Sobras de um amor…

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         ­“- Amor, gostou deste lingerie azul que coloquei só para esta nossa noite especial?”, dizia a mulher se contorcendo toda para se tornar mais sensual do que a roupa intima lhe deixava.

“- Nossa! Ficou lindíssima. Já estava todo aceso e na expectativa. Agora então, meu tesão está há milhão e só diminuirá quando estiver dentro de você, te fazendo gozar de montão! Então venha encher o seu macho de prazer! Venha meu amor!”

Márcio já dava partida no câmbio entumecido, roçando-o na porta de entrada de sua casa do amor, mas um barulho ensurdecedor começou a incomodar. Ao virar do lado para ver do que se tratava, percebeu que estava com a mão no pau e que tudo não passou de um sonho e que havia sido despertado pelo som do telefone que não parava de tocar.

Como o aparelho insistia, o jornalista tratou logo de atender a ligação. Olhando pela janela de seu apartamento, observou que a chuva iria castigar avidamente o domingo. Coçou os olhos, sentiu a boca amarga e uma ressaca invadiu sua memória e alguns lampejos da noite anterior chegou ao cérebro, fazendo com que o repórter levasse a mão a cabeça, sentindo-a pesada e ouvindo as ressalvas do amigo: “pegue leve amigo, não tô afim de ser babá de cachaceiro hoje!. Se tu travar as quatro rodas, te jogo na sarjeta, te deixo lá e segunda-feira será demitido por excesso de alcoolismo!”

O telefone toca novamente e Márcio berra, como se quem estivesse do outro lado da linha estivesse ouvindo. “- Já vai caralho! Quem será o porra que tá me ligando a essas horas? Deve ser algum filho da puta que não tem o que fazer!”

– Alô!”

– Senhor Márcio?

– É!

– Será que dá para o senhor descer aqui na rua?

– Quem é que está falando?

– Desça e vamos conversar. Prometo não tomar muito o seu tempo.

Ao ouvir essa observação, o repórter dá uma olhada pela janela e vê apenas um enorme guarda-chuva azul e uma silhueta que usava saltos, fazendo com que compreendesse se tratar de uma mulher, mesmo que a voz no telefone parecesse fortemente feminina, Márcio era muito desconfiado, justamente por saber que muitas vozes podem ser modificadas com equipamentos tecnológicos. Sabia disso por ter assistido muitos programas de investigação e durante o curso de jornalismo fizera várias atividades com renomados profissionais da chamada Linguística Forense.

– Está bem! Estou descendo. Dê-me um segundo só!

Ao olhar para o meio de suas pernas, percebeu que sua cueca estava toda manchada. Devia ter gozado durante o sonho de amor. Não ficava bem chegar perto da mulher, com o pau duro e as roupas de baixo cheirando a porra. Correu para o chuveiro e tomou um banho tão ligeiro que parecia um gato. Vestiu-se tão rápido quanto passou pelo chuveiro. Desceu rapidamente para atender a pessoa, mesmo sentindo o estômago revirado pela bebedeira da noite anterior.

Entrou rapidamente no elevador e num pulo estava no saguão do prédio, abriu a porta e foi ao encontro da mulher misteriosa que havia pedido para ele descer. Da porta mesmo, pode fazer uma avaliação do corpo daquela pessoa e da roupa que usava: calça jeans não muito justa, nem muito folgada, mas o suficiente para que Márcio percebesse que cobria uma parte interessante do seu corpo. Se concentrou no sapato que a visitante usava e a imaginou o retirando na sala de seu apartamento para aliviar a pressão dos pés. Rapidamente, o jornalista se imaginou mordiscando as solas daqueles pés que acreditava serem lindos.

Enquanto se dirigia à mulher, terminou por fazer a avaliação, chegando à parte de cima onde se delineava um par de seios magníficos que fizeram Márcio imaginar os tendo em sua boca, sorvendo os mamilos, enquanto ela se contorcia em seus braços. Mas tudo isso desapareceu num piscar de olhos quando ele chegou perto dela, apertando-lhe a mão, dando-lhe bom dia. Como exalava um forte cheiro de bebida, a visita se afastou o suficiente para não inalar aquela baforada de bebida exalando um forte odor misturado com perfume vencido. Ela se apresentou cordialmente, fazendo com que o jornalista se perguntasse de onde a conhecia, mas não conseguia se recordar.

– Bom dia, senhor Márcio. Eu me chamo Tarsila e vim lhe falar sobre essa matéria assinada pelo senhor que foi publicada por este jornal hoje.

– Ah sim! A senhora gostou?

– Não! E estou aqui para pedir-lhe que não continue a escrever sobre isso! Não tem necessidade nenhuma dessa história ser sequenciada!

– Do que a senhora está falando? Aqui tem apenas uma pequena introdução de uma série de crônicas que pretendo publicar todos domingos e não diz respeito a ninguém.

– Pode ser para o senhor, mas para as pessoas que devem ilustrar esse e os futuros textos mequetrefes, dizem muita coisa sim. Então pare ou serei forçada a tomar medidas mais drásticas contra o senhor e esse jornalzinho de quinta em que o senhor escreve.

– Por favor, dona Tarsila, quer me explicar o que está acontecendo?

– Não se faça de desentendo. O senhor sabe muito bem do que se trata! Mas se quer um alento, pergunte ao seu fígado e as suas ressacas e aproveite escove esses dentes. Seu bafo de cachaça barata e vencida está horrível. Cruzes! Ave Maria, como consegue ser tão porco assim?

– Em primeiro lugar, quero que a senhora vá se foder. Em segundo, não vou parar nada e agora darei nomes aos bois e segunda-feira, daremos um jeito na situação, pois temos como encontrá-la. Em terceiro, a constituição garante a liberdade de expressão. Então fiquemos assim. Primeiro, a senhora vai tomar no olho do seu cu e segundo tenha um péssimo domingo. Cuidado para que essa sua bunda não engula o seu orgulho!

– Olha aqui senhor Márcio! Ninguém fala assim comigo, está me entendendo?

– Que parte, dona Tarsila, a senhora não entendeu? A de ir tomar no cu, ou a de tomar cuidado para que esse seu cuzão não engula o seu ego, orgulho e o que mais a senhor tenha aí de presunção?

– Que acinte! Um jornalistazinho pinguço de merda quer se achar melhor do que eu, só porque escreve umas porcariazinhas num jornal que não dá nem pra limpar o rabo.

– É isso que a senhora tinha a me dizer? Se for só, então, passar bem!

Márcio voltou para dentro do seu prédio sem olhar para trás. Estava com um misto de raiva, angustia, vergonha e tesão. Não sabia o que sentia primeiro, mas sabia que aquela mulher mexera em demasia com a sua cabeça, principalmente a que estava no meio das pernas. Não sabia se a que ficava em cima do pescoço daria conta de tudo o que acabara de passar.

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