Olhar Crítico

Democracia

Raramente começo meus olhares dominicais focando questões alusivas à política no seu âmbito nacional e global. Normalmente trato das pelejas locais, sem descuidar do geral, como dizia Machado de Assis (1839-1908) em seu texto crítico Instinto de Nacionalidade, entretanto, hoje vou inverter, isto é, tratarei dum tema que envolve a unidade federativa como um todo. Trata-se da fala presidencial, segundo a qual “quem decide democracia ou ditatura são as Forças Armadas”. Parece-me que numa sociedade que não sabe viver em harmonia com a democracia, sempre se dança bailes funestos com ideias autocráticas, enquanto a população sem cidadania, carrega o féretro da Nação e durante o velório, milhares de centenas choram copiosamente o falecimento de um país que não consegue deixar a sua fase infantil, para não dizer colonial e escravagista!

 

Brados

Para entender quão perigosa é essa fala do chefe do Executivo Federal, há vasta bibliografia que trata das temáticas nacionais desde a chegada das naus conduzidas por Pedro Alvares Cabral e da problemática envolvendo o período em que os coturnos pisotearam a bandeira da democracia. Talvez por isso, o capitão-reformado pelo bem da disciplina no Exército, flerta tanto com a ditatura civil-militar que sangrou as páginas da história brasileira – claro que não se pode se deter apenas um dos lados da moeda, contudo, faz-se necessário compreendermos que não há nenhum dos integrantes que militaram do outro lado da peleja política, desde meados de 64, que ainda vocifera brados daquele período e se o fizer, não passa de um pio enfraquecido pela sucessão dos fatos históricos.

 

Leituras

Dentro dessa miríade de livros, teses, dissertações e artigos sobre essa Pátria tão maltratada pelos políticos, seja em que esfera estiverem, isto é, local, estadual ou federal, eu destacaria duas obras: a primeira do ex-presidente e cientista social, Fernando Henrique Cardoso: Crise e reinvenção da política no Brasil. A segunda é da historiadora e antropóloga da USP, Lilia Moritz Schwarcz: Sobre o autoritarismo brasileiro. Atentar-me-ei apenas a esse segundo livro para não vos agastar, neste domingo, com minhas admoestações sobre essa Nação sem cidadania, quiçá o indivíduo social saber da existência dos direitos civis, sociais e político, contudo, sem saber utilizá-los com maestria, fazendo com que a nossa democracia manque sempre e, nesse ato de manquitolar, acaba sempre beijando líderes que garantam pão e segurança, mas escondem debaixo de seus governos vínculos atrozes com a corrupção e a violência.

 

Corrupção

Em determinado trecho de seu texto, a professora da USP afirma: “assuma a forma que assumir, o certo é que a corrupção leva ao desvirtuamento dos costumes, tornando-os imorais e antiéticos. Suas decorrências não incidem apenas nas esferas privadas; acabam por afetar, diretamente, o bem-estar dos cidadãos. O efeito é de causa e consequência. Os gastos destinados ao enriquecimento privado reduzem recursos e investimentos públicos na saúde, educação, segurança, habitação, transporte ou em programas sociais e de infraestrutura. A corrupção também fere a Constituição em outro ponto, ampliando a desigualdade econômica” [Lilia Moritz Schwarcz. Sobre o autoritarismo brasileiro. SP: Cia das Letras, 2019, p. 90].

 

“Rachadinas”

Pois bem, meus caros leitores, posto isto, fica-nos uma pergunta: por que se diz muito, se analisa tanto a corrupção em nosso país e não se consegue debelá-la? A culpa é de quem? Do eleitor! Isso é óbvio, contudo, há que se relatar o grau de conivência desta mesma população com políticos corruptos e isso evidencia que não é somente no Brasil que o desejo atroz de se enriquecer com dinheiro dos cofres públicos existe, contudo, aqui parece que o cidadão está anestesiado, com medo de reclamar, de exigir aquilo que é seu por direito constitucional. Talvez essa condição colonial e senzaleira faz com que parte substancial dos brasileiros beije as mãos de autocratas que prometem debelar a corrupção das entranhas do governo, contudo, feito baratas, se lambuzam no melaço corrupto que existe nos bastidores dos governos: um exemplo são os motivos que levaram a queda de Collor de Mello e as “rachadinhas” que escancaram o baixo nível do atual governo federal.

 

Hábitos

Deixando o âmbito nacional e me enveredando pelas paragens maria-chiquenses, os eleitores, no quarto trimestre do ano passado, elegeram uma nova Câmara – nem tão nova assim, pois ficaram ainda uns antigos políticos que costuraram a manutenção de um hábito [dito da atual presidente do Legislativo] em detrimento do que as leis e sentenças dizem. Por desejo da municipalidade, a chefia do Executivo trocou de mãos. Mas nem bem completou um mês no trono municipal, e o prefeito já se envolve em polêmicas, que, ao que tudo indica, seriam desnecessárias. Mas vá lá! Ele determinou, no caso da vacinação contra o coronavírus, quem deveriam ser os profissionais prioritários para tomarem a medicação, contudo, só o fez depois que a sua vice recebeu sua dosagem. Ao que tudo indica, quiçá ela seja médica, não estava na linha de frente no atendimento à pandemia que, até o momento em que essas linhas eram traçadas, havia levado à óbito 65 penapolenses.

 

Perguntas

Como perguntar não ofende e a Constituição Federal determina que é livre o expressar da opinião, pergunto ao prefeito: por que as normas foram adotadas depois que a sua vice foi medicada? Não seria de bom alvitre os enfermeiros e faxineiros que estão diretamente lidando com a problemática, bem como os médicos-infantes [no Exército um soldado da arma de Infantaria é que vai à frente no combate] os primeiros a passarem pelo procedimento? É! Penso que aquele que apresentou sua indignação com uma ação dessas, pode estar com a razão, pois o prefeito deveria ter feito diferente, portanto, ponto para o reclamante e pronto, até porque a situação não vai voltar atrás e “Inês já é morta”, como se diz no jargão popular. Outro elemento que a sociedade espera da ação do governante eleito em 2018 é a mudança na forma de cobrança da Taxa de Iluminação Pública. É preciso lembrar que, quando Caíque Rossi, fora vereador e presidia a Câmara, foi dele o voto de Minerva – eis a mitologia romana nos ensinando mais uma -, isto é, aquele que desempatou a peleja em desfavor do povo. Enfim, fico por aqui neste domingo, meus caros leitores, na expectativa de que a pandemia possa nos dar trégua, mesmo que muitos não cumpram com as determinações dos cientistas, pois acham-se integrantes dos grupos em que estão os super-heróis, profetas e ungidos, e saem a torna e a direita pela cidade, sem necessidade alguma de o fazer e ainda sem as máscaras de proteção.  E-mail:   gilcriticapontual@gmail.com, d.gilberto20@yahoo.com,   www.criticapontual.com.br.

 

 

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *