Reflexões

Começo meus aforismas críticos neste domingo, véspera de um dia dedicado aos índios, os verdadeiros habitantes dessas terras em que havia abundante madeira da cor de brasa, compartilhando com os meus leitores uma pequena observação feita pelo médico psiquiatra martinicano Frantz Fanon [1925-1961] que é apropriada para o momento em que o Brasil vem atravessando: “Mas o que são o entusiasmo e a preocupação de um homem se diariamente a realidade é tecida de mentiras, covardias e desprezo pelo homem?”. Esse excerto se encontra no livro Por uma revolução africana: textos políticos que a editora Zahar acaba de lançar no Brasil. Creio, meus caros, que vale uma reflexão, sem indicar ideologismos, teologismos e outros ismos inflamatórios de paixonites advindas de uma massa amorfa, cujos sujeitos sociais gostam de esconder nas sombras das maiores silenciosas, como nos diz o ensaísta Elias Canetti (1905-1994) em seu livro Massa e poder [SP: Cia das Letras, 2019].

Fantasma

Creio que todos que me leem semanalmente aqui, poucos são os que não assistiram e apreciaram um desenho animado que continua nos animando: Scooby-Doo e seu dono Salsicha e os outros três amigos que passam a juventude desvendando mistérios e fantasmas. O mais significativo é que o cão e o seu proprietário têm um medo danado de assombrações e elas acabam sempre os perseguindo. Interessante o programa, pois as nossas sociedades políticas continuam reinventando essa arte de enriquecer por meio de funcionários fantasmas e agora tem também candidaturas a cargos eletivos que não existem ou estão lá apenas para “inglês ver” como se diz no jargão popular, ou melhor, para fazer número. E não é que aqui em Penápolis esses fantasmas andaram passeando e em virtude disso o Tribunal Regional Eleitoral do Estado de São Paulo determinou que seja investigada uma suposta fraude eleitoral na cidade. O sinistro teria andado de lençol branco, de acordo com a representação feita, no interior do PSDB local no âmbito das candidaturas femininas. Aguardemos as cenas dos próximos capítulos, lembrando que a cada quatro anos o povo, seja em formato de massa ou individualmente, é conclamado a escolher novos governantes, legisladores e seus séquitos de apaniguados personificados nos cargos de confiança, resta saber qual é o grau dessa “confiança”.

Poéticas

Deixando os fantasmas de lado, mesmo sendo os que pululam os desenhos animados ou a vida real, principalmente no cenário da política nacional e me enveredando pelo âmbito da enunciação poética. Campo apropriado para que o escritor diga, conforme nos relata o filósofo Aristóteles em seu livro Poéticas, não o que foi, mas como ele, autor, gostaria que determinado acontecimento tivesse tido um desdobramento diferente. Portanto, a ficção é o campo apropriado para o real tornado imaginado pelo roteirista e escritor. Não se pode esquecer que toda obra ficcional é uma máquina preguiçosa que não pode dizer tudo, segundo o semiólogo italiano Umberto Eco (1932-2016). Sendo assim, o leitor precisará fazer a sua parte, transformando o “eu narrado” num “nós” em pleno ato narrativo, recheando a leitura com conhecimento histórico. Desta maneira, um artigo que publiquei aqui nessas páginas há coisa uns 10 ou 15 anos, não sei ao certo, objetivava tão somente trabalhar a distinção entre tonalidade de pele e condição pretérita l. A segunda chancela o portador da primeira por conta de sua ancestralidade africana. Daí Frantz Fanon ser significativo para se pensar o presente.

Poesias

E já que a temática é as poéticas e suas literaturas e formas enunciativas, compartilho aqui com vocês, meus caros leitores, a informação de que o primeiro volume do livro Coletânea Penpapolense de Poesias que sairá pela Editora Municipal de Penápolis já está em fase de edição e os participantes, entre eles, este que vos escreve, estão decidindo qual das capas ilustrará essa edição. Quem não enviou seus versos engavetados, não se preocupem, haverá novos volumes. Lembrando que cada escritor poderia enviar até quatro poemas. Em conversa com o secretário de Cultura, Lucas Casella, idealizador do projeto, fui informado que a ideia é ampliar mais a proposta dando visibilidade as Letras penapolenses. Ponto para essa Cultura e pronto.

Contos 

O secretário revelou ainda que entre o primeiro volume e o segundo dessa coletânea de poesias penapolense, será lançado um de contos, de forma alternada, ou seja, um livro de poesias, outro de contos. Está sendo pensado para essa modalidade que o participante envie dois textos breves, como dizia Julio Cortázar (1914-1984), que devem caber dentro de uma garrafa. Muito interessante essa definição de conto que tem em Machado de Assis (1839-1908) um dos grandes nomes. A enunciação deve ser breve, mas conter tudo o que o autor pretende expressar. Clarice Lispector (1920-1977) fazia isso muito bem. Se eu ficar aqui nomeando os contistas e cronistas brasileiros, meus leitores passariam o domingo em ótimas companhias. Mas fiquemos aqui no aguardo do lançamento do primeiro volume de poemas e posteriormente o de contos.

Academia

Frutificando essas obras, me parece, conforme dialoguei com o secretário de Cultura da cidade, pode ser gestado aí uma Academia Penapolense de Letras. Recordo-me certa vez que se chegou a aventar a criação do órgão nessas paragens maria-chiquenses, mas não passou de duas reuniões. Quem sabe agora, com a Editora Municipal e a possibilidade de publicar obras de escritores penapolenses, o projeto não deslancha de vez, inclusive com a realização de concurso de contos, poesias e a realização de uma Feira Literária de Penápolis. Parece-me que já aconteceram algumas edições aqui na cidade, contudo, por falta de visão de gestores em anos posteriores, o projeto foi parar na latrina.  Talvez essa mentalidade obtusa se coaduna com a ideia defendida pelo governo federal em taxar livros porque os pobres não leem. O jurista Rui Barbosa (1849-1923) dizia que um país se faz com homens e livros [eu acrescentaria e livres]. Agora se o chefe da Nação tem uma visão torpe a respeito desse material, então é possível entender o teatro dantesco que assistimos nesse momento pandêmico.

Escolas

Na conversa que mantive com Lucas Casella, lhe disse que um concurso de poesias, contos, realizado entre as escolas públicas e particulares da cidade seria bem-vindo num momento pós-pandêmico. Uma das provas que mais reprovam os estudantes secundaristas nos principais vestibulares do país é a temível redação. Então um evento dessa envergadura poderá vir auxiliar nesse sentido, estimulando as escolas a criarem em suas unidades trabalhos voltados para essas especificidades, como já havia para a participação na Maratona Cívico-cultural conduzida com maestria pelo amigo Adhemar Módena que faleceu no último dia 10 de março. Para este domingo é que temos, agora ao devir quem sabe uma discussão sobre escolas e pandemia. gilcriticapontual@gmail.com, d.gilberto20@yahoo.com,   www.criticapontual.com.br.