Sobras de um amor … parte III

34.

O noivado de Esdras e Débora foi apalavrado pouco depois do meio-dia daquele chuvoso domingo em que muitas desavenças aconteceram e outros acertos foram ajustados. No momento do anúncio, Rogério informou que estaria, juntamente com a esposa se mudando para a cidade até que a nova loja ganhasse robustez e o casal pudesse retornar ao munícipio-sede da cadeia de supermercados Preço-justo.

A notícia pegou a todos de surpresa, principalmente o filho que gerenciava o novo empreendimento. Do lado da noiva, Esdras se manteve em silêncio e não contrariaria o pai naquele momento, mas ficou claro que a família não confiava no trabalho que ele vinha realizando à frente da filial. Depois de encerrado o cerimonial, Rogério explicou o motivo pela atitude tomada. Na visão dele, havia mais dinheiro envolvido e outros sócios, como a sogra de Marzinho, o amigo Roberto e recursos do general. “- Então a prudência me pede para ficar mais tempo aqui contigo, enquanto agiliza o seu casamento. Não é isso que quer, meu filho”, perguntou o patriarca.

A exemplo dos outros eventos que envolviam a presença de Marzinho e a sua esposa, conhecida por todos como dinamite dos olhos esverdeados, foram poucos os registros, limitados apenas ao momento em que Esdras e Débora trocaram alianças. Quem fazia parte desses encontros sabia muito bem os motivos da ausência de imagens, fotos e reportagens nas colunas sociais dos jornais e da mídia local e regional.

Os primeiros a anunciarem que deixavam a casa do casal Romualdo-Adélia foram Amadeu e Tarsila. Por incrível que pareça, todos ali sabiam que aquele noivado começou a se desenhar numa noite chuvosa de segunda-feira quando Márcio, em mais um dia triste na redação de um jornal que afundava, foi procurar refúgio nuns goles de bebida e acabou tendo seu caminho cruzado com outro que buscava esquecer um amor impossível.

“- Pessoal, eu e a minha Tarsilinha estamos partindo. Ela e o nosso bebê precisam descansar. Então, que todos nos desculpem, principalmente o meu amigo Mosquito que eu adoro tanto”, disse o vice-presidente das Organizações Oliveiras que, ao abraçar o editor lhe segredou que no dia seguinte haveria uma reunião na sede da Jardim da Leitura. “- Do que se trata, amigo”, quis saber Márcio.

“- Apareça na reunião e saberá de tudo. Se não for, estará evidenciando que a rainha diaba da minha irmã manda em você”, respondeu Amadeu rindo e dando um beijo na face do amigo.

Ninguém entendeu nada, exceto Eleanora, acostumada com os atos, gestos e trejeitos do marido, acabou vendo na ação do filho algo semelhante quando uma pessoa estranha ao círculo da família era aceita. Por mais que o sujeito fosse bom, tivesse um currículo invejável, só era digno de confiança de Jô após ele cumprimentar o indivíduo daquela maneira.

A matriarca entendeu que finalmente Márcio havia ultrapassado uma linha imaginária que existia entre eles. Enquanto o genro sentia o toque em sua face, sua esposa lhe apertava a mão, formalizando o pacto entre eles. Assim que o cunhado se afastou, o editor quis saber o motivo daquele gesto e a arquiteta lhe disse que apenas o silêncio e o som sem ruídos poderiam lhe explicar, por ora, o marido devia apenas se ocupar em amar e se amar.

Depois de transcorrida meia-hora da saída de Amadeu e Tarsila, foi a vez de Danisa e Roberto pedir licença a todos e deixarem o imóvel. A esposa precisava descansar e o casal tratar de algumas coisas importantes, pois na segunda-feira o dia seria corrido, inclusive Marzinho inauguraria a sua tão sonhada editora.

Na sequência, os outros convidados foram deixando o ambiente, não sem perguntar aos noivos quando seria o cerimonial de casamento. Esdras aprendendo o valor do silêncio, apenas dizia que ele e Débora ainda não haviam conversado sobre isso, mas que poderia ocorrer depois que ambos tivessem concluídos seus cursos na faculdade.

Eleanora se aproximou de Débora e lhe entregou um envelope. “- Para você transportar os seus sonhos. Não convém a sócia de minha filha ficar pegando carona com o irmão sempre que precisar ir ao trabalho ou visitar a família do noivo”.

Débora quis saber o que era, mas a sogra de Marzinho colocou o dedo na boca em gesto de silêncio, dizendo apenas que era para abrir quando estivesse sozinha com os pais. Neste momento, ela imaginou do que se tratava, mas se conteve, pois sabia que todos ali eram discretos, exceto Angélica quando o assunto era o seu marido.

Eleanora chamou em seguida o general para se retirarem, mas antes informou a todos que o motivo da partida era uma viagem que pretendiam fazer no meio da semana. “- Vamos buscar a irmã de Alexandre para vir morar com ele. Está na hora da família se reunir novamente”, explicou a presidente de honra das Organizações Oliveira.

Quando a mãe de Angélica se encaminhava para deixar o imóvel teve a companhia da filha que, surpresa com o anúncio, quis saber mais sobre a tal viagem para Resende. “- Nada especial, minha filha. Apenas quero presentear meu amor com a pessoa que mais importa na vida dele: a irmã. Com ela por perto, creio que o coração dele estará em paz para se dedicar integralmente ao meu”.

A mãe de Angélica disse tudo isso enquanto o namorado ligava o automóvel e ela do lado de fora do automóvel conversando com a filha. “- É só isso que vai me dizer, dona Eleanora”, quis saber a empresária. “- É só o que você precisa saber, pois sua prioridade é outra: fazer seu marido feliz e ajudá-lo na inauguração da editora amanhã. E não se esqueça: há uma reunião amanhã cedo lá, portanto, quero os dois. Procure sobreviver até lá”, explicou Eleanora.

Enquanto a esposa conversa com a sua sogra, Márcio falava com os pais indicando a felicidade pela informação que Rogério deu momentos antes de que passarão uma temporada lá. “- Eu e sua mãe não vamos interferir em nada, apenas cuidar para que as coisas não saiam do eixo e seu irmão deixe escapar essa belíssima moça”, explicou o pai.

– Também deixaremos Leônidas e a mulher dele um pouco sozinhos. Eles precisam fortalecer o casamento para que o filho chegue num ambiente sem muitas brigas e desajustes. Marido e mulher podem até viver às turras, mas os filhos estão em primeiro lugar. E hei daqueles dois se fizeram alguma coisa que prejudicará a saúde do meu neto”, sentenciou Judith.

– É filho! Mãe duas vezes vale por quatro. Se Judith era assim com os filhos, imagina agora com a chegada do primeiro neto”, disse Rogério, querendo sorrir, mas sabia que seria advertido pela mulher que já iniciava um beliscão.

Enquanto o pai sentia a potência contido nos dedos da esposa, os filhos dialogavam entre eles. “- E aí Esdras? Pronto para uma nova jornada em sua vida”, perguntou Léo.

“- Eu achava que ia andar sozinho, mas agora com a chegada desses dois, percebi que não terei trégua”, desabafou o irmão.

“- E não terá mesmo! Ou achou que entraria na casa dos outros comer a filha do dono da casa e sair como se fosse o rei”, disse Judith.

Marzinho, Léo e o pai caíram na gargalhada. “- Fique tranquilo, meu irmão. Você vai ver como é bom o colo da mãe e as reprimendas do pai. Os dois estão sempre na mesma direção quando o assunto é colocar os filhos no caminho certo”, disse o editor.

“- Lá vem o Márcio com as suas filosofias de boteco. Guarde isso para a doida de sua mulher. Eu dispenso tais observações”, vociferou Esdras. “- Por mim, tudo bem! Não disse isso por achar que é filosofia barata, mas por pensar e agir assim. Não cobro o mundo quando quem precisa ser modificado sou eu”, replicou Márcio.

Assim que terminou de fazer a observação, o editor escutou sua esposa perguntando se já poderiam ir para casa. “- Estou cansada e quero me preparar para amanhã. Afinal é o grande dia para o meu marido”.

“- Vai lá frutinha curtir a esposinha”, disse Esdras de forma irônica.

“- Prefiro ser esposa de um frutinha que sabe como cuidar de uma mulher, do que ser casada com um cretino, ignorante como você Esdras. Começo a achar que Débora fará uma péssima união contigo, caso não mude essa sua mesquinha forma de ver o mundo. Mas eu sei porque és assim: não é culpa de Judith e nem do seu pai, mas totalmente sua que escolheu péssimas companhias, achando que dinheiro e pau duro é tudo na vida”, afirmou a empresária deixando o ambiente para procurar Débora, mas dizendo a Márcio para procurà-la quando quisesse ir para casa.

“- Reze para a sua cunhada não contar nada para Débora. Se isso chegar ao ouvido dela, não queria estar na sua pele”, advertiu Léo, enquanto Judith e Rogério caiam na gargalhada. “- Toma! Foi dizer o que não quis pensar antes, escutou o que não queria ouvir. Você não aprende mesmo, né moleque”, disse por fim a mãe.

“- Podem ficar despreocupado. Angélica não dirá nada, pois disse o que precisava ser dito ao garotão aí. O machão, comedor e rei da mulherada. Ou melhor, o pinto de mel”, disse Márcio se despedindo dos pais para ir ao encontro da esposa.

– Vai lá mocinha. Garanto que a sapatona da sua esposa, está com a sua cueca e você com a calcinha dela.

O editor não pensou duas vezes, virando-se para o irmão lhe acertando um soco no nariz levando Esdras ao chão. “- Desculpe-me mãe e pai, mas ele precisa saber que não deve meter o nariz onde não é chamado. Se continuar assim, jamais conseguirá manter o noivado com Débora. Ela não é como aquelas vagabundas com quem Esdras costumava gastar o dinheiro do senhor, pai”.

Leônidas ajudou o irmão a se levantar, enquanto Judith lhe passava o lenço para estancar o sangue que escorria do nariz. “- Satisfeito agora? Acho que era isso que estava precisando para ficar no seu canto. Não se meta na vida do seu irmão que tenho certeza que ele não quererá saber como anda a sua”, disse a mãe colocando o lenço no nariz do filho mais novo.

Márcio alcançou a esposa quando ela conversava com a secretária. “- Débora, tenho certeza de que meu irmão será um ótimo esposo para ti, mas por ora tenha paciência com ele. Ainda acha que é o pegador da adolescência”, disse o editor.

“- Você tem certeza, Marzinho”, quis saber Débora.

– Meus pais ficarão por aqui até que tudo esteja ajustado.

“- Será mesmo”, inquiriu a futura cunhada.

“- Fique tranquila Débora. Qualquer coisa eu e o Marzinho estamos aqui. É só nos procurar, mas além do mais você tem seus pais para te auxiliar e os pais dele também”, informou a empresária e amiga.

Ao dizer isso, Angélica abraçou a funcionária que será sua sócia na agência, se despedindo dela, indo em direção aos pais de Débora repetindo a ação. “- Mas já querida”, perguntou Adélia.

“- Já! Estou saudades de ficar a sós com meu amado”, reiterou Angélica.

– Filha! Me desculpe pela indiscrição de hoje de manhã.

“- Não se preocupe Adélia. Depois que conheci esse homem, mesmo que continue achando as mulheres interessantes, ele preenche todo o espaço da minha vida. Então Marzinho é tudo o que tenho e o que desejo para hoje e para a eternidade”, disse Angélica de forma toda especial olhando para o esposo.

Quando o casal ia deixando o imóvel, a empresária notou que Esdras segurava um lenço próximo ao nariz todo manchado de vermelho e quis saber o que acontecia. “- Pergunte ao seu ilustríssimo marido”, respondeu de forma ríspida o cunhado.

Ao olhar para o esposo, ela entendeu tudo e apertou o passo, ficando à frente dele. Judith puxou o filho pelo braço, perguntando se precisava de tudo aquilo. “- Mãe! Esdras sabe porque levou um murro no nariz. Toda vez que ele olhar no espelho, lembrará que não deve metê-lo na vida de ninguém. Não é porque é meu irmão que lhe dou o direito de ficar fazendo gracejos sobre coisas que ele não sabe absolutamente nada”.

– Mas eu não criei filhos para ficarem se esmurrando.

“- Então aproveite que ficará por aqui mais tempo, oriente de forma correta o seu filho mais novo que parece não entender que temos ponto de vista diferente e que enquanto ele usufruía de todo o conforto e dinheiro do meu pai, eu ralava sozinho aqui nessa cidade. A culpa foi toda minha, mas acho que já paguei o preço pelos meus equívocos e agora desejo apenas viver em paz com a minha esposa que não é perfeita, ainda bem, mas é a pessoa que me conhece de dentro para fora e não o contrário”, disse Márcio, em tom de desabafo.

Enquanto o editor se explicava com a mãe, a empresária berrou querendo saber se ele ia não voltar com ela. “- Calma que já estou indo”, disse Márcio pedindo desculpas à mãe por ter esmurrado o irmão na frente dele. “- Prometo-lhe que não acontecerá novamente, mãe”, completou o editor dando beijos nas faces da mãe e acenando para o pai.

Ao entrar no carro, o editor sentiu a ira de sua esposa. “- Por que foi esmurrar seu irmão? Não sabe resolver as coisas de outro modo”, inquiriu Angélica.

“- Esdras precisava ser colocado no lugar dele e não houve outro jeito senão o de lhe indicar que não deve meter o nariz onde não é chamada e minha vida contigo não diz respeito a quem quer que seja, apenas a nós dois”, respondeu o proprietário da Jardim da Leitura.

– Quer me explicar melhor.

“- Não há necessidade. O nariz de Esdras sangrando explica tudo. Não tenho sangue de baratas e não admito ninguém vir questionar nada a seu respeito, ainda mais se for de maneira jocosa”, informou Márcio tentando encerrar o assunto.

– Ah entendi. A coisa é comigo então. Isso deixa claro então porque ele tem inveja de ti. Talvez quisesse me comer, mas não tem competência e sua visão de mundo se restringe ao que ele tem no meio das pernas.

“- Vamos esquecer essa história. Estou contigo porque te amo e não porque é gostosa e tem dinheiro que não acaba mais. A grana é sua e não minha. Sua beleza não serviria de nada se não fosse conduzida pelo ser maravilhoso que tu és. Então isso é tudo. Ficarei contigo até o dia que não desejar mais e quando esse momento chegar, saberei deixar a estrada e me restringindo ao meu universo solitário”.

Em silêncio, Angélica colocou o automóvel em movimento e ambos mergulharam em seus mundos particulares, refletindo sobre aquele domingo chuvoso em que muitas coisas foram ditas e outras nem tanto, ficando tudo nas entrelinhas, mas de uma coisa todos sabiam: Márcio e Esdras estavam longe de se entender, a exemplo dos personagens bíblicos Caim e Abel, Esaú e Jacó.

Do nada, Angélica tira os dois de seus mundos ao frear bruscamente o automóvel, parando próxima de uma guia: “- E precisava quebrar o nariz do seu irmão”, perguntou ela ao marido.

“- Para ele deixar de ser enxerido, creio que sim e não foi por falta de aviso. Ele está com sorte por eu não ter dito nada a noiva dele, pois aí sim, sentiria uma dor maior. Mas deixemos esse assunto ser lavado com a água desta maravilhosa chuva e vamos logo para casa. Quero descansar e pensar na inauguração da nossa editora amanhã”, pediu o esposo.

O casal fez o restante do caminho em silêncio como se houvesse algo de errado entre os dois. Já dentro do apartamento, Angélica voltou à carga sobre o que tinha acontecido na casa de Débora. “- Posso ter muitas divergências com o meu irmão, mas nunca saímos no braço ao ponto de trocar socos e pontapés”, sentenciou a empresária.

– Você fala por ti e não pelo resto do mundo.

“- Cruzes Márcio!  Como está azedo hoje”, disse a esposa de forma assustada.

– É que já te pedi para encerrar esse assunto, mas parece que ficou surda.

“- Você esmurrar outros homens porque estão me paquerando acho louvável e muito excitante, mas quebrar o nariz do próprio irmão, já é demais para a minha cabeça”, observou Angélica.

– Bom! Esdras vem me enchendo a paciência faz tempo e hoje pela manhã foi fazer graça com a noiva me enxovalhando e aí Fernanda escutou e saiu em minha defesa, quase não havendo noivado.

“- Ah! Tinha que ter dedo da Fê. No mínimo ele cantou a sua queridinha e o todo poderoso Márcio saiu em defesa da puta amada e indefesa. Nos faça um favor: quando quiser uma boceta, vai atrás da dela e vê se me esquece. Sabia que o problema não era comigo e sim com ela”, vociferou a esposa.

– O seu problema é achar de mais e ouvir de menos.

“- Está certo ‘meu amor’, a surdinha aqui sai de cena e aproveita vai tomar no olho do cu, mas antes pede o vibrador da Fê, pois tenho certeza de que ela usou muitas vezes pensando em ser enrabada pelo seu pau”, gritou Angélica de maneira desesperada.

Antes mesmo que Márcio pudesse dizer alguma coisa, Angélica correu para o quarto, se trancando em seu interior, como fazia das outras vezes. Lá fora a chuva aumentava de intensidade e o esposo ficou ali, pensando o que fazer e no que ela lhe disse. Não conseguiu explicar que o soco foi motivado por outra coisa: maldita mania de querer explicar tudo nos mínimos detalhes.

Aguardou uma meia-hora na expectativa de que ela retornasse e como isso não aconteceu, o editor se dirigiu ao quarto de hospedes e resolveu observar o temporal daquela janela, encontrando uma outra paisagem que nunca havia notado. Era os bairros mais periféricos que surgiam com a expansão do município. Ficou imaginando como seria a vida daquele lado da cidade, recordando de muitas matérias que publicou por conta dos deslizamentos de terra e queda de imóveis construídos de forma irregulares.

Ele não soube precisar o tempo em que permaneceu nessa contemplação, mas percebeu a noite chegar quando alguns raios riscaram os céus no mesmo momento em que sentiu as mãos da esposa lhe envolverem pela cintura. “- Amor! Mil perdões! Não vou prometer nada, pois tenho ciúmes de Fernanda contigo e sei que existe mais dela em ti do que eu, mesmo que diga que me ama de todo o seu coração”, desabafou Angélica enquanto o marido voltava a sua face para a dela.

Sem atropelo algum, o editor foi direto onde precisava: “- Esmurrei meu irmão porque ele disse que eu tinha vestido a sua calcinha e você a minha cueca, numa clara alusão ao que ele sempre achou de minha sexualidade e que sou dominado por ti”.

Antes que a esposa pudesse dizer algo, Márcio completou: “- Pela manhã ele já tinha brigado com Fernanda por insinuações, além de tentar ressuscitar aquela história que me fez fugir da minha cidade, vindo parar aqui e acabar por te conhecer. Outra coisa: se eu quisesse transar com a Fê, teríamos feito isso antes de você e Ricardo aparecerem em nossas vidas. Claro que eu a conheço mais tempo do que tu, mas é você quem me conhece de dentro para fora e não o contrário”, informou o editor.

– Quando você me explica essas coisas, me sinto como uma idiota dominada pelo ciúmes e medo de te perder, principalmente em se tratando de Fernanda. Fico pensando que ela é bem melhor do que eu para ti.

– Esse tipo de comportamento inseguro é próprio das pessoas que durante boa parte da vida passou comprando amizade, carinho, admiração. Quando conheci seu irmão, ambos estávamos na sarjeta e a beira de um colapso. Ele por conta de ter conhecido o amor de sua vida e eu por não o ter encontrado naquela época. Mas hoje ele está imensamente feliz com Tarsila e eu encontrei o caminho do paraíso em seus braços. Todos sabem disso, inclusive aquele raio que acabou de riscar o céu.

– Acho linda essa sua amizade com o meu irmão e mais doido ainda porque não enxergo desta forma a sua relação com Esdras.

“- Desconfio que a bronca dele comigo é porque quando tudo aquilo aconteceu ele era adolescente e por conta dos problemas causados pela minha ação, Esdras sentiu o baque quando meu pai precisou refazer a vida econômica deles”, tentou justificar Márcio.

– Se for isso, é compreensível, amor. Então, deixe tudo isso para lá. O mais importante é que está tudo resolvido agora e, eu, apesar da minha ciumeira toda, insegurança e outros traumas não suporto a ideia de te ver longe do meu mundo.

O casal se entreolhou e Márcio deu um leve beijo na esposa, puxando-a em seguida em direção à sala. “- Vem comigo. Vamos escolher as roupas que usaremos amanhã à noite. Não quero nada extravagante para nós dois. Penso em algo bem sóbrio para nós, pois quem deve brilhar é a editora e não o seu editor”, explicou marido já sentando no sofá e abrindo o notebook.

– E no que meu esposo está pensando, posso saber?

“- Estou pensando em cores laranja e esmeralda para ti. Nada provocante e nem cafona, mas algo bem sensual e no meu casso, um jeans, camisa branca, sapatênis e um blazer. O que achas”, quis saber o editor.

– Deixe-me ver se entendi. Você quer que eu me vista sem vulgaridade, sem ressaltar minhas formas, mas que todo mundo olhe para mim? Como vai ser isso?

Sem responder à pergunta da esposa, ele se voltou para a tela do computador onde estava sendo exibido o site de uma loja em que os internautas podiam escolher as roupas e vesti-las num manequim construído a partir das medidas apresentadas e começou a experimentar as vestimentas apresentadas à direita da página. Depois de fazer isso uma dezena de vezes, Márcio apresentou uma imagem para Angélica lhe dizendo que a queria vestida daquela forma.

A empresária ficou maravilhada com o que viu. No manequim que a representava, estava vestida com uma saia beach babado bambu, de cor esmeralda. Calçava uma sandália de salto da mesma cor da saia com detalhes em laranja. A blusa era bem simples na cor laranja e detalhes frisados na cor verde esmeralda, seguida de uma bolsa em tons laranja e verde esmeralda. Tudo realçando as formas da esposa que, parada não demonstrava os seus atributos, mas quando Márcio colocou o manequim em movimentação, era possível vislumbrar toda a beleza física da esposa.

“- Caralho Márcio! Estupendo! Achei que não entendias de moda”, afirmou Angélica.

– Talvez faltava o motivo para me inteirar melhor desse universo e agora eu o tenho. Gostou?

“- Adorei! Pode reservar essa roupa aí, informando para que entreguem na sede da editora amanhã à tarde lavada e pronta para eu usar. Agora que você escolheu e muito bem a minha roupa, deixe que eu faça o mesmo por ti”, disse Angélica toda empolgada com a expectativa de usar um manequim escolhido pelo marido.

– Veja lá hein! Não vai me fazer ficar vestido feito um pinguim de geladeira.

Essa observação do editor fez a esposa gargalhar, porque ficou imaginando o esposo vestido como na descrição que fez. Assim que ela montou o manequim, chamou Márcio para ver no que foi aprovada a sua escolha. Ela vestiu o marido de maneira sóbria para que não chamasse atenção de nenhuma mulher, mesmo sabendo que isso seria impossível.

Quando Angélica pensava em fechar o computador, o esposo chamou a atenção dizendo que precisava fazer uma coisa. Pediu para ela fechar os olhos e escolheu um conjunto de lingerie que desejava vê-la usando.  Para surpresa da empresária, tudo inspirava sexualidade, sem cair na vulgaridade e sem mostrar nada, além do que ficaria na imaginação dos homens, pois eles poderiam acreditar estar enxergando algo quando na verdade tudo não passava de holografias feitas pela saia.

“- Obrigada paixão! Não só pelo sentimento que me tens, mas sobretudo por cuidar do meu coração, da minha cabeça, enfim, dar um norte para a minha vida. Te amo, doutor esquisitão”, disse Angélica dando um leve beijo no esposo que sentiu toda a magia presente naquele suave toque dos lábios dela no seu.

– Estamos no começo. Tenho uma imensa floresta de amor para lhe dar, minha rainha diaba.

Dentro do apartamento o calor dos corações dos dois esquentava tudo e mais um pouco, diria o poeta se observasse a cena carinhosa entre o casal. Lá fora tudo parecia terminar em água. Longe dali, na casa de Débora os pais de Márcio tinham uma conversa reservada com o noivo da secretária de Angélica.

– Tudo bem mãe! Eu sei que errei, exagerei, mas o Marzinho com aquele jeitão de santo não me engana e aquela mulher dele que também gosta de outra mulher. Eles me dão nojo. Ficam bancando de casal ajuizado quando todos sabem que ela controla tudo e enche o rabo dele de dinheiro. Ou vocês estão achando que essa história de editora não é a maior mancada. Deixa ela encontrar uma buceta para chupar para ver se tudo não acaba em questões de segundos.

“- Respeita a sua mãe ou lhe quebro os dentes e vai acabar se casando banguela”, disse Rogério em tom de ameaças.

“- A vida do Marzinho com a mulher dele não tem nada a ver contigo. E se ele te partiu a cara hoje foi para evitar que não ficasse noiva de Débora. Então vê se coloca juízo nessa cabeça e honre essa penca que carrega no meu das pernas e vire homem”, disse Judith.

– Eu não vou amanhã na merda daquela inauguração. Estou farto de ver tanta bajulação em cima do Márcio. Dá vontade de falar para todo mundo que ele veio parar nessa cidade do caralho porque foi chifrado na noite anterior ao casamento.

“- E o que tu ganha com isso? Um inimigo? Deixe seu irmão no mundo dele e cuide do seu. Do contrário, eu mesma acabo com esse seu noivado”, sentenciou a mãe.

“- Posso participar da conversa”, pediu Débora.

– Pode sim, minha filha. Já terminamos aqui com o marmanjão que acha que é dono do mundo.

– Tudo bem Judith. Conversamos bastante e farei tudo o que for possível para ajudá-lo a diminuir essa bronca que tem do irmão. Esdras precisa aprender que Márcio só tem olhos, boca, ouvidos e vida para Angélica e que não cruzará o caminho dele em qualquer coisa e é por isso que eu entendi a recusa do Marzinho de entrar na sociedade do supermercado.

Ao terminar de fazer suas observações, Débora pediu ao futuro sogros que os deixassem sozinhos. Ela queria ter uma conversa com o noivo. “- Tudo bem minha filha. Estamos na sala com seus pais e assim que essa chuva diminuir, vamos para casa e o Esdras vai conosco”, disse Judith.

“- Pronto! Me diga de onde brota tanto ódio do seu irmão ao ponto de querer humilhá-lo quando ele nem está aí para ti”, quis saber Débora, olhando fixamente para o noivo.

Esdras tentou, mas não conseguiu fugir da inquirição da noiva que o colocou na parede dizendo: “- É bom que tenhas uma resposta bem plausível, porque não vou me indispor com ninguém, ainda mais com a minha futura sócia por conta de birras do cara que deseja ser meu marido”.

– É um lance complicado.

“- Então descomplica, pois amanhã quero te ver no lançamento da editora dele”, cobrou a noiva.

– Ah isso não!

“- Isso sim e desembucha logo! Estou começando a perder a paciência, além de achar que você não passa de um moleque crescido e mimado que deseja ser melhor do que seu irmão, só que não tem competência para isso”, disse Débora em tom de afronta.

Esdras pensou, pensou e quando a noiva ameaçou sair do quarto, ele disse que tudo começou quando o irmão brigou com a ex-noiva e tentou espancar o amante dela. “- O pai do cara era sócio do meu pai e eu tive que aguentar muita coisa. Não foi nada relacionado ao dinheiro, mas era chamado na rua de chifrudo como Márcio”.

“- E daí? Você era? Acha que vou te trair”, lhe perguntou a noiva.

– Não é isso!

– Então esqueça essa história. Já são passados mais de cinco anos e aquela vagabunda da Márcia está presa, condenada por tráfico de drogas. Então não adianta trazer o passado para o presente, pois penso em estar contigo daqui para frente. O ontem eu não posso resolver e sei que Angélica também não e nem o seu irmão quer aquele passado incomodando todos hoje. Tenho certeza de que se ele pudesse fazer diferente faria, mas não se pode mudar o pretérito, apenas aprender com ele”, explicou Débora.

– É que toda vez que olho para ele, me vem à mente todas as humilhações que sofri e então, acho que posso lhe devolver um pouco daquilo tudo, daquela dor.

“- Imagine que consiga fazer isso. E depois, como vai ficar? Você acha mesmo que seu irmão está lá preocupado contigo? Não achas que ele já sofreu o bastante durante todo esse tempo? As rusgas com seu pai. Só depois que Angélica apareceu na vida dele é que os olhos dele voltaram a brilhar”, argumentou a noiva.

– E o que você quer que eu faça?

“- Deixe Marzinho no mundo dele, do contrário, essa mágoa que carregas aí dentro de ti te afundará num tonel de bosta de onde ninguém conseguirá te tirar e eu, por mais que te goste, não farei esforço algum por saber que é consequência de sua incapacidade de abandonar as dores pretéritas e caminhar em direção ao Sol”, explicou Débora.

Esdras ficou pensando e abraçando a noiva lhe pede para ajudá-lo a perdoar Márcio.

– Acho que você precisa aprender a se perdoar, por ser tão insensível com o seu irmão. Pelo pouco que o conheço, ele não quer nada além de viver em paz com a esposa e olha que Marzinho corta um bocado com Angélica. Sou testemunha disso. Então, enquanto trabalha esse ranço dentro do seu peito, procure ser mais sociável com ele.

“- Está bem! Você me ajuda”, perguntou Esdras com os olhos lacrimejados.

– Vamos tentar.

O casal estava abraçado quando a mãe de Débora bateu na porta chamando os dois para jantar. Ela havia feito uma sopa de lentilha que a filha tanto gostava e precisava ser acompanhada com vinagre e azeite. A iguaria era uma ótima refeição para aquela noite chuvosa de domingo. Os noivos deixaram o quarto em silêncio e, ao chegaram na sala de jantar, sentaram um do lado do outro e Judith percebeu que a futura nora estava um pouco diferente, mais esperançosa.

Foi Romualdo quem disse ao filho Ricardo que depois do jantar era para levar os pais de Marzinho e Esdras para a casa deles e depois ele e Fernanda irem descansar porque na segunda-feira tudo seria corrido. “- Não vai decepcionar o seu patrão. O dia é importante para ele e para você também”, disse o pai.

O tecnólogo apenas assentiu com a cabeça. O dia havia sido bastante tenso e deveria ter sido diferente, mas na cabeça dele e do futuro cunhado, Marzinho e a esposa tinham o dom de azedar qualquer reunião. “Trabalhar com ele, eu até topo, mas aos poucos tentarei afastar Fernanda dele e daquela doida da Angélica”, pensou Ricardo enquanto sorvia a sopa de lentilha.

“- Sogrinha, você precisa me ensinar a receita dessa sopa. Vai que o maridão aqui queira que eu faça uma semelhante a esta tua”, disse Fernanda para quebrar o gelo, tentando engatar uma conversa animada. Ela sabia que o clima de velório era por conta do seu amigo. Márcio era muito certinho, mas não fazia de propósito. Era o jeitão dele.

Terminada a ceia, os homens foram para sala dar sequência às conversações de como seria o dia seguinte. Rogério trabalharia com Esdras no supermercado, tendo a companhia de Leônidas que já tinha avisado que ele e a esposa não iriam à inauguração da editora do irmão, pois aquele ambiente não tinha nada a ver com eles. “- E não adianta a mãe vir com chantagens disso e daquilo que não vamos e pronto”, sentenciou Léo que foi seguido por Esdras. Restando ao pai dizer apenas que representaria os homens da família naquela tentativa infantil de Márcio ser editor.

No apartamento de Alexandre, o militar e sua namorada começavam a organizar a viagem que fariam até Resende e tentariam trazer a irmã dele para morar com ele ou colocá-la num lar para idoso ali na cidade onde ficaria mais fácil para o general acompanhá-la. “-Deixe comigo. Conversarei com ela, meu amor”, garantiu Eleanora.

– Sei não. Ela é muito sistemática, entretanto, se você conseguir, estará me dando um ótimo presente de aniversário.

“- Como assim, aniversário”, perguntou a namorada.

– É! Daqui duas semanas eu começo um ano novo em minha vida e ao que tudo indica será fantástico e com muitos desafios pela frente.

“- Pode me enumerá-los”, quis saber Eleanora.

– Muitos deles vão aparecendo conforme vou vivendo, mas posso te adiantar que o maior deles é te fazer feliz. Não tenho ilusão alguma de que vou substituir seu falecido marido aí em seu coração, mas penso que seja possível caminharmos juntos daqui para frente.

“- Sabe amor, uma das coisas que Márcio me ensinou e sempre vou ter comigo é não sentenciar as pessoas antes de conhecê-la. Antes dele aparecer, acreditava que dinheiro, posição social era tudo, e isso me fez tentar transformá-lo num sem-teto. Angélica o defendeu com unhas e dentes, inclusive atacando o pai, coisa que nunca havia feito antes”, revelou a namorada.

– Você acha que ele tem algo especial?

“- Não! Ele é um homem comum, mas com valores bem impregnados que os definem. Para aguentar minha filha e as neuroses dela, somente alguém que tenha a certeza do que se é, do contrário, já teria desistido de tudo. Se bem que no caso dele, acho que já tentou várias vezes, mas ela o encontra”, respondeu Eleanora.

– Então é uma relação tipo entre tapas e beijos?

“- Não! Ciúmes mesmo! Angélica manteve um relacionamento por sete anos com uma mulher e eu nunca soube que discutiram por conta disso, entretanto, bastou o meu genro aparecer que o mundo dela virou de cabeça para baixo e os olhos dela brilharem mais do que duas turmalinas ou esmeraldas”, informou a namorada.

Diante do mutismo de Alexandre, Eleanora continuou ressaltando os valores que acreditava ser o genro portador. “- Márcio não é perfeito! Ainda bem, pois seria mais chato do que já é! Mas é uma pessoa que tem me ensinado muita coisa, principalmente a me ver diferente do que eu era e encarar essa nova mulher que deixa a essência ser mais importante do que o dinheiro e tudo o que ele significa. Durante os quase 40 anos que convive com o meu marido, nunca tinha visto essa pessoa que estava guardada dentro de mim. Aquele neguinho, com todo o amor que tem pela minha filha e por Amadeu, me abriu de dentro para fora, usando apenas um martelo de borracha. Não sei se você me entende, amor”, perguntou Eleanora.

– Acho que sim, mas de qualquer forma, penso que eu sou o maior beneficiado dessa sua descoberta. Afinal, te conheci quando tentava preparar o noivado de sua filha com Marzinho.

“- Alexandre! Sei que tenho ainda uma grande jornada para me harmonizar comigo e com o mundo. Também que o dinheiro que tenho não seria suficiente para comprar a paz que tanto busco, mas tenho certeza de que daqui para frente quero tê-lo comigo. Quando te vi quase morrendo dentro daquele banheiro, sem poder fazer nada e recorri ao seu cozinheiro, entendi que dinheiro não compra afeto, não adquire caráter, mas somente traz aquilo que é semelhante a quem o deseja”, revelou Eleanora.

– Como assim, amor?

“- Eu vivia rusgada com a minha filha, mas teve uma noite que passamos juntas e ela me falava do Márcio e da necessidade de encontrá-lo para ajudar com Amadeu, mas eu sabia que não era esse o desejo dela, mas o queria para a sua caminhada até o fim da eternidade”, respondeu a namorada.

– Explique melhor isso.

“- Jô, meu marido, nunca foi capaz de me amar. Não porque não quisesse, mas porque não podia, pois amava outra pessoa. Ele me cobria de coisas materiais, fazia todos os meus desejos, mas era incapaz de me dar o que eu mais queria: o coração dele. Estive com ele até o último dia, como dizem as pessoas, o seu último suspiro, mas a sua alma pertencia a outra mulher que só existia dentro dele”, desabafou Eleanora.

– E quando percebeu isso?

“- Quando Márcio deu um jeito de sumir da vida de minha filha. Ele foi se esconder nos confins do estado e eu achava que tinha sido um covarde, mas não! Ele o fez por ter certeza de que amava Angélica e ela já era comprometida, portanto, não podia fazer nada. Na cabeça dele, o coração de Keka já tinha dono e ele jamais iria tomar o lugar de alguém”, informou a mãe de Angélica.

– Você está me dizendo que seu genro não fugia de Angélica, mas do amor que lhe sentia? Ele poderia até encontrar outra pessoa, se casar com ela, mas o coração dele já tinha sido preenchido pela sua filha?

“- Exato! Por isso Fernanda não conseguiu conquistá-lo. Márcio estava sempre ali, então ela não precisaria fazer nada. Podia dormir com outros homens, mas meu genro estaria ali para segurar a mão dela quando chorasse por ter acreditado em mais um idiota que só queria o seu corpo”, explicou Eleanora.

– Agora estou começando a entender por que ele provoca tanta bagunça por onde passa. Márcio não é seletivo, mas apenas reservado como o seu filho Amadeu e por isso se deram tão bem e vivem como se fossem irmãos.

“- Já tinha perdido as esperanças de ter meu filho de volta, mas nunca tinha tentado trazê-lo do modo correto: apenas com afeto, como meu genro fez e Fernanda sabe muito bem disso. Ela vai amar Márcio até o fim da vida, mesmo estando casada com Ricardo que transa com o corpo dela, mas não com a alma que foi conquistada por Marzinho sem fazer o menor esforço”, revelou a namorada ao general.

– Angélica sabe disso?

“- Sabe! E é por isso que tem um ciúme medonho da sua gerente. Minha filha teme que o marido possa se encher das loucuras dela e cair nos braços de Fernanda, entretanto, sei que isso nunca acontecerá por conta do jeito que ele olha para Angélica e pelas conversas que tive com Judith”, respondeu a presidente de honra das Organizações Oliveira.

“- E como é esse olhar”, quis saber o general.

– O mesmo que você me envia e eu só fui capaz de compreendê-lo naquela noite em seu apartamento. Você acredita que Angélica ameaçou ficar pelada num terminal rodoviário, caso Márcio não voltasse com ela.

“- Eu ouvi essa história, mas achei que fosse tudo fantasia”, disse Alexandre.

– Que nada! Naquele momento, minha filha me disse que teve certeza do amor dele por ela, mas era tudo confuso para os dois.

Alexandre só olhava para a namorada tentando imaginar Angélica, toda bela, tirando a roupa num lugar completamente desconhecido para forçar o seu amor a retornar com ela. “- Não vale ficar imaginando a minha filha sem roupa. Contarei tudo para o Márcio e aí você se entende com ele e depois comigo”, disse gargalhando Eleanora.

– Não posso negar que sua filha seja bela, também pudera, com a mãe que tem. Como o fruto não cai longe do pé, adoro a semeadora de tanta beleza e que agora me dá o prazer de caminhar com ela até o fim da eternidade.

“- E quanto tempo dura a eternidade”, quis saber a namorada.

– Sei lá. Uns dizem que apenas uns segundos, outros que é o tempo que levou a criação do universo e tudo que tem nele e há aqueles que dizem ser o tempo suficiente da explosão de um átomo. Eu creio que seja um sopro enviado pela alma ao coração que se sacode quando o espírito encontrou sua morada. O meu já encontrou o dele e por isso não há necessidade alguma de chave que atende pelo adjetivo ciúme.

“- Jura que me ama assim desse jeito que sou”, perguntou Eleanora.

– E como você c é? Me apresenta para eu poder dizer algo.

“- Sei lá! Meio prepotente, arrogante, egoísta e que não aceita não como resposta”, tentou responder a namorada.

– Isso tudo é essencial ou mecanismo de proteção criado a partir do momento em que percebeu que não entraria no coração do seu marido?

“- Está vendo só! Nunca ninguém me fez essa pergunta. Agora tenho que pensar”, revelou Eleanora soltando uma grande quantidade de ar boca.

“- Está bem, enquanto reflete sobre a pergunta, que tal me dar um beijo delicioso”, acrescentou o general já abraçando Eleanora que sentiu o calor que emanava dos lábios do militar e do meio das pernas dele.

Alexandre percebeu que, através daqueles diálogos, a namorada revela mais um pouquinho do seu intrincado passado, bem como os elementos que faziam com que os filhos fossem meio estranhos. Ambos haviam encontrado a felicidade nos braços de dois pretos, que detestavam aparecer e viviam silenciosamente a partir de suas profissões. “- No que está pensando, meu amor”, quis saber Eleanora.

– Em tudo e nada ao mesmo tempo. Você e seus dois filhos encontraram a felicidade nos braços de três pretos. Isso não te diz nada?

“- Muita coisa, inclusive se pudesse ter uma máquina do tempo retornaria um tiquinho só para tentar arrumar a minha cabeça. A mulher que me impedia de entrar no coração do meu marido também era uma preta que foi violentamente assassinada a mando do meu sogro”, revelou a namorada.

– Como é que é?

“- Isso mesmo que você ouviu! Jô só teve coração para uma mulher que a amou quando ela era funcionária do seu pai e pagou com a vida por tentar viver esse amor com ele. Por conta disso tinha aversão aos pretos, mas só fui perceber isso quando Márcio resgatou meu filho do mundo enlouquecido em que vivia e quis desaparecer porque amou minha filha desde o primeiro dia em que a viu no bar”, explicou a presidente de honra das Organizações Oliveira.

– Me explique como é conviver com tudo isso?

“- Uma loucura total dentro da minha cabeça que bagunçou meu coração quando te conheci e percebi o quanto você é parecido com o meu genro. Parecem dois seres forjados a base de cimento e aço, mas tem aí dentro do peito um sentimento singular. Sinceramente não sei como não foram fisgados antes por nenhuma outra mulher”, disse a sogra de Marzinho.

– Talvez porque os nossos olhos e corações estivessem fechados para elas. Por exemplo, Fernanda é belíssima, inteligente, mas não conseguiu passar das linhas e dos arames farpados colocados pelo coração de Márcio. Aí eu te pergunto, como Angélica conseguiu?

“- Achou que foi o contrário. Márcio a derrubou do salto várias vezes, fazendo ela correr atrás dele sem saber porque o fazia. Esse foi o encanto dele e de Tarsila. Ela se afastou de Amadeu para não ter o mesmo destino do grande amor de Jô. Minha nora só retornou com a ajuda do meu genro que, mesmo sendo humilhado por todos nós, quase virando um morador de rua, nos devolveu Amadeu. Acho que somente isso faz dele um homem singular e, ao mesmo tempo, aluarado, mas o prego no concreto da vida de Angélica”, contou Eleanora.

O general escutava tudo atentamente como fazia nos tempos de quartel quando participava dos cursos de aperfeiçoamento. Ele sabia que só teria alguma chance se fosse o melhor e depois caísse nas graças dos comandantes para ficar entre os classificados. Quando perguntava sobre as falhas, sempre ouvia que as avaliações eram subjetivas e que o mais importante era ele estar ali, mesmo que não fosse entre os primeiros da turma.

– Por que está me contando tudo isso, Eleanora? Dá última vez que me falou de algo íntimo de sua família, sua filha entrou em pane por conta de minha inabilidade.

“- Em breve você abrirá uma parte do seu passado. Me levará para conhecer a pessoa que mais importa em sua vida e tentará trazê-la para viver entre nós. Então acho que deveria saber mais sobre o meu ontem. Eu e meus filhos somos apenas discretos e sabemos o valor que o silêncio tem e entendo que você também possa ser desta forma, meu amor. De modo que não tenho motivo algum para não o deixar visitar um pouco do meu passado e desta forma, possamos construir juntos o que desejamos viver amanhã”, explicou a mãe de Angélica.

Com essas observações, Eleanora conseguiu, no seu entendimento, entrar definitivamente no coração do general e não sair mais. Ela sabia que o militar era metódico, desconfiado, andava sempre de lado para nunca dar as costas a ninguém, mas o coração dele já era dela. Disso ela tinha certeza absoluta.

Alexandre abraçou a namorada num gesto de puro afeto, enquanto pensava como seria o reencontro com a sua irmã e o que ela pensaria de Eleanora, bem como se aceitaria voltar com o irmão e morar sob o mesmo do militar. “Entre pensar negativo e positivo, claro que prefiro a segunda opção, então tudo dará certo e no próximo domingo ela estará aqui conosco”, imaginou o general.

No apartamento, cujas paredes tantas vezes pareciam desejar devorar Amadeu, Pedro e Fabrícia conversavam afetuosamente enquanto os filhos dormiam no sofá diante da tevê. “- Amanhã o dia vai ser daqueles. Márcio vai inaugurar a editora e tenho certeza de que a mulher dele ficará lá atormentando. Já vi gente insegura, mas como Angélica está para nascer. Ela tem tudo! Beleza, dinheiro e um homem que só falta limpar o cu dela com a língua e ainda assim, segue ele com os olhos e não deixa ninguém chegar perto”, disse a esposa de Pedro.

– Amor! Eu conheço bem o general desde os tempos de quartel, mas acho que a mãe é igual a filha. Ela expulsou duas mulheres que acompanhavam Alexandre. Mas me parece que Angélica teme, antes de qualquer mulher, aquela amiga do marido, a tal da Fernanda. Ninguém me tira que ela a levou para as empresas para ficar de olho nela.

“- Ainda bem que eu não tenho esse problema contigo, né, meu amor”, disse Fabrícia em tom interrogativo.

– Até você não me trocar por outro. Sei que não sou belo e nem perfeito, mas tenho plena convicção do amor que lhe dou diariamente e aos nossos filhos.

“- Você está me dizendo que só está comigo por conta deles”, quis saber a esposa.

– Os três são a razão do meu viver e como são frutos do nosso amor, acho impossível separar uma coisa da outra: estar contigo por conta deles, se eles existem por conta deu estar com você. Então não estar junto de ti é não tê-los e não tê-los é não te ter.

“- Mudando de pato para ganso, Pedro você acha que pode crescer mais no restaurante do Alexandre”, perguntou Fabrícia.

– Ir para onde? Estou bem lá e ele precisa do meu trabalho e você está na editora, então, não vejo porque pensar em outra coisa.

“- Sei lá! Não quero ficar limpando o chão daquela editora e vivendo entre aquela turma de amalucados. Para mim ali ninguém bate bem da cabeça. Começando pelo Marzinho. Meu deus do céu que homem complicado! E aquela sócia dele? Outra destrambelhada que morre de amores por aquele Amadeu que não sabe direito onde está”, desabafou a funcionária da Jardim da Leitura.

– Amor! Acho que não deveria colocar reparo nisso. Aquele cara ficou por mais de cinco anos feito um doidivanas pelas ruas dessa cidade procurando Tarsila e só voltou ao mundo dos assim chamados normais por conta do Márcio. O general me disse uma vez que não entende direito como é que funciona a cabeça daquele pessoal. Eles têm dinheiro de montão, mas detestam fotografias, aparecer em colunas sociais. É como se não existissem para o mundo aqui fora.

“- Disso você tem razão! São esquisitíssimos”, sentenciou Fabrícia.

– Então fiquemos assim: esperemos ver o que Alexandre se decide. Aquele lá é outro que caiu de quatro por aquela ricaça que não enxerga mais um palmo à frente do nariz. Posso propor algo a ele sobre o restaurante.

“- Que algo”, desejou saber Fabrícia.

– Sei lá arrendar o ponto. Tenho certeza de que depois que ele trouxer a irmã para cá, não terá mais tempo para cuidar do negócio. Então de repente podemos propor o negócio a ele e você sai da editora e fica comigo no restaurante.

“- Se ele topar, será ótimo e ainda teremos aqueles destrambelhados como nossos clientes”, disse a esposa, apresentando caracteres de devaneios.

– Pelo que pude observar, aquele irmão do Marzinho quer distância dele. Então jamais será nosso cliente. Poderá ir esporadicamente lá, mas duvido que será um frequentador assíduo. Se conseguirmos tocar o restaurante, quem sabe podemos propor negócio semelhante à Eleanora com o estabelecimento dela no shopping?

Não muito distante do apartamento em que Pedro e Fabrícia residiam, os ponteiros do relógio na torre da rainha diaba marcavam três horas de um novo dia. A noite ainda era presenteada por chuvas quando Angélica percebeu que havia apenas seu corpo na cama. Como de praxe se desesperou, achando que Márcio tinha partido. Por mais que o marido lhe dissesse que a amava loucamente, sempre haveria insegurança, pois temia perdê-lo para Fernanda. Diriam os antigos que uma mulher reconhece de longe aquela com a qual rivalizará pelo resto da vida e a relação da empresária com a sua gerente de finanças corroborava para que o dito se concretizasse.

Sem atinar direito sobre o que acontecia, Angélica saiu da cama sem se ocupar em cobrir parte do corpo, deixando o quarto em desespero chamando pelo marido que estava de pé, imerso em um mundo completamente seu, olhando a chuva que caia na cidade. “- O que aconteceu amor”, quis saber a esposa, emendando outra afirmação: “- Pensei que tinha me deixado e ido procurar Fernanda”.

Lentamente o esposo se virou para ela, dizendo calmamente: “- Esquece a Fê! Ela não é nenhuma ameaça para o nosso amor.  Talvez esse seu ciúme excessivo seja mais prejudicial do que ela ou qualquer outra mulher”, sentenciou o editor.

– Eu sei disso tudo amor. E por mais que eu tente me controlar, às vezes não consigo. Fico imaginando quantas vezes você dormiu na casa dela e aí vem cenas que podem nunca ter acontecido. Me ajude não ser tão insegura assim.

Márcio dá um passo em direção a esposa e ela faz o mesmo e o casal se abraçou. Ele lhe diz que estava ali porque perdeu o sono e ansioso com a inauguração da editora, concretizando um sonho a muito acalentado. “- Sai da cama porque fiquei com medo de atrapalhar o seu sono. Foi só isso. Tenho certeza de que se eu estivesse nos braços de outro alguém, o chamaria de Angélica”.

– Tenha certeza de que se isso acontecer, serei sentenciada por duplo homicídio e os dois estarão comendo grama pela raiz.

Márcio fitou a esposa bem dentro dos olhos, sentindo o coração acelerar ainda mais. Batimentos que foram notados por Angélica que quis saber o que era aquilo. Ela obteve como resposta que o nome era “efeito Angélica”.

“- O que posso fazer para te acalmar, meu amor”, quis saber a empresária.

“- Apenas me amar até o fim da eternidade”, pediu o esposo.

Após se beijarem afetuosamente, o casal se caminhava para o quarto. No trajeto da sala para os aposentos, Angélica pediu à Márcio que ficasse na cama com ela, mesmo que não conseguisse dormir. “- O calor do seu corpo sempre me acalmará, me tranquilizará”, explicou a esposa, antes mesmo dele responder ao seu pedido. Márcio optou pelo silêncio, se limitando a dar um abraço mais apertado na esposa que se sentiu mais tranquila.

Apenas tendo o abajur do seu lado aceso, o editor deixou que ela se deitasse sobre o seu tronco, passando a mão lentamente pela cabeça dela que entre um suspiro e uma declaração de amor, acabou adormecendo e Márcio se deixou ficar ali ouvindo o barulho da chuva, recordando tudo o que havia lhe acontecido nos últimos meses.

Chegou àquela cidade como um cão escorraçado de casa. Refletindo agora sobre todos as ocorrências, compreendeu que foi o único culpado daquilo tudo, pois Márcia já havia dado indícios de que tinha índole duvidosa, mas acreditou que o amor que lhe tinha fosse capaz de revogar todas aquelas falhas de caráter. Recuperou o dia em que começou a ascender no jornal para logo em seguida cair de forma vertiginosa, como a própria empresa também descambava. Dali para o bar o caminho foi feito numa velocidade enorme.

Entre uma memória e outra, Márcio percebeu que o sono não lhe visitaria aquele resto de noite e a chuva lá fora começava a emitir sinais de que em breve cessaria. Recordou da maneira engraçada como conheceu Fernanda, depois a encontrou na fila da lotérica e foi ela quem lhe dirigiu a palavra, quebrando o gelo entre os dois que se falavam apenas com o olhar. Gostou dela logo de início, mas ela tinha algo não lhe agradava. Atropelava as palavras, não concluía nenhum raciocínio para emendar com outro deixando a conversa totalmente desconexa. Não marcaram de se encontrar, mas ficou pensando insistentemente nela, chegando a achar que poderia avançar o sinal, mas as lembranças de Márcia o impedia de seguir adiante.

O encontro dos dois se deu no mesmo barzinho, mas Márcio estava em companhia de Roberto e os dois conversavam sobre os problemas da redação e da crise de criatividade que o repórter vinha tendo e a pressão que recaia sobre o amigo que lhe arrumara o trabalho. “- Porra Roberto! Eu tento, mas está muito foda”.

– Você é que precisa dar uma foda espetacular para destravar o pinto e a cabeça. Esperma acumulado no saco está fazendo mal à sua mente. Olha lá aquela gostosona que está entrando. É disso que estou falando.

“- Eu já a conheço. Chama-se Fernanda e meu santo não bateu com o dela”, informou Márcio ao amigo.

– Você quer dizer que seu pau não se encantou pela boceta dela?

Diante do silêncio de Márcio, Roberto completou. “- Porra! Não precisa filosofar para comê-la. É só engatar uma conversa, depois um cinema, motel e pronto. Depois é só deixar a coisa fluir”.

– Você sabe que não sou assim, Roberto.

“- E como sei meu amigo. Desde que levou o fora daquela professora, você nunca mais foi o mesmo. Ela tinha o que na buceta? Mel”, indagou o chefe da redação.

– Vá de foder, Roberto. Vamos mudar de assunto. Não estou afim de falar das saudades que meu pau tem de uma buceta.

“- Nossa! Não sabia que falava dessas coisas”, disse Fernanda chegando à mesma em que os dois estavam.

Roberto caiu na gargalhada, entendendo tudo. Daquele mato não sairia coelho e Márcio jamais comeria Fernanda. Ela sabia muito sobre ele e o mais engraçado é que sem terem conversado muito.

“- Quem essa mulher maravilhosa, Márcio”, perguntou o amigo colocando pilha no repórter.

Sem cerimônia, Fernanda lhe disse o nome e já falando tudo sobre ela, inclusive que conhecera Márcio porque ele tinha deixado a perna estendida enquanto estava com a cara metida num livro ali mesmo naquele bar.

“- Não se preocupe Fernanda. Se um dia vocês vierem a namorar, ter alguma coisa ou até ser marido e mulher, com certeza ele não irá lhe trair, exceto com alguma personagem do livro que estiver lendo”, explicou Roberto entre sonoras gargalhadas.

Recordando aquele primeiro encontro, tendo Angélica adormecida em seus braços, o editor entendeu que entre ele e Fernanda haveria sempre uma forte amizade e se fossem para cama, o relacionamento iria para o bueiro. Fez um movimento com a cabeça, beijando a cabeça da esposa, como um fiel faz diante da imagem da Santa pela qual tem devoção.

Vencido pelas memórias, Márcio acabou dormindo, sendo despertado pela mulher que o beijava pedindo para acordar para o grande dia da vida dele. “- Vamos amor, acorde! Temos muito trabalho na editora hoje”, disse Angélica.

– Quem disse que te quero na editora hoje?

– Você acha que te deixarei lá sozinho o dia todo? Vai que aparece uma escritora gostosona dando em cima desse pau que eu adoro tanto. Mas não é isso que me ocupa agora. Está lembrado que meu irmão disse que teremos uma reunião lá agora pela manhã? Pois é! Estamos em cima da hora. Se aprece e tomaremos café na editora.

Num pulo, Márcio estava debaixo do chuveiro tendo o seu corpo todo molhado e despertado pelo contato com a silhueta da esposa que sentiu que algo mais acordava. “- Nossa senhora que homem tarado eu arrumei para marido”, disse Angélica enquanto esfregava sua vulva no membro do marido que completou a ereção para alegria total do coração dela.

Lentamente a esposa foi se ajustando ao corpo dele, de modo que o pênis se encaixou dentro da vagina dela, a levando ao delírio e ao êxtase. Enquanto Márcio a penetrava, Angélica ajustava as pernas para que o membro se acomodasse completamente dentro dela.

Depois de um certo tempo nesse movimento de vai e vem, o casal chegou junto ao orgasmo numa sinergia que Angélica nunca teve com ninguém e o marido desconhecia. Seria realmente o tal amor que os poetas tanto diziam e escreviam sobre, se perguntou o marido quando ambos deixavam o elevador em direção ao automóvel.

“- Posso saber o motivo de tal silêncio, senhor Márcio”, perguntou Angélica em tom de ironia.

“- É o amor, respondeu o marido”, voltando a ficar em silêncio.

No trajeto entre o apartamento e a editora, o celular dela tocou. Era Amadeu querendo saber se chegariam logo. Estavam atrasados. “- Meu deus Keka, será que não consegue deixar para trepar com seu negão hoje à noite depois da inauguração da editora”, disse o irmão, gargalhando em seguida, pois sabia que o cunhado havia escutado a conversa toda.

“- Deus já te deu a Tarsila. Então isso basta”, respondeu Márcio.

– Ora meu amigo mosquito falando de deus. Vivia dizendo que apenas buceta de minha irmã bastava.

“- Estamos chegando Amadeu. Agora chega dessa conversa toda. Eu nunca quis saber das trepadas entre você e sua esposa, então não quero que se meta na minha vida sexual com Marzinho”, sentenciou Angélica.

Querendo evidenciar chateação, Amadeu disse tu que tudo bem. “- Câmbio, desligo”.

– Amor. Desculpe-me pelo meu irmão. Ele sempre foi meio atrevido assim e quando está feliz então. Quer que o mundo inteiro saiba e Tarsila faz um bem danado a ele. Obrigado por tê-la devolvido a ele.

“- Angélica! Amadeu é meu amigo, assim como é Roberto e os dois o são, talvez, mais do que meus dois irmãos. Roberto me apresentou essa cidade, me permitindo, mesmo que de maneira trôpega, recomeçar a minha vida e o seu irmão me apresentou a ti, a coisa mais importante em minha vida. Mas isso não dá aos dois o direito de invadir nossa intimidade”, emendou Márcio à observação feita pela esposa.

Conduzindo o automóvel pelas últimas ruas antes de chegar à sede da Jardim da Leitura, Angélica apertou a mão do esposo se sentindo mais segura ainda. “- Quero ser a mulher ideal para ti”, lhe segredou a empresária.

– Desejo apenas que me ame incondicionalmente e o resto nossos sentimentos farão. Esquece a ideia de perfeição. Isso é muito platonismo para o nosso presente. Seja apenas a mulher que atravessou o estado quando descobriu que me amava. Almejo aquela mulher que ameaçou ficar pelada num terminal rodoviário duma cidade desconhecida para me forçar a voltar com ela para essa cidade.

Ao ouvir esse comentário do marido, Angélica sentiu todo o seu interior vibrar, experimentando uma vontade louca de gritar, como naquele dia em que buscou o marido no hospital e este lhe disse que só voltaria com ela se fosse para ser o seu esposo.

Finalmente chegaram a editora e foram surpreendidos pela presença de Eleanora, Alexandre e Roberto. “- Ué o que fazem aqui. Não sabia que a reunião contaria com a presença de vocês todos”, afirmou Márcio olhando para uma mesa repleta de alimentos para o café da manhã.

“- Fui eu quem convoquei todos, Márcio”, explicou Eleanora. “- Estou atendendo a um pedido do meu filho”, completou a presidente de honra das Organizações Oliveira.

Assim que se sentaram, a sogra de Márcio aguardou enquanto Fabrícia servir a todos e se afastava. “– Bom. Vou direto a ponto, sem rodeios, até porque não gosto de muito nariz de cera”.

Essa última expressão de Eleanora surpreendeu mais ainda Márcio, pois era uma gíria do universo jornalístico, mas optou por ficar em silêncio, enquanto a sogra falava. Havia aprendido com a mãe e com a vida: escutar mais e falar menos e quando fosse dizer alguma coisa que fosse para acrescentar e nunca para desunir.

– Amadeu me pediu e eu resolvi atendê-lo. Ele quer se afastar da vice-presidência das empresas e passar mais tempo com Tarsila. Afinal, ficaram longo tempo separados um do outro e agora ela aguarda meu primeiro neto.

Como ninguém dizia nada, a sogra de Tarsila continuou. “- Também desejou que a esposa se afastasse da editora, depois de sua inauguração para se dedicar exclusivamente à gravidez e a chegada do primeiro filho deles. Claro que isso só poderia acontecer com a anuência dela e já conversamos sobre isso e ficou tudo acertado que ela só voltará depois do nascimento do filho. Lógico que fará trabalho remoto, mas de forma bem reduzida”, explicou Eleanora, depois de sorver uma grande quantidade de café sem açúcar.

Todos olharam para Márcio que fez uma cara de quem não gostou muito, mas teria que aceitar ou arrumar a maior briga com todos. Ainda tinha a aceitação da própria sócia, portanto, não poderia fazer nada, a não ser aceitar tudo aquilo. Sabendo do grande desconforto que o marido estava enfrentando naquele momento, Angélica lhe apertou a mão por baixo da mesa, enquanto a mãe continuava em seu relato.

“- Com Amadeu longe das empresas, se dedicando mais a editora em parceira contigo, Márcio, o cargo de vice-presidente das empresas ficou vago e será ocupado por Roberto, caso ele queira. Você aceita esse desafio, de ser vice de minha filha”, interpelou a presidente de honra das Organizações Oliveira.

Roberto quase engasgou porque nesse momento colocava um pedaço de pão na boca, sorvendo uma quantidade significativa de café. Pela primeira vez, desde que começou a trabalhar nas Organizações, Roberto procurou aprovação de Márcio e o fez por intermédio de um olhar que os dois conheciam muito bem. A resposta à Eleanora só foi dada depois que o amigo deu o sinal verde para que fosse adiante.

“- Eleanora, não sei nem o que dizer. Fui pego de surpresa, da mesma forma quando me descobri apaixonado por Danisa”, tentou justificar o amigo de Márcio.

“- Você pediu permissão para Márcio para namorá-la”, perguntou Eleanora.

Essa observação não passou despercebida, pois indicava que a presidente de honra das Organizações Oliveira tinha notado a comunicação do genro com o seu executivo. A filha tinha razão, Márcio sabia olhar sem deixar transparecer que o fazia.

Para não alongar a conversa e revelar mais coisas sobre a amizade que tinha com o genro de Eleanora, Roberto apenas disse que aceitava o desafio, mas queria Fernanda junto dele ocupando um cargo na diretoria, por exemplo, o que ele ocupava na área de comunicação. “- Me sentirei mais seguro. Espero que a senhora me entenda”.

“- Vamos deixar a senhora para eventos públicos quando assumir o cargo. Aqui em nossa intimidade me trate por você”, disse Eleanora afirmando em seguida que a amiga dos dois ficaria com o cargo dele. “- Sendo assim, Márcio e Amadeu poderão dar sequência ao que iniciaram nas mesas do bar da Net. Gastar toda a poesia e versos que conseguirem escrever. Se dedicarão em tempo integral à editora e Angélica se dividirá entre as empresas e o seu escritório de arquitetura que anda meio abandonado”, informou Eleanora.

Amadeu ficou imensamente feliz, evidenciando tudo isso em seus olhos esverdeados que tanto encantam Tarsila que também não se contentava de tanta felicidade. Poder ficar em casa e cuidar do marido e da chegada do primeiro filho.

Depois desse anúncio, todos cumprimentaram Roberto como vice-presidente das Organizações Oliveira e em seguida, Eleanora virou-se para a filha, ordenando que ela, após aquele café da manhã voltasse com a mãe para o apartamento. “- Amanhã sairei em viagem com o Alexandre e quero que me ajude com algumas coisas. Ontem você viajou para trazer Marzinho de volta, amanhã eu parto para buscar a irmã do meu amor para morar aqui conosco”.

Angélica pensou em dizer algo, mas foi contida pela observação da mãe. “- Hoje teu marido, teu irmão e Roberto tem muitas coisas para fazerem até a inauguração da editora a noite e você, pelo que me consta, não entende nada desse riscado. Então te quero comigo lá em casa o dia todo, pois o general também vai tratar dos negócios dele”.

– Está bem mãe! Fazer o quê? Mas se Marzinho ficar aqui de prosa com outras mulheres, ele já sabe!

Todos caíram na gargalhada porque sabiam que Márcio era inteiramente dela. Depois dessas primeiras conversações, o café transcorreu normalmente, mas Angélica grudou mais no marido, pois sabia que só iria vê-lo a noite e o tempo iria parecer uma eternidade, mas fazer o quê, o jeito era ajudar Eleanora com as coisas dela.

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *