Júri literário
Quem ainda não se convenceu da traição ou não de Capitolina Pádua Santiago – personagem central do romance Dom Casmurro escrito por Machado de Assis (1839-1908) no final do Brasil Oitocentista – terá mais uma oportunidade para assistir o embate proporcionado pelo narrador-personagem da enunciação que encanta o mundo há pelo menos um século. O júri literário acontecerá nas dependências do Colégio Futuro no dia 12 de junho – dia dos namorados. De um lado, os estudantes do 9º ano A defenderão Capitu e de outro, o 9º ano B, tentará provar as teses do marido ciumento que desterra a mulher como adultera e enterra a mãe, Dona Gloria, como Santa.
Traição
E ai caros leitores, afinal, Capitolina foi adultera ou não? Aqui em Penápolis, no cenário político recente também teve uma questão semelhante, porém, com seres humanos de carne e osso e a quem acredite que o livro Malleus Maleficarum, ou simplesmente O martelo das bruxas será utilizado para o desterro daqueles que foram chamados de Judas, o Iscariotes somente porque não obedeceram ao cabresto central. Será que a personagem machadiana também não aceitou as rédeas que a sociedade patriarcal novecentista, através do advogado Bento Santiago, lhe impunha e resolveu quebrar as peias que a prendiam num jogo de cartas marcadas, sem, no entanto, ser adúltera? Qual foi o preço que a maior heroína da literatura nacional teve que pagar? A execração ficcional sem ter a menor chance de se defender.
Ficção…
No cenário concreto da existência política nacional e, por que não, local, a questão da traição ou quase isso é a tônica, mesmo porque Maquiavel já havia antecipado essa questão lá no século XVI quando publicou o seu Príncipe, no qual, entre outras coisas, ao líder não se deve cobrar a palavra dada, pois quando da promessa a situação era uma e com o correr do tempo o quadro mudou. Mas será que o procedimento vale também em relacionamentos matrimoniais como o ficcionalizado por Machado de Assis? Claro que são situações diferentes, entretanto, faz com que o ser humano pense sempre nas consequências de seus atos. Em Dom Casmurro um pequeno indício levou a esposa ao exílio, no caso concreto, deverá haver a caça as bruxas, ou melhor, o martelo das bruxas será aplicado naqueles que resolveram, assim como o Titã Prometeu a se rebelar contra os deuses criadores da humanidade, cujas criaturas ousaram questionar-lhes os mandos e desmandos.
Realidade
Muitos querem saber como é que ficará a situação na cidade a partir do momento em que o trono central foi ocupado por outro reinado. A preocupação existe porque, durante o mandato tampão do interino Rubens Bertolini (SD) este foi severamente criticado por seus ex-companheiros, inclusive recebeu a pecha de Iscariotes pós-moderno. Ele voltará a presidir a Câmara e manterá sua imparcialidade ou liderará a oposição, coisa inexistente até agora, ou estou enganado? Se haverá oposição, qual será? É preciso lembrar quem era contra ontem, hoje é só beijos e abraços! Coisas da política e para quem tem estômago, como se diz à boca pequena e os zum-zuns das mais diversas esquinas penapolenses.
“Inimigo”
Lembro-me de uma palestra ministrada por Padre Léo Tarcísio Gonçalves Pereira (1961-2007) que assisti numa rede de televisão paulista. Neste evento, o religioso fazia comentários sobre os inimigos que os seres humanos têm ou congrega ao longo da vida. É interessante notar que ele dizia que o inimigo não é alguém desconhecido, mas ao contrário, é um conhecido, mais especificamente alguém que lhe fora muito próximo num passado não muito distante e é conhecedor de muitas coisas sobre ti. Portanto, segundo a minha compreensão, é que quem não conhece o ser, dificilmente tornar-se-á seu inimigo, agora, aquele que estais junto de ti, pode levá-lo a dizer Tu quoque, Brute fili mi?[Até tu, Brutus, meu filho?]. Mas ai já não é comigo, prefiro me debruçar sobre outro enigma, qual seja, o criado pelo escritor Machado de Assis, o Bruxo do Cosme Velho, conforme poema que lhe direcionou o poeta Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) na década de 50 do século passado.
Esquerda
Deixando esse universo de ficção e realidade, na qual se debate o que é real e o que imaginário no cenário político local e nacional, tendo em vista que, com os últimos acontecimentos, os brasileiros acreditam mesmo que tudo não passa de um imenso palco teatral em que todos participam duma opera bufa, cujo orquestrador é o candango que habita a Capital Federal, quero recuperar aqui um aforisma do colunista Abel José Correa que publicou em sua coluna Eis a questão, estampada aqui no último dia 5 de maio. No tópico Jovens de esquerda ouçam bem, o missivista aponta que um indivíduo que está alinhado com a ideologia mais a esquerda do escrete político ainda não estaria preparado para mudar o mundo, através dum ato revolucionário. Isso reside no fato de que os mesmos não teriam experiência para conduzirem uma transformação social.
Recomendação
Achei interessante a parte em que ele vaticina: “Estudem. Sejam úteis à sociedade, em vez de sonhar com um emprego público porque é garantido e mais seguro. Antes de mudarem mundo, mudem primeiro o bairro […] para depois mudar seu Estado e o país”. Até ai nada de mais, mesmo porque as pessoas têm o direito e devem externar seus pensamentos, entretanto, esse trecho que destaquei me fez lembrar a personagem principal do romance Eu vos abraço milhões, do escritor gaúcho Moacyr Scliar (1937-2011). Ela sai da cidade de Santo Ângelo, interior gaúcho – o mesmo município de onde, em 1924, o capitão-engenheiro do Exército, Luiz Carlos Prestes (1898-1990) partiu com as tropas sediciosas em direção a São Paulo para posteriormente formar a famosa coluna Miguel Costa-Luiz Carlos Prestes que entrou para a história como Coluna Prestes. Na ficção, o jovem deixa o Sul em busca do revolucionário Astrogildo Pereira (1890-1965).
Enredo
A personagem perambula pelo Rio de Janeiro da década de 20 do século passado e trabalha na construção do Cristo Redentor, todavia, quiçá seus esforços, não encontra o líder revolucionário, mas conversa com pessoas que participaram de uma sedição sulista. Bom, para encerrar a questão, não há encontro com Astrogildo Pereira e o então revolucionário sonhador torna-se um homem de negócios, casado e com filho que se torna comunista, como ele fora na juventude, e é perseguido pelo Regime Militar. E-mail: gilbertobarsantos@bol.com.br; gilcriticapontua@gmail.com; social@criticapontual.com.br. www.criticapontual.com.br.