Sobras de um amor … parte II

12

 

Eram cinco horas quando Angélica acorda assustada com o barulho do celular. Percebeu que dormia apoiada no ombro e peito de Márcio que também se alarmou com o que tinha visto. Mas antes perguntou a amiga o que estava acontecendo. “- Não sei! Acho que o meu telefone”. O aparelho tocou novamente e a arquiteta atendeu.

– Alô! Mãe? O que foi? A senhora me ligando a essa hora da manhã. Aconteceu alguma coisa?

Eleanora chorando lhe informou que estava no hospital. Seu pai havia passado mal durante a madrugada, sendo levado ao pronto-socorro. Lá chegando foi direito para a UTI. “- Não sei o que fazer filha. Estou perdida. Será que você pode vir para cá e trazer o Amadeu. Estou com medo de que seu pai não resista e morra!”

– Está bem mãe. Estou indo. Só me dê uns minutos para eu me arrumar. Depois dou jeito de levar o meu irmão. Agora se acalme. Quem está com a senhora?

– Só os seguranças que estão na porta evitando que estranhos e jornalistas entrem, mas não tenho com quem conversar. Estou desesperada. Vem logo, por favor!

Márcio vendo que Angélica mudava de expressão, aguardou ela desligar para saber o que estava acontecendo. Antes mesmo que o repórter lhe perguntasse, a arquiteta foi falando, como forma também de desabafar. “ – Meu pai está na UTI. Não se sentiu bem de madrugada e foi hospitalizado. Será que foi por conta das coisas que lhe disse ontem?”

– Não vai colocar essas coisas dentro da cabeça. Seu pai, pelo que você disse, tem saúde debilitada que vinha piorando à medida em que não conseguia levar Amadeu de volta para a família. Então, vá lá ficar com sua mãe.

Sem pensar direito, Angélica foi tirando a roupa para se aprontar e Márcio, meio que constrangido foi saindo do jeito que estava vestido, sem camisa e com o short da amiga. Voltou correndo ao quarto, pegando suas roupas, mas não resistiu e deu uma olhadinha para Angélica que estava de costa. Ela registrou a presença dele. “- Não sai aqui de casa. Espere que vou te ligar. Preciso que acorde meu irmão e o leve ao hospital. Mas primeiro quero preparar o ambiente e quero você lá comigo. Não quero ele dando show e nem minha mãe”.

– Meu deus do céu. Falou tudo sem respirar. Calma. Dará tudo certo. Eu te espero. Até porque tu terás mesmo que destravar essa porta para eu sair, sua Rainha diaba que mantém prisioneiros nessa torre eu e o seu irmão.

– Amadeu a hora não é para brincadeiras. Tchau. Não vá dormir. Assim que eu te ligar quero você e meu irmão lá.

– Está certo patroa.

– Vá se foder você e essa sua mania de me chamar de patroa.

Deu um beijo na face do amigo e saiu apressada para o hospital onde sua mãe a aguardava aflita. Fez o percurso pensando que talvez tivesse sido muito cruel com Jovelino. Poderia ter pensado e avaliado melhor a maneira como dizer tudo aquilo. “Mas fazer o quê. Eu já falei e não dá para voltar atrás. Também não vou tentar me redimir de nada, pedindo desculpas, pois eles é que precisam fazer isso”, pensou a arquiteta chegando ao hospital.

Entrou e já encontrou a mãe em prantos. Estava aflita e queria saber notícias do marido, mas desde que o levaram à UTI, a única que sabia é que o quadro era grave e que os médicos estavam fazendo tudo o que era possível, mas a situação era gravíssima.

Assim que conseguiu acalmar a mãe, Angélica lhe perguntou o que havia acontecido. Eleanora explicou que acordou com o marido conversando e achou que tinha alguém dentro do quarto, mas viu que não. Ele estava sentado em sua cadeira de rodas com o olhar longe e dizia coisas desconexas, que só chamaram atenção da mulher quando ele disse: -Vem Lourdes, meu amor. Vamos viver a felicidade que foi nos roubada brutalmente pela violência humana”.

Em seguida, a mãe de Angélica relatou que Jô começou a ficar estranho e falar enrolado e ficar gelado. Ela então viu que o marido estava tendo um ataque e gritou pelo enfermeiro que cuida dele. Os seguranças também chegaram rapidinho e já colocaram o esposo no carro. “- Só deu tempo deu colocar uma roupa por cima da que eu estava e vim com ele”.

– Mãe, o Amadeu disse ao Márcio que viu algumas vezes o pai conversando sozinho, fazendo gestos com as mãos parecia que falava com alguém. A senhora sabe de alguma coisa? Fale-me. Precisamos saber se o meu irmão estava vendo coisas ou foi realmente uma alucinação do meu pai?

– Antes de mais nada filha. Quero que saiba que teu pai ficou muito sentido com o que você falou para nós ontem. Mas tudo bem! Não adianta mais! O passado não volta e seu pai sabia disso. O que vou te contar, é fechadíssimo. Então, não sei se Jô sobreviverá, espero que sim, mas entendo que você e seu irmão precisam saber.

Eleanora revelou à filha que sabia que o marido não lhe tinha amor. Revelou que Jovelino sempre foi apaixonado por uma secretária negra que o pai mantinha na empresa para impressionar todo mundo e dizer que não era racista. “Contudo, meu sogro descobriu que o filho a amava e andavam tendo uns encontros escondidos. Para acabar com o romance, organizou o sequestro da moça e pagou muito dinheiro para os capangas violentarem a moça e depois matá-la”.

Ao ouvir isso, Angélica perdeu a cor. A cabeça voltou na conversa do dia anterior e percebeu o quanto tinha sido agressiva com o pai que carregava uma dor muito forte n’alma. Eleanora contou coisas mais fortes ainda, de pura crueldade que fizeram com a secretaria.

“- Meu sogro providenciou fotografias da mulher sendo agredida em sua intimidade, sendo assassinada e depois o corpo todo crivado de balas. Para despistar o verdadeiro mandante, o pai de Jô fez todo aquele barulho dizendo que ia fazer e acontecer, mas acharia os autores da terrível violência. Passado uma semana do enterro de Lourdes, Jô recebeu as fotos da crueldade que fizeram com a moça. Nas fotografias haviam texto nos versos dizendo: ‘isso acontece com quem se mete a querer se envolver com os brancos além dos limites definidos. Preto é preto e pronto, além de ser inferior e não há amor no mundo que os coloquem em pé de igualdade com os brancos”, disse a mãe de Angélica com os olhos marejados, enquanto a arquiteta estava totalmente passada.

“- Aquilo destruiu Jô. Logo depois fui apresentada à família de seu pai e passado uns tempos nos casamos. Então, acho que entendo a cabeça e o coração dele. Ele virou cadeirante depois duma noite em que caiu da escada. Me disse que acordou sendo chamado pela sua amada e quando a viu flutuando pela casa, tentou pular para alcançá-la, mas caiu na escada e nunca mais andou”, revelou Eleanora em prantos!

– Mãe! Quem mais sabe dessa história de violência macabra contra o meu pai e Lourdes, além dos motivos que o levaram a uma cadeira de rodas?

“- Ninguém! Até uns anos atrás ele tinha aquelas malditas fotos”, minha filha. “- Tempos depois que Jô deu um jeito de sumir com a Tarsila, Amadeu foi em casa para falar com ele, mas seu já era cadeirante e depois isso, nunca mais se falaram. Eu sei que seu pai tentava de alguma forma se redimir com o seu irmão, mas não conseguia. Era como se ele visse no relacionamento entre aquela moça e o filho a mesma coisa que aconteceu com ele. Por isso que acho que ele fez tudo para separar os dois porque não queria ver o seu passado estampado na felicidade do Amadeu”, explicou Eleanora.

Sem esperar que a filha tomasse pé do que estava sendo narrado, a mãe foi revelando muito mais coisas do que pretendia dizer, mas falava como para aliviar o coração amargurado e amedrontado diante da hipótese de perder o marido. “- Eu, de certa forma, por saber que nunca substituiria aquela mulher no coração do seu pai, desenvolvi certa aversão aos negros. Seu pai sempre lutou para não faltar nada para mim, mas eu sei que fazia isso porque não podia me ter dentro do seu coração. Então me cobria de dinheiro e me deu dois filhos que amo muito. Porém, o que eu mais queria, nunca consegui. E sinto que ele está partindo sem que eu conquiste o sempre desejei: o amor do seu pai”, revelou a mãe de Angélica.

Eleanora, apesar de perceber que a filha ficava alarmada a cada coisa que ouvia, continuou a desabafar com a arquiteta. “- Da mesma forma que me comprou e reconheço a minha culpa nisso tudo, pois me perdi no meio do luxo que recebia diariamente, o teu pai tentava se apossar de tudo nessa cidade: prédios e as pessoas, numa busca desenfreada para preencher aquele vazio dentro do peito. Também tentamos comprar vocês, mas quando Jô descobriu que Amadeu estava se relacionando com uma negra, acho que inconscientemente não admitiria isso, pois se ele não pode ser feliz com Lourdes, então nenhum branco deveria ser feliz com um negro”.

– Mãe! Vocês tinham que ter me falado. Eu fui injusta com o meu pai ontem.

– Não filha. Você não foi injusta, pois não sabia de nada. Somos injustos quando conhecemos o certo e o errado e ainda sim prejudicamos as pessoas. Então não carregue contigo mais essa dor. Se você tiver amor aí dentro de ti, espero que perdoe seu Jovelino, inclusive das violências sexuais que sofreu que acabaram te afetando profundamente. Eu sabia de tudo, mas ele ameaçava fazer comigo o que o pai fez com a Lourdes, a mulher que ele ama até hoje. Jô a chamava de sua Rainha de Ébano. Ele dizia que quando estava com ela, o mundo parava e as estrelas vinham à terra, promoverem um belíssimo concerto só para o casal.

Quando Eleanora terminava de falar, a enfermeira a chamou para falar com os médicos. Angélica fez menção de ir junto com a mãe, mas esta vetou. “-Depois te digo o que o doutor explicou. Agora traga Amadeu aqui. Quero falar com ele, antes que seja tarde”.

– Está bem mãe. Daqui a pouco ele chegará.

Enquanto a mãe falava com o médico que atendera o marido, a arquiteta ligou para Márcio.

– Alô! Achei que estava dormindo. Meu irmão já acordou? Traga ele aqui rápido. Estou passada, minha mãe me revelou umas coisas que me fizeram cair das pernas. Preciso de você aqui e agora!

– Calma! Uma coisa de cada vez. Seu irmão acordou e perguntou por você e eu falei que teve que sair às pressas e que eu precisaria levá-lo em um lugar. Ele achou que era para jogar as garrafas no oceano. Disse que não! Antes precisávamos fazer outra coisa.

– Não lhe diga a verdade. Só o traga aqui. Invente qualquer coisa. Vocês jornalistas são mentirosos mesmo! Quando querem, criam histórias para as pessoas que não querem falar, digam alguma coisa.

– Obrigado pela parte que me diz respeito. Mas pode deixar. Ele estará aí daqui a pouco e quanto a mim, provavelmente estarei distante. Câmbio. Desligo.

A arquiteta ligou novamente e Márcio foi mais frio e distante. “- Não precisa gastar com ligação. Quando eu e seu irmão estivermos prontos eu informo para a senhora abrir a porta da Torre para nós”, disse o repórter desligando em seguida.

Assim que Amadeu terminou de se higienizar, o repórter disse que ambos precisavam sair e que a irmã os esperava numa loja de departamentos da cidade. Iriam fazer compras, inclusive mais peças para ele, Márcio. O poeta olhou, gargalhou e falou: “- Tu estás caindo por aqueles olhares esverdeados, hein negão!?”.

– Não exagere, meu amigo. Eu e sua irmã somos como eu e você. Sem precisar reinventar a roda.

Márcio ligou para a arquiteta dizendo que estavam saindo. Pediu um transporte sussurrou no ouvido do motorista o local para onde iam. Depois ligou novamente para Angélica, dizendo: “-Esteja na frente, eu e seu irmão não vamos conseguir entrar”.

Assim que chegaram ao hospital, Amadeu percebeu que não havia loja nenhuma e gritou com o repórter. “- Seu traidor duma figa. Eu confiei em você e agora me traz para esse sanatório. Eu não estou louco! Deixe-me sair daqui seu filho de uma puta”.

– Não é nada disso Amadeu! Você não vai ficar internado, porra nenhuma. Te trouxe aqui para você fazer visita a um amigo seu que não está passando bem e quer te ver antes de irmos às compras. Vamos.

– É isso mesmo Márcio?

– Claro que é!

Assim que terminou de falar, Angélica abriu a porta do automóvel e pegou o irmão pela mão. Já haviam uns dois enfermeiros de prontidão, caso o poeta desse algum trabalho, mas pelo que Márcio lhe disse, não houve problemas.

– Keka onde está esse meu amigo? Ele precisa saber que eu estou aqui para visitá-lo.

“- Vem comigo. Você vai falar com ele já”, lhe informou aa arquiteta.

Entraram e Amadeu viu a mãe no corredor e já gritou com ela. “- O que essa rainha diaba está fazendo aqui. Ela quer me destruir ou quer matar o meu amigo. Vou avisá-lo para ficar longe dela”.

A irmã pediu para ele sentar e solicitou um copo de água para a enfermeira que trouxe o líquido contendo um sedativo. Amadeu tomou e em seguida se sentiu sonolento, dormindo em seguida. Angélica explicou a Márcio que aquilo foi necessário, pois quando acordasse seria atendido por uma psicóloga que conservaria com ele sobre o estado clínico do pai.

Quando Márcio viu Eleanora vindo em sua direção, fez menção de sair, pois ainda ardia dentro do coração as ofensas que aquela mulher lhe disse dias atrás. Mas antes que pudesse fazer qualquer movimento, a mãe de Angélica pediu para falar com ele. Sem ser agressivo, mas com muitas reservas, só perguntou à mulher: “- O que a senhora quer? Já não bastou as ofensas, me fazer ficar sem casa quase dormindo na rua, tentar tirar o meu ganha pão. Eu não quero nada de vocês, pois tudo que vem daí cheira a sepulcro. Não quero sentir cheiro de gente morta com dinheiro. Portanto, se me der licença, preciso cuidar da vida”.

– Meu rapaz! Não posso te pedir nada! Nem exigir que me escute e sei que vai me dizer que estou a lhe falar porque meu marido está entre a vida é a morte, mas quero apenas que me perdoe. Sei o quanto fui injusta contigo, culpando você e a todos os pretos por conta duma dor que é minha e eu a canalizei para todos de sua etnia. Depois pergunte a Angélica que talvez ela lhe diga.

Quando terminou de dizer isso, Eleanora tinha junto de si a filha que a abraçava. O repórter olhou para ela e à amiga dizendo: “- Dona Eleanora se eu lhe disser agora que lhe perdoo, estaria mentindo. Mas só o fato de a senhora tomar essa atitude, me deixa mais aliviado.  Pode ser que um dia eu a perdoe, mas hoje as ofensas que me direcionou, além de afetar a minha dignidade humana, me dói n’alma. E tudo o que vocês fizeram Amadeu e Tarsila sofrerem ainda é muito presente em meu coração. Então assim como a senhora espera que eu a perdoe, também espero que me compreenda, dona Eleanora. Não lhe quero mal, mas não posso ser hipócrita para fazer média com quem quer que seja. Agora a senhora me de licença. O momento é de vocês e seus familiares e eu sou um estranho.

Foi dizendo e já saindo. Ao mesmo tempo em que Eleanora dizia à filha que se enganou em relação ao rapaz. “ – Tem caráter, princípios e sobretudo ético e não é vingativo. Ficaria bem como meu genro”.

-Mãe! Sou casada com a Rosângela. Lembre-se disso!

– Tudo bem! Mas é só ver os seus olhos quando ele está por perto, como agora, e terás a resposta que procura faz tempo. E a defesa que fez dele no almoço ontem? Só um cego não vê que tu se escondes atrás dessa aliança. Mas de qualquer forma filha, a única coisa que quero é que você seja feliz e ainda me dê um tempo para ser a mãe que você e Amadeu merecem.

– Tudo bem mãe. Se eu disser que não fico bagunçada quando estou com ele, mentiria. Ele me transmite uma segurança singular. As horas voam. O dia fica com brilho especial e as noites magnificas. Sempre que estou na presença dele, se eu escutar os sapos coaxando, com certeza estarão executando uma bela melodia. Mas daí a dizer que é amor e que quero passar o resto da minha vida com Márcio, seria muita loucura de minha cabeça. Como não sei o que é e ainda tem Rosângela que está na Alemanha, prefiro esperar e se depender dele, vamos andar lado a lado até o fim da vida e não haverá avanço do sinal.

– Tudo bem filha, faça como você quiser. Afinal não é mais criança e tem aí vários problemas que teu pai lhe deixará e uma fortuna para administrar. Ou você está pensando que eu é que vou trabalhar com isso ou deixar em mãos de estranhos? Jovelino tinha muito defeitos e eu os encobri como podia, mas ontem quando você falou tudo aquilo e eu lembrei do amor dele por Lourdes, fiquei feliz em poder ter compartilhando um pequeno pedacinho deste sentimento e além de me ter dado vocês dois.

Depois de ouvir a mãe lhe dizer isso, Angélica informou que precisava falar com Márcio, saindo à sua procura, mas quando chegou na portaria do hospital, perguntou a atendente se alguém com as características do repórter havia passado por ali. A funcionária perguntou o nome dela e do jornalista. Assim que foi informada, lhe entregou um envelope. “- Ele pediu para entregar isso a senhora”.

A arquiteta voltou para junto da mãe, abrindo o envelope. Dentro encontrou o cartão e a senha que tinha deixado com ele, mais o celular que ele usava. Junto havia um pequeno texto que dizia.

“- Querida mulher dos olhos esverdeados! Foi um prazer enorme conhecer você. Também acho que será possível, com o passar do tempo, tu e seu irmão se entenderem com seus pais. Minha parte termina aqui. Devolvi Amadeu para os braços de vocês. Eu seguirei meu caminho. Sou grato pelo presente, mas não posso aceitá-lo. A indenização também não quero, pois não a requisitei. Seguirei minha estrada. Quem sabe um dia, os caminhos não se cruzam novamente e possamos construir outras verdades. As que erguemos terminam aqui. Beijos. Márcio”.

Nem deu tempo de Angélica processar direito tudo o que tinha acontecido, inclusive entender porque o jornalista deixou com ela o seu celular. Claro que era para que não fosse encontrado. Antes mesmo de concluir o raciocínio, a arquiteta escutou um grito no fundo do corredor e vinha dos lados onde tinha deixado a mãe. Apertou a passada e ao chegar encontrou a mãe sendo amparada pelas enfermeiras. E nem foi preciso dizer nada: seu pai tinha falecido. Quem sabe finalmente encontrado a Lourdes.

Foi aquele alvoroço todo e Angélica perdida, com medo que o irmão acordasse. Teria tanta coisa por fazer e Márcio desaparecendo justamente naquela hora em que mais precisava dele. Não podia ficar pensando no que não tinha e fazer o que era preciso. Ligou para a sua empresa. Dispensou todo mundo. Deu o dia de folga aos colaboradores. Avisou os amigos mais próximos do pai. Ligou para os jornais informando da morte de Jô.

Quando ligou para o jornal onde Márcio trabalhava, Angélica pediu para falar com ele ou com o seu chefe. Foi informada que o repórter não aparecia ali fazia um tempinho. Estava cobrindo uma matéria para lá de doida como a cabeça dele. Ao atender a ligação, Roberto identificou a voz de Angélica que passou as principais informações e em seguida perguntou pelo amigo. “- Dona Angélica eu não vejo o Márcio faz uns dois ou três dias. Eu soube que ele me procurou aqui, mas não quis esperar. Posso ajudar em alguma coisa?”

– Não Roberto. Fique descansado. Depois eu converso com ele.

Assim que o editor desligou o telefone, o repórter entrou em sua sala. “- Márcio, aquela loura gostosona acabou de ligar. O pai dela faleceu e ela perguntou de ti”.

– Se ela ligar novamente diga que não me viu! Não sabe de nada! Agora, me diga uma coisa: você tem um celular sobrando? Me empresta. Preciso sair da cidade. Não me faça mais perguntas.

– Você comeu aquela mulher e os parentes dela querem te matar?

– Não! Nada disso. Só me dá o celular.

– Onde está o seu?

– Deixei com ela. Anda me dá o celular. Assim que eu estiver hospedado num hotel eu te ligo, mas se me prometer que não vai falar nada para ela? Eu sei que vai vir babando em cima de você. Posso confiar em ti?

– Toma aqui o celular. Está com R$ 500 de crédito. Dá para falar bastante tempo. Quando você voltará à redação?

– Ainda não sei. Se o João Marcelo perguntar diga que tive que fazer uma viagem para descobrir umas informações sobre uma nova matéria. Tchau. Ficarei bem. Se minha mãe te ligar, diga a mesma coisa: que está tudo certo comigo.

Márcio deixou a redação do jornal e foi direto à rodoviária. Já tinha o destino traçado. Entrou no ônibus apenas com a roupa do corpo, documentos e um pouco de dinheiro que tinha sacado e ficou assustado com o saldo. Os pais de Angélica já tinham depositado a primeira parcela de R$ 10 mil. “Isso dá para começar em algum lugar longe daqui”. Comprou passagem para uma cidade que ficava distante uns 400 quilômetros quase na divisa com outro Estado.

Quando chegou no local, se hospedou, ligando em seguida para Roberto que foi informado estar tudo certo com ele. A matéria sobre o pai de Angélica seria publicada logo na edição do dia seguinte. Também ficou sabendo que a arquiteta tinha ligado várias vezes atrás dele. “-Ela jurou que vai te encontrar. E aí você sabe o que ela fará contigo. Chamou você de o tímido poetinha dela. Ladrão de corações”.

– Roberto, essa mulher é doida, mandona. Não diga nada. Por isso que nem te falei em que cidade estou. E esquece esse número de telefone. Deixa que eu te ligo de um orelhão.

Em seguida desligou, se deixando ficar jogado na cama. Mas o que ele não sabia é que havia muitas maneiras de Angélica achá-lo. Uma delas era através de sua conta bancária. Se ele fizesse saque ali na cidade, ela saberia. “-Não posso movimentar minha conta bancária daqui da cidade. Terei que ir em outra cidade”.

O repórter era mesmo inocente. A arquiteta ia tornar a vida de Roberto um inferno até conseguir o que queria. Enquanto Márcio tentava se passar por desconhecido na pequena cidade, seu amigo já sentia o peso da família da arquiteta agindo.

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