Sobras de um amor … parte III

23.

 

Enquanto, entre chateada com um bom conteúdo de frustração, Danisa terminava de arrumar o interior da casa, Roberto organizava tudo em torno da churrasqueira. Eram perto das onze quando o telefone da esposa toca e ao atendê-lo, ela sabe que é a mulher de Marcão reclamando da violência do marido. “- Nós bem que te avisamos para se afastar dele. Com certeza, é bissexual ou é homossexual enrustido. Meu marido só fez uma pergunta à toa, Danisa e seu esposo não precisava agredi-lo”.

– Dandara, conheço meu marido e os amigos dele. E se ele não disse nada, é porque não tem nada a ser dito e quanto à sexualidade dele, creio que o filho que eu espero diz tudo. Talvez você esteja querendo um macho como o meu, mas terá que melhorar muito.

– Todos em nossa família desconfia deles e acham que tu encoberta as putarias deles porque não é mulher para mandá-lo pastar.

– Nunca pedi opinião de nenhum de vocês sobre o meu esposo, portanto, entendo que tu deves pegar esse comentário e enfiar no seu rabo, pois sei que teu marido não te enraba faz tempo, pois vive bêbado. Ou tu pensas que não sei dos chifres que você coloca na cabeça dele.

“- Do que está falando, minha prima”, perguntou Dandara tentando desviar o assunto.

– Acho que enquanto ficas se preocupando com a sexualidade do meu marido, na verdade está louca para dar a bunda para ele, mas como ele não tem olhos para ti e nem o amigo dele, fica aqui fazendo fofoca.

– Não sei do que falas, minha prima.

– Sabe sim. Ou tu achas que não sei que ficou cercando a Fernanda para ela marcar um encontro entre ti e o Márcio. Ele já estava noivo e você tentando arrumar um motivo para pedir divórcio do Marcos.

“- Antes de dizer alguma coisa a meu respeito, tu tens que provar”, disse Dandara em tom de desafio.

– Olha só! Por que não me deixa em paz e segue o seu caminho. Me arrependi de ter te convidado e seu marido para vir em minha casa. Boa noite.

Quando Dandara pensou em dizer alguma coisa, Danisa já tinha desligado e viu o marido lhe olhando da porta que dava para a área de serviço. – “O que foi querida”, perguntou Roberto.

– A esposa do Marcão querendo ampliar fofoca, dizendo que você agressivo com o marido dela. Ai não aguentei e lhe disse o que sei a respeito das putarias dela, inclusive querendo que a Fernanda arrumasse um encontro dela com Marzinho.

– Como é que é? Por que não me disse isso antes?

– Ué! Porque não tinha sentindo algum em te falar e por vários motivos: Márcio jamais aceitaria e a prova disso é o casamente dele com a dinamite. Ela queria por toda lei que, quando o Marzinho saísse da UTI, a Fê levasse ele para a casa dela. Então tudo o que Dandara me falou é por despeito e desespero e queriam saber mais coisas para ampliarem a conversa sem propósito algum.

– Querida. Eu não me coloco entre você e seus parentes, mas gostaria que se distanciasse dessa sua prima. Se algumas das empresas do grupo abastecer automóveis no posto em que Marcos é o gerente, mudaremos de estabelecimento.

Ao dizer isso, Roberto ingressa no interior da casa, afirmando que vai tomar banho e está esperando a esposa no chuveiro. Em cinco minutos, ela se junta ao diretor e enquanto se higienizam, trocam juras de amor, terminando-as numa relação sexual primorosa em que Danisa atinge várias vezes o orgasmo, a deixando ainda mais apaixonada pelo marido.

No imóvel dos familiares de Débora, Romualdo convidou Esdras para voltar ao hotel e, de quebra, levou a futura nora embora. “- Vamos menina. Amanhã tu tens uma reunião importantíssima nas empresas e depois vamos todos passar um final de semana numa chácara de um amigo”.

– Pai, por que não posso levar minha noiva embora?

– Simplesmente por que você bebeu além da conta e não estou afim de ter que buscar teu carro porque foi guinchado. Fica aí e ajuda tua mãe e sua irmã arrumar tudo aqui. Se tudo correr direitinho, passaremos um final só nosso.

O pai de Ricardo levou Esdras primeiro e no caminho entre o hotel e a casa de Fernanda, foi conversando com ela. “- Filha, fique tranquila, pois o Ricardo está se esforçando para não perder o teu amor. Creio que tem uma coisa que poderá deixá-lo mais leve. Me diga se não for possível, mas acho que seria bom se o Márcio convidasse ele para se fixar na editora, nem que fosse para pagar a mesma coisa que ele ganha no atual trabalho dele”.

– Romualdo, sinceramente não sei se posso fazer esse pedido para o Márcio, mas a ideia é legal, pois podemos afastá-lo daquele pessoal, fazendo com que tenha que se relacionar mais com a turma próximo ao Marzinho e ao Roberto, bem como Esdras e o supermercado, já que pode também trabalhar nas empresas dos pais de Márcio.

– Qualquer coisa, se precisar eu converso direto com o seu amigo. Sei que o Ricardo tem idade e não precisaria disso, mas sinto que se não formos mais enérgicos, será engolido por aqueles amigos e se conseguirmos colocá-lo na editora e no supermercado, teremos mais chances.

– Tudo bem sogro. Amanhã mesmo falarei com Roberto. Acho que ele consegue preparar o terreno para chegarmos ao Márcio. Até porque ele quer inaugurar a editora dentro de quinze dias e precisará do Ricardo em tempo integral. Mas por outro lado, dá para dizer ao Ricardo para pedir férias na empresa e ficar junto com Márcio nesses quinze dias e aí temos um motivo a mais para pedir a incorporação dele à editora.

– Pode ser também Fernanda. Mas de qualquer forma, temos que tirar Ricardo daquela empresa. Fale com Roberto amanhã pela manhã, depois de sua reunião de integração à gerência das organizações. Parabéns, sei que chegará à diretoria, pois é esforçada e tem competência para isso.

Enquanto o futuro sogro deixava a mais nova gerente das Organizações Oliveira em sua casa, a presidente se divertia com o marido na cidade vizinha. O casal estava tão à vontade que nem parecia ter se envolvido num entrevero em que Joana tinha ficado com um olho roxo após levar um soco de Angélica, e Valdo com o nariz arrebentado depois de ofender Márcio, inclusive questionando a sua sexualidade.

A conversa dos dois girou o tempo todo em recuperar coisas do recente-passado deles, como as loucuras que a esposa fez e, com certeza, não ficariam ali, já que por mais que tentasse, não conseguia controlar seu ciúme. Bastava alguma mulher olhar mais de uma vez para o seu marido, que Angélica já interpelava a pessoa para saber o que desejava com Márcio.

A empresária adorava quando ele narrava a situação em que ficou quando ela surgiu naquela manhã vestida só de camisão. A luta que teve para tentar esquecê-la e quanto mais tentava, mais doido de paixão por ela, o editor ficava. “- Só tinha uma saída: diante da dúvida, pois minha certeza era de que seria rechaçado e ainda ouvir a velha narrativa de que tinha confundido as coisas. Deixei o hospital, fui ao banco, saquei uma quantia que achava suficiente para uma semana e pedi um celular para o Roberto e sai sem destino”, explicou o esposo.

Ao ver os olhos da esposa ficarem mais verdes ainda, o editor continuou sua narrativa. “- Na medida em que o ônibus se afastava da cidade e eu me encostei na poltrona assistindo a paisagem passar rapidamente pelos meus olhos, sentia que no final da viagem, o que eu sentia por ti, teria ficado para trás”

“- O engraçado amor é que quanto mais você se afastava, querendo deixar esse amor no seu ontem, mais eu me convencia de que te queria mais do que como amigo e minha mãe descobriu isso antes mesmo do que eu. Segundo ela, no momento em que te viu entrando no hospital com Amadeu e eu o olhei, ela sabia que minha vida tinha virado do avesso”, relatou Angélica.

Márcio disse que quando desceu do ônibus naquela cidade que parecia ter ficado no fim do mundo, entendeu que havia acertado na ação, pois não conseguiria ficar mais um dia do lado daquela mulher que o tentava de todas as formas. “- Eu tinha certeza de que se abrisse meu coração para ti, levaria um tremendo soco no queixo”, disse o editor sentindo a esposa lhe pegar o rosto dando um beijo onde ele disse que seria esmurrado.

“- Amor eu estava tão confusa que seria capaz de te dizer não, mas te se visse com outra mulher, com certeza teria aprontado alguma para vê-lo longe dela. Então, acho que a sua atitude foi a mais acertada. Primeiro porque pude pensar, sofrer e ter a certeza de que és a pessoa com a qual desejava passar o resto de minha vida e também pude costurar as pazes com a minha mãe”, explicou a empresária, beijando novamente Márcio.

“- Marzinho! Quando percebeu que não conseguiu deixar esse amor para trás”, quis saber a esposa.

– Foram vários momentos. Naquela noite que você invadiu meu quarto no hotel, tinha passado a tarde lendo, buscando um caminho. Estava tentado a encontrar outra pessoa, mas não sabia como. Fui para o bar e entre uma dose e outra eu conseguia te apagar da minha cabeça, mas o coração não deixava.

Essa era a melhor parte da história entre os dois que Angélica apreciava, justamente porque naquele momento, quando o surpreendeu dentro do quarto do hotel, sabia que o fazia porque já o amava e não conseguiria viver sem ele. O problema era como lhe falar de amor, sem ter resolvido as questões com Rosângela.

“- Amor, eu tenho vários momentos contigo e todos são especiais porque são únicos, mas há um em especial do qual gosto muito. Estava dentro do carro com a minha mãe e ela, para me sacanear, disse que tinha te visto passar e eu fiquei toda eufórica lhe procurando”, explicou a empresária.

“- E quando teve medo de me perder”, inquiriu Márcio, virando mais um gole do uísque que bebia. Era a última dose, conforme havia acordado com a esposa.

– Tirando que sempre tenho medo que me deixes, mas naquela noite em que estava no motel e sua mãe te ligou. Que pavor e depois que mico. Também quando descobri que tinha ido parar na UTI por conta do coma alcóolico e depois quando Alice apareceu e eu te vi com ela no barzinho. Fiquei cega de ciúmes.

“- E quando é que não fica”, perguntou o marido rindo até os olhos, o que deixou Angélica mais excitada do que já estava. Ela o acompanhou na gargalhada, respondendo não saber o momento em que ficará totalmente tranquila em relação ao esposo.

Márcio toma mais um gole do uísque e olha para o relógio, percebendo que as horas já estavam avançadas e que ambos tinham ainda trabalho na sexta-feira. Em virtude disso, acenou para o garçom solicitando a conta. “- Naquele dia em que tomei o porre, tive muito medo de te perder. Ali compreendi o inferno astral em que Amadeu viveu durante cinco anos por conta do sumiço de Tarsila”, explicou o editor à sua esposa.

– Marzinho quando descobri que você estava na UTI por conta de um coma alcóolico e Roberto e Fernanda me acusando de tudo isso e mais um pouco, fiquei sem chão. Não conseguia mais falar, só chorava e rezava muito para que tu não morresses sem me dar uma chance de recomeçar contigo. Se isso acontecesse, seria o meu fim também. Minha mãe não conseguia ajudar, pois não sabia por onde começar, portanto, me sugeriu procurar uma psicóloga para me ajudar a lidar com a dor.

O barman trouxe a conta e a mesma foi quitada com dinheiro. O casal havia decidido nunca usar cartão em lugares que não costumavam frequentar assiduamente e por conta do ocorrido logo quando chegaram, optaram por essa forma de pagamento.

Deixaram uma gorjeta para o garçom, pedindo para falar com o proprietário que os atendeu prontamente. “- Eu e meu marido queremos pedir desculpas ao senhor pelos transtornos que causamos em seu estabelecimento e queremos saber se temos que pagar alguma coisa por conta disso”.

– Não precisa dona Angélica, já que a situação ficou bem esclarecida. Minha garçonete contou o que aconteceu dentro do banheiro e o João Marcelo informou que o funcionário dele ofendeu seu marido, duvidando de sua sexualidade. Portanto, sou eu quem lhe peço minhas sinceras desculpas, colocando meu estabelecimento à disposição de vocês.

O casal se despediu, indo em direção ao automóvel da empresária. No caminho foram interceptados por Valdo e Joana. “- Achei que tínhamos terminado a nossa conversa lá dentro”, disse Márcio aos dois ex-colegas de redação.

Angélica, nem parou para conversar com a dupla, pois não queria estragar o seu resto de noite, mas ouviu quando o repórter-fotográfico, com enorme hematoma no nariz, quis saber porque foi agredido daquela forma. “- Toda ação, meu amigo, gera uma reação. Se me conhecesse um pouco, saberia que tudo o que diz só teve como objetivo me ofender, então, como deixou a sua mesa para me denegrir na frente de minha esposa, o resultado se encontra estampado em seu nariz. Agora se me der licença, preciso voltar para casa para trabalhar”.

– Pode ir, seu preto. Anima o circo dessa grã-fina metida a besta. O picadeiro dela precisa de um macaco para que ela fique feliz.

Angélica desceu do carro e acertou um pontapé no escroto de Valdo que, ao se abaixar para tentar amenizar a dor, levou uma joelhada no rosto desferido pela empresária. “- Você entendeu agora, meu caro fotógrafo de bosta porque eu prefiro o Márcio a tu. Compreendeu dona Joana porque quem dorme com o Marzinho sou eu e não a senhora que trabalhou com ele, mas foi dispensada, pois o meu marido não queria sua buceta”.

Ao ver a cena, Márcio ficou pasmo. “- E se os nossos caminhos se encontrarem, acho melhor você correr, pois a coisa poderá ficar pior para ti. Tem sorte teu não ter quebrado sua máquina, apenas esse pinto mole que não vai dar prazer a essa quenga que tu carregas a tiracolo”, sentenciou Angélica, pegando na mão do marido o chamando para irem embora, pois o ar está poluído demais, cheirando a puta barata.

Ao ouvir isso, Joana ameaçou ir para cima de Angélica que foi enfática: “- Acho que lhe ter acertado um olho só não foi o suficiente. Creio que não compreendeu que o meu marido não está comigo por dinheiro, mas por desejar ter do seu lado, uma mulher que tenha qualidade e seja uma pessoa digna. Agora cuide do seu homem aí antes que o pau dele não suba mais e tu tenhas que ser comida pelos leões-de-chácara que ele te arrumará.

Já dentro do carro, a empresária acena mandando beijinhos para Joana, lhe dizendo: “- Adeus queridinha, ainda dá tempo de você melhorar seus olhares para encontrar um homem descente que te faça mulher de verdade e não puta de cabaré de quinta categoria. Esse aqui é meu e ninguém tira”.

Márcio e Angélica fizeram o trajeto de volta em silêncio. Ninguém falava nada, até que a esposa falou; “- Meu deus do céu homem! Não fiz nada de errado. Apenas mostrei aqueles dois idiotas que não devem tentar entrar em estrada que não conhecem”, disse a empresária, pacientemente.

– Eu não falei nada, amor. Só constatei que a mulher que arrumei para ser minha esposa é briguenta. Agora, de fato, compreendo porque minha mãe te apelidou de dinamite dos olhos esverdeados.

Ao dizer isso, Márcio pegou na mão da esposa e bem juntinho do ouvido dela disse que a amava loucamente, agradecendo por ela ter dado sentido à vida dele. “- Vamos juntos até o fim da eternidade”, vaticinou o editor.

– Jura Marzinho que não está chateado comigo por conta dessa briga de hoje à noite?

– Quando gostamos de alguém e o queremos, não podemos abrir mão de passar um só segundo junto desse amor. Não quero ficar longe de ti por nada nesse mundo. Quando sai daquele hospital contigo, tinha certeza absoluta que não saberia dar um passo mais sem tê-la comigo.

A empresária olhou para o esposo, ficando ainda mais apaixonada pelo marido. Conduziu o automóvel ouvindo a respiração dele, e de vez em quando, lhe pegava na mão, enquanto o esposo lhe acariciava a perna num gesto de puro carinho.

Depois de uma hora que deixaram o barzinho em que foram para se divertir, Márcio e Angélica estavam de volta ao apartamento. Ela entrou apressada para usar o banheiro, enquanto o editor pegou uma cerveja sem álcool na geladeira e ficou olhando para as estrelas, revendo mentalmente a cena que presenciou a esposa agredindo Valdo, como que tentando eliminar algo que trazia consigo há muito tempo e ameaçando Joana.

Ao reencontrar o esposo na sala, Angélica desejou saber o que se passava na cabeça do marido. “- Acho que a porrada que você deu no Valdo tinha mais coisas do que somente a discussão de hoje. Mas espero estar enganado”.

– Com certeza não está enganado. Eu conheço aquele fotógrafo desde os tempos de colégio. Ele vivia me assediando, mas como não lhe dava atenção, passou a seguir meus passos até que descobriu que eu tinha queda por mulher e espalhou que era para elas tomarem cuidado comigo, pois eu era chegada em xereca.

– E o que fez na época?

– Demorei para saber que tinha sido armação dele, mas quando descobri, Valdo tinha deixado o colégio. Os pais perderam tudo num negócio errado e ele foi obrigado a ir para uma escola mais em conta para a família. Nunca me esqueci, mas sempre o encontrava em cerimônias em que tinha que manter as aparências até hoje, mas quando tentou ser mais do que era contigo, não me segurei. Acho que enquanto pensar na porrada que levou no saco, o pau dele não levanta tão cedo.

“- E o que mais preciso saber da minha garota guerreira? Acho que não poderia mais nem olhar dos lados, pois corro o risco de ter o pescoço quebrado”, disse Márcio gargalhando e abraçando a esposa, dizendo que a amava muito.

– Também te amo. Meu editor que calçava sapatos que pediam graxa há muito tempo!

Ficaram abraçados e o editor sentiu que a esposa queria lhe perguntar algo. “- O que lhe incomoda, paixão”, interpelou Márcio.

– Por que Joana ficou olhando insistentemente para ti e ainda foi tirar satisfação quando deixávamos o bar?

– Prefiro nem pensar nos motivos, mas pode ser aquela velha situação em que quando você está sozinho, ninguém te dá a mão, não deseja caminhar contigo, por pelo menos um pedaço da estrada e aí quando aparece alguém, desejam ardentemente estar no lugar da outra pessoa. Quando disse a ela, nos tempos do jornal, que queria algo a mais do que o sexo, ela me ofendeu, ao invés de tentar entender como sou.

– Então quer dizer que ela desejava chamar a sua atenção?

“- Minha não! Sua! A provocação foi para ti. Provavelmente ela deveria saber do seu ciúme e quis te importunar e saber até onde tu irias e, provavelmente Valdo deve ter-lhe do seu apreço por mulheres”, explicou Márcio.

– Ah entendi.

“- Penso que ela não contava com a sua antecipação, indo lhe dar um soco direto no olho. Creio que imaginava que tu irias dar em cima dela, mas a coisa fugiu do controle dela e do Valdo”, continuou explicando Márcio.

– Marzinho, fico intrigada quando me diz coisas que não vejo, mas depois que me fala enxergo. Como isso funciona contigo?

“- Amor: o ser humano é previsível. Todos somos assim. Eu auxiliei Amadeu porque eu precisava ser socorrido e justamente porque fazíamos tudo igual por conta do medo de que no dia seguinte fosse diferente e quando isso aconteceu, Tarsila apareceu na vida dele e você na minha. Vivíamos infelizes porque, de certa forma, optamos por ficar com o conhecido”, respondeu o marido.

Enquanto dizia isso, Angélica prestava atenção em tudo o que o esposo falava, pois de certa forma, a vida dela também era bem medíocre e somente foi despertada dessa insignificância quando alguém lhe mostrou isso e, essa pessoa foi Márcio que também vivia uma existência sem nenhuma pitada de cores.

– Agora estou compreendendo bem. Antes achava que vida medíocre só existia para quem não tinha dinheiro, mas convivendo contigo e seus amigos e, recordando do meu irmão completamente alucinado, vejo que uma vida vazia é aquela em que não existe sentimentos sinceros, amor pelo outro do jeito que ele é, amizade, companheirismo. Hoje tenho isso, Amadeu tem com todos vocês, Fernanda e Roberto também e por isso que os três formam uma espécie de triângulo com os três lados iguais.

“- Talvez Joana, lá atrás possa ter observado que eu, Roberto e Fernanda éramos três nadas. Um trio de medíocres que corriam atrás do rabo ou serem felizes com seus pífios ideais. Eu jornalista decadente, Roberto redator com os dias contados e a Fê uma vendedora sem inspiração alguma numa loja especializada em vender roupas cafonas para os dois amigos dela”, externou o editor à sua esposa.

Angélica olhou para o marido, começando a rir, pois a descrição que fez coube direito no que ela via e pensava naqueles dias em que o encontrou no apartamento dele sendo completamente escorraçada como um cão sarnento da frente do prédio em que Márcio residia.

– Amor estou rindo porque é impressionante como me resumiu naqueles dias. Eu tentando te achar e o único que tinha contato contigo era o Roberto. Quando te levei para comprar roupas na loja em que Fernanda era vendedora, ela te descreveu e eu toda irritada porque, por lhe conhecer tão bem, me tiraria você. Muito pelo contrário, por saber muito de ti é que tentava me ajudar a não deixa-lo escapar. A vida de vocês três pode ter tido de tudo, menos mediocridade.

Márcio abraçou a esposa, toda feliz, por estar casada com o editor e ele ter paciência com ela. “- Meu Marzinho, vamos tomar banho para dormirmos. Amanhã temos uma sexta-feira cheia”, pediu Angélica.

– Tudo bem, minha princesa. Você vai às suas empresas e eu terminar de arrumar tudo no apartamento. No sábado quero levar tudo para a editora. Os móveis não serão entregues amanhã?

– Sim.

– Então, enquanto tu ficas nas Organizações eu e Tarsila arrumaremos tudo e no sábado levaremos o restante para, na segunda-feira, já começarmos lá. Por agora as portas ficarão fechadas, enquanto montamos a livraria e ajustemos os primeiros livros que chegarem da gráfica. Vamos ver se daqui uns dez dias inauguramos tudo.

– Amor! Se você estiver feliz com a concretização deste projeto, meu coração se regozija contigo. Será que posso dar uma passadinha lá amanhã no meio da tarde?

– Não! Te quero focada no seu trabalho e em seu escritório de arquitetura. Não desejo te ver enrolada nos negócios da minha editora. Você já nos meteu no supermercado, sem eu aceitar, me queria na fundação, mas quem vai trabalhar lá é o general e o Roberto e se quiser, leve Fernanda como Tesoureira.

– E você ficará só com o trabalho da editora?

– Não! Desenvolverei projeto de leitura dentro da fundação. Oficinas para descobrirmos talentos na poesia, na crônica, no conto e quem sabe desenvolver lá um jornal em que os próprios assistidos criem suas matérias. Dentro da loja nova do supermercado, a editora promoverá eventos de sorteio de livros entre os clientes, criar um jardim no estacionamento em que as crianças ficarão lendo, enquanto os pais fazem tranquilamente as compras.

– Está bem! Falaremos mais sobre isso no final de semana. Agora vamos nos higienizar e cama. Quero o senhor bem juntinho de meu corpo que só consegue paz estando do lado do teu.

Ao dizer isso, Angélica pegou a mão do esposo, fazendo menção de puxá-lo para o quarto. Já no interior do cômodo, a empresária foi tirando a roupa e Márcio só ficou olhando como a beleza externa dela emergia quando a cada peça retirada. Ao perceber que o editor a observava até com uma certa devoção, desejou saber o que se passava pela cabeça do esposo. Para sacaneá-la ele quis saber qual cabeça ela se referia.

– Seu tarado! Já não comeu o suficiente hoje? Agora se quiser mais um pouquinho, podemos pensar, minha paixão.

– Só estou observando como a beleza de sua alma se externaliza em suas formas físicas e na sublimidade que forjou seu caráter e a maneira como o meu amor lida com o mundo que o seu ser me apresenta.

Ainda de calcinha e sutiã, Angélica se dirige ao esposo, o beijando lhe dizendo que boa parte dessa nova mulher se deve a ele, pois andou dando uns choques de realidade nela, a fazendo acordar para a vida e compreender o sentido do verdadeiro amor, principalmente o universal e o individual. “- Analisando a maneira como tu lida com seus amigos e as demais pessoas, além de detestar publicidade, me fez tentar encontrar essa pessoa que vivia escondida dentro de roupas ensebadas, sapatos sem graxa e sem graça. Um ser que passaria despercebido se não fosse essa mania de não querer aparecer”.

“- Não sabia disso. Agora aumentou a minha responsabilidade em te fazer imensamente feliz”, externou Márcio.

– Você já me faz, meu Marzinho. Judith, minha mãe e sobretudo Rogério, me ajudaram a abrir essa armadura que não deixava ninguém te ver. Acho que todas essas mulheres tentaram e não conseguiram, provavelmente porque se apresentaram de modo errado para ti.

“- E como seria essa apresentação, minha cara doutora em Marciologia”, inquiriu Márcio.

– Embora tu sejas um ótimo amante, não deixou ninguém ver isso de antemão. Sabe comer uma mulher sem colocar as mãos. Toca cada parte delas com o olhar, desnudando-as num piscar sem querer enxergar. É algo mágico que só você sabe fazer e não é qualquer mulher que nota maravilha.

– Como é que é? Eu olho sem ver, trepo sem colocar o pênis? Coloco a mão sem tocar no corpo? Me explique como é isso, pois se não der certo a editora, monto uma clínica de massagem.

– Já te falei. Se quiser, não tem problema nenhum, mas com certeza ficará sem esse delicioso instrumento que você transporta diariamente no meio das pernas e me conduz até as estrelas.

Ao dizer isso, Angélica cai na gargalhada para dizer ao seu esposo que ele é especial porque sabe observar uma mulher, adorá-la, sem cair na vulgaridade, sem precisar ficar dizendo para todo mundo. “- Aquele homem sentando numa mesa no fundo do bar numa tarde perdida de domingo, viu mais do que o meu corpo podia expressar naquele dia. A pessoa que não revidou nenhuma de minhas agressões. Que homem foge de uma ricaça porque a ama e poderia arrancar qualquer valor monetário dela durante a sua vulnerabilidade? Por você ser esse indivíduo é que preciso defender com unhas e dentes o que sinto por ti”, disse a empresária levando Márcio para o banheiro para que tomassem banho juntos.

Enquanto o casal se higienizava, no restaurante do general os últimos clientes tinham deixado o estabelecimento e tanto Alexandre, quanto Eleanora estavam cansadíssimos. O cozinheiro fazia o pagamento do dia trabalhado de cada garçom e o militar pediu para dar mais R$ 200 de gorjeta para cada um. Claro que durante todo o turno, a namorada evitou ficar exposto aos colaboradores e fotógrafos, mas todos os diaristas sabiam que nunca deveriam olhar para quem estava no restaurante, apenas servi-lo.

Quando o patrão levantou para ajudar Pedro, este lhe falou. “- General vá para casa e leva sua namorada para descansar. Olha só para ela: parece que foi atropelada”.

Os três riram e o cozinheiro entrou para terminar de ajustar tudo dentro do estabelecimento, enquanto Eleanora foi direta: “- Amor! Não quero dormir sozinha na mansão. Será que aquela sua cama deliciosa aceita esse corpo aqui cansado do dia”.

“- Você quer dormir em casa comigo? O que seus filhos vão dizer quando souberem”, inquiriu o militar.

– Amadeu é capaz de te perguntar se eu sou gostosa quanto pareço. Angélica quererá saber se estou feliz em seus braços. Portanto, não quero saber o que eles acham, mas se você aceita eu dormir em sua cama de hoje para amanhã? Até a semana que vem estarei em outro apartamento e o casarão será transformado na sede da fundação. Então para ir me acostumando dormir fora, o meu primeiro teste tem que ser estar entre seus braços.

– Claro que pode. Meu apartamento está batendo palmas, pois receberá um caminhão de estrelas essa noite.

O casal se levantou para ajudar Pedro a concluir a arrumação, mas praticamente foi expulso do espaço. “- Somem daqui os dois. Estou terminando e depois pedirei um transporte para casa”.

“- Nada disso. Vamos te esperar e te levaremos para casa Pedro”, disse Eleanora.

Enquanto a namorada falava com o funcionário, Alexandre colocou três notas de R$ 200 no bolso de Pedro que fez menção de devolver, mas com um gesto com a mão, o militar indicou que não aceitaria a recusa. “- Obrigado meu amigo. O dinheiro é um presente para o seu coração e por aturar esse militar que ainda não aprendeu a viver sem a farda”.

– Meu caro amigo, essa senhora que está te esperando já pegou o verde-oliva e mandou para o lugar devido: para o quartel. De ti ela só quer o seu coração e o seu amor. Ame-a, pois vocês se merecem. Observe como o olho dela brilha quando está contigo. Dona Eleanora me segredou que estar aqui contigo agora a noite, sem todos aqueles tremeliques que o dinheiro permite, foi o melhor presente que destes a ela.

Terminado toda a arrumação, a namorada do general se sentou no banco de trás do automóvel, enquanto Pedro indicava o caminho de sua casa ao amigo-patrão. Ao chegar ao imóvel, o cozinheiro desceu com a marmita de comida. Alexandre fazia questão que ele levasse para casa alimento que dava para o dia seguinte. “- Você almoça e janta comigo e seus filhos comem o quê? Eles devem se alimentar da mesma coisa que ti”.

Os três filhos de Pedro sabiam que desde quando o pai começou a trabalhar com o militar, não faltou mais comida em casa e todos os dias havia café da manhã bem reforçado e a mãe podia cuidar deles, inclusive fazer as tarefas que a escola enviava.

Antes que o general desse a partida no automóvel, Eleanora chamou Pedro dizendo que na próxima segunda-feira se desejasse poderia trocar os filhos de escola. “- Pode deixar que os estudos deles ficarão por minha conta até a universidade, mas quero ver as notas antes. Se tiver uma nota abaixo de oito, perderão o benefício”. O cozinheiro agradeceu, dizendo que conversaria com a esposa e verificaria como os filhos estavam de notas escolares.

Ao entrar dentro de casa, a esposa do cozinheiro notou algo diferente no esposo e quis saber qual era o motivo. “- Sabe aquela antiga patroa que eu tive? Pois é, ela custeará os estudos dos meninos até a universidade, mas não quer que eles tenham nota abaixo de oito”. Ao informar a esposa, Pedro tirou do bolso os R$ 600 que havia ganho do general e deixou com ela. “- Presente do general. Então guarde. Acho que os dias de vacas magras acabaram, amor. Mas não vamos esbanjar. Eu te prometi uma casa do jeito que queres e isso se concretizará”.

“- Obrigado amor. Eu nunca duvidei que cumpriria o que me prometeu no dia em que eu disse sim ao nosso amor”, disse Fabrícia abraçando o esposo que se sentia mais leve, pois já tinha um bom dinheiro guardado e era hora de pedir ajuda ao amigo Alexandre para comprarem o terreno. Pelo imóvel que estavam namorando fazia alguns anos, faltavam ainda pouco mais de R$ 5 mil.

– Você acha que o general pode te ajudar? Será que te empresta os R$ 5 mil que faltam para termos o terreno?

“- Vamos confiar em Deus que indicará a hora certa de falar com ele. Parece-me que o momento chegou”, disse o cozinheiro.

“- E se ele falar não, Pedro”, inquiriu Fabrícia.

– Tenho que conversar com serenidade. Aproveitarei que as crianças vão para uma escola privada e com bolsa, para lhe dizer e também propor que desconte dos meus recebimentos nos próximos dois anos. A alimentação sempre trago do restaurante.

“- Enquanto você se banha, colocarei as crianças para dormir e aí conversaremos mais um pouco. Amanhã tenho aquela faxina grande para fazer e preciso estar inteira”, propôs a esposa.

– Amor, como já combinou a com a pessoa, faça essa e não precisa pegar outras. Estou pensando em tentar arrumar um outro trabalho para ti. Não prometo, mas falarei com aquele repórter que se casou com a irmã daquele maluco que vivia lá no boteco. Ele inaugurará a editora dele, e quem sabe não te contrata para ser a zeladora de lá.

“- Pedro, se conseguir isso, ficarei imensamente grata. Esses R$ 600 vai nos ajudar um bocado”, disse Fabrícia em tom de desabafo.

– Vamos na fé e com muito trabalho e já, já as coisas mudarão para nós.

– Nunca duvidei disso, meu amor.

Quando Pedro escutou as últimas palavras da esposa, já estava dentro do banheiro e enquanto se higienizava, ficou recordando quando conheceu Fabrícia. Havia dado baixa no serviço militar, sonhando em ser cozinheiro num importante restaurante da cidade, mas apenas conseguiu bicos e depois trabalhou numa empresa que organizava almoços e jantares quando conheceu Angélica e Eleanora.

Se encantou pela filha de Jô, mas já na primeira conversa percebeu que não havia espaço para ele naquele mundo, além da moça ser esquisita e olhava em demasia para outras mulheres da festa. Ainda trabalhou em mais dois eventos na mansão, quando desistiu do emprego e perambulando pelas ruas da cidade, sem saber por onde começar, se sentou num barzinho para tomar uma cerveja e a atual esposa chegou com um casal. O rapaz era seu conhecido antes de ingressarem juntos no quartel.

Foi convidado a se juntar aos três e se encantou com Fabrícia, com querm voltou a se encontrar outras vezes. Começaram a namorar e como desejava passar o resto da vida com ela, precisava se ajustar num emprego. Mas não conseguia ficar mais do que um ano e lá ia-se Pedro demitido. A coisa ficou mais complicada quando a esposa anunciou que estava grávida. Seguiram em frente e no momento em que a criança fez dois anos, o presente de aniversário foi o anúncio de que teria um irmãozinho.

– Pedro! O que vamos fazer? O dinheiro está curto e só com seus bicos e as faxinas que faço não dá para continuar.

– Calma que amanhã tomarei providências.

No dia seguinte, enquanto andava pelas ruas da cidade, tentando achar uma solução para o seu problema, viu afixado na porta do bar que o local precisava de um cozinheiro que pudesse começar imediatamente. Entrou e conversou com Rodolfo que pediu para ele sentar e aguardar. Voltou perguntando quais eram as referências dele: “- Fui cozinheiro dos oficiais do Exército”.

Com essas informações, Rodolfo checou e confirmou tudo o que ele havia dito, inclusive a empresa de organização de eventos que tinha trabalhado. Olhando bem para Pedro, o garçom-segurança o reconheceu e disse que poderia começar no dia seguinte e já teria o cardápio para aquele dia.

O ex-soldado foi retirado do passado quando sentiu as mãos da esposa lhe abraçando pela cintura. “- Obrigado amor, por me tranquilizar e fazer a mulher mais feliz do mundo, além de ter me dado os três belos filhos que tenho. Te garanto que nenhum de nós quatro irá te decepcionar um dia”.

Saindo do box, o casal se prepara para dormir, enquanto no apartamento do general este conversava com Eleanora sobre a situação de Pedro. “- Sinto que posso fazer mais por ele, mas não sei como. A mulher é faxineira, mas sempre lhe fala que não tem mais pique para o trabalho”, segredou Alexandre.

– Podemos ajustar com Marzinho para ela trabalhar com ele na editora, mas antes de tudo, ela terá que passar pelo crivo da ciumenta da minha filha. Se Keka não for com o jeito da moça, já viu né. Se perceber que essa mulher olhou diferente para o marido, é tempestade na certa.

“- Obrigado por vir dormir comigo hoje, minha paixão”, disse o general a Eleanora.

“- Virei sempre que você me pedir. Não é bom a mulher ficar se oferecendo para dormir na casa do namorado”, falou a matriarca dos Oliveira caindo na gargalhada. “- Precisarei de um pijama seu ou se preferir dormei sem roupa”, perguntou maliciosamente a namorada.

“- Fique a seu critério. A única coisa que desejo é tê-la aqui comigo”, disse o general apontando a cama, enquanto retirava do guarda-roupa um pijama que cairia bem no corpo de Eleanora que, pegando o conjunto, entrou no banheiro para tomar banho. Assim que deixou o box, Alexandre entrou para fazer o mesmo e logo depois os dois estavam deitados com o sono chegando rapidamente.

Todos os casais que se harmonizaram depois que Márcio socorreu Amadeu naquela teia de aranha chamada Bar da Net montada por Angélica para tentar minimante ter controle sobre os atos dos irmãos, dormiram, enquanto as estrelas conversavam entre si, dizendo uma à outra que havia muita coisa para acontecer entre os amigos. O desafio maior era fazer com que cada uma das duplas tivesse vida própria, sem muita conexão de sentido com a empresária e o editor.

Na Alemanha, depois de muito procurar o paradeiro de Rosângela e Evelyn, os policiais descobriram os destroços de um carro que havia saído da estrada que, após sucessivos capotamentos, caiu numa ribanceira de difícil acesso. A descoberta da carcaça do automóvel aconteceu acidentalmente por um ciclista que tirando fotografias, percebeu algo prensado entre duas árvores.

Depois de resgatados, os dois corpos foram identificados e chegaram até a universidade em que a irmã de Tarsila fazia sua pesquisa. Em seguida o contato foi feito com a instituição de ensino superior brasileira em que Rosângela atuava. A única referência que eles tinham era Angélica que acordou na manhã de sexta-feira sobressaltada com o som de seu celular. Ao atendê-lo foi informada do ocorrido e o pessoal da Alemanha precisava saber quais procedimentos adotar.

– Vocês podem me dar uma meia-hora para eu resolver isso, mas por que estão me ligando? Eu e a professora não mantínhamos mais relacionamento algum desde que ela foi para Alemanha.

A secretária do departamento de Antropologia informou que era a única referência que eles tinham lá e o assunto precisava ser resolvido imediatamente. “- Tudo bem, me liguem daqui a pouco que eu já terei a resposta”. Ao desligar o telefone, a empresária percebeu que o marido já tinha acordado e como abordar aquele assunto com ele.

Ao ver a expressão de Angélica, Márcio perguntou o que havia acontecido e ela respondeu de imediato. “- Amor! Se falar com Tarsila agora, ela ficará abalada e como não toca no nome da irmã, acho melhor deixar que Rosângela seja enterrada mesmo na Alemanha com a certidão de óbito expedida por lá e quando a tivermos em mãos, conversaremos com Tarsila e veremos se ela consegue receber uma pensão da universidade”.

– Márcio! Achei que você brigaria comigo por me envolver ainda com coisas relativas à Rosângela.

– Amor! Não há um momento sequer que não veja o fantasma dela. Afinal, a irmã é minha sócia e se parece com ela, mas agora com a morte de sua ex-esposa, o passado de vocês duas foi definitivamente sepultado. Desculpe-me pela franqueza, querida, mas sempre ficava ressabiado com medo que ela aparecesse dos confins do inferno para assombrar o nosso amor.

“- Por que nunca me disse isso, homem de deus”, perguntou Angélica.

– Amor já temos tantas coisas para resolver, inclusive esse seu trauma da adolescência. Então não queria colocar mais lenha na fogueira. Eu teria que equacionar isso aqui dentro do meu próprio peito.

“- Você chegou a comentar isso com mais alguém”, inquiriu Angélica.

– Não! Não havia necessidade disso. Sabia que mais cedo ou mais tarde resolveria internamente.

Ao ouvir isso, a esposa abraça o marido de forma carinhosa, pois tinha a exata dimensão do sofrimento dele e não dizia a ninguém. A empresária sabia que os temores dele poderiam se materializar um dia, pois vivera sete anos com Rosângela, mas agora tudo havia se dissipado com a morte dela e o passado entre as duas havia de fato ficado lá e a única lembrança era a presença física de Tarsila entre eles.

O casal não deixou a cama enquanto conversava e logo em seguida a secretária do departamento ligou novamente, recebendo todas as instruções de Angélica, inclusive informando que daria a notícia para a irmã dela, mas por conta da gravidez, achava melhor dizer com calma. “- Tudo bem dona Angélica. Como conviveu com ela mais de cinco anos, é preciso definir os procedimentos para que receba uma pensão e um seguro que ela tinha em que a senhora era a beneficiada”.

– Tudo bem, na semana que vem eu passo e resolvo tudo.

Ao desligar o telefone, a empresária passa essas informações ao marido querendo saber dele qual posicionamento deveria tomar. “- Você está precisando desse dinheiro? Se você for repassar tudo para Tarsila, a burocracia poderia ser enorme. Então receba tudo, guarde e quando formos dar a notícia para Tarsila, lhe repassamos o dinheiro e a pensão será direcionada para o filho que ela está esperando de Amadeu”.

– Obrigado amor pela sua clareza, mesmo sabendo que eu convivi com Rosângela sete anos, não emitiu uma palavra sobre isso e nem ficou fazendo comparações.

“- A minha preocupação sempre foi depois que eu entrei em sua vida. Antes não posso dizer nada. Eu era solteiro e vocês duas viviam um casamento problemático. Sempre pedi para ti ter clareza no que iria fazer”, disse Márcio.

– Eu sei amor e é por isso que estou feliz contigo. Não porque vivemos num mar de rosas, mas pela forma como tu me ajuda a resolver coisas aqui dentro da cabeça e do coração também e as minhas inseguranças.

“- Agora vamos esquecer tudo e dormirmos mais um pouquinho. Depois levantamos e caminhamos para mais um dia de trabalho. Enquanto isso, encontraremos um jeito de informar Tarsila”, propôs o editor.

– Obrigado Marzinho por ficar comigo no meio da tempestade.

Os dois se abraçaram e mergulharam num sono que durou mais ou menos uma hora. Foram despertados novamente pelo som do celular de Angélica. Desta vez era Eleanora querendo saber se podiam tomar café da manhã juntas na confeitaria. “- Podemos sim mãe, mas nos dê uma meia-hora. Sabe como o Marzinho é. Até ele se localizar que está vivo demora um tempinho”.

Conforme o combinado, Angélica e o marido entram na confeitaria e Eleanora e Alexandre já estavam lá fazia uns dez minutos. O casal se encontrava na mesma mesa que a filha e o genro ocupavam sempre. A empresária deu uma olhada para as funcionárias e percebeu que elas observavam com certa insistência para os lados onde a mãe e o namorado dela estavam.

– Meninas! Tomem jeito. Olha só! Minha mãe é dez vezes mais ciumenta do que eu. Se perceber que estão de olho no general dela, a coisa ficará feia para os lados de vocês.

– Dona Angélica aquele negão bonito que está com a sua mãe é general do Exército? Meu deus do céu e eu aqui tentando ficar firme com meu namorado de merda e dona Eleanora fisga um peixe deste tamanho e gostosão! O que fizemos de errado? A senhora com um homem que tem um sorriso encantador e sua mãe com um general.

Angélica deu risadas, porque quando suas funcionárias percebessem que Márcio e Alexandre são meio parecidos, com certeza ficarão mais doidas ainda. Assim que a filha sentou, Eleanora pediu para que ela o acompanhasse até o banheiro deixando os dois homens de suas vidas conversando à mesa.

Márcio perguntou ao general que expressão facial era aquela. Tentando segurar o riso, o militar quis esconder, mas acabou gargalhando sendo seguido pelo editor e nesse momento, as duas funcionárias tiveram a certeza de que os dois se pareciam muito, pois o sorriso até o olho era semelhante.

Quando as duas retornam, até a face de Eleanora era outra, parecia mais radiante, enquanto Márcio e Alexandre tomavam uma xícara de café com pão de queijo. “- Vocês não pediram nada ainda”, perguntou a presidente das Organizações Oliveira. “- Estávamos esperando vocês duas”, respondeu o general.

Quando a atendente chegou à mesa, Angélica foi a primeira a prestar atenção no olhar dela. Queria saber qual era o interesse da colaborada: Márcio ou general.  Entretanto, como foi alertada antes e sabia do gênio complicado da patroa, optou por colocar atenção à Eleanora que fez o pedido dizendo que era para ela e o seu general. Provocando surpresa na funcionária que, em seguida, perguntou a empresária, que fez o pedido dizendo que era para ela e o marido.

Enquanto as refeições eram preparadas Maria Rita comentou com Jordana não acreditar no que tinha acabado de presenciar. “- Aqueles dois bonitões, deixam as mulheres mandarem neles. O militar nem abriu a boca para dizer que não aceitava o que a mandachuva escolheu para ele e o outro, o jornalista nem piscou os olhos. Cruzes que homens frouxos”.

“-Mas bem que você gostaria de estar no lugar de uma delas”, perguntou rindo Jordana.

– Gostaria de estar na cama com eles, só isso. Acho que a convivência seria horrível.

Conforme os produtos foram saindo, Maria Rita levou para a mesa e tentando não deixar Angélica perceber, olhou novamente para o general e Márcio que conversavam animadamente. Foi justamente nesse diálogo que Alexandre pediu ao editor que empregasse como funcionária no setor de limpeza de sua editora a mulher de Pedro.

“- Olha só general. Estava mesmo pensando nisso, pois quero começar lá na segunda-feira, mas está tudo uma bagunça e nem sei por onde começaria. O que acha meu amor”, perguntou Márcio a Angélica.

– Primeiro preciso ver quem essa mulher e saber se não vai dar em cima de você. E se for mais bonita que eu, pode esquecer general.

Ao ouvir a filha dizer, Eleanora começou a rir e apertou a mão de Alexandre que gargalhou também. “- Por que o riso mamãe? Eu disse alguma besteira? Lógico que eu tenho que ficar de olho ou acha que vou colocar alguma mulher que pode ameaçar o meu reinado junto ao coração do Marzinho”, disse a empresária.

Foi Alexandre quem falou ainda rindo. “- Eu havia comentado isso com a sua mãe ontem à noite e ela me disse que primeiro quem teria que autorizar seria você”.

“- Cruzes Eleanora! Você acha que não posso comandar a minha editora”, perguntou o editor.

– Meu querido genro, eu sei que pode tudo e muito mais, mas conheço minha filha e o ciúme que ela tem de ti e também porque atravessou o estado atrás de ti. Sem contar que esmurrou a sua ex-namorada dentro do banheiro de nosso restaurante.

– Tudo bem general, pode pedir para ela falar comigo e se possível agora na parte da manhã, mas se não der, pode ser no período da tarde.

“- Márcio, provavelmente ela irá na parte da tarde com o marido. Acho que assim sua mulher ficará mais tranquila”, informou o general rindo.

A conversa dos dois casais era assistida pelas duas funcionárias que falavam da semelhança entre os dois homens, inclusive no modo de falar e rirem. “- Você sabe por que aqueles dois não falaram nada do pedido que as duas fizeram para eles”, perguntou Jordana à Maria Rita. Antes mesmo da interlocutora responder, a amiga sentenciou: “- Porque as duas são loucas por eles. É só observar como mãe e filha olham para eles”.

“- Jamais vão arrumar confusão com elas por coisas à toa. Angélica é doida de pedra e pode explodir do nada. Agora a mãe dela é difícil saber, mas já ouvi dizer que bate no cidadão sem colocar a mão e quando age é para derrubar. Então o melhor que devemos fazer é nos mantermos distantes desses dois negões lindos, mas que andam com duas seguranças armadas até os dentes”, disse Maria Rita.

Quando os dois casais iam saindo, Alexandre deu uma nota de R$ 200 para a atendente e outra para Jordana. As duas agradeceram e pediram para voltarem sempre. “- Para quê”, perguntou Eleanora. “- Para vocês duas comerem eles com os olhos? Ou pensam que não as vi tirando a roupa de nossos maridos”, acrescentou a sogra de Márcio caindo na gargalhada só de ver a expressão das duas.

“- Trabalhem firmes meninas e parem de procurar os homens que desejam em lugares errados”, orientou a presidente de honra das Organizações Oliveira quando o gerente apareceu todo solícito, obtendo como resposta para ficar sereno. “- Você tem que tratar bem os clientes e não nós que somos proprietários”, cravou Eleanora.

Walter ficou sem saber o que dizer, pois foi surpreendido com a resposta, contudo já tinha ouvido comentários que a família Oliveira detestava colaboradores que ficavam puxando o saco e também não se dava bem com publicidade e desejava sempre não aparecer, ser destaque em nada, exceto se fosse frutífero para as empresas. Essas, sim, precisavam de destaque, pois elas existiriam independentemente de quem estivesse no comando. O grupo conduzido inicialmente pelo pai de Jovelino incorporou isso de tal maneira que estava impregnado no corpus da organização.

Ao deixarem o estabelecimento, Eleanora e Alexandre decidiram ir até a casa de Pedro e dar-lhe a notícia, além de levá-lo para o restaurante. Angélica conduziu o marido até ao apartamento-editora para que ele finalizasse tudo e no dia seguinte finalmente esvaziasse o espaço que seria a nova moradia de Fernanda.

Na residência do cozinheiro, Pedro ficou surpreso com a chegada do casal. “- Eu só iria para o restaurante mais tarde general. Fabrícia foi fazer uma faxina e eu fiquei com as crianças e depois levaria elas para ficarem com minha sogra. Mas o que o traz aqui em minha casa”, perguntou o cozinheiro-gerente.

– Pedro eu vim para te levar ao restaurante e te dizer que consegui arrumar uma colocação para a sua mulher. Ela não precisará mais fazer faxina.

“- Como assim, meu caro general”, inquiriu o cozinheiro-gerente.

– O genro de Eleanora montou uma editora e contratará sua mulher para o setor de limpeza. O trabalho não é pesado e ela poderá inclusive voltar a estudar, pois acho que essa será uma condição imposta pelo Márcio.

“- E meus filhos com quem ficarão”, perguntou novamente Pedro.

“- Primeiro trocarão de escola. Vamos arrumar uma em que fiquem em período integral recebendo educação de qualidade. Depois, ela poderá estudar pelo sistema EaD. Tenho certeza de que meu genro não a aceitará sem essa condição e assim você poderá se dedicar integralmente ao restaurante, pois o seu general aqui será presidente da fundação que estamos criando”, explicou Eleanora.

“- General, me belisque para eu sentir que não estou sonhando”, disse Pedro que não se aguentava de felicidade.

“- Não meu amigo. Você está plenamente acordado e vamos construindo aos poucos, coisas novas em nossas vidas. Não precisamos apressar o rio, mas sim construirmos canos e barcos com as madeiras fornecidas pela ética e a moral e pelo respeito aos nossos semelhantes”, disse o militar.

– Agora vamos. Temos trabalho a fazer. Coloque seus filhos aqui com a gente. Enquanto você faz o almoço no restaurante, eu e o seu amigo aqui vamos levar seus filhos para um dia de lazer.

Pedro convidou o casal para entrar enquanto arrumava os filhos. Eleanora reparou bem dentro da casa, não com intuito de alcovitice, mas para entender como era a vida do cozinheiro e percebeu que poderia fazer mais por ele. A namorada do general entendeu que o apartamento em que Amadeu morou poderia ser útil para o casal e seus filhos.

– Pedro! Sem querer ser intrometida, mas quanto é o aluguel desta casa ou ela é própria?

O cozinheiro achou estranha a pergunta, mas respondeu normalmente, pois confiava no militar como se este fosse seu pai. “- Consome boa parte de nossos recursos, obrigando Fabrícia a uma jornada exaustiva de faxinas, mas ela nunca reclamou, pois sabe que esse é um ato que repetimos sobre as coisas que não são boas em nossas vidas”.

– Se tua mulher passar pelo crivo de minha filha e começar a trabalhar na editora do meu genro, podemos mudar algumas coisas. Tenho um apartamento que está fechado e acho que é útil para vocês dois e o valor podemos negociar.

– Mas por que tem que passar pelo crivo de sua filha, dona Eleanora? Ela já me conhece, então acho que não terá problema algum.

Alexandre cai na gargalhada. “- Vai por mim, meu amigo. Tenho certeza de que não terá problema, mas o ritual precisa ser seguido”, disse Alexandre ajustando os filhos de Pedro no banco de trás do automóvel, sendo vigiados por Eleanora que já estava treinando para quando o neto chegasse.

Entre o trajeto da residência do cozinheiro e o restaurante, Pedro ensaiou várias vezes para falar sobre o empréstimo, mas quando pensava em falar, recuava, mas o general sabia que havia algo. “- Pedro, é impressão minha ou está querendo me dizer algo e não consegue”, perguntou o militar.

– General eu nunca te pedi nada, mas precisarei de sua ajuda. Eu e Fabrícia temos um dinheiro economizado e queremos usá-lo na compra de um terreno para darmos início a construção de nossa casa própria, contudo, ainda nos faltam R$ 5 mil. Então, quero saber se você tem condições de me emprestar esse dinheiro e ir descontando mensalmente em meu salário.

– Bom. Primeiro quero saber onde fica esse terreno. Se for em bairro periférico que tu terás vizinhos não muito confiável, esquece. Depois que eu conhecer o espaço, posso pensar seriamente no assunto.

“- Se você quiser podemos passar por lá agora”, sugeriu Pedro.

– Está certo. Vamos lá e já acabamos com essa sua agonia.

O que Alexandre não contava é que a conversa entre os dois tinha sido escutada por Eleanora que permaneceu em silêncio, pois não tinha sido consultada sobre o assunto, portanto, seria deselegante entrar numa conversa que estava havendo entre o seu namorado e o funcionário dele.

Entraram no bairro e o general começou a olhar detalhadamente tudo e quando viu o imóvel que Pedro estava desejava comprar, achou que valeria o investimento. Os dois desceram e Eleanora também e as crianças a seguiram, pois já tinham estado naquele local outras vezes. “- Pedro, vou te emprestar o dinheiro e farei mais: comprarei os dois terrenos em volta e aquele outro do fundo. Você sabe onde fica a incorporadora”, perguntou o militar.

Quando o seu cozinheiro falou, Eleanora reconheceu, inclusive recordou que foi lá que a filha comprou o apartamento com o qual presenteou Márcio e depois ela, subornando o gerente, conseguiu deixar o genro na rua. Aquela ação só atiçou mais o amor que a filha sentia por ele.

“- Eu sei onde fica”, disse Eleanora. “Se vocês quiserem, podemos ir lá agora e fechar o negócio.

“- Por mim tudo bem”, disse o general querendo saber se seria isso também o caso do cozinheiro.

– Tenho que passar no banco, falar com o gerente para liberar o que temos guardado lá e também com Fabrícia. Desde que nos casamos, não faço nada, absolutamente nada sem falar antes com ela. Então acho que pode ficar tudo para segunda-feira.

– Em absoluto. Se o problema for o dinheiro, podemos ir lá e resolver tudo e depois você repassa os valores para a minha conta, meu caro Pedro.

Ao chegarem na incorporadora e imobiliária. Saulo reconheceu a mulher e ficou sem saber o que dizer. Tempos depois, soube pelos jornais que Márcio havia se casado com a filha dela e de nada adiantou ela ter feito todo aquele estardalhaço.

Tentando ser simpático e sentir onde estava pisando, ele quis saber quem ela desejaria despejar desta vez. Assim que ela se sentou, o general pegou o assento do lado e Pedro com as crianças ficou um pouco afastado pois não havia como ficar junto dos dois.

– Saulo não quero despejar ninguém, até porque aquela ação me proporcionou muitas felicidades. Márcio se casou com a minha filha e eu só soube do amor dos dois por conta daquela minha atitude intempestiva e infantil. Mas aquilo ficou no passado, hoje estou aqui para falar de coisas futuras: esse aqui é meu amigo e general aposentado do Exército e tem interesse num conjunto de quatro terrenos um ao lado do outro que vocês estão vendendo.

Ao ouvira exposição da milionária, Saulo abriu a tela de seu computador para mostrar os terrenos e Alexandre apontou quais eram. Ao indicá-los, o corretor quis saber o motivo da aquisição dos imóveis contíguos. O militar olha para ele e responde: “- Tenho fetiche. Quanto estão valendo”, perguntou o general.

Ao falar o preço, Eleanora olhou para o incorporador e já iniciou a negociação, dizendo que o pagamento seria a vista e o objetivo era para ser construída a sede da fundação que estava sendo criada, portanto, não haveria nenhuma finalidade especulativa ou aumento do patrimônio do militar. “- O projeto dele é montar ali uma instituição para instruir crianças carentes de nossa cidade. Então, será que os quatro não poderiam ser comercializados pelo valor dos três”, perguntou a presidente de honra das Organizações Oliveira.

Saulo recordou que o dinheiro que ganhou para despejar Márcio seria cobrado um dia e a hora era aquela. “- Podemos fazer sim, dona Eleanora”. “- Ótimo meu caro, então farei a transferência dos valores agora e já quero a documentação, pois hoje à lavraremos as escrituras”, explicou a namorada de Alexandre.

Ao término da transação, Eleanora disse ao corretor que nada daquela comercialização teria que sair dali. “- Você sabe como trabalhamos. Se nenhum de nós atrapalharmos o outro, todos ganham e ninguém precisa ficar sabendo nada sobre a minha pessoa e os meus amigos”.

– Sei sim senhora. Obrigado por confiar em minha incorporadora.

Todos se levantaram e se dirigiram ao veículo do general e de lá foram para o restaurante. No trajeto, Eleanora disse ao Pedro que na parte da tarde, depois que fechassem o restaurante, ela e Alexandre o levariam juntamente com Fabrícia para conversarem com o genro dela e passar as escrituras dos terrenos.

Já dentro do restaurante, enquanto Eleanora brincava com as crianças dizendo que as levariam ao shopping e almoçariam em outro restaurante, no escritório do estabelecimento, Pedro perguntava ao general porque ele comprara os outros três terrenos. “- É para cada um dos teus três filhos. Contudo, faremos um contrato em que só poderão ter acesso a eles depois que fizerem 18 anos e está vetado a comercialização e hipotecá-los. Claro que se construírem neles e desejarem alugar as casas, poderão fazer desde que o dinheiro vá para reserva econômica deles”.

“- General, como posso lhe agradecer pelo que está nos fazendo”, disse Pedro indo às lágrimas.

“- Meu amigo, se podemos aliviar o peso daqueles que não tiveram a mesma sorte que nós, porque não fazer? Você é meu cozinheiro, meu braço direito, toma conta do caixa e tem conduzido esse restaurante quase que sozinho e eu ficando com o lucro. Não acho justo! Então, estou dividindo contigo, o fruto do seu trabalho, mirando o futuro dos teus filhos e um pouco de paz à tua família”, explicou Alexandre acrescentando: “- Eu e Eleanora vamos passear com seus filhos e almoçaremos no restaurante dela. Quando você estiver fechando o restaurante aqui, me ligue que venho te buscar para encontrar a sua esposa e irmos falar com Márcio. A mulher dele estará lá porque tem um ciúme maior do que a muralha da China.

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