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Com a presença de Judith em seu apartamento, Angélica pode se dedicar plenamente ao trabalho, organizando tudo para a viagem. Márcio foi melhorando e voltando ao que era antes, enquanto sua mãe observava o comportamento da empresária para com ele. Eleanora também passava as tardes lá com ela enquanto o jornalista dormia. Amadeu aparecia lá também para azucrinar o repórter com a história da aranha, da torre e da Rainha Diaba.
Numa tarde, Eleanora e Judith escutou os amigos conversando. “- Rapaz! Tua irmã é mesmo a Rainha Diaba e que diaba. Fez tantos diabretes que acabei aqui prisioneiro na Torre dela. Mas é uma prisão deliciosa. É sublime vê-la feliz. Nem parece a mulher que tentou me humilhar naquele domingo de manhã”, disse Márcio ao poeta.
– Meu amigo, você fez com ela o que ninguém conseguiu. Obrigou a baixar a crista. Ela achava que podia atropelar todo mundo, mas com o seu jeito de ser indicou que jamais lamberia os sapatos dela, aqueles que ela costumava pagar R$ 1000 para satisfazer as manias daquela Rosângela. Ainda bem que chegastes para tirá-la dos braços daquela Circe.
“- Do que eles estão falando”, perguntou Judith a Eleanora.
– Da sua futura nora. Teu filho é apaixonante por conta disso. Márcio poderia ser o que desejasse, mas optou por ser ele mesmo. Não vejo nenhuma gota de ambição que não seja a de ser e fazer a minha filha feliz. Quando descobriu que estava apaixonada por Angélica, sumiu, sem dizer para onde e nem porque, mas ela o achou. Estava na divisa do estado. Fico imensamente feliz de a mulher que se casar com ele seja a minha filha.
“- É meu Marzinho, mas posso dizer a senhora que às vezes achava ele meio esquisitão”, informa Judith.
Eleanora caiu na gargalhada, saindo rápido de onde estavam para não denunciar que espiavam os dois amigos no espaço em que sempre estiveram para escrever as tais cartas.
No final daquele dia, Angélica chegou um pouco mais cansada do que o habitual. Mas quando viu que a recuperação de Márcio estava bem adiantada, falou que marcaria uma sessão com a sua terapeuta. Estava ansiosa para aquele encontro. Puxou o jornalista até o quarto, pedindo licença a Judith. “- Amor! Estou ansiosa. Ela me disse que dependendo do que você falar, pode mudar a linha de ação. Por mais que me diga e tendo o apoio de sua mãe para o nosso casamento, ainda acho que tu podes ir embora, caso eu não consiga me desvencilhar dos fantasmas do passado”.
– Acalme-se! Uma coisa de cada vez. Primeiro. Dê-me um motivo para eu te deixar. Segundo, a sessão ainda não aconteceu, então não devemos sofrer pelo devir da existência. Terceiro: para onde eu iria sem o brilho dos seus olhos a me guiarem. O quarto ponto é: estamos de acordo que teus fantasmas perto dos meus, são enormes.
– Antes mesmo deu falar contigo, já marquei para amanhã à tarde e depois vamos ao médico. Quero que te avalie e diga se tens condições de viajar comigo à Alemanha. Quero terminar isso logo. Quanto mais próximo fica de oficializar o nosso amor, mais desparafusada fico.
– Amor, posso te fazer uma pergunta? Responda se quiser.
– Faça!
– Quando você e Rosângela oficializaram a união, quando pensaram em fazer isso, como você se sentiu? E por que se casou com ela? Você a amava? Ou foi tudo arroubo daquela mulher que numa certa manhã dominical e chuvosa chegou em meu prédio achando que podia tudo e mandava e desmandava, determinava quando a terra tinha que parar?
– Deixe-me pensar. Desde que descobri algo diferente por ti, não olhei mais para trás. Achava que aquilo tudo não tinha mais sentindo na minha vida, contudo, toda vez que eu tentava avançar, ficava encalhada lá. A minha terapeuta me disse que enquanto eu alimentar os eventos ruins do meu ontem, mais eles me perturbarão no futuro.
– Vai! Me responda. Quero te ouvir.
– Sério mesmo?
– Claro.
– Eu me senti atraída por Rosângela desde o dia em que nos conhecemos naquela exposição que fui para fugir de um programa social da família. Conversamos bastante naquela noite, depois eu a levei para a casa. Ela morava com uma irmã, que depois eu vim saber se tratar de Tarsila. Ela queria ingressar na mesma universidade em que Rosângela dava aulas. Antes de nos despedirmos, demos um beijo, metade no rosto, e parte no canto da boca.
– Continue.
– No dia seguinte, eu quem dei o primeiro passo, ligando para ela na universidade e marcamos de almoçar. Naquela tarde ficamos juntas pela primeira vez. E o resto você já sabe.
– Eu não sei! Você não me contou e nem me disse o que sentia por ela. Então até agora ficou na mesma. Se você não tiver a coragem de ir lá e olhar esse sentimento do ponto de vista racional, poderá apenas estar fugindo do passado com uma novidade: EU! E sinceramente, não sou vocacionado a ser instrumento de curiosidade de ninguém. Tenho bem claro o que sinto por você e, se tiver que seguir em frente sem você, o farei, porém continuarei com o mesmo amor que eu lhe tenho agora.
– Realmente as coisas estão confusas dentro de minha cabeça.
– Estou lhe dizendo isso, porque se eu for para a Alemanha contigo, pretendo voltar de lá como seu namorado, noivo ou até mesmo marido. Agora, se for para voltar de mãos vazias, melhor nem ir. E caso você resolva ficar com ela, só me avise. Não quero que minha mãe fique aqui nos esperando e eu retorne sem ti. Eu posso até te perdoar, mas acho que dona Judith não terá essa condição e, sinceramente não farei nada para que ela pense ou alimente um sentimento diferente.
– Eu sei que tenho quedas por mulheres também, mas quando estou com alguém sou fiel.
– Não duvido disso amor. Entretanto, meu receio é que isso dure uma tempestade de verão. Eu também estou inseguro com tudo isso.
– Você está me dizendo isso porque já tem um plano B né. Já está de olho em outra. Bastou ficar recuperado para colocar as manguinhas de fora. Você não presta mesmo. Vou te matar seu filho de uma puta!
– Você quer se acalmar. Como vou ter outra, se nem de casa estou saindo. Quem está cuidando de mim é minha mãe e a sua está aqui toda a tarde. Realmente assim fica difícil conseguir caminhar.
– Sai daqui seu bunda mole. Corre lá para os braços de suas amiguinhas. Ligue para a Fê, pede a ela para fazer um cafuné e depois chupar teu pau, seu desgraçado!
Quando ela termina de falar, Eleanora está dentro do quarto, querendo saber o que está acontecendo. “- Pergunte a sua filha. Estávamos conversando sobre o futuro, como foi a vida dela com Rosângela e ela começou a dizer que estava perguntando isso porque se, se reencontrar com a esposa na Alemanha e, caso fique por lá, eu já estaria preparando um plano B com outra mulher. Tem cabimento uma coisa dessas”.
O jornalista saiu do quarto e foi para a sala, onde sua mãe o aguardava aflita depois dos gritos de Angélica com ele. “- O que foi meu filho? O que está acontecendo com vocês dois? Ela chegou aflita e de repente começou a berrar contigo. Você fez algo de errado?”
– Não mãe! Não fiz nada! A não ser que desejar ser feliz seja algo de muito errado nesse mundo em que as pessoas compram umas às outras e quando isso não acontece, elas não sabem o que fazer. Sinceramente, não sei mais como agir com Angélica.
– Quer acabar com tudo isso, meu filho? Voltamos amanhã para casa e você termina a sua recuperação lá. Deixa que com o seu pai eu me entendo. Eu pagava o seu aluguel aqui e posso continuar a fazer em outra cidade. Marzinho essa sua noiva, ou quase isso, é temperamental. Do nada explode. Pense bem antes de dar um passo e observe o que Márcia fez contigo. Melhor passar o resto da vida solteiro, sendo chamado de esquisitão e carolão do que num casamento que não te fará feliz.
– Obrigado mãe. Mas deixe as coisas se acalmarem e aí vejo como vou fazer.
Enquanto Márcio conversava com sua mãe na sala, Eleanora chamava a atenção da filha. “- O que é isso Angélica? A mãe do rapaz está aqui. Veio para ver o filho e pode levá-lo embora se ele quiser. Não é porque ele tem 35 anos que perdeu o respeito pela mãe. Olha só como ele melhorou desde que Judith chegou. Ela está com um pé atrás contigo. Desconfia de sua relação com Rosângela e posso te falar, na condição de mãe, se ela falar que Márcio vai embora, nem todo dinheiro do mundo o faz voltar atrás.”
– Eu perdi a cabeça mãe! Márcio me encostou na parede. Quis saber o que eu sentia pela Rosângela. Se eu a amava. Disse que não viaja à Alemanha para voltar com as mãos vazias. Não quer que a mãe fique aqui e quando retornar eu não esteja com ele. Aí achei que estava arrumando pretexto para, por qualquer motivo, me deixar. Achei que a Fernanda é a mulher ideal para ele.
– Ele te falou isso?
– Eu que acho mãe. Ainda não conseguimos transar. Amanhã eu marquei terapia para nós dois juntos e conforme o que ele disser, a terapeuta pode mudar a linha de trabalho. Eu estou com medo que Márcio possa dizer que não quererá me ajudar.
– Minha filha, o rapaz só estará querendo poupar a mãe de mais um vexame. Ele já carrega aquela coisa da véspera do casamento fracassado. Se irá à Alemanha contigo, e, sabe-se lá porque, você resolve fazer uma nova tentativa com aquela professora. Como ele fica? Amadeu nos braços de Tarsila, você com Rosângela e Márcio, depois de tudo o que fez e te ama incondicionalmente, aceita que fique com ela? Você virou a vida desse homem do avesso. Sabes que tem uma dose muito grande de culpa por ele ter entrado em com alcóolico. Você não pode fazer isso com rapaz e tem mais, Márcio está certíssimo em querer saber disso tudo. Levarei Judith e Amadeu para passearem no shopping comigo. Te dou uma hora e meia para resolver isso, se não, eu mesmo acabo com tudo e pronto. Chega de brincar com o sentimento dele.
Ao sair fechou a porta do quarto e foi até a sala. “ – Judith vamos dar uma volta pelo shopping. Quero que leve umas lembrancinhas daqui. Deixe os dois conversarem. Creio que quando voltarmos, tudo estará resolvido entre eles. Duas personalidades bem diferentes que pretendem viver juntas precisam se ajustar antes de se tornarem esposos. Amadeu, vamos!
Judith entendeu o recado e seguiu a mãe de Angélica. Ao passar pelo filho lhe disse: “- Juízo meu filho! Você não precisa passar tudo novamente. Estarei sempre contigo”. Ao falar isso, beijou a face de Márcio sabendo o quanto ele gostava daquela mulher destemperada.
Angélica saiu do quarto e se sentou com ele na sala, lhe dizendo, com os olhos marejados; “- O que posso te falar?”. O jornalista olha para ela e sentencia: “- Comece me respondendo o que te perguntei”.
– Márcio! Quando penso que está tudo resolvido, vem você querendo mexer no passado e aí me deixa sem chão. Por que desejar saber isso dos meus sentimentos pela Rosângela?
– Bom! Me chamam de esquisitão, carolão, eu não ligo. Mas não quero mais entrar em canoa furada. Estou adorando ter minha mãe aqui comigo e vê-la toda empolgada com a hipótese de nos casarmos, mas quero ter certeza de que voltaremos juntos da Alemanha. Se tiver um pequeno percentual disso não acontecer, prefiro parar por aqui. Melhor enfrentar anos de briga com o meu pai desde que eu era adolescente do que embarcar numa viagem da qual sei que sairei em pedaços. Sendo assim, acho melhor não lhe ter no futuro, mas saber que poderia ter sido belíssimo se os encontros de nossas almas tivessem de materializado através de nossos corpos.
– Amor! Eu não sei. Não tenho a resposta que você quer, até porque eu só vou saber quando lá estiver. Muita coisa mudou desde a nossa conversa naquela noite antes do embarque dela. Márcio, como eu posso pensar no futuro se o homem que eu amo não me dá uma chance, não me transmite essa segurança? Eu te amo muito e compreendo que você não queira ficar entre nós duas e nem eu quero isso. Tenho aversão a ideia de triângulo amoroso. O que é meu é meu e pronto. Por exemplo, se me falasse preferir Fernanda, ou se sua mãe me dissesse desejar ela como nora do que eu, sairia do seu caminho.
– Por que a implicância com a Fernanda? Ela não faz o meu tipo e nem eu o dela. Nunca tivemos absolutamente nada.
– Só de pensar que você já dormiu na casa dela e como ela mesmo disse: bunda com bunda, minha cabeça ferve. E agora, tua mãe te chamando de Marzinho, me lembrei que ela te chamou assim também. Então ela sabia o seu apelido de infância e eu não.
– Quem contou isso a Fê foi o Roberto numa noite, para me sacanear porque ela me achava cheio de frescuras. Aí ele disse: ‘- O que você acha de um homem com mais de trinta anos que a mamãezinha o chama de Marzinho’? Ela falou aquilo para te zoar, provocar. Bom. Eu não sei mais o que te falar sobre o meu relacionamento com Fernanda.
– Eu achei muito fofo tua mãe te chamar de Marzinho. Me lembra o mar e esse diminutivo diz que é algo muito particular, especial. Aí surtei porque a Fernanda sabia e eu não. Eu que vou me casar com você não conhecia o seu apelido carinhoso.
– De qualquer forma, achei deselegante da tua parte berrar, gritar comigo, sabendo que minha mãe estava na sala. A tua mãe está fazendo de tudo para não deixar dona Judith colocar a colher dela no meio de nós dois e, do nada você surta e me ofende.
– Amor. Eu só te peço uma coisa: confia em mim, por favor. Se não eu não conseguirei seguir em frente. Ficarei como aqueles brinquedos de parque de diversões que bate e volta no mesmo lugar. Eu preciso estar com ela para colocar um fim nisso tudo, mas se não estiveres comigo, não sei nem se consigo sair daqui e tem o meu irmão que está esperando para se encontrar com Tarsila.
– Então faremos assim: amanhã vamos a terapeuta juntos e depois ao médico. Ele me liberando, marcamos a viagem. Preciso colocar um fim nisso também. Isso tudo está me matando. Não quero ficar assombrado com a hipótese de não estar contigo todos os dias no meu futuro. Também preciso me dar um voto de confiança. Quero abrir a porta da felicidade para nós dois.
Angélica subiu no colo dele e começou a beijá-lo com devoção. Márcio não conseguiu segurar a ereção, o que valeu um comentário sarcástico da arquiteta. “- Pelo seu brinquedinho aqui, você está pronto para uma vida a dois plena”, disse isso agarrando-se mais ao repórter. Ficarem ali mais um pouco e Angélica foi pegar água e os dois beberam, se aninharam no sofá mesmo, acabando por dormir.
Quando o trio chegou, encontrou os dois dormindo abraçados no sofá. Foram acordados pelas gargalhadas de Amadeu. “- Dona Judith. Esses dois brigam, mas acabam sempre assim. Dormindo nesse sofá, mesmo tendo duas camas enormes nesse apartamento”. Eleanora deu um cutucão no filho, pedindo para ele fechar a boca e não constranger a irmã.
Judith olhou para o filho e não falou mais nada. Sabia que não havia mais volta. “- Dona Judith essa Rainha branca aí é uma diaba. Tirou o juízo do seu filho”, disse o poeta que ia completar a frase, mas Eleanora foi severa com ele. “- Se tu falar o que está pensando, vai a pé até a mansão”. Todos riram porque sabiam o que ele queria dizer.
Eleanora pediu para Márcio descer com ela e pegarem as compras. O jornalista entendeu o recado e todos que estavam ali também. “- Pois não dona Eleanora. Vamos lá”. Quando entraram no elevador, ela já foi falando. “- Dei uma dura na Keka. Ela não pode continuar agindo assim. Precisa confiar em você. Tua mãe sabe que quase morreu por culpa dela. Judith queria te levar embora, mas eu disse que a decisão não era dela e sim de você”.
– Obrigado Eleanora. Angélica precisa resolver essa situação da Alemanha o mais rápido possível. Não teremos paz enquanto isso estiver entre nós. Eu entendo o ciúme dela, porque também estou enciumado. Tenho medo de chegar na Europa e ela optar por ficar com Rosângela e eu tendo que voltar ao Brasil sozinho. O que direi à minha mãe se isso acontecer? Dona Judith ficará aqui me esperado.
– Agora eu entendi tudo. Os dois estão inseguros diante de uma decisão dela. Mas lhe dê uma chance e ao amor de vocês. Essa prova terão que passar. Não dá para fugirem. Deixe sua mãe comigo.
No apartamento, Judith chamou Angélica para uma conversa séria e definitiva. “- Minha filha. O que eu vi aqui hoje, foi gravíssimo. Não se pode resolver situações como essa de vocês aos gritos e com ofensas. Meu negão é bom de mais contigo, porque se fosse o pai dele, o pau tinha quebrado na hora. Por que vocês brigaram? Ciúmes?”
– É! Tenho um ciúme terrível dele e acho que a senhora prefere a Fernanda com ele do que eu. Acabei achando que Márcio estava arrumando uma saída para ficar com ela por ser a preferida da senhora!
Judith deu uma gargalhada até os olhos que não passou despercebida pela arquiteta, pois era semelhante à do filho. “- Não era mais fácil me perguntar do que arrumar essa confusão toda? Eu conheci a Fernanda uma vez que ela foi em nossa cidade com o Roberto. Achei-a com os pinos soltos. Nem me conhecia e já estava me chamando de sogrinha isso, sogrinha aquilo. Cortei logo o barato dela. Falei que se meu filho se casasse com ela, poderia esquecer que tinha mãe. Ela me respondeu. ‘Dona Judith, estou brincando com a senhora. Adoro seu filho, mas ele não me serve como marido. Disso a senhora pode ter certeza’. Depois que ela falou isso, o Roberto confirmou, me deixando mais tranquila. Aquela moça e doida de pedra”.
– A maior parte de nossas brigas é por conta dela. Outro dia Márcio estava com ela num barzinho, depois de passar o dia inteiro sem falar comigo. Tinha desligado o telefone. A senhora me desculpe, mas fiquei cega quando vi os dois ali conversando como um casal de namorados. Joguei o chope na cara dele e dela.
– E o Marzinho o que fez?
– Não reagiu. Só pediu para eu me acalmar e a Fernanda foi embora.
– Fez muito bem minha filha! Colocou-a no devido lugar. Não deixe nenhuma mulher ciscar na sua área se você realmente ama o meu filho. Agora, não exagere, porque se ele falar não, é como mula empacada, não vai nem com reza brava. Quero muito que você seja a esposa de meu filho, mas se controle e não o deixe ficar no comando. Homem precisa saber que tem uma mulher do lado e não um capacho.
Márcio e Elanora entraram com as compras e pelo olhar de Angélica, tinha ganho mais uma aliada contra ele. A mãe da arquiteta chamou Judith para ajudá-la no jantar enquanto os dois se ajustavam. Quando começaram a conversar, Amadeu chamou o jornalista para que este lesse uma carta que havia terminado de escrever para Tarsila.
“Tarsila, minha amada. Lembra-se do supermercado, quando nos conhecemos. Não foi amor à primeira vista, porque as almas, de acordo com o panteão dos deuses, já tinham se visto desde o princípio da eternidade. Por isso te digo com as palavras que o coração formula: a mente tenta passar para as mãos o que deve ser grafado no papel. Sendo assim, digo, ou melhor, escrevo que você é o meu etéreo instante seguinte. O nosso passado não começou naqueles corredores, mas sim quando fomos criados pelo Senhor da Vida um para o outro. Aguarde-me que estarei em breve em seus lindos braços de ébano e você nos meus, fundindo nossas almas, como é desejo delas desde que o firmamento surgiu do caos, da escuridão. Acredito que o nosso amor é o que abastece de energia todas as estrelas que iluminam nossas noites. Sempre que durmo, sou guiado até seu espírito pelas luzes acesas pelo seu coração objetivando iluminar o caminho até seus braços. Te amo hoje, ontem, amanhã e até quando a eternidade durar e acho que vai ser por muito tempo. Estou chegando paixão”.
– Gostou, Márcio?
“- Meu amigo, pergunte a sua irmã o que ela acha se eu lhe mandar uma carta dessas”, lhe responde o jornalista.
– Amor! Se você me manda um texto desses, com certeza eu viria da Alemanha a pé só para sentir seu abraço, seu cheiro, seu beijo, seus olhos me devorando como naquele dia em seu apartamento. Eu me jogaria da torre Eiffel só para cair em seus braços.
– Caralho! Márcio. Não sabia que minha irmã era tão tarada assim por ti. Você fez a Rainha má ser a fada madrinha da Cinderela. Estais de parabéns! Derreter esse coração que ela tem aí dentro do peito não é tarefa para qualquer um. Para alguém que gostava de desfilar com sapatos de R$ 1000 e dizer que fazia e acontecia, como naquela noite em que jogou na minha cara que pagava minhas contas, Keka está mudada para cacete.
“- Meu irmão! Depois que conheci esse homem aqui, eu entendo o que tu sentes pela tua Rainha. Pode passar o tempo que for, estações, e ainda assim, tudo continuará como dantes. O devir será sempre o que sentes no presente. Ele não só te ajudou a encontrar o seu amor, como está me auxiliando a entender muita coisa. Obrigado amor, por ter ficado comigo”, disse Angélica como quem suspira as palavras.
“- Márcio. Tem muita gente querendo usar coroa, dizendo ser Rei, mas só o é aquele que consegue manter uma usina de energia chamada amor pela eternidade a fio. E isso vale para as Rainhas. Manter um Rei ligado vinte e quatro horas não é para qualquer uma”, explica o jornalista.
– Amadeu! Na próxima semana vamos até a Alemanha para você se encontrar com Tarsila. Eu já comecei a caça à suas cartas. Assim que eu as encontrar, trabalharemos para publicá-las em livro.
– Obrigado meu irmão. Te adoro Márcio.
Os três ficaram se olhando até que Amadeu mandou-os embora dali. “-Saiam daqui. Preciso caprichar mais. Minha Rainha de Ébano é exigente e não aceita textos como aquelas porcarias que você escrevia para o seu jornal de forrar gaiolas. Aquelas merdas, nem os ratos liam”.
Quando o casal passava pela cozinha, escutou Judith dizendo para o próprio filho e a futura nora. “- Cuida desse negão e, se tentar sair da linha, é só puxar o cabresto. Homem não pode dar mole não. Se tentar pular a cerca é só mostrar o ferrão”.
Todos deram risadas e o repórter falou: “- Poxa vida mãe! Pensei que a senhora estava do meu lado. Assim não vale. Está vendo o que você fez amor, conseguiu ter duas mães e eu fiquei órfão da minha”.
– Estarei com você se estiver certo, mas se deslizou apanhará das três. Então fique esperto neguinho. Não durmo com os seus olhos.
Márcio e Angélica continuaram o caminho até a sala. Judith levou um suco de maracujá, dizendo a arquiteta. “- Beba bastante filha. Você precisa se acalmar para saber levar esse homem aqui”.
– Obrigado sogrinha. Já está me acostumando mal.
– É para esse rapaz aí não ter motivo para querer olhar por cima do muro, para o quintal do vizinho, principalmente para aquilo que não deve.
Ao dizer isso, saindo rindo. “- O que vocês conversaram que ela está mais leve contigo, depois de nossa discussão?”, pergunta o jornalista à arquiteta.
– Eu não disse nada. Ela apenas nos surpreendeu dormindo juntinhos no sofá e pode ter visto como nossas almas estavam e continuam em paz. Te amo meu Marzinho.
O jantar foi servido. Todos se alimentaram bem. Márcio estava bem melhor. Amadeu só falava nas tais cartas e na viagem da próxima semana. Mostrava-se ansioso. Fazia tempo que nem falava com Tarsila. Ela só havia enviado uma mensagem para Angélica que estaria lá sim e que as saudades do Rei Branco eram imensas. Claro que a arquiteta não falou nada, para não deixar o irmão mais doido ainda.
Durante a comensalidade, Judith cochichou no ouvido de Eleanora que concordou. Depois da refeição Márcio foi com Angélica organizar a cozinha. Amadeu voltou para o computador e as duas senhoras se sentaram na sala e continuaram a conversa.
Quando o casal se sentou para falar com as duas, elas se levantaram dizendo que já era tarde, precisavam ir para a mansão. “-E a senhora mãe? Por que está indo com dona Eleanora?”.
– Menino. Não vou te responder em respeito a tua noiva. Amanhã eu venho cedo para cá, antes de Angélica sair para o trabalho dela.
– Dona Judith não precisa vir. Eu ficarei a parte da manhã com o meu a amor aqui e a tarde vamos ao terapeuta e ao médico dele. Se a senhora quiser a noite podemos visitá-la na mansão.
“- Está certo então minha filha. Boa noite. Durma bem filhão e juízo hein. Ainda não está de todo firme. Vai fazer coisas que ainda não está totalmente inteiro”, disse Judith em tom de malícia.
– Vamos Amadeu. Leve o computador e termina isso em casa.
Quando todos saíram, Angélica se dependurou no pescoço de Márcio lhe dando um terno beijo. “- Amor, obrigado de novo por me suportar e me ajudar a superar esse momento. Tenho certeza que depois dessa tempestade, vamos vibrar de felicidade.
Resolveram não apressar nada, nem mesmo aquela noite. O casal decidiu não falar mais nada do ocorrido, pois do nada, Angélica ganhou uma aliada. Se Fernanda tentasse alguma coisa além da amizade, sairia perdendo. “Meu deus do céu, como posso deixar esse homem escapar?”, pensou a arquiteta deitando a cabeça no peito de Márcio, ouvindo o seu coração bater e sua respiração acelerada.
“- Amor! Vamos tomar banho e dormir? Teremos a manhã todinha só para nós dois”, indaga Angélica. O repórter concordou e saíram de mãos dadas até o quarto. Enquanto ela se banhava, Márcio ficou sentado na cama pensando nela, na vida, na mãe e como a presença dela foi importante na resolução daquele conflito e também Eleanora.
Quando a arquiteta saiu do banheiro pronta para dormir, os olhos de Márcio se agigantaram e ela não conseguiu conter um sorriso. “- O que foi amor”, interroga Angélica. “- Você está linda nessa camisola. Não mostrando nada, mas ao mesmo tempo me apresentando essa beleza em que sua alma habita”.
A empresária estava com uma camisola verde esmeralda, com um conjunto de lingerie da mesma cor e a calcinha em estilo tanga. Ela deu uma volta e quando se voltou para ele, viu mais do que os olhos vibrantes de Márcio. Notou a reação no meio das pernas dele. Ela deu um tapa na perna do jornalista, dizendo que era bom ele ir tomar banho. “- Quem despertou agora precisa entender que o dono está convalescendo, necessitando de descanso”, informou a arquiteta dando risadas.
O futuro editor se levantou, sem se preocupar em esconder a ereção, até porque ela tinha visto o volume. Quando Márcio passa pela arquiteta, ela o segura pelo membro, lhe mordendo a orelha. Ele se volta e a beija, indo em direção ao banheiro. Quando volta já higienizado, encontra Angélica em baixo dos lençóis. Ao se deitar e entrar em baixo dos cobertores nota que a empresária estava completamente nua. “- Fique assim também. Quero senti-lo bem pertinho até o sono chegar para nós”.
-Tudo bem amor!
E assim ficaram até que o sono encontrou o casal, bem tranquilo e Márcio se controlando, mas sabia que o amor que nutria pela empresária era superior a qualquer tentativa de manter relação sexual, sem que ela estivesse totalmente em harmonia para que o ato fosse de troca e não de posse.