Sobras de um amor … parte II

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Angélica e Eleanora, depois do almoço se deixaram ficar no restaurante conversando. A mãe querendo falar sobre o passado em que a arquiteta foi violentada, mas tinha medo de tocar no assunto, justamente por ver a filha toda empolgada, começando a resolver sua vida de uma forma bem mais racional. “Depois que ela voltar da viagem eu converso sobre isso”, pensou a viúva de Jô.

– Mãe, assim que eu resolver tudo isso. Colocar tudo certinho, vou procurar uma assistência psicológica. Preciso estar inteira para essas novas responsabilidades. Tentarei ver se Amadeu quer também. O que a senhora acha?

– Eu que te pergunto: o que você acha? A última vez que falei com você sobre isso, o mundo quase acabou.

– Dona Eleanora! Aquele era outro momento. Agora a situação é diferente. Parece que tenho que estar inteira para o amanhã.

– Você quer dizer, inteira para o seu negão?

– Cruzes mãe!

– Filha! Não precisa esconder que você está de quatro pelo Márcio.

– Como assim?

– Keka! Você só fala nele. Quando não está falando dele, está pensando nele. Então admita isso para ti mesma. Se não fizer isso, continuará vivendo uma verdadeira bagunça dentro do seu ser. Observe. Para que você pensa em fazer terapia? Para ficar melhor para você ou para ele?

– Sinceramente não sei! Eu cheguei a picotar umas roupas dele. Disse que ia ficar com uma chave do seu apartamento. Por que queria isso? Agora ele sumiu, então fiquei como barata tonta. Mas consegui saber onde está, inclusive coloquei um dispositivo no celular que o amigo emprestou para saber notícias da mãe.

Eleanora deu uma forte gargalhada. Foi a primeira que a arquiteta viu deste jeito nos últimos anos. “- Minha filha isso é paixão, isso é amor. Mas tome cuidado para, caso seus desejos venham a se realizar, não deixe que o ciúme jogue tudo fora. Diga-me uma coisa: você já sentiu ciúmes de Rosângela?”

– Não!

– Então cuidado. Márcio é o tipo de homem que sabe olhar para uma mulher sem denunciar que está fazendo e se elas perceberem, vão dar em cima dele. Isso indica que o seu negão tem bom gosto e não sairá azarando, cantando ninguém e não é uma trepada que fará ele pular a cerca.

– Mãe! Posso te confessar uma coisa?

– Pode!

– Eu conheço esse olhar dele. É como tirar nossa roupa sem colocar as mãos. Tem uma lasciva desconhecida. É coisa de segundos. Ele não fixa os olhos, mas já viu sem fazer comentários, depois finge que não é com ele. Olha firme para você e não enxerga a mulher, mas a pessoa. E se a pessoa for dizer alguma coisa, é capaz de dizer que a interlocutora está vendo coisas. Se é flagrado olhando para outra mulher desta forma, é capaz de dizer que não estava vendo, ela quem passou diante dos olhos dele.

“- Enxergou tudo isso nele? Se viu então corre, porque se ele encontrar outra nesse buraco onde se meteu, adeus coração que arquiteta tudo, menos a possibilidade de viver um sublime amor. Você não o encontrará mais”. Eleanora disse isso e caindo na risada novamente.

– Por que está rindo? Abro-te o meu coração e você zomba.

Eleanora firmou os olhos na a filha e disse: “- você ama esse homem e só percebeu agora por que ele não está mais em seu alcance. Torço para que o traga de volta. Pois não vai achar outro em lugar algum. Ah leve ele para a Alemanha com você”.

– Mãe! Não estou apaixonado por ele. Apenas sinto a falta dele e da paz que me passa. Não se esqueça de que sou casada e ele é alguém que ainda vive no século passado, além de ser teimoso e se recusa a viver no presente. Não sei como se vira com a tecnologia.

– Mero detalhe que você usa para não admitir o que está no seu coração e demonstrado nos olhos. Se os vê-lo no espelho observará como ficam da cor de esmeralda quando fala nesse jornalista. Sua mente quer forçar o contrário, mas veja bem, filha querida, são dois contra um. Tenho certeza de que ele aparecesse aqui e se declarasse para você, você ficaria toda derretida.

– Acontece que Márcio nunca faria isso.

– E é por isso que você está loucamente apaixonada por ele. Por saber que o seu repórter especial jamais atravessará o samba. Olhe para você. Vai fazer uma viagem de 400 quilômetros. Para quê? Para trazer um homem que vai ajudar o teu irmão a reparar o juízo no lugar ou colocar o seu coração no lugar certo? Pense bem. Vamos?

– Vamos. Preciso arrumar as malas. Viajarei amanhã cedo.

– Malas para quê? Se você só vai lá e trazê-lo de volta. Não vão a lugar nenhum. Então faça como ele. Viaje só com a roupa do corpo. Ou está pensando em seduzi-lo antes?

Eleanora caiu na gargalhada novamente. Estava se divertindo com a filha que sabia muita coisa, mandava e desmandava e agora assumiria as empresas da família, mas se embananava toda quando o assunto era sobre a pessoa que a ensinou ler os poemas que as estrelas escrevem todas as noites.

Antes deram uma passeada pelo shopping e a mãe da arquiteta só prestava atenção nas vitrines que a filha parava mais tempo. Numa delas, Angélica ficou namorando os lingeries e perguntou a Eleanora o que ela achava. “- Você quer usá-las com quem? Rosângela está na Alemanha. Então, não precisa gastar dinheiro com isso! Os que você já tem são suficientes. Agora se for para um certo negão, acho que você deve olhar com mais cuidado e pensar bem”, respondeu a mãe dando risadas novamente.

– Mãe! Não dá para falar sério com a senhora. Só enxerga o Márcio! Acha que quero mover o mundo para tê-lo comigo.

– Filha! Você sabe por que o rapaz virou a sua cabeça?

– Ele não virou a minha cabeça coisa nenhuma!

– Você está certa. Ele te virou inteirinha do avesso.

– Chega! Vamos para casa. Tenho muita coisa para fazer lá. Arrumar minhas coisas para viajar e trazer Márcio de volta para me ajudar com Amadeu.

Entraram no carro e enquanto o automóvel se movimentava, mãe e filha ficaram bom tempo sem trocar palavra alguma, até que Eleanora quebrou o silêncio e começou a falar de Jovelino e de como os olhos dele brilhavam e mudavam de cor quando ele o assunto era Lourdes. “- Filha! Teu pai tem os olhos idênticos ao seus e só mudavam de cor quando o assunto era aquela mulher. Se ela se materializasse chamando-o para junto dele. Ele não pensaria duas vezes!”, disse a mãe à filha.

– Bom! Pelo menos sabemos agora de onde Amadeu tirou tanto amor por Tarsila. Antes de desaparecer, quando falava dela era como se fosse uma deusa nascida na Terra. Ele era capaz de ficar horas conversando sobre ela. Até que desapareceu. O Márcio inventou uma história de Amadeu escrever umas cartas e colocar dentro dumas garrafas de uísque e jogar no mar para que Tarsila recebesse na Alemanha. Quando começou a escrever, ficou sossegado. Seu filho virou outro, mãe.

– Ah! O Márcio que fez isso? Entendo.

– Num dia desses, o surpreendi olhando o pôr do sol da janela do apartamento. Do nada, me perguntou algo sobre as cores dos meus olhos com o laranja pintado no céu pelo Sol. Eu fiquei sem saber o que responder. Ele disse baixinho para eu escutar, mas também para que ficasse em silêncio só tentando compreender o sentido que estava naquilo que falou.

– E o que mais filha?

Angélica percebeu que Eleanora estava lhe dando corda para falar mais sobre o repórter. Em virtude disso, se calou. Em seguida colocou uma música e foi justamente uma que tinha escutado com o jornalista, antes dele desaparecer. A mãe percebeu que a filha ficou no automático. E para sacanear olhou do lado e gritou: “-Olha o Márcio ali!”

– Onde?

Eleanora não se segurou e começou a rir da filha. Mas resolveu ficar quieta. “- Querida, onde vamos jantar hoje? Estou perguntando porque sei que nos próximos dias vou ficar sozinha, então quero decidir também onde posso comer até que volte. Amanhã antes de viajar, me leve de volta para casa. Lá eu consigo me arrumar”.

Angélica nem ouviu o que a mãe lhe disse. Seguiu em frente, conduzido o automóvel como se fosse um robô. “- Filha, me deixe em casa agora. Você não está aqui. O corpo dirige, mas a cabeça e o coração estão muito longe. Eu fico lá e quando você voltar, me procure.”

– Está bem mãe.

A arquiteta mudou a rota e chegou à casa de Eleanora que lhe beijou a face desejando uma boa viagem. “- Traga meu futuro genro de volta. Se não terei dois filhos para ajustar os juízos”, disse a mãe dando risadas. Angélica só olhou e foi embora.

Ao chegar em casa, a arquiteta ficou tentada a ligar para o número que Roberto lhe dera, mas sabia que se o fizesse, Márcio passaria a fronteira indo para o outro Estado. Então resolveu responder à mensagem de Rosângela. “Tudo bem meu amor. Assim que eu resolver tudo aqui, compro passagem e vou ao seu encontro. Saudades. Angélica”. Assim que a mensagem chegou ao destinatário, a arquiteta recebeu uma confirmação do recebimento indicando que a mesma foi visualizada. Só isso é mais nada.

Foi para o quarto. Tomou um banho desejando se desligar de tudo. Precisava colocar a cabeça e a vida em ordem. Pensar naquilo que a mãe lhe falara sobre Márcio, Rosângela, Amadeu, Tarsila. Uma coisa tinha ficado evidente: tudo se ajustaria depois que, pelo menos falasse com o jornalista e entendesse as razões para a sua silenciosa fuga.

Enquanto passava o sabonete pelo corpo, ficou ali tentando decifrar o que Eleanora quis dizer em relação a ter mais um passado para se esquecer no futuro. “Será que ele desapareceu porque descobriu que não pode ser apenas meu amigo. E por conta desta aliança e de minha mania de ressaltar que sou casada, Márcio sumiu como um ser sem eira nem beira?”, pensou Angélica que começou a imaginá-lo sem roupa e como teria ficado nas duas vezes que a viu só de camisão transparente.

A arquiteta estava tão sensível que quando deu por si, estava se masturbando e os pensamentos preenchidos pelo amigo desaparecido. Deixou-se levar pelo desejo e por tudo que gostaria de vivenciar com ele. Descarregou toda a energia sexual acumulada, relaxando em seguida. Saiu do banheiro, se jogando na cama e ficando ali, esperando o tempo passar, até que caiu no sono.

Despertou com o celular tocando. Atendeu e automaticamente perguntou se era Márcio. Do outro lado da linha, a mãe gargalhava aos montes. “-Não! Sou eu Eleanora, a senhora sua mãe. Está tudo bem filha? Já arrumou sua mala?”.

– Não mãe! Acordei agora. Assim que cheguei aqui tomei um banho e deitei para descansar e acho que passei da conta. Vou preparar alguma coisa para comer. Depois vejo se encontro um filme para assistir ou ficar ouvindo músicas. Meu voo sai amanhã cedinho.

– Está bem filha. Volte logo e de preferência com o meu futuro genro a tiracolo. Ainda espero pelo perdão dele.

– Mãe! Pare com isso. Não existe nada entre eu e ele.

Depois que terminou de falar com Eleanora, Angélica se deixou ficar ali andando de um canto a outro do apartamento, pensando no que levaria e como seria o seu encontro com o jornalista. “-Engraçado. Ele sumiu só com a roupa do corpo e eu aqui encanada tentando ver o que levar para a viagem. É! Esse neguinho me bolou toda. Mas deixa ele comigo”, pensando desta forma, a arquiteta começou a rir sozinha, sentindo o coração leve, mas ao mesmo tempo uma certa ansiedade. Estava com medo da reação dele. Afinal, atravessou o Estado para se esconder dela, mas não teve como. Sempre havia um jeito de achá-lo e ela conseguiu.

Andava de um lado para o outro pensando em como fazer quando chegasse a cidade. Esperaria do lado de fora ou entraria e o aguardaria do lado de dentro do hotel. Achou melhor fazer-lhe uma grande surpresa. Daria um jeito de entrar no quarto e assim que ele adentrasse teria uma surpresa.

Arrumou mais ou menos uma pequena bolsa com coisas rápidas e duas trocas de roupas e mais três conjuntos de lingeries. Dormiu já quase de madrugada. E mesmo assim um sono agitado, com muita gente lhe apontando o relógio. Despertou com o telefone tocando. Era sua mãe. Queria se despedir da filha e como sabia do horário, também fez uso da ligação para acordá-la.

Assim que terminou de se preparar para a viagem, ligou para o segurança, pedindo para pegá-la defronte ao seu prédio. Quando desceu, Rodolfo fez menção de perguntar onde iam, mas a arquiteta só lhe disse: “- Vamos ao aeroporto e não me pergunte mais nada. É só o que precisa saber”.

Rodolfo ficou em silêncio, mas sabia que havia algo estranho. Todos sumiram do bar desde a morte de Jô. Amadeu também fazia dias que nem para almoçar aparecia no Bar da Net. Márcio também ninguém sabia. Ligou na redação para tentar arrancar alguma informação, mas nada. Quem apareceu por lá foi Márcia para saber notícias do jornalista. Enquanto conduzia a patroa até o aeroporto, o garçom-segurança ficou pensando o que aquela doida queria com o negão. “-Acho que aquele preto deve ter o pinto de mel. Não é possível. Essa doida aqui tem dinheiro que não acaba mais e fica atrás daquele mentecapto e agora aparece essa outra que chifrou ele na véspera do casamento. Qual será o segredo dele”, se perguntou o motorista.

Assim que parou no local apropriado, Rodolfo escutou de Angélica que era para ele ficar à disposição de dona Eleanora. Se acontecesse alguma coisa na ausência dela, o motorista podia procurar outro trabalho ou sumir no mundo, pois o destino dele seria a cadeia. “- Pode ficar tranquila dona Angélica. Atenderei sua mãe com todo o meu profissionalismo. Quando a senhora volta?”

– Quando eu voltar eu te ligo para vir me pegar aqui no aeroporto. Só isso que precisa saber. O resto não lhe diz respeito. Ou você pensa que eu me esqueci do comentário que fez naquela tarde no bar? Só não perdeu o emprego porque o seu “amigo” Márcio te defendeu. Então pense duas vezes antes de dirigir a palavra a minha pessoa ou fazer qualquer comentário a meu respeito ou de alguém com quem eu esteja. Márcio poderá não estar mais para te defender. E que o senhor tenha um bom dia!

O voo de Angélica durou poucas horas. Quando já estava em terra firme, procurou por um transporte, pedindo que a levasse a até a empresa que reservo um automóvel. Daquela cidade até o pequeno município em que o repórter escolheu para se refugiar, tinha uns 100 quilômetros. Era final da manhã e a arquiteta começava a sentir fome. Pensou em almoçar por lá mesmo, mas achou melhor não.

Estava ansiosa para chegar logo na localidade onde Márcio estava. Dirigiu com todo o cuidado pela estrada, fazendo o percurso entre as duas cidades em 90 minutos. Procurou o hotel onde o jornalista fazia de casa e em seguida procurou um restaurante. Queria almoçar e pensar com calma o que faria.

Como não desejava levantar nenhuma suspeita. Vestiu-se de maneira bem simples. Nada extravagante. Apenas jeans, camiseta e tênis e óculos escuros. Entrou no restaurante, escolheu um lugar bem distante da porta, mas que desse para olhar à rua. Quem sabe não visse Márcio andando por ali. Foi bem atendida e não inventou nada na hora de pedir o prato. Pediu peixe grelhado, salada agridoce e água.

Assim que terminou de fazer a refeição, levantou-se indo ao banheiro fazer a higiene bucal. Quando voltou, solicitou a conta. Assim que o garçom retornou, pagou e mostrou o visor do celular para o atendente enquanto colocava uma nota de R$ 100 na outra mão dele. Perguntou-lhe se tinha visto aquele homem por ali. Se havia estado no restaurante.

– Ele saiu daqui faz uma meia hora. Sujeito estranho. Não conversa com ninguém. Pede as mesmas coisas todos os dias. Usa roupas iguais, mudando somente as cores. Umas camisas velhas, barba por fazer. Por que a senhora está procurando por ele?

– O senhor sabe onde ele poderia ter comprado essas roupas?

– Eu sei porque a dona da loja veio aqui um dia desses e nos contou que um cara esquisito apareceu por lá e comprou um monte de camisas do mesmo modelo e apenas mudando de cores. Escolheu um sapato modelo antigo e disse que quando este acabasse voltaria para comprar outro. Desde então ele aparece no mesmo horário, come do mesmo jeito, pede a mesma coisa e sai na mesma hora. Olha para os lados. Não usa celulares. Outro dia, quando eu vinha para o trabalho eu o vi no orelhão falando com um cara. Sei que ele estava falando com um cara chamado Roberto e olhava para ver se não tinha ninguém próximo.

– Tudo bem! Obrigado pela informação.

– Ele fez alguma coisa? É fugitivo da polícia? Acho que não! O cara é muito esquisito. Outro dia eu percebi que ele estava com meias de cores diferentes.

Angélica colocou mais R$ 100 nas mãos do garçom, lhe dizendo: “- O senhor não me disse nada e nem me viu aqui e nem ele. Esse homem que o senhor viu não existe. É coisa de sua cabeça. É apenas um mito. Só isso. Boa tarde!”

Assim que saiu, o garçom ficou olhando para Angélica, pensando: “que gente esquisita. O que ela quer com aquele negão com cara de doido que ninguém sabe o nome? Bom. Por R$ 200, se ela me falasse que ele era o boi tatá, ele seria e eu ficaria bem quieto”. Quando o garçom imaginava que a cliente já tinha partido, foi surpreendido por uma pergunta dela: “- O senhor sabe onde fica a biblioteca municipal da cidade e se ela está aberta agora?”

O atendente lhe explicou, dizendo que funcionava sim e sua mulher trabalhava lá. “- Obrigado. Mas nem você e nem sua mulher me viram aqui e nem esse homem. Entendeu?”

“- Sim, senhora”, se apressou em dizer o garçom.

Angélica entrou no carro e seguiu as instruções que o funcionário do bar lhe passou. Ao chegar ao local, pediu os jornais do dia, perguntando se havia um local em que pudesse ler sem ser incomodada. A servidora informou que tinha, mas era preciso deixar um documento e pegar a chave. Ao invés de dar o documento, a arquiteta colocou uma nota de R$ 100 em cima do balcão e perguntou se aquele RG seria apropriado. Pegou a chave e informou a balconista que a chamasse quando faltasse uns 10 minutos para fechar. “- A senhora sabe se tem restaurante aqui na cidade que serve jantar?”

A resposta foi positiva, inclusive que era o mesmo local em que a arquiteta havia saído momentos antes. Angélica mostrou o visor do celular para a moça e perguntou se já tinha visto aquele homem por ali. “- Sim. Ele vem aqui todas as manhãs, pede uma chave. Só que ao invés da carteira de identidade, ele deixa uma nota de R$ 50 e diz que não é para ser incomodado. Apenas para bater na porta da cabine quando estiver faltando 10 minutos para fecharmos para o horário do almoço”.

– E no período da tarde. Ele não aparece aqui?

– Eu nunca vi. O pessoal chama ele de esquisitão. Não fala com ninguém. Usa camisas do mesmo modelo todos os dias. Só muda as cores. Parece estar sempre com a mesma calça ensebada. Como ele não fala com ninguém. Ninguém fala com ele. É um cara muito estranho, mas como fica na dele, então, deixa ele lá. Mas que é estranho é. Ele está morando no hotel. Meu irmão trabalha lá e diz a mesma coisa.

– Obrigado pela informação. Como é o nome do seu irmão? Quando estiver perto do horário você me avise ou se ele aparecer por aqui.

– Sim senhora!

Angélica entrou na cabine e leu os jornais da capital e também daquela cidade e da região. Queria saber tudo o que acontecia ali, o motivo que levou Márcio a se esconder de tudo e de todos naquela localidade que parecia ter parado no tempo.

Antes mesmo do horário combinado com a funcionária, Angélica saiu do compartimento, entregou a chave para a balconista, colocando junto outra nota de R$ 100 dizendo de forma categoria: “- Você nunca me viu por aqui. Tenha uma ótima noite!”

A arquiteta deu um giro pela cidade e ficou nas imediações do hotel, encontrando um boteco bem próximo da hospedaria. Passou lentamente com o veículo olhando para dentro do bar. Lá no fundo, viu alguém que se parecia com Márcio, mas não podia passar novamente, poderia chamar a atenção. “Mas vou arriscar”. Depois de uns dez minutos, voltou e já viu a pessoa de pé no balcão. Não deu outra. Márcio que pagava a conta e olhava para os lados. Angélica andou mais uns 10 metros e parou o carro junto à guia da sarjeta e ficou olhando pelo retrovisor.

O jornalista saiu do estabelecimento, desta vez usando um boné. Passou pelo carro em que Angélica estava e se dirigiu ao hotel que ficava ali perto. Entrou, pegou a chave e nem perguntou se tinha algum recado. Até porque ninguém sabia que ele estava ali. Desta forma, conseguiria pensar com calma na vida e o que ia fazer. Podia ficar ali um ano sem ser notado por ninguém. Se é que já não tinha sido notado por conta dos hábitos esquisitos.

Passados uns vinte minutos, Angélica entra no hotel e chama o atendente pelo nome. Ele estranhou porque nunca viu aquela mulher pela frente. “- Pois não! O que a senhora deseja? E a propósito como sabe meu nome?”, pergunta Rosevaldo.

– Olha só Rosevaldo, com um nome desses e ainda escrito no eu uniforme, não seria difícil advinhar como se chama. Vou ser direta. Vocês têm um hospede que está aqui faz uns quatro ou cinco dias chamado Márcio…

Antes que ela pudesse terminar de dizer o nome inteiro do repórter, Rosevaldo disse que não. Haviam poucos hóspedes e sabia o nome de todos, principalmente aqueles que ficam mais tempo no hotel.

– Você tem certeza absoluta disso?

– Tenho sim senhora.

A arquiteta coloca uma nota de R$ 50 sobre o balcão e fala para o atendente: isso é para ajudar a sua memória. “- Já lhe disse que não tem ninguém com esse nome aqui e pronto!”

Angélica não se dá por vencida, pois viu Márcio entrando ali fazia uns 20 minutos, enquanto ela ficou no carro aguardando. O jornalista não saiu. Então ela pegou o celular e mostrou uma foto no visor e mais uma nota de R$ 50 sendo colocada na mão de Rosevaldo. “ – E esse homem, está aqui ou não?”

– Esse tipo de informação eu não posso lhe dar. É confidencial do hotel e também dos hóspedes.

– Escuta aqui meu jovem. Tome aqui esse dinheiro e agora me diga. Está aqui ou não está?

– Moça. Ele está sim, mas está com outro nome. Guilherme, mas todos nós o chamamos de esquisitão. Não fala com ninguém e faz todos os dias a mesma coisa e no mesmo horário. Ninguém sabe quem ele é e o que faz da vida. Chegou aqui, pediu a suíte, pagando duas diárias antecipadas e não falou mais nada.

– Então você vai me fazer um favor. Pegue essas duas notas e as substitua pela chave do quarto em que ele está. Fique tranquilo não vai acontecer nada. Eu quero fazer uma surpresa a ele. Pode ser?

– Olha lá em dona! A delegacia de polícia fica aqui pertinho. Qualquer barulho eu chamo os tiras.

De posse da chave extra, a arquiteta subiu, chegando ao quarto bateu na porta e escutou quando Márcio disse: “-Não quero nada! Já é noite e não preciso de nada para o jantar. Caso eu queira, pode deixar que eu solicito!” Após ouvir a voz dele, o coração de Angélica parecia que sairia pela boca. Ficou em silencio fazendo movimento com os pés como se afastasse.

Passados dez minutos, ela entra no quarto e escuta o barulho do chuveiro. Fica apreensiva, olhando para todos os lados para ver se tinha um lugar para se esconder e surpreender Márcio. Achou uma poltrona perto da janela que estava aberta e a luz da rua fazia sombra com a parede. Permitindo que ficasse oculta. Sentou-se e ficou aguardando. O repórter sai do banheiro enrolado na toalha. De costas para o ponto em que a arquiteta estava, retira a toalha e joga em cima da cama. Nesse momento, leva um enorme susto.

– Eu sabia que sua bunda era linda, mas não fazia ideia o quanto era bela. Durinha do jeito que eu gosto. Agora estamos empatados. Você me viu pelas transparências e eu vi essa sua bunda deliciosa!

Ele se vira e se depara com Angélica gargalhando.

– Como você entrou aqui? Como me achou? Ao terminar de fazer as perguntas já estava com a toalha cobrindo sua genitália e com os olhos arregalados.

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