Gilberto Barbosa dos Santos
Democracia, mesmo que tardia, a qualquer pífia segurança supostamente garantida por qualquer líder autocrático travestido de populista com verniz democrático! É isto o que penso e espero do Brasil, mesmo sabendo que existe uma imensa contenda no país, por conta de um governo que ainda não diz a que veio, ou melhor, ainda não desceu do palanque e gosta de governar por meio das redes sociais. Em primeiro lugar, é preciso comunicá-lo de que o tempo de campanha já passou e sua gestão precisa apresentar um projeto coerente para se administrar uma Nação com dimensões continentais e problemas de todo tipo, desde o desemprego até epidemias de doenças que já deveriam ter sido erradicas.
Sei que há, entre os meus leitores, muitos que dirão que é preciso calma, afinal de contas o governante pegou uma casa desarrumada. Quando percebo este tipo de observação, procuro respaldo na história recente deste país e quem sabe um apoio fragmentado num dos três principais nomes das Ciências Sociais no mundo: Karl Marx (1818-1883); Emile Durkheim (1858-1917) e Max Weber (1864-1920). Do primeiro, compartilho da seguinte análise: a história se repete: uma vez como farsa e a outra como tragédia. Desta observação, é possível entender, por exemplo, a eleição do ex-presidente Fernando Collor de Mello (filiado ao desaparecido PRN). Durante a campanha realizada um ano depois (1989) da Constituição Brasileira, a constituição cidadã, o ex-governante dizia ser o “caçador de marajás”: deu no que deu e todos sabem: impeachment do primeiro presidente eleito depois da redemocratização.
Se em nosso ontem, havia um presidente que, durante a campanha eleitoral se dizia o “salvador da Pátria”, aquele que iria acabar com o processo inflacionário galopante que corroía diariamente o salário do trabalhador, no presente temos um ser que vocifera contra a corrupção e arroga ser o único capaz de colocar fim ao sistema corruptível e a velha política. Bom. Faz cinco meses que está no poder e ainda não andou um centímetro se quer. Conseguiu apenas rearticular a oposição, e de quebra, o que é comumente chamada de esquerda brasileira – tenho cá minhas dúvidas se ela existe mesmo, a exemplo da tal direita conservadora: compreendo mais por ser uma sociedade reacionária com saudades do período escravagista em que o trabalho do outro não tinha valor nenhum. Mas a pergunta que fica é: como o presidente da República, eleito democraticamente, conseguiu em menos de seis meses fazer uma coisa que nem mesmo a oposição foi capaz de dar-se corpo? Seria a sua incapacidade de administrar o Brasil? Ou simplesmente porque o seu cabedal político acabou? Creio, meu caro leitor, que essas interpelações são significativas para se compreender o atual momento em que vive o país.
Eu, do meu lado, tentarei entender o que se passa, sem o viés ideológico. Até porque, muitos dos que me leem semanalmente recordarão que jamais fiz apologia a qualquer governo, credo ideológico ou “puxei a sardinha”, como se diz no jargão popular, para legenda alguma. Faço essas ressalvas porque é comum, quando um idólatra dum determinado político se depara com uma crítica mais contundente – racional e sem paixonite – e desfavorável à sua mercadoria política – aquele que ele ainda acredita ter a capacidade de encantá-lo com promessas rasas e Fake News e uma tropa de milicianos digitais, adjetivar-me equivocadamente. Até aí nada de mais, já que faz parte da guerra política e elemento fundamental da antipolítica, contudo, o que entristece são os defensores desse tipo de postura acreditarem que aquilo que é exposto, por exemplo, para diminuir a importância das universidades públicas no cenário político-educacional, é verídico. Mais incongruente ainda é esses mesmos sujeitos sociais e entes eleitorais dizerem que os estudantes não podem aprender política, colocando em xeque a observação feita há muito tempo pelo filósofo Aristóteles, segundo a qual o homem é um animal político por natureza. Esse postulado é evidenciado na própria defesa que esses homens, que, se adjetivam como cidadãos de bem, ou seja, não querem que os alunos e os próprios filhos saibam como funciona o mundo da política. Ao se posicionarem desta maneira, acabam delegando para líderes e títeres autocráticos seus futuros, tudo em busca dum presente meio cinza, meio desbotado com cores desfocadas, tudo porque desistiram de acalantarem e construírem seus amanhãs sem peias com a politicalha nefasta para a cidadania plena.
Mas construir o próprio amanhã a partir duma perspectiva política é complexo, pois exigirá do sujeito a compreensão de si mesmo, além de deixar de lado o velho chavão que todo político é corrupto e que a categoria é formada por gente desonesta. Desta forma, nenhum político se auto elege. Pelo contrário, o representante precisa do aval da patuleia que, desavisada e desvairada por promessas vis, desprovida dum mínimo de conhecimento político, acaba acreditando que o eleito será capaz de transformar o inferno de Dante num paraíso próspero da noite para o dia, apenas com decretos assinados com a famosa esferográfica azul Bic. Nada mais jocoso do que chamar atenção para esse fato rasteiro e sem um viés de relevante significância para o país. Mas deixando essas picuinhas de lado e enverando pelos caminhos que realmente interessam, ou seja, a democracia, é preciso compreender que o direito à manifestação é livre nesta República. Sendo assim, parece que haverá um movimento em prol do atual governo, entretanto, o que me parece ser esquizoide é que o próprio presidente, que conclamou seus eleitores e demais defensores para o ato, não participará do mesmo. Complexo isso, ainda mais porque a manifestação anterior não foi contra o este governo e sim em prol da educação, tão maltratada nesse início de gestão, além de escolher os professores como “saco de pancadas” e prováveis propaladores de determinada ideologia, como se fosse possível fazer tal proselitismo, diante de salas numerosas com péssimas condições de trabalho para os docentes, materiais sucateados e ainda no velho sistema de lousa e giz.
Triste a Nação aquela que seu governante máximo e seus asseclas atacam, molestam, maltratam a educação achando patrocínio entre os cidadãos que clamam por melhorias nas qualidades de suas vidas, melhores salários, mais empregos e sistema de saúde que funcione de acordo com os valores que o Estado arrecada a partir da carga tributária. Não bastasse isso, corta-se as verbas destinadas às pesquisas sob pretexto de que o dinheiro público está sendo mal direcionado e com desvios de recursos. Claro que não vou afiançar que isso não ocorra, contudo, são casos pontuais que devam ser apurados com rigor e, constatando os equívocos, os responsáveis sejam punidos. O que não se pode levar a sério é um caça-as-bruxas generalizado, colocando todo o universo científico brasileiro na mesma gaiola das loucas que propalam aqui e ali que as universidades públicas são antros de promiscuidades e que não se faz nada de positivo para a sociedade. Somente quem desconhece o universo desses centros de conhecimento para acreditar nessas aleivosias alucinatórias. Desta forma, creio que é democrático a manifestação, só não se pode querer empurrar goela abaixo da população inverdades para se manter no poder com aval de uma quantidade de brasileiros que acha que estudantes não devam aprender nada sobre política. Portanto, em minha opinião, democracia, mesmo que tardia.
Gilberto Barbosa dos Santos, Sociólogo político, editor do site www.criticapontual.com.br, autor do livro O sentido da República em Esaú e Jacó, de Machado de Assis; professor do ensino superior e médio em Penápolis; pesquisador do Grupo de Pensamento Conservador – UNESP – Araraquara e membro do Conselho Editorial e Científico da revista LEVS (Laboratório de Estudos da Violência e Segurança) – UNESP – Marília; escreve às quintas-feiras neste espaço: e-mail: gildassociais@bol.com.br; gilcriticapontual@gmail.com. www.criticapontual.com.br.