Sobras de um amor…

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Durante a refeição, Angélica conversou com Rosângela sobre o seu irmão e a ideia que apresentaria ao jornalista no dia seguinte. Explicou que passou o dia fora para tentar equacionar o problema e como fora ignorante logo cedo quando viu Márcio sendo humilhado pelo diretor e ela tento contribuído enormemente para isso. “- Droga! Eu não sou assim. Nunca fui de humilhar ninguém, de usar meu dinheiro e minha posição social para sobressair em qualquer situação. Mas quando vi que a vida de Amadeu ia ser revelada por aquele repórter abelhudo, perdi a cabeça! Você me entende, Rosângela?”

A esposa assentiu com a cabeça, procurando tranquilizá-la, deixando claro que não estava cobrando nada. Queria apenas ser informada quando ocorresse situações semelhantes à daquela segunda-feira. “ – Mas o que você resolveu? Conversou com seu pai? Você sabe como ele enxerga o nosso casamento!”

– No começo estava arredio, mas o fiz ver que a questão não tinha nada a ver comigo e você. Isso poderíamos até conversar num outro momento. O momento era para tentar resgatar Amadeu daquela situação em que se encontrava. Nem mendigo, nem doido, mas apenas alguém que andava em círculo procurando algo que nem sabia o que está buscando.

– E ele?

– Disse que se o nome da família não aparecer, tudo bem, mas é preciso tomar cuidado. Me deu “carta branca” para resolver do meu jeito. Fiquei animada, por que se conseguir trazer o filhinho querido dele de volta, quem sabe ele arrefece um pouco a sua visão sobre o nosso amor.

Ao dizer isso, Angélica lançou um olhar provocativo, sedutor, prometedor, além de por baixo da mesa roçar a perna da esposa, numa clara alusão de que desejava dormir nos braços da amada. Despachando de vez aquelas sombras que rondavam sua cabeça e coração quando a imagem de Márcio surgia do nada, a exemplo daquele momento em que se olha na linha do horizonte na praia e vislumbra o ponto de fuga. Era dali que o corpo do repórter estava brotando.  Mas naquela noite, aquele corpo não seria nada, absolutamente nada, apenas a pessoa que poderia ajudá-la a resgatar o irmão daquela alienação em que se encontrava.

Logo após sentir o roçar da perna de sua esposa, Rosângela não resistiu, avançou sobre Angélica beijando-a profundamente, explorando todos os recantos da boca da arquiteta que correspondia aos anseios apresentados pela língua da amante que se apresentava extremamente envolvida pelo contato dos corpos que pareciam duas labaredas prestes a incendiar o mundo todo.

Passados os instantes iniciais do tórrido beijo, Angélica foi se afastando lentamente, pois tivera a sensação que estava beijando outra pessoa. Para tentar disfarçar a confusão, olhou para a esposa, dizendo-lhe: “ – Vamos terminar esse delicioso jantar que o seu coração me preparou!”

Ao término das comensalidades, Angélica disse a Rosângela que não se preocupasse. “ – Enquanto eu lavo a louça e organizo a cozinha, coloque uma música para ouvirmos!”

A antropóloga não pensou duas vezes, encaminhando-se para a sala e escolhendo a música que ouviram juntas pela primeira vez. Quando os primeiros acordes alcançaram os ouvidos de Angélica, esta olhou a esposa e deu um sorriso como querendo abraçar o corpo inteiro da companheira. Rosângela ao ouvir o refrão “eu vou aparecer nua na sua porta” não resistiu e praticamente saltou para a esposa, abraçando-a pela cintura, dando-lhe um beijo na nuca e acariciando seus seios.

Com tamanha carícia, foi praticamente impossível Angélica concluir a limpeza do ambiente onde o jantar foi feito e ali mesmo ela devolvia o que recebia da esposa, ora conduzida, ora levando, as duas foram para o quarto e lá ficaram por prolongados minutos trocando juras de amor, mas em determinados momentos, mesmo se contorcendo de prazer num balé sexual em que as amantes se subsumiam uma na outra em busca do clímax perfeito, a arquiteta fugia para outro ponto do universo e o corpo parava de responder as carícias que recebia da esposa.

Depois do sexo e de outras tantas juras de amor, Rosângela e Angélica tomaram banho e foram dormir. A primeira pegou logo no sono, a segunda, tentava, tentava, virava para um lado e para o outro e, ao perceber que não conseguiria dormir, foi terminar a arrumação da cozinha e caso o sono não chegasse, leria o artigo que a companheira deixara aberto no computador.

Ao terminar o trabalho na cozinha foi ter com o texto da amiga. Ao se sentar diante do equipamento, conseguiu compreender o que lhe incomodava tanto. A presença de Márcio se materializava diante de si, mas de um jeito todo especial. O repórter estava apenas de calça branca, semelhante aquelas que jogadores de capoeira usam em suas atividades físicas. “Não é possível! Por que não tiro esse cara da cabeça?”, pensou a irmã de Amadeu. “Bom. Amanhã soluciono isso. Acho que tudo tem a ver com Amadeu. Resolvendo isso, tudo ficará calmo novamente”.

– Perdeu o sono amor?

Era Rosângela que lhe perguntava da porta que dava para as duas salas.

– É! Acho que essa história do meu irmão está me deixando meio zoada. Mas volte para cama. Eu vou logo. Assim que concluir a leitura desse seu artigo!

Enquanto via a esposa voltar para o interior do quarto, Angélica se lembrou de deixar um recado para Márcio. Vasculhou na bolsa em busca do cartão dele. Assim que achou, deixou a mensagem para o repórter.

“Caro sr. Márcio, amanhã não vá a redação de seu jornal, antes de falar comigo. O assunto é urgente. Att. Angélica”. Enviou o texto, e decidiu que não ia ler mais nada. “Rosângela que me desculpará, mas não tenho condições de ler nada agora”. Salvou o documento e foi em direção ao quarto para dormir ou pelo menos tentar.

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