Gilberto Barbosa dos Santos
Sei que hoje poderia tratar aqui do descalabro em que se encontra o sistema penitenciário brasileiro, além de apontar diversos fatores que fazem com que o quadro seja caótico, todavia, optei por enfocar uma questão que, até onde me consta, todos gostam de dar seus palpites, sejam aqueles que vivem dela e para ela, passando pelos pais e outros sujeitos sociais que vociferam que a dita cuja é a saída para se colocar o Brasil nos eixos. Entretanto, muitos se esquecem de fazer a parte que lhes apetecem na condição de responsáveis pelos seus filhos. Desta forma, posso afiançar que a grita parece ser uma só e recheada por uma singela interpelação: qual educação os brasileiros querem?
Diferentemente da maneira de fazer um bolo – em que se se seguir os preceitos, a guloseima para ser apreciada no chá da cinco ficará pronta e encantará as visitas – para responder a interrogação formulada no parágrafo acima não se tem uma receita, mesmo porque o Brasil é um país continental com mais de oito milhões de quilômetros quadrados, recheados por miríades de diversidades culturais, religiosas permeadas pela sua regionalidade. Contudo, quiçá seu aspecto geográfico, me parece que algumas medidas que podem ser adotadas pelos nossos governantes viriam a nos indicar uma luz no fundo do túnel. Mas até onde sei, não há um interesse efetivo em transformar o universo educacional do país, proporcionando assim uma Nação diferente num futuro não muito distante em que a cidadania seria de fato exercida pelos indivíduos.
Se isso é fato, então se deve fechar as portas e todos irem para suas casas e criarem em seus interiores altares de lamentações onde serão depositadas as esperanças de um futuro bem melhor do que o presente que o povo vivencia e olha que o mesmo é dantesco, em que a ética e moral não existem e o pronome mais utilizado é o “eu” seguido do possessivo “meu”. Lógico que nessa arquitetura escudada no egocratismo marcada, sobretudo pelos governantes que adoram dizer “nosso” governo, discurso no qual o particular, numa espécie de simbiose nefasta para a democracia, se mistura com o coletivo sem que o segundo perceba que está ajudando a sacralizar uma maneira muito própria da política brasileira e que todos conhecem por populista administrada pelos asseclas desses sebastianistas.
Mas, por outro lado, ainda creio que exista alternativas ao caos educacional que reina na Nação. Na última segunda-feira, um jornal de circulação nacional publicou uma entrevista de página inteira com o biólogo educador Lee Sing Kong, vice-presidente da Nanyang Technological University (NTU) em Cingapura. Na dupla condição de pai e educador, tentarei sintetizar, aqui nesse espaço, minhas impressões sobre o que o cingapuriano disse aos leitores daquele jornal. Ao ser interpelado pelo repórter sobre o que Cingapura – ex-colônia pobre da Inglaterra – fez na esfera educacional para chegar ao topo do ranking do Pisa – “a mais importante avaliação internacional da educação” sob a coordenação da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico).
“Fizemos uma grande revisão em 2009 e desenvolvemos um modelo de formação de professores para o século 21. O estudante agora é o centro da educação. O aprendizado no século 20 era passivo, hoje é ativo. Nós temos que permitir que os alunos sejam responsáveis pelo seu próprio aprendizado e os professores são os facilitadores, não o principal fornecedor de conteúdo”, diz Kong, acrescentando que uma das coisas que as autoridades cingapurianas fizeram foi “ensinar com questionamentos corretos, com perguntas, ajudando a criança no processo do conhecimento. Isso faz com que desenvolvam um pensamento extremamente crítico”, afirma o educador. Se compararmos essa prática educacional de Cingapura com o Brasil, é possível apontar que, enquanto lá, os estudantes se tornarão adultos críticos, aqui o futuro me parece esdruxulo, no qual a crítica será sempre vista como afronta aos homens do poder acostumados desde o berço – herança do nosso sistema escravista – a serem bajulados, enquanto a raia miúda, como aponta Machado de Assis, vive ad infinitum dependendo das migalhas que caem do alto do trono.
Em outro ponto da entrevista, Lee Sing Kong diz que os cingapurianos sabem como querem educar seus alunos. E o Brasil, sabe? Deixo essa pergunta para ser respondida no transcorrer de 2017, ainda mais nesse momento em que se aproxima o início do ano letivo e com ele uma miríade de desafios para os educadores, equipes gestoras e seus pedagogos e diretores, sejam eles das escolas públicas ou particulares. Posto isto, me atentarei ao que diz o educador cingapuriano. Segundo ele, os estudantes de lá – e penso que os de cá também – precisam “[…] ter habilidades para serem relevantes no tempo em que vivem (integralidade, pensamento crítico, curiosidade, amor a Cingapura [Brasil])”. De acordo com o entrevistado asiático, somente quando os responsáveis pela educação estabeleceram esse princípio puderam falar sobre qual currículo era necessário, bem como quais avaliações e atividades seriam aplicadas.
“A chave do sucesso é: todos os componentes do sistema educacional precisam estar alinhados. Se o currículo vai para um lado, a formação dos professores vai para outro e avaliação para outro, como vai ter impacto? Se muda o currículo, a formação de professores precisa mudar também”, explica Lee Sin Kong. Além dessas observações, o educador informou que o setor educacional em seu país é o segundo que mais recebe investimento do governo e desta forma, “bons profissionais foram atraídos para a carreira de professor, que teve salário equiparado ao de um engenheiro”. Ou seja, lá “o professor é crucial para o país”, tanto é, que o profissional é valorizado, enquanto aqui, todos já sabem, mas o processo está na contramão em diversos pontos, entre eles, o fato de a sociedade estar com as costas viradas para a educação, terceirizando princípios fundamentais dentro do universo educativo que devem ser passados pelos pais durante a socialização primária. Fico por aqui, mas quem desejar ler a entrevista na integra é só acessar http://www1.folha.uol.com.br/educacao/2017/01/1850158-professores-e-curriculo-tem-de-estar-alinhados.shtml?cmpid=compfb.
Gilberto Barbosa dos Santos, sociólogo, professor no ensino superior e médio em Penápolis. Pesquisador do Grupo Pensamento Conservador – UNESP e membro do Conselho Editorial e Científico da revista LEVS-UNESP. Escreve às quintas-feiras neste espaço: www.criticapontual.com.br. E-mail: gilbertobarsantos@bol.com.br, gilcriticapontual@gmail.com, e social@criticapontual.com.br.