Sobras de um amor … parte III

26.

        

Enquanto escolhia uma roupa que usaria no almoço que preparou para o marido, Angélica ficou pensando sobre o seu ontem e o momento em que se vestiria para aquele homem que, sem tocar em alguma parte do seu corpo, a virou do avesso. Antes tinha certeza de sua homossexualidade, acreditando amar Rosângela que agora estava morta, mas bastou Márcio não ceder aos seus arroubos de ricaça para que o seu mundo ruísse.

“Meu deus do céu, onde está aquela mulher, senhora de si que entrou no bar naquele domingo à tarde para saber do irmão e hoje vive uma relação heterossexual com um homem totalmente diferente do que ela é”, se perguntava mentalmente, enquanto retirava da gaveta uma calcinha que poderia delinear todo a sua bunda, já que ficaria em casa com o esposo.

Enquanto ajustava a peça ao corpo, a empresária recuperou a primeira vez que esteve com o ainda jornalista que exalava álcool por todos os poros do corpo. Parecia nunca ter tomado banho na vida, contudo, alguma coisa em seu olhar eliminou toda aquelas impressões iniciais. Ao falar com o estranho, percebeu que ele já mais baixou os olhos, observando-a diretamente como se ela não fosse nada, insignificante. Foi como se Márcio estivesse cravado um golpe certeiro em toda a estrutura do seu orgulho.

Entre esses devaneios, Angélica pegou uma blusa azul que não lhe apertava o corpo, marcando-o suavemente, exaltando suas formas. Anatomia que chamou a atenção do homem que estava na sala e gostava de chuva, de ficar conversando com as estrelas, que não queria nada daquele mundo competitivo, mas tinha tudo o que precisava: a simplicidade de ver e viver a vida. É justamente por conta de ser assim, que nunca baixou a guarda, sempre muito sincero com todos, embora não tenha muitos amigos.

Abriu o outro armário e tirou uma saia que evidenciava muito bem as suas pernas sem ser vulgar. “Será que ele vai gostar”, se perguntou mentalmente a empresária notando que até isso ele havia conseguido, sem muitas discussões, mudar nela. Tudo o que fazia tinha que contar com a aprovação dele. Era raro usar palavras para dizer alguma coisa em relação à roupa a esposa usaria, mas bastava um olhar para que ela ficasse toda excitada e úmida.

Enquanto ajustava a saia no corpo, Angélica escutou o marido bater na porta do quarto. Até nisso ele era diferente, pensou a esposa. Márcio podia entrar, mas sabia que se a porta estava fechada porque era o momento dela. “- Já vou amor. Estou terminando aqui. Espero que goste”, respondeu a empresária caminhando para abrir a porta e tentar adivinhar se o marido gostou.

Assim que estava defronte a ele, percebeu o quanto Márcio adorou a maneira como se vestia. Seus olhos estavam iguais àquele domingo que tanto estrago provocou em suas certezas, evidenciando que nada era fixo e tudo poderia ser modificado quando os seus globos oculares se cruzassem com os de sua alma gêmea. Márcio era isso: a sua outra metade. Aquela parte que faltava como dizia Platão no livro O banquete, que ela usou tanto para conquistar uns beijos das meninas indecisas quanto à própria sexualidade.

Nem foi preciso perguntar ao esposo o que ele achou, já que ficou nua novamente diante da maneira como a observou. Tirou unidade por unidade, deixando-a completamente pelada, mas uma nudez que somente quem ama com a alma é capaz de enxergar. Não tinha nada a ver com a paixão, coisa passional, mas algo que vai além do mundo material. Naquela singela olhada, Angélica compreendeu as conversas silenciosas que o marido vinha tendo constantemente com as estrelas. Entendeu o que interligava o coração do irmão à esposa, Tarsila.

Márcio olhou para Angélica usando poucos segundos, mas que foram capazes de levá-la ao altar quantas vezes fosse preciso. Naquele ato silencioso, ele a beijou dos pés à cabeça, inclusive o ser que fazia o seu corpo se movimentar. “- Você está divina. Tenho certeza de que seguirei te amando eternamente como falei para sua mãe e para o general”.

Márcio pegou a esposa pela mão e a conduziu até a mesa onde almoçariam. Sobre o móvel havia uma garrafa de vinho branco, da marca que a esposa adorava. No pequeno trajeto da porta do quarto até o cômodo em que fariam a refeição, o tempo material foi veloz, mas no mundo d’alma tudo transcorreu de forma diferente como se o casal percorresse o universo inteirinho e de maneira bem lenta. Todo o ser de Angélica flutuava e os ouvidos escutavam uma melodia celestial.

“- Marzinho, queria te dizer tantas coisas, mas desconfio que faltam palavras humanas para descrever o que sinto por ti”, confessou a esposa.

– Então economizemos sonoridade e deixemos que nossos corações falem por nós.

Enquanto o mundo lá fora era nocauteado pela chuva, dentro do apartamento, Angélica e Márcio existiam como se estivessem suspensos no ar, passeando entre as nuvens. Ela querendo dizer, mas não saia som nenhum e ele, para não quebrar o encanto, a despia com olhares, ao mesmo tempo enigmáticos e devoradores, porém fixos na esposa. Angélica, a cada movimento que o marido fazia com os olhos em sua direção, sentia o rosto em brasa.

O esposo, excitado, amando-a ternamente, tentava dizer coisas que pudessem quebrar o silêncio, mas não havia nada, absolutamente nada que conseguisse expressar humanamente o que a alma sentia em relação a empresária. Cada um serviu a quantidade que achava que aguentaria comer na primeira rodada, enquanto taças estavam cheias de vinho.

Angélica tentou esboçar algo sobre a segunda-feira, mas foi contida pelo marido que lhe disse: “- Amanhã é amanhã. Quero apenas o hoje e o aqui e agora que é te amar incondicionalmente”.

– Mas eu sou tão…

“- Não diga nada que achas que diminuirá a grandeza de mulher que tu és, meu amor”, completou o editor.

Pela qualidade da comida, o casal fez três rodadas e em seguida, a empresária se levantou, indo se sentar no colo do marido que, ao tocá-la sentiu a temperatura do seu corpo. “- Amor! Você está pegando fogo. O que é isso”, perguntou o editor, obtendo como resposta que aquele calor todo que sentia era semelhante ao que lhe aconteceu naquela tarde em que foi escorraçada por ele.

“- Eu tinha que falar. Dizia que ia te destruir. Que ia fazer isso e aquilo, pois havia um fogo que me queimando por dentro, amor. Eu só me tranquilizei quando, no começo da noite recebi todas as informações sobre o seu segredo. Pensei que te tinha sob domínio. Me desculpe por ter sido tão intempestiva e infantil”, explicou Angélica.

– Naquele domingo que te vi no bar, o meu mundo começou a ser revirado e eu precisa dar um jeito de não te deixar entrar em minha vida, mas tudo o que eu fazia para expulsá-la, não te deixava sair. Eu não queria pensar em ti, não desejava te sentir aqui dentro, mas não conseguia parar de te ver dentro do meu coração, subindo para o cérebro.

“- Finalmente eu só fui entender aquela tarde quando entrei no quarto do hotel e te vi completamente nu, mas a nudez não era a corporal, mas aquela que está contida n’alma e não tem relação alguma com sexo ou sexualidade, meu amor, mas sim a totalidade do seu ser”, disse Angélica, de forma carinhosa alisando o rosto do marido.

Ao término do que disse ao esposo, a empresária entendeu que todo aquele torpor, calor, ansiedade, garganta seca tinha origem e estava localizada no meio de suas pernas, pois bastou sentir o pênis do marido para que a situação lhe fugisse do controle. Por mais que tentasse frear o tesão, o desejo, não conseguia. Precisava saborear o falo do esposo, na tentativa de dominar aquele desejo. Compreendendo o que ansiava todo o ser da esposa, Márcio, girando na cadeira, de modo que ela pode abrir as pernas sobre as dele, num encaixe perfeito, se levantou segurando a esposa como se ela não lhe pesasse quase nada.

Caminhou até o quarto com ela nos braços, se sentando na cama tendo Angélica no colo, colocou dois dedos na vulva da esposa que mordiscou sua orelha, pedindo baixinho para deixa-la comer o pau dele com a sua buceta. Em seguida, a empresária desceu do colo do esposo, puxando sua bermuda e cueca juntos, deixando o falo livro. Tomou-o na boca, acariciando-o enquanto o marido se deitou na cama, sendo que as pernas estavam do lado de fora do móvel apoiadas no chão.

Ansiosamente, Angélica arrancou a saia com a calcinha, subindo sobre o pênis do marido. Quando sentiu o pau dele invadi-la todinha, ela gozou quase que imediatamente e, chorando, dizia ao esposo que o amava loucamente. Nem foi preciso Márcio responder o enunciado da amada, seus olhos diziam tudo, pois a esposa reencontrou aquela observação de quem não estava vendo nada, mas ao mesmo tempo, desvendando a alma da mulher que o enlouquecia tanto.

Para deleite de Angélica, o editor deixou que ela comandasse aquela encantada tarde de amor regida pela maestrina chuva que desabava fora do apartamento, fazendo com que o casal se entregasse plenamente àquele momento de divinização em que dois corpos, que se amam, devem atingir durante o ato sexual. Depois de ter perdido a conta das vezes que chegou às estrelas, tendo o pênis do marido dentro de si, Angélica chegou mais a um orgasmo quando Márcio balbuciando palavras desconexas, ejaculou. Marido e mulher exaustos, se deixaram ficar largados na cama se acariciando até o momento em que o esposo se levantou para se higienizar, no que foi seguido pela empresária que, parecia estar em êxtase, o abraçou ternamente.

Os dois estavam debaixo do chuveiro e Angélica perguntou ao editor onde ele estava durante todo esse tempo no qual ela vagava pelas ruas da cidade, alimentando um casamento que poderia ter de tudo, menos amor. “- Me preparando para te encontrar e te amar até o fim da eternidade”, respondeu Márcio a beijando numa mistura de sexualidade, amor, paixão, carinho, harmonia e amizade.

Ela correspondeu aos atos do marido, deixando as lágrimas caírem dos olhos, pedindo ao companheiro que lhe prometesse que seria sempre daquele jeito. O esposo apenas ficou a observando e depois de um pequeno silêncio, perguntou: “- Para onde eu iria sem a sua alma”.

“- Não sei! Você vive fugindo quando a coisa aperta e eu fico sem chão consumida pelo meu ciúme”, desabafou Angélica.

– Se tento sumir não é porque não te amo, mas é pelo contrário, por te amar muito e achar que não conseguirei provar o quanto amor tenho por ti, minha dinamite dos olhos esverdeados.

“- Meu amor, não é essa aliança em nossos dedos da mão esquerda que provam alguma coisa, mas só o fato de estar comigo, caminhar do meu lado, me olhar do jeito que me observa que, ao mesmo tempo me faz ser a pessoa mais feliz do mundo, também me provoca calafrios só de pensar que eu possa te perder por conta de outra pessoa”, disse a empresária.

– Paixão! Quando disse a Judith, a senhora minha mãe que deixasse meu pai e aí sim eu a seguiria, te abandonando, sabia que jamais ela faria isso, portanto, eu também não. Só quero que aprenda a ter ciúmes e saberá sempre como agir em silêncio.

Ao dizer isso, Márcio pega a esposa, de surpresa, no colo e a transporta para a cama. Colocando-a lentamente sobre o leito, se deita do seu lado e diz que sempre vai amá-la, pois não consegue conceber a vida sem tê-la consigo. “- Amor, por quantas mulheres você já se apaixonou”, perguntou Angélica.

“- Que eu pensava ser paixão, amor, várias, mas apenas uma me fez cair de um prédio de cem andares e o mais engraçado é que quando cheguei no chão, fui seguro pelo coração dela. Então tudo ficou parecido com aquela beleza de espetáculo que o Sol nos oferta todos os finais de tarde quando a chuva não está caindo lá fora”, respondeu Márcio.

– Eu tentei evitar que você entrasse em meu coração. Fiz de tudo, mas toda vez que me dizia que seguiria em frente, pois não havia mais nada a fazer aqui em nossa cidade, era como se um punhal me cortasse ao meio. Naquele dia no terminal rodoviário, se se recusasse a retornar comigo, estava disposta a tudo, inclusive tirar a roupa ali para te provar o quanto estava apaixonada por ti.

“- Por que volta sempre naquele dia”, perguntou o esposo.

– Porque naquele momento tive a certeza de que não daria mais um passo sem ti e se isso acontecesse seria como um pulo no vazio, dentro dum vácuo enorme e também porque ali, sem saber, você confirmou que me amava e tinha ido embora por conta do sentimento que me nutria, mas como não tinha certeza de que era correspondido, resolveu partir para não ter que viver se escondendo de uma segunda decepção.

Márcio ficou em silêncio como quem absorve lentamente cada sílaba que a esposa disse sobre o amor que lhe devota. “- Eu sei que sou infantil, mimada e que desejo tudo do meu jeito, mas você c, meu amor, me faz ser adulta de um jeito todo especial. Não me violenta, não me agride, não me força a crescer, mas pelo contrário, sempre encontra um jeito de me fazer ver que agora sou uma mulher que tem como desafio deixar o passado lá onde ele está: no ontem”, desabafou a presidente das Organizações Oliveira.

Márcio apenas beija os cabelos da esposa agradecendo-a por fazer o mundo dele ser colorido, com sentido, com amor, paz e harmoniza. “- Claro que não são todos os dias assim, mas sei que podemos melhorar, mas tu tens um jeito todo especial de dizer que me ama e isso me faz ficar mais doido de amores por ti”, explicou o editor à esposa.

“- Ah é! E que jeito é esse, hein meu nego delicioso”, perguntou Angélica.

– Seus ciúmes. Pensei que fosse um lance de menina mimada, mas não é! É coisa de pessoa que ama do fundo d’alma. Eu só sabia desse tipo de sentimento por intermédio dos romances, alguns deles, espíritas. Uma vez li um que explicava sobre a tal das almas gêmeas. Elas podem encarnar juntas ou não, mas estarão sempre ligadas,

Ao dizer isso, Márcio escutou um som e ao tentar observar de onde vinha, percebeu que Angélica dormia. Aproveitou o momento para ajustar o corpo dela à cama, o cobrindo e o deixando ali, enquanto vestia um roupão, se dirigindo à sala para olhar a chuva que desabava lá fora.

Quando se colocou diante da vidraça, seu pensamento foi direto à Fernanda que dormia serenamente nos braços do noivo depois de uma tarde deliciosa de sexo com Ricardo. Finalmente a amiga encontrou um homem pelo qual brigaria até o fim, mesmo sabendo que algumas coisas precisavam ser ajustadas e ela sentia a pré-disposição dele em fazê-la feliz, além de contar com o apoio dos pais e da irmã dele.

Da amizade com aquela vendedora que parecia ser amalucada, mas que escondia um coração aflito e agitado que desejava encontrar a sua alma gêmea ou alguém que a ajudasse esquecer o passado de solidão e de abandono, a mente do editor voltou ao apartamento em que tentava equacionar tudo a sua volta. Como era próprio de sua natureza, queria entender tudo, sem deixar nada escapar, porém, sabia que estando do lado de Angélica, nunca teria pleno domínio do seu mundo.

Pegou uma garrafa de uísque, encheu um copo e começou a bebericar sem pressa, até porque gostaria muito de se encontrar naquela jornada iniciada na segunda-feira quando conheceu Amadeu e acabou nos braços da irmã dele. Ingressou num universo que nunca imaginou fazer parte, já que estava em decadência pessoal, só querendo saber como acordaria no dia seguinte. Só não tinha desaparecido no mundo por conta da amizade com Roberto e Fernanda e também não tentou tirar a própria vida por pura covardia.

Resgatou os dias em que, apavorado com a incerteza do amanhã, pedia abrigo para Fernanda que o deixava em sua casa, enquanto saia a noite com um cara que ela dizia que seria o último, pois o levaria ao altar, mas lá estava ela começando uma segunda-feira novamente com aquele rosto de ressaca e Márcio se dirigindo à redação do jornal com a cara mais amarelada do que papel de jornal que ficou exposto ao sol por muito tempo.

Recordou um sábado à noite em que ele e a amiga tomaram um porre numa competição. Compraram duas garrafas de uísque, uma para cada um e outras duas de vodca, vinho e cachaça. Colocaram músicas, enquanto São Pedro castigava a cidade. Fernanda apagou na metade do primeiro litro de uísque, mas antes fez um show à parte para o amigo, ficando completamente nua na frente dele.

“- Vem meu Marzinho. Venha me comer do jeito que só tu sabes”, pedia Fernanda, enquanto o editor ria dizendo que jamais faria aquilo em virtude do teor alcóolico dela. “Amanhã, tu terás duas ressacas para se livrar: do porre e de ter transado comigo porque estava completamente bêbada. Vem vou te levar para dormir”.

“- Está vendo porque és um cuzão que eu adoro. Não quer experimentar minha buceta, nem mesmo eu estando passada”, disse Fernanda perdendo o controle e só não se espatifou no chão porque o amigo a segurou, pegando-a no colo, colocando-a debaixo do chuveiro e depois a levou para a cama.

Assim que a amiga dormiu, Márcio preparou um chá de carqueja, bebeu uma grande quantidade, deixando o restante para Fernanda tomar no dia seguinte. Sentou-se no sofá e ficou pensando no que teria acontecido com Fernanda. Nunca tinha se oferecido a ele desta forma. Pensando no tamanho da solidão da amiga, resolveu ficar mais próximo dela.

Tendo essas reflexões, Márcio acabou adormecendo ali mesmo no sofá, sendo despertado pela dona da casa que o sacudiu. “- Marzinho, acorde! Você dormiu nesse sofá”, perguntou a dona da casa.

O ainda jornalista despertou e sentiu a cabeça meio pesada, olhando para Fê que tentava segurar um vômito, mas acabou despejando tudo em cima dele. “- Aí minha cabeça”, vociferou Fernanda olhando para o amigo todo lambuzado com o jato de vômito que recebeu vindo da boca dela.

Márcio pediu para a anfitriã se sentar que pegaria um chá que havia deixado pronto para ela desde a noite anterior. Trouxe a bebida, lhe pedindo para aguardá-lo enquanto se limparia. Entrou no banheiro, tomou banho e foi ao quarto da amiga e pegou uma bermuda emprestada dela, vestindo e voltando para a sala.

– Márcio! O que aconteceu ontem? Eu acordei estava completamente nua. Não vem me dizer que transamos? Se fizemos isso, esquece tudo. Você não faz o meu tipo de homem. E nem vem com essa história de que me ama.

– Calma Fê! Não aconteceu nada. Você apagou depois de pedir para eu te comer. Te levei para o banheiro, dei um banho e te coloquei na cama. Só isso. E pode ficar serena, você também não é o meu tipo de mulher.

Fernanda acabou de tomar o chá, dizendo que voltaria para a cama. “- Tudo bem amiga. Estou de saída. Levarei esse resto de bebida e minhas roupas sujas. Pegarei uma blusa sua e depois que lavá-la te devolvo na loja. Deixarei a porta trancada. Qualquer coisa me liga tá. Beijos. Te adoro moça”, disse Márcio saindo da casa de Fernanda.

Enquanto essas cenas pululavam em sua memória, o editor consumiu três doses de uísque olhando a chuva caindo e compreendendo que naquela noite de bebedeira, tinha selado a amizade com Fernanda e nada no mundo levaria os dois para a cama como amantes.

“- O que tanto tem para pensar Márcio”, perguntou Angélica, trazendo o esposo de volta ao apartamento. “Faz uns vinte minutos que estou aqui só te observando e vejo o quanto está longe. Quer dividir comigo o que lhe vai n’alma”, inquiriu novamente a esposa.

“- Não é nada não amor. Só estava repondo uns tijolos soltos no meu passado”, explicou o esposo.

“- E pelo visto tem mulher na jogada”, afirmou Angélica.

– Esquece isso. O mais importante é que estou contigo daqui para adiante.

“- Quem é ela”, perguntou a empresária indicando ciúme do passado do esposo.

“- Por que tem que ser ela”, perguntou o editor.

“- Porque tenho certeza de que você não é homossexual e sei que não me disse tudo sobre o seu passado, inclusive a Fernanda é quem decifrou o bilhete que me deixou. Então acho que vocês dois têm mais coisas que nos dizem”, disse a empresária em tom de sentença.

“- Amor é um passado que não tem necessidade alguma de ser desenterrado”, disse Márcio, tentando se justificar diante da afirmação de Angélica.

“- Se não tem, por que se desliga desse jeito quando está lá”, inquiriu a esposa.

“- Lá onde”, perguntou Márcio em devolutiva.

– Nesse passado! Tenho certeza que tem cheiro de calcinha da Fernanda. Se você a comeu e me escondeu isso, pode ter certeza de que não ficará assim. Amanhã mesmo tomarei as providenciais necessárias.

“- Pare com essa perseguição tola. Já lhe dissemos que não transamos, nunca fomos para a cama e somos apenas bons amigos”, tentou explicar Márcio.

– É o que você me diz e ela ao Ricardo, mas sabemos que ela te olha de um jeito todo especial e tu, eu já não sei, pois conheço bem esse olhar não olhando, essa coisa de enxergar, mas não vê.

“- Está bem! O que o meu amor quer saber”, inquiriu o marido.

– Deixa de ser cínico porque sabe muito bem o que me deixa com a pulga atrás da orelha. É essa sua amizade com Fernanda. Para mim, isso tem pau na buceta, mas querem esconder de todo mundo e eu só não sei o motivo disso tudo.

“- Simplesmente porque não tem nada disso que você imagina”, afirmou o editor.

– Olha só. Você morava sozinho e Fernanda não saia do seu apartamento. Ou acha que eu não levantei todas as informações. Você também não saia da casa dela, inclusive tinha as chaves do imóvel. Então, só falta os dois confessarem que dormiram juntos e não foi uma vez só.

Márcio olhou para a mulher e voltou a face para a janela, olhando para a chuva. “- Por que será que eu sabia que você não ficaria surpreso se eu te falasse que tinha investigado tudo isso”, exclamou Angélica.

– Veja bem. Se foi capaz de levantar uma história sórdida como aquela noite da véspera do meu noivado, também teria condições de saber quem entrava e saia do meu apartamento, bem como quem frequentava a casa da Fernanda. Então, essas informações que obteve não me surpreendeu em hipótese alguma.

“- Então confirma que comia a Fê”, inquiriu a esposa.

– Não confirmo, porque isso nunca aconteceu. Eu tinha a chave da casa dela porque éramos e somos muito amigos e isso não significa que eu entraria ou sairia da casa dela quando bem entendesse. E o fato dela ir em meu apartamento, não diz que nos encontrávamos para trepar ou coisa parecida. Éramos dois solitários numa cidade que parecia nos engolir diariamente. Então conversávamos de tudo e sobre o que ia em nossas almas e o que esperávamos do amor, caso ele batesse em nossa porta.

“- Então é por isso que você sabe que Ricardo era o homem certo para ela e Fernanda pediu para eu te fazer feliz”, questionou Angélica.

– Provavelmente sim. E foi por isso que ela conseguiu decifrar o bilhete que lhe deixei. Ela entendeu que eu estava indo embora não para fugir do amor que lhe tenho, mas por te amar muito e não estar conseguindo te fazer feliz. Ricardo é o cara certo para ela. É meio desajustado, mas um precisa do outro. Ele é um cagão que se protegia atrás dos amigos idiotas, mas dará sentido à vida da Fê. Ela nunca quis dinheiro, cara bonito, musculoso, porém, um homem que fizesse a segunda-feira dela ser especial.

Assim que terminou de explicar, Márcio virou o conteúdo do copo de uma vez dentro da boca. Em seguida olhou para a esposa, completando que ele não tinha motivo algum para ficar aborrecido porque ela vasculhou o relacionamento dele com Fernanda.

– Eu te digo isso, Márcio porque você sempre soube que fui casada com Rosângela, mas não me disse tudo em relação à sua amizade com Fernanda.

– Eu não disse tudo, porque não tem nada para dizer. Eu e ela contamos tudo a ti e ao noivo dela. Fernanda é minha amiga e só isso e não há chance alguma de acontecer algo no futuro porque no passado não teve nada.

O editor abraça a esposa, olhando para o relógio observando que o dia estava indo embora, pois os ponteiros se aproximavam das seis horas e nada da chuva diminuir sua intensidade. Enquanto Angélica tentava a todo custo não desconfiar do marido e de sua gerente de finanças, Fernanda havia saído da cama, deixando lá o noivo que dormia profundamente. Entrou no chuveiro e assim que recebe o primeiro jato d’água no corpo, sua mente se transporta direto para o amigo. Queria entender o que havia entre os dois: tudo bem que vivia dizendo que ele não era o seu tipo de homem, mas sempre que precisava dele, lá estava Márcio do seu lado.

“Meu deus do céu o que faço? Tive esse homem comigo por cinco anos e nada aconteceu entre nós, exceto aquela vez que dormir descoberta esperando que ele avançasse o sinal e quando, bêbada, tirei toda a roupa querendo trepar com Marzinho”, pensou a gerente de finanças do grupo Oliveira.

Enquanto a água lhe retirava o resto do sono do corpo e higienizava suas partes íntimas, plenas do sexo de Ricardo, Fernanda se assustou quando se perguntou porque o noivo não era como Márcio. “Sei que ele cuidará bem de meu coração, mas será que não ficarei comparando ele com o Marzinho”, se perguntou mentalmente Fê.

Quando estava terminando o seu banho, Ricardo entrou no box, a abraçando por trás, trazendo-a de volta à terra para sua paz. “- Oi amor. Não quis te acordar, pois dormia tão bem e feliz”, disse Fernanda ao noivo que respondeu que fazia muito tempo que não dormia daquele jeito e ainda com a chuva que caia lá fora.

“- Rick! Você me ama mesmo ou está apenas encantado comigo e com o meu corpo”, inquiriu Fernanda.

“- Por que a pergunta? Posso saber, antes de responder”, quis saber o noivo.

“- É que sei que sou uma pessoa difícil, com profundas cicatrizes e com muito medo de ser feliz ou achar que só existe felicidade em romances e novela”, explicou a noiva.

– Eu não sou perfeito como o seu amigo Marzinho, mas de uma coisa tenho certeza: se não fosse por ele, com certeza não estaria aqui junto de ti. Lembre-se que nos conhecemos no noivado dele com a doida da Angélica.

– É! Angélica é completamente desparafusada, mas conhecendo o Márcio como eu conheço, ninguém teria condições de suportar aquele comportamento espartano dele. A não ser que fosse completamente aluarada como a mulher dele. Não sei como os dois conseguem conviver.

– Então. Antes de receber o convite de minha irmã para ir ao noivado de duas pessoas que eu nunca tinha visto na vida, já tinha ouvido falar delas, mas ninguém sabia quem era. Já tinha escutado conversas sobre empresas em que você trabalha, porém, lá onde estou os colaboradores diziam que nunca tinha visto ninguém de lá. Não sabia de sua existência, mas quando entrei no apartamento e dei de cara contigo conversando com Roberto, fiquei encantando, mas pelo jeito que dialogavam, achei que ele seria seu marido, noivo, namorado, ficante, sei lá alguma coisa assim.

– É! Somos muito íntimos mesmo. No começo Danisa cismou comigo, mas tive que fazê-la ver que fui eu quem os aproximei. Naquela noite, meus olhos cruzaram com o seu e pensei que ninguém tinha visto, mas Roberto notou e começou a tirar o sarro.

– Como é que é? Vocês três se comunicam pelos olhos? Me explica como é isso?

– Nada de especial, mas algo que surgiu naturalmente entre nós, indicando que estamos em perigo. Eu só pude achar o Marzinho ontem por conta de uma conversa que tivemos no segundo dia em que nos conhecemos.

“- É algo para eu, Danisa e Angélica nos preocuparmos”, perguntou Ricardo.

– Sim! Se meu nego não me fizer feliz, já sabe que terá dois irmãos postiços para te capar e, se sobrar alguma coisa, ainda tem os pais e irmãos do Marzinho. Então acho melhor tu andar na linha.

Fernanda disse isso, saindo do banheiro, dizendo ao noivo para se apressar pois queria levar tudo o que separou para o apartamento aquela noite, independentemente da chuva que cai na cidade. Ricardo achou que poderia repetir a dose no chuveiro, mas percebeu que não ia rolar. “- Se acalme homem, teremos a eternidade para treparmos, caso o senhor não faça nenhuma besteira”, disse rindo a noiva.

Enquanto a água caia sobre o corpo, Ricardo ficou pensando no que teria que fazer para que a noiva não viesse sempre com essas tiradas que brochava qualquer um. Um jogo de pensamento, conforme lhe propôs a terapeuta, se alguém lhe perguntasse o que ele lhe diria. “Precisa deixar a coisa fluir com naturalidade. Já está certo entre vocês e tudo será uma questão de tempo e também não tem necessidade de ir com muita sede ao pote, pois não terá que dizer nada a ninguém”.

Ao sair do box e foi surpreendido pela sua roupa seca no banheiro. Fernanda tinha deixado tudo pronto para ele vestir. Desta forma, ao se retirar do compartimento já estava vestido para levar a noiva até o apartamento que ela residiria a partir daquela segunda-feira. Já dentro do carro, a gerente de finanças das Organizações Oliveira lhe deu um beijo, o surpreendendo, agradecendo o domingo que lhe proporcionou. “- Estou imensamente feliz contigo meu amor. Obrigado por estar comigo, me dando a certeza de que irá até o fim da eternidade do meu e ao meu lado”, enfatizou Fernanda.

Em virtude do volume de chuvas que caia sobre a cidade, Ricardo dirigiu com todo o cuidado e depois de meia-hora estavam defronte ao apartamento que seria a nova moradia de Fernanda. Rapidamente, o noivo colocou o carro sobre a calçada e foi tirando tudo rapidamente e colocando em lugar que não molhasse. Sem dizer uma palavra, a noiva observava tudo em silêncio, enquanto o noivo ficava encharcado.

Em seguida foi aquela viagem de elevador para transportar tudo. Depois de tudo ajustado dentro do imóvel, Fernanda puxou o noivo lhe dando um beijo caloroso, o arrastando para o banheiro. Tomaram banhos juntos e novamente gozaram várias vezes na mesma sintonia e acabaram por dormir na cama que Márcio havia deixado no local.

Antes de se desligar completamente nos braços da noiva, Ricardo conversou com os pais, dizendo que só voltaria no dia seguinte. “- Estou aqui no apartamento com Fernanda e vou daqui direto para a empresa. Depois de amanhã estarei em férias e trabalharei com o amigo dela na editora”, explicou o filho aos pais que, do outro lado da chamada de vídeo, tentaram se mostrar surpresos, pois sabiam que a futura nora faria caso Ricardo estivesse pronto para continuar com ela.

Se Fernanda e Ricardo encaminhavam tudo para que o casamento se realizasse no próximo final de semana, sem que ele soubesse que isso aconteceria, Márcio e Angélica ficaram bom tempo vislumbrando a chuva e ambos conversando sobre seus respectivos passados. Ela desejou saber por qual motivo, o esposo era tão recluso e não tinha apreço pela exposição.

– Uma escolha. Eu optei, pois achava que teria que competir com os demais colegas e isso eu não sei fazer. Querer ser mais do que sou. Então, achei que o melhor era me preservar e isso tem me poupado um bocado de aborrecimentos. Lógico que tudo tem um preço nesse mundo e eu topei pagar, por isso tenho comigo uma excelente pessoa. Muito complicada, contudo, me presentou com uma joia rara: seu coração!

“- Às vezes, ou quase sempre, estou insegura por conta de minhas oscilações e ciúmes exagerados. Estou sempre temendo que encontre alguém que não provoque tanto tumulto em sua vida e aí eu não dou conta de segurar a onda”, disse Angélica fitando o marido.

Márcio olhando para a esposa, a puxou para um abraço e não disse nada. Ficou assim com ela em silêncio por cerca de uns dez minutos, escutando o barulho da chuva que caia. “- Amor, não sou apegado ao passado, mas aquela mulher que me buscou num banco da praça é insubstituível. Também sei que não sou perfeito e preciso parar de tentar fugir”, explicou o editor à sua esposa.

O casal se sentou no sofá e Márcio continuou tentando confortar a empresária e. fitando-a dentro dos olhos lhe pergunta: “- Você acha que a mulher que ameaça ficar nua numa estação rodoviária para me forçar a voltar com ela, merece ser trocada por outra”. Ela responde dizendo que sabe disso, mas tudo pode mudar um dia e a alteração poderia vir, por exemplo, na segunda-feira.

“- O que sentes por mim, dona Angélica”, inquiriu Márcio à esposa.

– Eu poderia falar um montão de coisas, mas vou dizer apenas que você desacelera meu coração e meu mundo. Me dá cores especiais e o dia que te vi apreciando o laranja do céu, me perguntando se ele combinava com os tons dos meus olhos, entendi que tu és o meu tudo.

“- Então, meu amor, se tranquilize que me esforçarei ao extremo para me fazer merecedor deste seu sublime sentimento. Agora, tu precisas deixar eu trabalhar naquilo que gosto de fazer e sei que farei do mesmo jeito contigo. Tenho tanto ciúme de ti quanto tu tens de minha pessoa”, expôs o editor.

– Mas o meu é exagerado.

– Fernanda tem ciúmes de Ricardo, mas não deixa transparecer. Danisa se perceber uma mulher olhando para o Ricardo, arma a maior confusão. Sua mãe é capaz de quebrar o pescoço do general se ele piscar diferente para outro canto. Todos temos, uns mais, outros menos, ciúme quando amamos verdadeiramente e isso não é diferente comigo e contigo. Amadeu socou um cara na fila do cinema porque estava conversando diferente com Tarsila e, ao que tudo indica, era amigo dele de outrora, mas teu irmão ficou cego e esmurrou o indivíduo.

– Essa eu não sabia. Meu irmão batendo em alguém por conta da Tarsila.

“- Amadeu ficou cinco anos fora do ar por conta do desaparecimento do grande amor da vida dele. Não parece, mas ele é completamente apaixonado, alucinado por ela. Se Tarsila falar que vai embora, ele entra em parafuso novamente. E, para ele inventar que tu tinhas cometido suicídio é porque sabia qual seria a minha reação”, disse Márcio.

– Obrigado Marzinho pelo amor que me tens e me compreender diariamente.

“- Não me casei enganado. Você nunca me escondeu nada, assim como eu também não”, afirmou o marido.

– Ah isso eu já não sei. Por mais que eu tente, não consigo engolir sua amizade com Fernanda.

O esposo olhou para Angélica e caiu na gargalhada. Desistiu de dizer o contrário, pois simplesmente ela não conseguia ouvi-lo e tinha certeza de que Ricardo também não. Por mais que Fernanda lhe dissesse que entre ela e o seu Marzinho não rolou nada, sempre ficaria com aquela pergunta entalada.

– Pare de rir desse jeito, pois sei que está me provocando e me deixando doida de tesão.

“- Não sei dar risadas diferente, meu amor”, explicou Márcio.

O casal se ajustou ao sofá, de modo que o corpo de Angélica ficou totalmente protegido pelo de seu marido e ela apenas sentindo os batimentos cardíacos dele, agradeceu em silêncio por ser amada incondicionalmente por ele. Márcio se perguntava mentalmente porque os caminhos deles não se cruzaram antes, talvez teria poupado tanto sofrimento aos dois. Mas assim que terminou esse pensamento, recebeu outro em que a voz de sua consciência lhe dizia que quando o aluno está pronto, o mestre aparece. No caso da dupla, antes não estaria pronta para o amor que um nutria pelo outro.

Por estar em plena harmonia sentados no sofá, Márcio e Angélica acabaram dormindo e não sabem por quanto tempo, pois acordaram com Eleanora dentro do apartamento. “- Mãe! O que a senhora faz aqui com o general? Aconteceu alguma coisa”, perguntou Angélica, se levantando rapidamente do colo do marido.

– Desculpe-me filha. Eu havia prometido ao Alexandre que me desligaria de vocês hoje, mas sabe como é coração de mãe. Ele me entendeu e veio comigo saber como os dois estão.

Márcio olhou para o casal que havia acabado de entrar no apartamento e respondeu que estava tudo certo. “- Me desculpe Márcio. Eleanora quis vir e só aguardamos a chuva dar uma pequena trégua. Ela ficou muito impactada com a história que Amadeu contou para lhe convencer a voltar”, explicou o general.

– Mãe! Alexandre! Eu e Márcio precisamos crescer para o nosso casamento dar certo! Não é culpa de ninguém, nem dos meus ciúmes exagerados e nem do medo que ele tem que o faz querer fugir sempre que há algo que está atrapalhando o equilíbrio entre nós dois: é um somatório de coisas que temos que saber lidar para não estragarmos tudo.

Márcio aproveitou a ocasião para oferecer um uísque ao general, chamando-o para beberem no escritório que o editor improvisou no apartamento. Já dentro do cômodo, o anfitrião quis saber qual foi o real motivo da visita. “- Nada em especial, meu amigo. Acho que Eleanora está com vontade de ser a mãe que, de certa forma, deixou escapar quando os filhos eram adolescentes”.

“- Então você sabe que ela tem uma parcela de culpa pela filha ser tão insegura assim”, perguntou o editor.

“- Ela não me falou nada, contudo, desconfio e com essa vinda aqui agora, tenho certeza disso, no entanto, deixarei que ela me diga. Porém, é claro que há nela um medo terrível que, por qualquer razão, tu deixes a filha dela e Tarsila abandone Amadeu”, desabafou o militar.

– Meu amigo, eu amo Angélica com todos esses problemas que carrega consigo, e depois que fui informado naquela parada de ônibus que ela tinha tirado a própria vida, fiquei completamente arrasado. Enquanto meus amigos não chegavam, eu assisti não sei quantas vezes o filme de nossas vidas desde o domingo que a conheci e sabia que não conseguiria caminhar sem tê-la do meu lado. Estava com medo de ficar sem rumo como o Amadeu.

– Eu sei Márcio. Dá para ver o amor entre vocês exalando pelos olhos de cada um. E Angélica é uma dinamite prestes a explodir, então, como amigo se é que posso me considerar assim, posso te dizer que, se perceber alguma coisa, antecipe e não deixe que ela estoure.

– Como fazer isso?

– Não se tem receita, meu caro, mas há momentos em que ela precisará do amigo. Só isso e nessa condição, significa que pode brigar contigo, falar coisas, inclusive como se fosse sua namorada que briga e sai, te deixando falando sozinho.

– Devo agir como se fossemos namorados?

– Exato! Quando o casal briga e não moram na mesma casa, a tendência é ela ou ele ir embora e ficar uma semana sem se falar, mas a saudade apertará, o amor vencerá e o ente amado irá buscar o outro no seu trabalho.

– Você quer dizer que devo colocar mais romantismo no relacionamento e menos filosofia?

– Sim! Isso aqui é real e não é uma narrativa que estampa páginas de livros. Seja real com ela. Quando lemos um livro ou assistimos uma novela, de certa forma, sabemos o final: o mocinho ficará com a heroína e os vilões, ou vão parar na cadeia ou morrem. Mas no mundo concreto, muitas vezes os vilões vencem sempre, justamente porque não sabemos lidar com o nosso ser denso.

Márcio ficou atento às observações do general. “- O amor não é para dar certo ou errado, mas apenas para ser sentido e vivenciado. Quando amamos uma pessoa, mesmo que ela não esteja conosco e por várias razões, seguiremos amando-a porque amá-la é algo especial. É saber que aquela pessoa existe e os olhares sempre se encontrarão”.

Ao perceber que o editor lhe dava atenção, Alexandre continuou. “- Se me permite dizer mais uma coisa, quero que saiba que o pouco que conheço vocês dois, tanto tu quando ela, parecem procurar uma bula no outro para saber quando e como o parceiro vai agir se acontecer isso ou aquilo. Quando tomamos um remédio, sabemos que podemos sentir essa ou aquela reação, mas quando se ama não acontece a mesma coisa”, explicou o militar.

“- Vocês dois estão na fase do conhecimento. O casamento aconteceu porque os dois tinham pressa de viver juntos e não queriam ficar separados. Ela tem ciúmes de ti e tu dela. Angélica nunca enxergará outra pessoa como te observa. Há um certo encantamento, uma divinização naqueles olhares e tudo isso porque o mundo dela parou de girar ao contrário e começou quando você disse não às infantilidades dela”, orientou o militar.

– Obrigado general pelas suas palavras.

“- Pare de ficar sonhando com o mundo perfeito, esperando que tudo se acalme e que somente aí será feliz com a sua esposa. Olha só. Lá fora está caindo água desde a madrugada e se a tua sogra fosse esperar parar para vir ter com vocês, teria tido um treco de ansiedade. Não espere as estrelas brilharem para fazer esse amor dar certo: ame e caminhe junto com ela até o fim do infinito”, completou o general Alexandre.

– Gostaria que ela não fosse tão insegura.

“- Isso só passará com o tempo e não é dá noite para o dia, tipo assim: ela acordará na segunda-feira segura de si e do amor que vocês nutrem um pelo outro. Não seja tão formal, inove, provoque, lhe faça surpresas, busque-a no trabalho, dizendo que estava com saudades. Largue tudo e saia com ela, programe uma viagem. Não seja tão quadrado, fazendo todos os dias a mesma coisa. Ninguém suporta isso, meu amigo”, explicou o militar.

– Mas eu sou assim, Alexandre e não consigo pensar em nada diferente.

“- Isso acontece porque tu ficas pensando no resultado, ao invés de viver tudo isso”, afirmou Alexandre como querendo despertar o amigo para o outro lado do mar.

– Novamente obrigado pelo apoio.

– Não tenha medo de ser feliz com Angélica. Tudo entre vocês está complicado por conta desse medo dela te deixar e tu abandoná-la.

Assim que o general terminou de falar e virar o resto do uísque na boca, os dois ouviram bater na porta. Eram a mãe e a filha querendo saber o que tanto os dois homens de suas vidas tinham para conversar.

“- Vamos dizer que o general estava passando instruções para esse soldado raso aqui como a vida funciona”, disse Márcio simulando um sorriso.

“- Amor, o que vamos jantar”, inquiriu Angélica.

O editor olhou para o general como quem perguntando se ele tinha uma sugestão.

Ele pegou o celular e ligou para Pedro perguntando se tinha como colocar mais água no feijão. “- Tem sim general. Por quê? Você vai vir jantar conosco”, perguntou o cozinheiro.

– Estou saindo daqui agora e levarei Eleanora, a filha dela e o Márcio, o patrão de Fabrícia.

“- Mas general, o senhor me pegou com calças curtas”, respondeu Pedro tentando argumentar com seu patrão e amigo, desde os tempos de caserna.

“- O bom soldado está sempre pronto. Estamos chegando dentro de vinte minutos”, disse o militar informando que não tinha como recuar. Era seguir em frente, sempre.

Ao desligar o telefone, Alexandre disse: “- Eis a minha sugestão. Jantar com a família do Pedro”.

Angélica, Eleanora e Márcio foram pegos de surpresa, contudo, o general sabia que a palavra final era do editor que deveria confirmar e irem até a casa do cozinheiro.

Aquela ação do militar de alta patente era provocante e o editor deveria seguir em frente. Ser imprevisível e fazer coisas que deixariam Angélica extasiada. “- Vamos então”, afirmou o editor.

Tudo tinha sido conversado com a namorada e quando a filha tentou se arrumar, Eleanora foi enfática: “- Nada de coisas sofisticadas. Vista de modo simples, buscando sempre a aprovação de seu marido”.

Em cinco minutos, todos estavam dentro do carro do general que guiou com serenidade até a casa de Pedro que os esperava à porta. “- General! Que história é esse de virem jantar em casa? A comida vai demorar uma meia-hora para ficar pronta”.

– Ótimo. Ficaremos eu, tu e o Márcio na cozinha, enquanto as mulheres e as crianças conversam no outro cômodo de tua casa. Preciso que me ajude a colocar um prego bem firme no casamento deste homem aqui.

Assim que o amigo terminou de falar, o cozinheiro entendeu e todos foram para a cozinha. Pedro abriu uma cerveja para os três tomarem. Enquanto ia preparava o jantar, o anfitrião começou a falar de tudo e de nada, tentando sondar a alma de Márcio até que chegou no ponto. “- Meu amigo, o que sua esposa tem de especial”, perguntou o cozinheiro, já se desculpando.

Márcio devolveu com outra pergunta: “- O que Fabrícia tem de especial”. O anfitrião olhou, respondendo: “- Nada. Ela não está nos livros, nos romances e tratados filosóficos. Apenas fica comigo o tempo todo: na chuva, no frio, no calor, durante a noite, nas madrugadas e sei que até que o infinito termine. Temos um projeto de vida juntos. E tu tens algo assim com a sua esposa”, perguntou Pedro.

“- Por que está me perguntando isso, Pedro””, quis saber Márcio.

– Por que você pergunta tanto? Tem medo de viver o amor? O sentimento não precisa de muitos por quês, mas apenas ser sentido de peito aberto. Eu amo Fabrícia, tendo a certeza de que se eu pular de um prédio, ela estará no solo para amparar minha queda e me amar mais ainda.

Na sala, as mulheres conversavam e Angélica fez menção de se levantar para ir ver como o marido estava. “- Dona Angélica. Não tem ninguém lá, além do general e o meu marido. Deixe o seu Márcio ficar mais à vontade. Consinta a ele amar a senhora sem precisar ficar lhe provando isso o tempo todo. Ninguém gosta de ser aprisionado por mais que ame o ser com quem se está”.

Angélica olhou para Fabrícia, ficando em silêncio enquanto a anfitriã lhe perguntava o que o marido tinha de especial. “- Por que está me perguntando isso, Fabrícia”, inquiriu a visita.

– É pelo que iria fazer agora. Seu marido está no cômodo ao lado, conversando com o general que é uma excelente pessoa e meu marido e eu estou aqui contigo e sua mãe. Então não precisa ir lá ter com ele. Amor é muito bom. Amar ainda melhor e ser amada é coisa genial e, tenho certeza de que seu Márcio a venera, mas o deixe sentir isso, sem pressão alguma.

“- Você está me dizendo que estou tirando o oxigênio dele”, perguntou Angélica.

– Não! Mas o que ia fazer da impressão que sim.

“- É que …”

– Não fique insegura. Seu Márcio não fugirá, não irá embora, basta observar a forma como ele olha para a senhora. Pedro me observa todos os dias assim, e só com esse brilho me conforta, me tranquiliza o dia todo. Então, se a senhora me permite, deixe o amor dele te abraçar, te desejar um bom dia, ter saudades de ti. Enfim, me desculpe, pois sei que a senhora não pediu minha opinião, mas deixe o senhor Márcio amá-la do jeito que a senhora é.

Sem saber o que dizer, Angélica olhou para a mãe que acrescentou: “- você precisava ver como ele estava todo destruído com a sua suposta morte. Então, minha filha, todos que estão em torno de ti sabe o quanto ele é apaixonado por você. Então deixe esse amor que ele lhe tem, chegar à sua alma. Não tenha medo de perdê-lo, pois se continuar assim, com certeza, ele poderá partir, não fisicamente, mas estará apenas de corpo presente contigo”.

“- E o que eu faço”, inquiriu a empresária.

“- Nada”, respondeu Fabrícia. “- Apenas o ame e siga em frente com ele. Construam um projeto para vocês dois. A editora é dele e o escritório de arquitetura é da senhora. Então programem viagens, pensem em ter filho ou vários, enfim, algo que seja positivo para o casal”, explicou Fabrícia.

“- Pensei que iriam falar que o amor que eu tenho pelo meu marido é lindo e que seremos felizes para sempre, mas o que recebo é só pedradas. Até parece que estou fazendo Marzinho infeliz. Achei que estava entre amigas”, disse Angélica de forma exasperada.

“- E está minha filha e é por isso que estamos lhe dizendo tudo isso. Para que não estrague essa coisa bela que tu e o Marzinho estão construindo. Ele só tem olhos, coração, mente, corpo para ti. Você é a mulher da vida dele e não se esqueça que não fui eu quem viu isso logo no início, mas a sua sogra, a Judith. Segundo ela, nunca tinha visto o filho tão encantado por alguém como seu marido está por ti”, disse Eleanora tentando tirar a pressão que ameaçava a conversa entre as três.

Assim que Eleanora termina de falar, Márcio apareceu na sala e, ao ser perguntado se aconteceu alguma coisa, ele apenas responde que sentiu saudades da esposa, por isso foi lá para roubar um beijo. Ao ouvir a voz do esposo, Angélica mudou completamente e correu para dar um abraço no editor e, olhando para as duas, mostrou a língua, provocando risos em todas.

Quando Márcio ia dizer alguma coisa, a sogra foi taxativa. “- Pronto! Já deu um beijo nela, agora volte à cozinha onde estão os homens. Hoje invertemos tudo. Ao invés de ficarmos preparando o jantar, os três é que farão isso para nós: suas esposas”.

Angélica bem que tentou segurá-lo, mas o recado foi bem dado por Eleanora, portanto, o melhor era voltar ao local de origem. Ao se sentar ao lado da mãe, a filha foi novamente abraçada por ela que completou: “- Entendeu o que estamos te falando querida. Você ainda tem dúvidas sobre o que vai no coração e n’alma deste homem, cujo oxigênio dele chamada Keka”, perguntou Eleanora rindo para deixar a empresária mais serena.

“- Aí mãe! Se esse homem me deixar, a senhora pode me internar no sanatório que enlouquecerei de vez”, disse Angélica respirando fundo para dar um tom de dramaticidade à sua fala.

– Sei bem como é isso dona Angélica. Se o Pedro sonhar em me deixar, entro em parafuso. Então cuidemos de nossos amores, mas sem precisarmos prendê-los numa redoma, já que temos essas alianças nos dedos indicando que nossos homens já têm donas.

“- Mãe! Você e o general? Como estão indo”, perguntou a filha.

“- Ele é um Márcio mais experiente. Só isso. Não vamos enfrentar as ondas e nem o mar quando as águas estão bravias. Decidimos esperar tudo ficar calmo e, enquanto isso, vamos dividindo o sombreiro, água de coco, beijos e outras coisas mais”, disse Eleanora deixando claro que não havia muito o que falar sobre eles.

A conversa entre as mulheres prosseguiu por mais uns vinte minutos, quando Pedro chamou todos para jantarem. Os filhos dos anfitriões optaram por comer na sala, já que estavam assistindo desenho animado e não deixariam de ver para ficar ouvindo conversa de adultos.

Pedro tinha assado três picanhas no sal grosso para regozijo de Márcio e ojeriza da esposa que teve que se conter para não desfazer da hospedagem e da alimentação que lhe estava sendo oferecida com muito carinho por parte dos donos da casa. Quando ela pensou em cortar um pedaço para Márcio, o cozinheiro se antecipou dizendo que ali era para todos comerem à vontade.

O editor deu aquele sorriso interno, pois sabia que ela não se oporia e também porque Angélica estava feliz. Não sabia o motivo, contudo não perguntaria, pois se ela quisesse falar, diria e caso optasse pelo silêncio, a respeitaria.

Todos se serviram e o general foi o primeiro a falar que assim que a editora fosse inaugurada, retomaria as entrevistas para o livro. O objetivo de sua publicação era o mesmo: arrecadar dinheiro para a fundação que ele presidiria com muito orgulho.

“- General, se tiver alguma coisa que eu e Fabrícia pudermos fazer para auxiliar, pode contar conosco, não é amor”, afirmou Pedro.

“- Sim. Queremos compartilhar de alguma maneira os benefícios que vocês estão nos concedendo para educarmos nossos filhos da melhor maneira possível. Meus pais nos ensinaram que não devemos querer tudo para nós. Aquilo que acumulamos pode estar fazendo falta ao nosso semelhante”, completou a esposa do cozinheiro.

– Então vamos pensar em algo que vcs podem fazer, por exemplo, aos sábados e domingos. A minha ideia, e aí penso que a minha namorada pode dizer se concorda ou não, é fazer com que a fundação funcione também aos sábados e domingos para as crianças e adolescentes assistidos e quem sabe uma vez por mês não promovemos um almoço para todos os pais.

“- Achei o projeto excelente, meu amor”, disse Eleanor ao seu general.

Angélica acrescentou que podem realizar diversas oficinas, contando com a colaboração de Amadeu, Tarsila, Débora, Ricardo, Fernanda e Roberto. Danisa teria que esperar um pouco mais, pois o filho nasceria em breve.

O jantar transcorreu normalmente até por volta das dez horas quando, apresentando cansaço, Eleanora chamou o general para irem embora. Ele assentiu, mas pediu para esperar um pouco enquanto ele e Márcio terminavam de organizar a cozinha. “- Ou você acha que vamos deixar tudo para que Pedro e Fabrícia arrumem essa bagunça toda”, inquiriu o militar olhando carinhosamente para sua namorada.

“- Claro que não né, meu amado militar”, exclamou Eleanora.

A dupla concluiu os trabalhos na cozinha como dois soldados que estavam sob a supervisão de um oficial. Logo em seguida, os dois casais se aboletaram no carro do general, não sem antes Márcio fazer as recomendações de praxe a Fabrícia sobre o trabalho na segunda-feira na editora.

Ao chegarem defronte ao prédio de Angélica, Alexandre e Eleanora não quiseram descer. “- Não filha! Vocês têm muito que dialogar e descansarem para terem uma semana de trabalho. Não é na próxima semana que vem que Marzinho inaugurará a editora”, perguntou a presidente de honra das Organizações Oliveira.

“- Sim Eleanora”, respondeu o genro.

“- Então. Os dois têm muito trabalho a partir de hoje e desde já, eu e meu general aqui estamos desejando longa vida à Jardim da Leitura”, disse Eleanora, enviando um beijo para o casal, enquanto o namorado ligava o automóvel.

Dentro do elevador, Mário e Angélica estavam levemente molhados por conta da chuva fina que caia naquele momento, fazendo com que a blusa dela aderisse ao corpo, a deixando mais sexy, o que não passou despercebido pelo esposo.

Mesmo desejando abraçá-la, o esposo se conteve e Angélica percebeu, mas optou por ficar em silêncio, contudo, por dentro se perguntava por que Marzinho fazia isso quando poderia avançar o sinal, evidenciando o quanto a desejava naquele momento.

Assim que o elevador parou no andar do apartamento da empresária, esta, demonstrando contrariedade, deixou o compartimento, dando quatro passos à frente em direção ao quarto, mas foi puxada pelo marido que a beijou profundamente, fazendo com que se incendiasse completamente nos braços do amado.

Do nada, a empresária começou a dar pequenos murros no peito do marido quase que chorando dizendo porque ele havia emitido sinais de que não a desejaria naquela noite. “- Eu te desejo, não só nesta noite, mas como em todas as outras a partir de amanhã, desde aquele domingo à tarde no bar”, disse o esposo, a beijando mais ainda.

“- Venha! Vamos tirar essas roupas molhadas que tanto tesão me provocou”, disse o editor já começando a puxar a blusa que Angélica havia colocado para ir ao jantar em casa de Pedro. A empresária entendeu o gesto do editor e também começou a retirar a camiseta que ele usava que aderiu ao seu corpo por conta da chuva.

Ao tentar dizer alguma coisa, a empresária foi contida pelo esposo que pediu para deixarem os corpos expressarem as vozes que vinham d’alma. Assim que o marido estava livre da parte de cima da roupa, Angélica começou a beijá-lo por todo o tronco, dando pequenas mordicadas, levando o esposo ao delírio que, correspondendo aos desejos da esposa, não a deixou sozinha nas carícias, tendo os seios, ombro, barriga e braços beijados, acariciados e massageados por Márcio.

Depois de se amarem duas vezes mais naquela noite, Angélica descansava no peito do marido, momento em que quis saber o que Márcio tinha ido fazer na sala enquanto ela conversava com Fabrícia e a mãe. “- Fui te ver, como disse. Estava com saudades de ti e como se encontrava no outro cômodo, era só atravessar a porta e deixar o meu coração em paz”, explicou Márcio.

– Obrigado amor. Naquele momento eu conversava com elas sobre o nosso amor e a minha insegurança em relação à nós dois.

“- Angélica! Não existe nada exato nesse mundo, mas esse momento aqui é único, como foi aquele em que nos conhecemos, brigamos e não conseguimos mais nos separar”, comentou o editor.

– Eu sei disso tudo, minha paixão. Mas vai falar para minha cabeça que tudo é tão simples assim.

Antes de dar sequência na conversa, Marzinho abraçou mais a esposa, dizendo logo em seguida: “- Por pior que seja a tormenta, vamos passá-la juntos. Eu e tu e mais ninguém”.

Com lágrimas nos olhos, a esposa disse que é a primeira vez em seus 33 anos que se sentia amada e amando alguém a partir de sua alma. “- Então seja bem-vinda ao mundo, minha paixão, pois você é o meu primeiro e, sei que único, amor. Nunca quis ninguém perfeito, mas uma pessoa que desejasse atravessar o oceano comigo”, disse o editor beijando ternamente a esposa.

Angélica se ajustou ao corpo do marido, se sentindo segura com o esposo e o amor que tinha por ele e sua receptividade. Enquanto deixava o sono chegar lentamente, a empresária recordou a conversa com Fabrícia, percebendo que o esposo não disse nada no elevador para senti-la e ela quase estragou tudo com sua mania de achar que tem que ser sempre do jeito que desejava que fosse.

Márcio por sua vez, demorou mais para pegar no sono. Assim que notou que a mulher dormia, saiu da cama para dar uma ajustada nas coisas que tinha que fazer na segunda-feira e depois ficou mais uns dez minutos no sofá recuperando a conversa com o general. Quando pensava em voltar para a cama, foi surpreendido pela esposa que de pé o inquiriu sobre o que tinha acontecido.

O editor respondeu que tinha saído da cama para ajustar umas coisas para o dia seguinte e estava pensando no quanto a ama. “- Então venha me dar mais desse amor que tu sempre dizes ter em relação à minha pessoa”. Márcio olhou para Angélica, percebendo que o casal teria um longo caminho pela frente, mas que com certeza, só percorreria se ela estivesse em sua companhia. Assim que os dois se deitaram o sono chegou rapidamente, enquanto a chuva aumentava em volume.

Se Angélica e Márcio buscavam avidamente o equilíbrio, Débora conversava com os pais sobre o relacionamento de Fernanda e Ricardo. “- Pai, o senhor acha que a Fê será capaz de fazer o Rick feliz”, perguntou a universitária. Romualdo respondeu que era o desejo de todos, inclusive a própria gerente que estava apostando alto naquele noivado.

– Minha filha, a sua futura cunhada não tem ninguém nesse mundão. Os únicos com quem ela podia contar era o Marzinho e o Roberto. Eles ainda se sentem, meio que responsáveis por ela, mas o marido de sua sócia é um bunda-mole e Angélica caga na boca dele. O outro com a esposa grávida, não terá condições de assisti-la, então, seremos a família dela daqui para frente e seu irmão terá que ter muitas responsabilidades.

– Eu sei disso pai, e é por isso que tenho medo do Ricardo escorregar e não dar conta do recado, pois Fernanda tem um gênio do cão. Ela só escuta os dois amigos e se o Rick tentar afastá-los dela, o senhor pode ter certeza de que ela larga dele.

– E se fizer isso, acho bem feito para o Ricardo. Avisado ele está sendo. Não precisa querer ser como aquele maricona do Márcio ou o todo-poderoso do Roberto. Nosso Rick precisa construir sua existência junto da noiva. Só isso.

– Fiquei feliz em saber que os dois estão dormindo juntos de hoje para amanhã e aí será a prova de fogo dele. A Fê não transará enquanto ele não tiver maturidade para isso. Não adianta o pau subir e ficar contando vantagens para os amigos. Aquele pessoal dela é estranho e detesta aparecer.

“- Filha, me diga uma coisa: como foi que Márcio conheceu aquela desmiolada da mulher”, perguntou Romualdo.

– Olha pai, trabalho lá faz um tempão e sabia que tinha umas coisas estranhas, mas a vida dos patrões não nos diz respeito, mas um belo dia o cara apareceu no escritório eu fui fazer uma brincadeira e o cantei. Para quê? Angélica virou um trem e ainda por cima começou a tirar o sarro. Mas o mais doido foi que ela tinha sumido uns dias antes sem dizer nada e eu tive que concluir os trabalhos dela.

– Sumiu?

– É! Dias depois que o pai dela morreu, me disse que tinha que resolver umas coisas familiares e desapareceu sem dar notícia alguma. Só fui saber depois que havia ido atrás do Márcio. O cara estava apaixonado por ela, mas tinha medo de levar um fora, então resolveu dar o fora da cidade. Mas aquela doida da Angélica deu um jeito de encontrá-lo numa cidade quase que na divisa com o outro estado.

“- Então ela é bem destrambelhada e por isso que Fernanda a conhece bem”, comentou Romualdo.

– Elas já saíram no tapa por conta do Márcio. Angélica até hoje não acredita que os dois nunca tiveram nada. E acho que o Ricardo também fica com o pé atrás com relação a isso, entretanto, precisa dar crédito ao que a noiva diz, pois pode ser verdade, mas se não for, o que aconteceu entre os dois ficou no passado. Hoje Márcio é casado, capacho e doido pela esposa e Fernanda será esposa de Ricardo.

“- É verdade que Fenranda está preparando uma surpresa para ele”, perguntou Romualdo.

– Sim. No sábado, ela vai pedir para trocar a aliança de mão e morarem juntos no apartamento que é do amigo até a casa deles ficarem pronta. Então o senhor pode ir se preparando para ter uma nora e fazer um churrasquinho aqui no sábado para os dois e já sabe: Márcio, Angélica, Alexandre, Eleanora, Roberto e Danisa estarão aqui. Esses não podem faltar e ainda teremos que aturar aqueles amigos chatos do Ricardo, mas tudo bem.

– Filha se for surpresa, com certeza aquele pessoal não virá. Primeiro por que o Rick estará de férias da empresa e ficará a semana todo ocupado no trampo da editora, então, pode ter certeza disso: não veremos a cara de nenhum deles.

– Está certo pai. Vou dormir que amanhã tenho um monte de coisas para resolver lá na agência e sabe como é Angélica: do nada, corre atrás do marido e deixa os projetos pela metade.

“- Boa noite filha”, disse Romualdo indo em direção ao seu quarto.

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