas vezes hoje. Não sou de falar muito, mas observo muito mais na medida em que fico em silêncio. Sempre tive facilidades para fazer leitura labial e Roberto sempre soube disso, por isso, tentava me conter e hoje ele não conseguiu evitar isso.

“- Eu quando fico com ciúmes, faço escândalo, brigo, mas aviso o que vou fazer. Você não tem reação, apenas dá o bote como uma cobra que aguarda o desavisado passar”, explicou a esposa.

– Eu sei quem é a mulher que está do meu lado. Compreendo perfeitamente que onde tu passas, provoca olhares e isso é normal, como acontece comigo e tu sabes muito bem disso. Diferentemente de ti, eu não vou para porrada, pois não posso evitar o movimento desses homens e mulheres, entretanto, posso sugerir que se vista de uma forma que não chame muita atenção.

– Foi o que aconteceu hoje? Tales ficou me cobiçando com os olhos e você já havia percebido, mas ficou em silêncio e provavelmente falaria com ele a sós e numa boa, mas quando partiu para tocar-me ai a coisa saiu do controle.

– Vamos dizer que hoje ele levou a cabo a provocação que vinha me fazendo desde o meu casamento. Só que não contava que eu já sabia do que estava pensando em fazer porque o flagrei conversando com os outros diretores e fazendo apostas. Ele queria que eu aprontasse no casamento e se saísse como vítima.

– Por que não me disse antes?

– Porque queria pegá-lo no flagra!

– Nunca passou pela minha cabeça que tu fosses ciumento dessa forma e ainda agir em silêncio.

“- Se quiser eu mudo, mas aí já não será mais este que vos fala e ama. Pode ser uma outra pessoa e, sinceramente, não estou com a menor vontade de moldar um indivíduo para te agradar e nem quem quer que seja”, informou o editor.

– Sinceramente amor: é esse seu jeito de ser, flexível como a taboa e resistente como carvalho que me encanta. Fiquei completamente excitada quando te vi me defendendo e também o nosso amor. O Amadeu tinha me dito outras vezes que meu Marzinho era capaz de girar o mundo ao contrário para me defender e hoje eu comprovei isso.

– Você acha que uma mulher que atravessa o estado para me encontrar; entra dentro do meu quarto num hotel dizendo que não voltaria para cá sem a minha companhia; que ameaça ficar completamente nua num terminal rodoviário. Uma pessoa que tem um ciúme maior do que o universo, não mereceria meu coração? Quero ver o filho de uma puta que vai olhar diferente para tu a partir de agora.

Ao ouvir isso da boca do marido, Angélica senta em seu colo, segura firme o seu pescoço e lhe dá um beijo profundo, de pleno amor, indicando que a alma estava em total regozijo e em sintonia com o esposo. “- Obrigado minha paixão por me deixar sempre segura com relação aos seus sentimentos para comigo. Vamos dormir que amanhã o dia promete. A noite Mariana, Leônidas, Danisa e Roberto virão jantar conosco”.

Márcio olha espantado para a esposa. Não sabia do evento. “- Foi ideia da minha sogra e Eleanora. Parece que há uma certa implicância de sua cunhada contigo e elas acham que pode ser ciúme e inveja. Vamos saber amanhã. Você, Roberto e o seu irmão se encarregam da comida, enquanto eu e Danisa conversaremos com ela”, explicou a esposa.

Quando Márcio fez intenção de avançar o sinal, indicando que desejava mais alguma coisa naquela noite, a esposa o fitou bem dentro dos olhos e disse: “- Amor! Estou com a cabeça na reunião de amanhã. Quando estiver contigo, não quero fingir, mas estar completamente incendiada.  Não vai ficar chateado comigo né? Ei sei o que falei a tarde na casa de minha mãe, mas agora estou sem clima”, explicou a empresária.

– Não há problema algum, querida. Teremos uma eternidade pela frente para viver isso e muito mais coisas que o nosso amor nos proporcionará durante a jornada. Então cama agora. Já que terei que estar nessa reunião amanhã cedo.

– Você e Tarsila. Amadeu faz questão que ela esteja com ele e eu também te quero lá. Eleanora que conduzirá a reunião que provavelmente levará a manhã toda.

Márcio olhou para a esposa indicando insatisfação. Ele odiava reuniões de pauta. A sua paixão era a reportagem que lhe permitia flanar pelos locais, escutando história e buscar os detalhes de cada um e transformá-la em matérias jornalísticas. Muitos diziam, inclusive Roberto, que ele parecia mais um cronista do que realmente um repórter.

– Não adianta fazer essa cara de quem está comendo jiló e chupando limão. Te quero segurando a minha mão e pronto. Tu sentarás à mesa e ao meu lado, a exemplo do que Tarsila fará com meu irmão.

– Bom! Para quem surrou um diretor para proteger a amada, ficar com ela durante uma reunião de negócios não será complicado.

Depois dessa conversa, Márcio levou Angélica no colo até o quarto para delírio da esposa. Adorava quando ele agia desta forma, lhe transmitindo segurança, pois nunca iria deixá-la cair. “- Te amo meu preto lindo”, disse a empresária quando os dois já estavam deitados.

Embora a reunião estava agendada para às nove horas, Angélica pretendia chegar bem antes e, em virtude disso, ajustou o relógio para despertá-los às seis horas. “- Por que tão cedo assim, amor”, perguntou o marido. “- Para que um certo homem tenha tempo de voltar para terra e não chegar na reunião pensando que ainda está na cama”, explicou a esposa já dando risadas e se ajustando ao corpo do esposo.

Despertaram com o som do celular e também com o barulho da chuva que caia sobre a cidade. A empresária foi a primeira a sair da cama, enquanto o esposo tentava ficar mais um tempo no leito, mas não deu nem tempo, pois Angélica começou a empurrá-lo de um lado para outro. “- Está certo Rainha Diaba. Já estou indo”, tentou dizer o editor.

“- Estou te esperando no chuveiro”, sentenciou Angélica.

Quando o marido abraça a esposa por trás dentro do box, ela sente o membro ereto de Márcio e logo responde. “- Para esse aí despertar não precisa de relógio e nem ficar chamando. Basta encostar na minha bunda que já apita meio-dia”.

– Fazer o quê né, se o dono dele é louco por essa esmeraldina que o faz perder a noção de tudo, inclusive a própria razão.

Ao ouvir o marido dizer isso, a esposa se vira e o abraça e sem que ele esperava, faz um movimento em que suas pernas foram parar nas costas de Márcio sendo amparadas pela bunda do marido, enquanto o falo penetra profundamente à vagina de esposa que arfa de prazer, fazendo movimento sincronizado com ele. O jogo sexual durou pouco mais de cinco minutos, com o casal chegando juntos ao clímax. Com os olhos brilhando, Angélica sussurrou no ouvido do marido: “- Agora estamos prontos para começar um novo dia. Te amo de paixão”.

Márcio respira fundo e feito bobo olha para Angélica, dizendo: “- Sem você esse mundo não teria cor alguma. Seria um eterno cinza. Obrigado meu amor por dar um colorido especial à minha existência. Também te amo muito, minha dinamite de olhos esverdeadas”.

Rindo, Angélica lhe devolve a provocação: “-Depois do que vi ontem, se eu sou dinamite, tu és uma bomba atômica. Obrigado por fazer meus dias terem sentido”.

Saíram do banheiro, se aprontaram para o dia e Márcio surpreendeu a esposa ao se vestir com uma calça jeans, uma camiseta branca sem detalhe algum, um blazer azul escuro e um sapa-tênis da mesma coisa. “- Meu deus o que deu em meu homem para se vestir desta forma numa reunião nas minhas empresas”, perguntou Angélica.

– Resolvi indicar para aqueles três diretores cuzões, que não sou nenhum zé ruela e que estou casado contigo porque sou loucamente apaixonado por ti e não pelo seu dinheiro.

– Obrigado Marzinho. Agora vamos. Tomaremos café no mesmo lugar de sempre e não podemos nos atrasar. Quero chegar bem antes e conversar um pouco com Roberto para sentir o clima.

Ao entrar na confeitaria, o casal foi saudado com jovialidade pelas funcionárias que, se olharam diferente para Márcio, conseguiram disfarçar bem. “- O que será que ela tem”, perguntou a balconista a atendente. “- Não tem nada, exceto esse monumento com quem se casou e briga com o mundo inteiro por ele. Soube que surrou aquela professora que esteve aqui outro dia e ficou olhando em demasia para ele”.

– Se eu tivesse com um homem desses comigo e alguma mulher o fitasse como aquela professora estava fazendo, o mundo tinha acabado e a cara dela estava todinha arrebentada.

Quando Márcio e Angélica se alimentavam o telefone dela toca. Era Eleanora perguntando onde eles estavam. “- Tomando café aqui em nossa confeitaria mãe. Por quê?”.

– E que chamei o general para ir comigo nas empresas e participar da reunião, mas agora estou em dúvida. Achei que deveria ter te perguntado antes. O que achas, minha filha? Eu consultei o Amadeu e ele está tirando o sarro dizendo que vai escrever uns versos e o título será O general e eu. Pode uma coisa dessas Keka?

A filha começou a gargalhar, mas acalmou a mãe, devolvendo a pergunta: “- Se fosse eu a lhe fazer essa pergunta, o que a senhora me responderia”. A matriarca pensou um pouco e entendeu o que a filha queria dizer. Assim que desligou o telefone, Alexandre estava aguardando a namorada na sala. Olhou para o relógio e perguntou se estava atrasado.

“- Quando você se atrasou na vida”, Alexandre, perguntou Eleanora.

– Ao me demorar em te deixar fazer morada em meu coração.

Judith que estava próximo aos dois fez menção de rir, mas para não deixar o militar sem graça, tentou se conter. “- Obrigado Lê por me deixar entrar em sua vida. Agora vamos. Você ficará comigo na sala de reuniões”.

– Não! De jeito nenhum. Eu te espero na antessala.

– Já está decidido. Você fica comigo, me dando forças. Hoje iniciaremos uma nova fase nas empresas. Meu filho será empossado como vice-presidente do grupo. Uma coisa que Jô queria muito, mas não soube pedir ao filho para fazer.

Eleanora tentou se desculpar pelo fato de ter falado de Jô. “- Você não foi casada com ele? Não teve esses dois filhos maravilhosos com Jô? Ele não deixou esse patrimônio para vocês administrarem? Não tenho ambição alguma de substituí-lo em seu coração. Seria egoísmo de minha parte querer fazer isso. Como você mesma disse, hoje começa uma nova etapa. Só não quero que me compares com ele, pois vou perder sempre”, explicou o general Alexandre.

Com essa fala, Eleanora se sentiu mais leve e feliz e quando ia saindo, deu um beijo na face da amiga pedindo a ela que cuidasse da cabeça de Mariana. “-Ela deixou claro que precisa do seu abraço, do seu carinho e do seu colo de mãe. A tranquilize, Judith”, pediu a anfitriã.

Quando a presidente de honra entra na sede das Organizações Oliveira de mãos dada com o general, todos os funcionários se entreolharam, mas ninguém dizia nada, pois as notícias da surra que Márcio tinha dado em Tales ecoavam por todos os andares do prédio. Sem se importar com os comentários feitos pelos corredores dos departamentos por onde passava, a matriarca chega no espaço das salas dos diretores.

Cumprimentou Fernanda que sorri toda feliz para Eleanora. “- Eita! O que uma aliança no lugar exato com o homem certo não faz com um rosto e um coração lindo como o seu, minha cara. Parabéns por ter reatado com Ricardo. Acho que depois de ontem, ele não ficará pensando bobagens sobre ti e o meu genro”.

– Obrigado dona Eleanora. Estou imensamente feliz e se a senhora me permite, estou me sentindo como uma adolescente cheias de plano para o resto da vida.

– Então, um por um os realize sem pressa e seus amigos, com certeza, lhe auxiliarão no que for preciso. Agora diga ao Roberto que já estamos na sala de reunião. Quero passar alguns pontos com ele e saber como está a situação por aqui.

– Os diretores chegaram e se fecharam cada um em sua sala à espera do início do encontro com o restante da diretoria, dona Eleanora. Vou chamar o seu Ricardo.

Enquanto Fernanda conversava com o amigo, chegou Amadeu com Tarsila e a reação dos funcionários dos andares de baixo foi a mesma da que tiveram quando Eleanora chegou com o general, que estava impecavelmente vestido. Todos falavam dele e de sua postura como se estivesse passando em revista à tropa. Uma das secretárias chegou a aventar que a chefona tinha comprado o homem. Assim que terminou de falar, foi advertida pela colega. “- Eu acho melhor você não dizer nada. Essas paredes têm ouvidos. Tales apanhou do genro dela, não só por pensar asneiras, mas também por fazer apostas com outros diretores sobre o relacionamento da filha com esse tal jornalista”.

Amadeu e Tarsila foram mais solícitos com todos os servidores. Ele já foi dizendo bom dia, sorrindo para todos e cumprimentando alguns e a esposa se limitou a sorrir, mas sem exageros. Queria sair daquele ambiente o mais rápido possível. Aquilo lá não era o mundo dela e sim o da editora. Esperaria ser a primeira e a última vez que estaria ali entre aquele pessoal todo.

Assim que o poeta e a tradutora chegaram no andar da diretoria, no térreo, Angélica ingressava com o seu marido. A mesma funcionária que fez o alerta para a colega acrescentou que a beleza daquele homem tinha feito a esposa esmurrar a ex-namorada dele no banheiro do restaurante que a família possui no shopping. “- O que essa pretaiada tem que conseguiram o que nenhum de nós alcançou”, perguntou Patrícia. O que ela não contava é que alguém escutaria e voltaria para tirar satisfação.

– Dona Patrícia, por favor suba comigo. Teremos uma importante reunião da diretora e a senhora, com certeza, terá a resposta a essa sua esdruxula pergunta. Minhas empresas pagam-lhe o salário e em dia para que trabalhe e não fique especulando sobre a vida de seus patrões.

Renata que estava conversando com ela ficou alarmada, mas a situação piorou quando também foi convidada. “- Mas por que terei que participar dessa reunião, dona Angélica? Tenho tanta coisa para fazer aqui”.

– Se realmente tivesse, com certeza, não teria dado ouvidos à sua amiga. Então a dupla terá as respostas que tanto buscam.

Os quatros estavam dentro do elevador e a notícia chegou ao último andar do prédio, antes que o quarteto deixasse o elevador. Como faltavam meia-hora para o início da reunião, Angélica chamou Roberto, Fernanda e soube que todos já estavam dentro da sala onde aconteceria o encontro.

Renata e Patrícia temiam o pior. Quando todos se sentaram, as duas queriam se explicar, mas Eleanora foi direta: “- Não fiz pergunta alguma, então, não precisam falar nada até que sejam consultadas”.

Foi Angélica quem começou. “- Mãe, quando passada pelo andar em que essas duas trabalham, estavam tricotando e Patrícia perguntou o que os nossos cônjuges fizeram para estarem casados conosco e isso inclui o senhor general Alexandre”, explicou a empresária.

Ao ouvir que o namorado de Eleanora era general, as duas ficaram sem saber onde colocar a cara. Prestando bastante atenção na reação das funcionárias, a presidente de honra explicou com muita paciência. “- Meninas, como podem ver, todas essas pessoas pretas que estão conosco são tão humanas quanto vocês duas, contudo, eles têm algo que desconfio que a dupla não recebeu em casa: respeito pelo próximo”.

Patrícia e Renata começaram a ficar desesperadas, pois sabia que a coisa começava a ficar pesada para os lados delas. “- O Alexandre chegou ao posto máximo de nosso Exército, não porque era amigo de um diretor aqui e outro ali ou porque sabia sorrir no momento certo ou dormiu com outro executivo de minhas empresas para subir na hierarquia da organização construída pelo meu marido”.

Ao dizer isso, a matriarca sabia muito bem o que estava falando. “- Aquele que entrou com a minha filha, é Márcio, meu genro que além do conhecimento que tem, é muito humano e tenho orgulho de tê-lo como marido de minha filha. E poderia ocupar um cargo aqui nas minhas empresas, mas se recusou para seguir em frente no seu projeto de levar conhecimento e cultura aos adolescentes e jovens para que quando se tornarem adultos, como vocês duas, não tenham a mente tão obtusa a ponto de avaliar seus semelhantes pela cor da pele. Aquela lá, é minha nora, casou com meu filho na Alemanha e voltou recentemente ao Brasil para ser sócia do meu genro em sua editora”.

A dupla de funcionárias estava gelada, suando frio e sabia que poderiam sair dali desempregadas e com dificuldades para conseguir trabalho, pois muitos saberiam do motivo da demissão. Eleanora apresentou Roberto, como amigo de Márcio, mas estava lá não pelos laços afetivos com o genro dela e por ser competente.

– Agora vocês podem voltar ao trabalho. As respostas já foram dadas, entretanto, o futuro das duas aqui nas Organizações Oliveira será decidido por eles. Se eles fizerem uma queixa por racismo praticado dentro de minhas empresas, isso ficará ruim para todos que atuam aqui. O crime que a dupla praticou é inafiançável e imprescritível, portanto, a qualquer momento, as duas podem ter complicações com a Justiça.

Quando Patrícia e Renata deixaram a sala faltavam 15 minutos para o início da reunião. Eleanora disse ao general que todos iriam almoçar em seu restaurante no shopping. Telefonou ao gerente, informando que os funcionários que a atenderam na última vez que esteve lá com um convidado, deveriam servi-los novamente naquela segunda-feira.

Foi Márcio quem primeiro falou: “- Eleanora, você acha mesmo que precisa demiti-las”, inquiriu o genro. Ela respondeu com outra pergunta ao general: “- O você acha Lê”. Ele olha e transfere a pergunta para Tarsila que responde: “- Fiquei afastada mais de cinco anos de meu amor por conta do racismo e de atitude de pessoas como elas. Ontem um diretor foi racista com Márcio dentro de sua casa, enquanto estava com visitas e em sua maioria pretas, eu não vejo outra saída que não seja a demissão. Angélica rompeu a sociedade em seu escritório de arquitetura porque a amiga da sócia fez um comentário racista e hoje estamos aqui justamente para resolver uma situação envolvendo o racismo. Um policial colocou o revólver no rosto do Márcio dizendo que as testemunhas dele estavam no cano da arma”.

Todos ficaram em silêncio, pois entendiam as razões de Tarsila e mesmo que o general fosse contrário ou Márcio, a demissão já tinha sido acertada, inclusive para colocar ordem na situação. “- Roberto, deixe-as pensando até terminar a reunião, depois você comunica o pessoal do RH as demissões das duas. Poderia ser por justa causa, mas se fizer isso, elas não conseguirão trabalho aqui na cidade. Comigo e meus filhos elas não atuam mais”.

Quando os ponteiros do relógio marcavam nove horas, os diretores começaram a entrar e tomarem seus assentos. Os últimos a ingressarem na sala foram os três que deixaram a mansão no domingo, após se envolver na confusão racial com Marzinho.

Eleanora estava na cabeceira da mesa, assento antes utilizado por Jô e vago desde a sua morte. À esquerda estava Amadeu e sua esposa Tarsila e à direita Angélica e Márcio e do lado de Tarsila estava Roberto e ao lado de Márcio, o general. Fernanda foi convidada a se sentar ali, pois o motivo da reunião dizia respeito a ela também.

A matriarca abriu o encontro explicando o motivo daquele evento logo na segunda-feira. Todos já sabiam por ouvir dizer, mas era necessário saber da história pela narrativa dos envolvidos. O primeiro a falar, em tom protocolar, foi Márcio esmiuçando o jogo que os três diretores fizeram desde o casamento dele com Angélica, culminando com a confusão no dia anterior, pois Tales o ofendeu na condição étnica. “- Não posso afirmar com convicção se ele é racista em sua essência, até porque não convivi com ele, mas creio que seu crime de racismo foi motivado e estimulado pelos outros dois diretores. Sendo assim, tendo várias testemunhas, posso pedir reparações na Justiça, já que o crime é inafiançável e imprescritível”.

Eleanora franqueou a palavra aos três diretores que ficaram em silêncio, apenas entregando três cartas para Fernanda repassar à Angélica. Quando o trio pensava em se levantar, a sogra de Márcio determinou que ninguém saísse da sala e os três deixassem ali seus celulares. Depois ela informou a todos a situação, apresentando o general Alexandre como sócio num novo empreendimento que estava levando para as Organizações Oliveira, além de ser o seu conselheiro para assuntos de segurança.

– Quero que os senhores saibam que a partir de hoje, o meu filho Amadeu será o vice-presidente, cargo que estava vago e meu genro Márcio se recusou a ocupar por considerar que não poderia fazer, pois não trabalhou em nada para a construção dessas empresas, optando por seguir o ramo no qual é entendido. Como podem ver, entre os diretores que estiveram em minha casa ontem e desrespeitaram minha filha e meus convidados, com certeza eu ficarei com o meu genro.

Todos olhavam para a diretora, enquanto ela acrescentava. “- Tanto meu filho, quanto a minha filha são casados com pessoas pretas e eu tenho muito orgulho disso, pois Amadeu estava em outro universo, mas nenhum dos senhores, com todo o conhecimento que tem e tempo de casa, foram capazes de fazer o que Márcio fez: trouxe-lhe de volta o seu grande amor, a tradutora Tarsila que é sócia do meu genro.

– Pedi para a secretária da diretoria participar desse encontro num assento próximo a vocês para todos saibam que Fernanda foi muito bem recomendada para atender todos os diretores, mais especificamente os meus dois filhos, e ela também estava ontem em minha casa comemorando o noivado com o irmão da sócia de minha filha. Eles também são pretos. Portanto, quem entre vocês diretores e funcionários de minhas empresas que se acharem melhor do que qualquer um por conta da tonalidade da pele ou posição social e recursos materiais, podem encaminhar o pedido de demissão aqui para o meu diretor de comunicação que vocês conhecem muito bem.

Todos se entreolharam e Eleanora concluiu. “- Nem Márcio, nem Tarsila, nem Débora, nem Ricardo e nem o general Alexandre fazem parte dos quadros de nossas empresas, mas fazem integram a minha família e são meus amigos. Então quero que pensem muito bem sobre suas opiniões, pois não ousarei em demitir quem quer que seja que tenha comportamento racista com eles ou com quem quer que seja, pois se tivermos as informações e as provas, a demissão será sumária. Como está o rosto, Tales?

Foi o diretor de Marketing que saiu em defesa dos outros três diretores que apresentaram as demissões. “- Dona Eleanora! A senhora acha mesmo que é necessária a demissão deles? Não há nenhuma chance de reconsiderar e recusar a carta que eles lhe apresentaram”.

– Valdecir, a falta dos três não cabe reconsideração. Primeiro, eles fizeram suas apostas e perderam, além de o objetivo delas era humilhar meu genro em pleno casamento com a minha filha. E isso tudo dentro de minha casa, onde eles eram os convidados. Não satisfeitos, ontem voltaram a afrontar o marido de presidente das Organizações Oliveira, além de assediar Angélica em provocação ao Márcio. Agora eu te pergunto: e se fosse com a sua filha ou até mesmo contigo, qual seria a sua ação?

Diante da observação pausada de Eleanora, não haveria como sair em defesa do trio. A patifaria tinha sido grande e a punição ficou pequena, pois se Márcio quisesse levar o caso adiante, a situação ficaria complicada para os três, contudo, o nome das empresas apareceria, levando tudo de roldão. “- Dona Eleanora, lhe peço desculpas, pois acho que no lugar do seu genro eu teria feito coisa pior”.

Eram dez e meia quando fizeram uma pausa para o café e todos os diretores conversavam entre eles e o general falava com a matriarca a agradecendo por não falar nada do relacionamento dos dois. “- Eita general cagão. O nosso amor só interessa a nós e aos nossos amigos. Fique tranquilo homem. No almoço vamos resolver aquela sua situação no restaurante”.

Encerrada a sessão do cafezinho, a presidente de honra pediu que o genro, a nora e o namorado os esperasse na sala de Roberto. A conversa agora não tem nada a ver com os meus três amores. Vamos cuidar para que as engrenagens das empresas não parem e nem enferrujem por conta de alguns racistas que ainda pensam que a organização tem à cara de Jô. Os três ficaram conversando e Márcio aproveitou a ocasião para convidar o general para escrever de modo ficcional suas memórias.

– Podemos construir umas personagens sem precisar te revelar, general. O que acha Tarsila? Talvez não dê para ser lançada agora quando inaugurarmos a editora, mas podemos preparar para a remessa do mês que vem.

– Eu acho ótimo, desde que Alexandre tope a empreitada. Pode ser um título bem interessante que seja comercializável e é claro, o nosso amigo aqui ficará famoso como escritor.

“- E qual seria o título, minha cara”, perguntou Alexandre.

– Da favela à caserna.

– Estai gostei da ideia! Quem sabe pode ser útil para essa molecada que vive achando que as dificuldades são maiores do que a capacidade que cada um tem de modificar o seu cotidiano. A batalha é árdua, mas a vitória é certa. Só que não quero que meu nome apareça. Como isso pode ser processado?

– Usaremos um pseudônimo e sua identidade será preservada, meu caro general.

Após esse diálogo, o trio inicia a conversa que tanto Tarsila quanto Márcio gostariam de saber. O que Alexandre sentia por Eleanora. “- Meu amigo! O que sinto por ela não chegue nem perto do que tu sentes pela filha dela e você menina pelo Amadeu. Enquanto o amor de vocês é um fogaréu só, o nosso é aquela brasa que vai deixando o cupim pronto para ser degustado. É algo físico, mas ocupa mais nossas almas do que propriamente o corpo. Quero estar com ela a todo momento, mas sei que no final do dia, mesmo pelo telefone vamos dar boas risadas e eu dormirei sonhando acordado com ela”, tentou explicar o general.

Quando Márcio ia dizer algo, a porta se abre e é Eleanora quem chama o namorado. “- Do jeito que entramos, sairemos. Primeiro, eu e o meu amado general. Depois Tarsila e Amadeu, até porque minha querida nora, eles estão resolvendo os últimos detalhes para amanhã. O almoço é por minha conta em meu restaurante. E por fim, Angélica e meu genro-filho sairá com a dinamite dele. Não vai bater em meus diretores se eles acharem que sua esposa é uma delícia”, disse de forma zombeteira a sogra.

Sendo assim Tarsila e Márcio continuaram a conversar por mais uns dez minutos e o assunto acabou sendo a surra que o editor deu em Tales no domingo. “- Cunhado. Ontem eu vi o quanto tu amas sua galega e brigará por ela em todos os lugares. E também uma cruzada contra os racistas”, explicou a tradutora.

– Tarsila! A nossa cruzada não pode ser através da porrada e nem por meio de casamentos inter-raciais. Precisamos que todos estejam atuando juntos num único propósito. Estou com Angélica porque a amo, independentemente da tonalidade de nossas peles, sei que contigo é a mesma coisa e também com Eleanora e o general dela e agora com Fernanda. O Ricardo começou a perceber que a situação é outra. Meu irmão com Débora e Leônidas com Mariana. A cruzada tem que ser firme e podemos fazer isso por intermédio de nossa editora. Lançando autores brancos e pretos.

– Será muito legal lançarmos esse romance-depoimento do general. Pode ser o carro-chefe da nossa coleção voltada para esse segmento. Não podemos conduzir a editora como sendo uma ativista, mas que cuida com carinho de seus escritores pretos.

Assim que a esposa de Amadeu terminou de falar, o marido chega em companhia da irmã e Roberto. “- Olha só Marzinho. Minha mãe deu folga para o seu amigo a tarde todo, mas tudo tem um preço. Ele e Danisa terão que almoçar conosco no shopping e a noite em casa. Quando eu falei que tu, ele e Léo farão o jantar, tua sogra informou que o supermercado será feito por vocês dois. Fernanda também. Eleanora falou diretamente com o chefe do Ricardo e todos estarão no restaurante”.

– Jante com a gente hoje à noite, Tarsila.

– Não! Não consegui ficar sozinha com o meu esposo poeta e ele me convidou para ver as estrelas a noite. Afinal temos cinco anos para recuperarmos. Não quero estar num evento que tem um objetivo específicos para vocês.

Amadeu já foi dizendo: “- Meu amigo mosquito, tu não achas que já passou tempo demais em minha companhia e de minha esposa? Afinal tu tens a sua e que bela dinamite. Você até provocou a demissão de três diretores desta empresa”, disse o poeta rindo às gargalhadas.

Depois dessa conversa, Tarsila e Amadeu saíram da empresa em companhia de Roberto que buscaria a esposa para o almoço. “- O jantar de hoje, Marzinho, será também de trabalho. Afinal meu filho ganhou cinco por cento do supermercado que teu pai tem o maior percentual. Quero cuidar da herança dele e quem sabe comprar as ações do general”.

Cena semelhante ao que aconteceu nas empresas, ocorreu no restaurante. Alexandre chega de mãos dadas com Eleanora, sendo recepcionados pelo garçom mais antigo, Manezinho. A proprietária pediu que fosse preparada uma mesa maior, pois estariam chegando mais pessoas e fechasse o estabelecimento.

– O que eu solicitei foi providenciado, meu caro Manuel?

– Sim dona Eleanora.

– Você sabe do que se trata?

– Eu faço ideia, mas realmente não costumo me envolver na vida dos meus patrões.

Tudo pronto, inclusive o garçom que havia esmurrado o general nos tempos de caserna, trabalhou sem saber o que o almoço lhe esperava. Assim que a proprietária se acomodou na cabeceira da mesa montada para o momento, apareceu Amadeu e Tarsila de mãos dadas, para espanto do atendente. Diante da reação dele, Manuel só observava.

Amadeu pediu um uísque e a esposa um suco verde. Alexandre seguiu o filho da namorada, até porque estava um pouco nervoso. Enquanto os dois casais conversavam descontraidamente, deixam o elevador Fernanda e Ricardo que se assentam e começam a se interagir.

Rafael, o ex-soldado que agrediu Alexandre ficou espantado quando viu Fê chegando. Ele a conhecia, pois vivia a assediando e sempre ofendia Márcio porque sabia que o amigo dela era osso duro de roer. Se ela não estava com o “negão”, como ele dizia aos colegas, estava com Roberto que, segundo ele, deveria ser namorado do preto. Diante do que viu perguntou ao garçom mais velho. “- O senhor sabe o que está acontecendo? Está chegando uns brancos com uns pretos. Confesso que não compreendo porque essa gente se mistura com essa negraida”.

– Cuidado que tu podes sair daqui hoje chamuscado sem saber de onde veio a porrada. Eu se fosse você, faria o meu trabalho de boca fechada.

Passados cinco minutos, entra no restaurante Danisa e Roberto. O garçom ficou sem chão. “- Seu Manezinha aquela ali que entrou com aquele preto, vivia com conversinha com esse branquelo que entrou agora com aquela mulher grávida. Eu sempre tentei ganhar aquela mina, mas ela estava sempre colada num preto e se não era ele era esse outro. Quase sai nos tapas com aquele macaco”.

Quando o garçom se aproximava da mesa, Márcio entrou de mãos dadas com Angélica. “- Meu deus do céu! Fodeu seu Manezinho. Aquele preto que entrou com aquela loira divina ali era o cara que parecia um guarda-costas daquela outra lá que está beijando aquele tição”

Ao fazer menção de sair, Eleanora o chamou. “- Por favor meu jovem. Almoce conosco. Quero te apresentar a minha família e os meus amigos”, disse a patroa de forma provocativa. Ela pretendia indicar para o garçom que sabia o que ele havia feito com o general nos tempos de caserna.

Márcio, que falava baixinho no ouvido de Angélica, voltou sua atenção para onde a sogra dirigia suas palavras e viu quem era o funcionário. Pelos olhares os dois se reconheceram e não teve como ficar sem chamar a atenção dos demais, principalmente de Eleanora que perguntou: “- Vocês dois se conhecem”.

Márcio com muita franqueza afirmou que sim. “- Mesmo casado, ficava assediando Fernanda e, por mais que ela dizia não, ele ainda continuava a insistir. E vivia lhe perguntando, se ela preferia o órgão de um macaco do que de um branco, pois ficava desfilando comigo para cima e para baixo. Se não estava comigo, tinha outro xibungo que tomava conta dela”.

Roberto, por ser mais comedido, só o observava, mas a vontade era pular no pescoço dele e enchê-lo de murros. “- Ainda bem que protegemos nossa amiga. Ela não precisava de cafajestes tentando levá-la para cama e depois ficar contando vantagens para os amigos calhordas”, disse o diretor de comunicação das empresas de Eleanora.

– É meu amigo! A vida é uma caixinha de surpresas. Quem diria que o todo galanteador, falastrão, comedor acabaria aqui como garçom no restaurante de minha patroa? Aproveito para te apresentar o meu noivo, um preto por sinal, mas homem capaz de me fazer imensamente feliz sem precisar dormir comigo. Coisa que você tentou, mas não conseguiu graças aos meus dois amigos que tu vivias os chamando de baitolas.

O garçom não sabia para onde ir. Deveria sentar-se com os convidados da proprietária do restaurante, mas se não aceitasse o convite, com certeza, estaria desempregado, contudo, se ficasse, seria esculachado pelos fregueses. Pensou na mulher grávida em casa e como tinha sido estúpido, ignorante querendo dar-se pelo que não era para aparecer para os amigos e ainda por cima se passar por solteiro.

Sentou-se todo acanhando, tentando buscar proteção onde não tinha. Eleanora chamou o garçom mais velho e disse para anotar o pedido de todos. O general pediu picanha na pedra, sendo acompanhado por Amadeu, Marcio e Ricardo. As mulheres pediram frango grelhado e saladas verdes. O marido de Angélica pediu cerveja alemã sem álcool e ela um vinho branco que teve como companhia a mãe.

“- E você meu jovem, o que pretende comer com a gente”, interrogou a proprietária.

Queria muito comer a picanha na pedra, mas ficou envergonhado porque os homens pediram a iguaria e todos eles, de certa forma, tinham desavenças com ele. Tentou se levantar, mas foi seguro pela proprietária do estabelecimento que lhe disse de maneira firme: “- O que foi meu jovem? Não consegue ficar diante das pessoas que você cansou de humilhar por conta da cor da pele ou pelo fato de ser mulher? Achou mesmo que meu genro desse o rabo para o meu diretor? Quando for brigar, observe bem se tu tens porte para isso. Eu sei que foi expulso do Exército porque esmurrou o general aqui pelo fato dele ser preto. Ele está aqui agora, sem farda e sem caserna. Pode agredi-lo à vontade, mas saiba que eu não o troco por dez de você”.

O atendente ficou quieto e a patroa mandou lhe servir o mesmo que os outros estavam pedindo, exceto bebida alcóolica. Antes mesmo que os pratos fossem servidos, Rafael pediu licença pois precisava ir ao banheiro. O seu movimento foi acompanhado por Manuel que compreendeu o olhar de Eleanora e seguiu o garçom.

“- Eleanora, precisava ser assim”, perguntou o general.

“Quando um racista ofende um preto, o ofensor deve sentir a mesma coisa que fez o outro sentir no passado. Eu ofendi uma pessoa por desconhecer-lhe o caráter e estar iludida num mundo que não existe mais, contudo, dias depois eu perdi perdão, mas eu nunca ouvi da boca dele o tal do perdão, porém só o comportamento dele diz tudo. Obrigado Márcio por me fazer ver, com a sua simplicidade, como nós brancos estamos equivocados quando atacamos os outros usando o dinheiro, a posição social e a tonalidade da pele”, desabafou Eleanora.

A comida foi servida e o garçom não voltou para a mesa. Estava arrasado dentro do banheiro, mas ainda assim esbravejava e Manuel colocava pilha nele. “- Vai lá agora. Soca os pretos que estão lá. Cante a noiva do outro, fala que o genro da mulher é homossexual. Não é bom humilhar as outras pessoas quando se acha melhor por conta da cor da pele e ainda enganando sua esposa. Meu jovem, ore para ela não te colocar no olho da rua”.

– Você acha que ela pode fazer isso?

– Tenho certeza que sim e se fizer terá toda a razão. Eu vivia te dizendo, cuidado. Quando chegava pretos aqui no restaurante tu os tratava com pouco caso, desfazia, demorava em atendê-los e ainda cuspia na comida deles. Agora está ainda. Foi atropelado por uma locomotiva cheia de pretos.

– Porra Manezinho. Eu aqui todo fodido e tu ainda pisa mais.

– Não foi falta de aviso, mas se achavas o máximo. Aquela nota que o general colocou em nossos bolsos outro dia, foi só um aviso para ti. Ele voltaria para te pegar, mas não do seu jeito, mas do dele, afinal o cara é general e cheio de comendas e tu és um saco de merda que fodeu a vida da tua esposa quando a engravidou.

Quando Manuel voltou, a proprietária quis saber como o funcionário estava. “- Com a pressão baixa, dona Eleanora. Ele já vem”.

– Sirva o pedido dele na cozinha e o avise que depois terei uma conversa particular com ele.

Todos se alimentaram e ninguém se preocupou com as histórias do garçom. Aquilo fazia parte do passado, como disse Márcio, que combinava com Roberto o jantar em sua casa. Ricardo, mesmo sem autorização dos pais, disse a Eleanora para que Judith fosse jantar em sua casa naquela noite, caso Fernanda concordasse.

Para sacanear o noivo, ela disse: “- Só se o meu Marzinho for também”. Todos caíram na gargalhada, pois sabiam que Márcio estava em outra frente e o objetivo era para trazer a cunhada para junto dos mais familiares e não ficar apenas no coração da sogra. Enquanto todos conversavam descontraidamente, Eleanora se levantou e foi ter com o garçom.

Antes mesmo dela falar alguma coisa, ele a atacou com uma faca a atingindo no braço, provocando um corte na derme provocando um forte grito e em questão de segundos, o general estava dentro da cozinha quando o atendente queria golpeá-la novamente, mas foi desarmado por Alexandre que falou firme com o rapaz.

– Se o seu problema é conosco, porque não nos atacou, seu covarde. Tentar esfaquear uma mulher quando sabe o que gostaria era de me pegar e todos os pretos que almoçavam com ela.

Márcio entrou e já acertou o rosto de Rafael e depois perguntou porque tentou matar a patroa. “- Ela me humilhou na frente de toda pretaiada nojenta. Quero que ela morra”. Assim que ele termina de falar, foi cercado pelos seguranças da família, enquanto a filha e Amadeu socorriam a mãe.

Ricardo foi a uma farmácia no shopping, comprando artigos para os primeiros-socorros, enquanto a polícia chegava de forma silenciosa pelo elevador de serviços. Ao verem o general, os soldados lhe bateram continência, perguntando se ele estava bem, se precisaria chamar a Polícia do Exército. “- Não precisa nada disso. Apenas prendam esse sujeito”.

– O senhor quer nos dizer o que aconteceu?

– Angélica, leve sua mãe para casa e chame o meu médico. Só diga que estou precisando dos serviços deles. Eu farei toda a ocorrência aqui.

A matriarca foi levada para a mansão, mas estava mais assustada do que ferida. Enquanto o seu general fazia toda a ocorrência, pedindo restrição a tudo, justamente pelo fato de sua patente.

Terminada a ocorrência, o garçom foi preso por tentativa de homicídio e racismo. O general aproveitou para complicar mais ainda a vida dele, juntando o ataque a Eleanora, uma tentativa de matar um general do Exército.

Ao sair algemado, o garçom cuspiu na cara de Alexandre que, silenciosamente limpou o rosto e pediu aos policiais um minuto com o criminoso. Quando estava a sós com ele dentro da viatura, lhe desferiu um potente soco no nariz e disse entre os dentes. “- Isso é para você saber, seu moleque, que cuspiu na cara de um general e isso não ficará assim”.

Ao sair da viatura, o oficial pediu para que o tirassem lá de dentro e o colocasse na gaiola. Quando o garçom estava de pé, Alexandre desferiu um potente chute nos testículos de Rafael, lhe dizendo: “- Para fechar com chave de ouro e quem sabe tu aprendes a não enganar tua mulher e ficar assediando pessoas que não são da sua laia, seu imundo”.

Gemendo de dor, o garçom foi colocado na gaiola e a viatura seguiu para a delegacia e o general seguiu-a em seu carro. Lavrado o auto em flagrante por tentativa de homicídio e racismo, o ex-funcionário de Eleanora foi conduzido à cela e Alexandre voltou para os braços de sua amada.

Chegando na mansão, o militar encontrou a empresária sentada na sala sendo atendida pelo seu médico e uma enfermeira que fazia todo procedimento. A mulher, que estava se sentindo aflita mesmo tendo ao lado os filhos, o genro e a nora, se acalmou quando o seu general chegou.

Roberto não os acompanhou porque levou Danisa para casa, pois ela ficou apavorada com os gritos dados por Eleanora. Ricardo tirou a noiva do ambiente, tentando acalmá-la, porém, uma felicidade singular. “- O que foi preto. Que sorriso é esse? O mundo se acabando, minha patroa foi atacada por um serviçal e você aí todo prosa”.

– Nessa confusão toda, acabei por entender como funciona a amizade de você, Roberto e Márcio. É uma proteção muito forte e sei o quanto Angélica penou para ultrapassar essa barreira que os três se colocaram e também Danisa. Pude ver como estava sendo idiota.

Ao dizer isso, Ricardo abraça a noiva e a chama para voltarem para a casa dele. Teriam um jantar para organizar, já que a patroa havia liberado a secretária e conseguido junto aos chefes dele uma folga aquela tarde. Fernanda queria abraçar a sogra que provavelmente a acolheria como uma filha e Débora seria a irmã que nunca teve e, se havia alguma, nunca soube do paradeiro dela e nem mesmo da sua existência.

Depois de checar que estava tudo bem com Eleanora que, praticamente expulsou todos da mansão, pois desejava ser mimada pelo seu general que ligou para o seu cozinheiro, pedindo para ele assumir a direção do restaurante aquela noite. Estava ocupado e não sabia quando e nem que horas iria voltar. Ao ouvir isso, os olhos da matriarca brilharam como as estrelas no céu.

– Podem cuidar da vida de vocês. Foi apenas um susto! Um arranhão.

Judith olhou para a amiga e saiu da sala rindo e segurando no braço do filho. “- Marzinho, está tudo certo para hoje à noite? A Mariana foi para o supermercado com o Léo. Queria ajudá-lo no que fosse possível, já que foi nossa funcionária”.

– Está tudo certo sim mãe. E a senhora vai para onde?  A Eleanora ficará de chamego com o general dela.

– Vou com Esdras no jantar na casa dos pais de Débora. O evento era só para Ricardo e aquela desmiolada da Fernanda, mas os dois deram um jeito de nos incluir e aí vamos lá. E você e sua galega?

– Estamos bem mãe. Era para começar a terapia hoje, mas com essa confusão toda e o jantar, resolvemos deixar para amanhã. Pedirei para Mariana e Léo dormirem lá na torre. Acho que será legal. Tem um quarto de hospedes, assim poderemos conversar mais à vontade.

– Marzinho, a deixe tranquila. Tu sabes que ela não tem ninguém e a única família dela somos nós e por isso ficou enciumada, achando que Angélica iria roubar o lugar dela em meu coração. Até parece.

Ao olhar no relógio, o editor percebeu que já passavam das quatro horas. Queria descansar um pouco com a esposa, como sempre faziam antes dos eventos. Quando o marido chegava perto do automóvel, a esposa o alcançou, perguntando onde ele ia sem ela.

– Roubaria meu filho e o levaria para aquele motel em que estavam e você atendeu a minha ligação.

“- Aí que vergonha, Judith. Não gosto nem de lembrar”, afirmou Angélica.

– Minha filha, meu filho só tem olhos para ti, mas cuidado. Não disse que ele via sem enxergar. Olha como ficou a cara do tal de Tales que achava que o Marzinho não estava vendo.

– Ele que olhe para outro lugar que não seja o meu corpo e minha alma que a conversa será outra.

– Tchau mãe. Se cuide. Amanhã nos falaremos mais. Amo a senhora.

O casal entra no carro e se dirigem ao apartamento, onde pretendiam dormir antes de iniciarem os preparativos para o jantar.

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