O que está por vir?

Gilberto Barbosa dos Santos

 

Até o próximo domingo, 17, só se falará numa coisa nessa Brasil: a votação, pelo plenário da Câmara Federal, do processo de impeachment da presidente da República, a petista gaúcha e com fortes resquícios peemedebistas, Dilma Rousseff. Para quem não sabe, a exemplo do que acontece com uma pessoa ligada ao petismo penapolense, a chefe do Executivo nacional tem um pé no PMDB, partido que articula sua saída do poder. Bom! Até ai nada de mais, pois as pessoas podem mudar de partido como mudam de roupas para irem ao baile, conforme Machado de Assis narrou o último baile da Ilha Fiscal em seu penúltimo romance Esaú e Jacó, mas deixando o mundo da ficção Oitocentista e voltando para a realidade brasileira do século XXI e da nossa pífia democracia – olha que em menos 40 anos, o país passará pelo seu segundo processo de impeachment presidencial -, confesso que ainda não entendi direito essa história, para não dizer mantra, de golpe perpetrada pelos asseclas de um tipo de governo populista idolatrando líder messiânico que, até onde se sabe, está enrolado até o último fio de cabelo com atos corruptíveis e achaques à principal empresa brasileira: a Petrobrás. Durmam com um barulho desses!

Mas já que o barulho, quase que democrático, nos acordou, vejamos de onde vem ou não esse tal mantra entoado por muitos seguidores do sebastianismo pós-moderno, se é que se pode pensar numa sociedade pós-moderna num país que ainda é assolado por práticas coronelísticas e de relações de “favor” como era outrora na sociedade estruturada no escravismo na qual se tinha o senhor de escravo, o escravo e aqueles que viviam esperando as migalhas caírem do trono, de acordo com o que Machado nos aponta em seu clássico romance Memórias póstumas de Brás Cubas. Mas, só para não ficar atrelado ao universo fictício da existência humana, entendo que um pouco de história não faz mal a ninguém, bem como a leitura do livro Política pra quê?, escrito pelo meu amigo e orientador dos tempos de UNESP e hoje professor titular de Sociologia da UNICAMP, Marcelo Ridenti – há um exemplar na biblioteca pública municipal de Penápolis. Desta forma, pergunto aos idólatras de plantão: quem encabeçou o pedido de impeachment do ex-presidente Fernando Collor de Mello que hoje voltou ao cenário da política nacional na condição de Senador da República com o beneplácito do governo que ai está? Depois o STF (Supremo Tribunal Federal) inocentou Collor de Mello das acusações criminais, mas ai ele já tinha renunciado ao mandato depois de perder a votação na Câmara Federal!

Qual foi o partido que sustentou no Congresso os anseios das ruas, por meio dos “caras-pintadas” cujos integrantes estão imiscuídos no mundo da corrupção palaciana? Qual legenda ocupava o posto de vice do ex-presidente Collor? Com quem o arauto do petismo nacional fez pacto para eleger o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad? Quem salvou o pescoço do senador amapaense, mas dono do reduto maranhense de um processo de cassação no Senado Federal e ainda disse que era preciso respeitar a biografia dum sujeito que se chama José Ribamar, filho dum Sarney? Como podem ver meus caros leitores, quem brada hoje haver uma orquestração de golpe, pode não ter um conhecimento adequado da recente história desse país, portanto, acabam sendo presas fáceis de idólatras orquestradores de mantras e palavras de ordem, para não dizer outra coisa.

Só para completar o rol de questionamentos: quem promulgou a Constituição de 1988 e a chamou de “Constituição Cidadã”? Quem leu a lei que dá aval para o impeachment presidencial? (http://presrepublica.jusbrasil.com.br/legislacao/128811/lei-do-impeachment-lei-1079-50) Qual foi o delito que a atual mandatária cometeu? Quem pediu a sua saída do governo? Não acredito que alguém, da envergadura do jurista e ex-petista Hélio Bicudo que foi vice-prefeito da maior cidade da América Latina numa chapa petista, tenha cometido algum equívoco na formulação do pedido. Mas, ainda existem aqueles que escutam o mantra que ecoa do alto do poder messiânico e tenta o reproduzir no sopé da montanha como se estivessem certo por entoar palavras de ordem orquestradas por líderes que se apegaram ao poder como se o mesmo fosse propriedade de um partido.

Posto isto, vamos ao que interessa: como o título da reflexão indica a partir de uma pergunta: o que está por vir? A interpelação lembra-me uma crônica machadiana publicada nas proximidades da mudança de regime no final da década de 80 do século XIX, quando o Brasil deixou de ser Monarquista e abraçou o credo republicano, mas sem abandonar aspectos da burocracia aristocratizada, cujos integrantes descendiam da falida nobreza lusitana e associados ao desejo plutocrata de determinados segmentos em se enriquecer as expensas dos cofres públicos e monárquicos. Naquela crônica, duas personagens conversavam sobre o país e que o estava por vir, ou seja, o movimento republicano vinha forte, a Coroa se enfraquecia, o monarca constantemente se afastava do posto para cuidar de sua saúde deixando em seu lugar, a filha, a regente Isabel de Orleans que pela Constituição de 1824 não tinha condições de suceder o pai no trono brasileiro, caso este viesse a óbito, mas ai é outra história, pois o que nos interessa aqui é observar que o texto jornalístico machadiano nos sugere a ideia de que a narrativa estava indicando que haveria uma ruptura da ordem vigente e de fato aconteceu: os militares sepultaram a Monarquia e colocaram sem lugar uma República com cara nova, porém, com práticas imperiais, conforme apontei em meu recente trabalho sobre Machado de Assis.

Mas, deixando o ontem com as provocantes reflexões machadianas que provam que o Brasil do passado permanece nas relações sociais do presente e concentrando-me no agora do impeachment da presidente Dilma Rousseff e o brado dos toureiros numa arena repleta de incautos cidadãos, é preciso observar que o “golpe” – como eles mesmos gostam de dizer – não parte da oposição e nem do grupo que quer vê-la pelas costas, mas sim de determinado séquito de idólatras que arvoram serem os proprietários duma verdade universal, e que são vítimas do sistema, contudo, esses discursos não sobrevivem a uma análise séria, pois os fatos – contra os quais não se tem argumento – evidenciam o que vem ocorrendo nos escombros e bastidores do poder central: o desejo atroz de se manter no poder a todo custo e, desta forma, continuar se enriquecendo com o trabalho alheio se apropriando dos dividendos gerados pelas estatais. Talvez ai possa ser esta a chave da contrariedade de muitos asseclas de um tipo de político messiânico com relação às privatizações que foram feitas no passado, entretanto, quando se apossou há 13 anos, do poder, nada se fez para comprovar que a venda de estatais deficitárias foi um erro para as finanças públicas, portanto, se não se fez nada, prevaricou, mas durmamos com um barulho desses a espera do vir a ser desta Nação que acordará na próxima segunda-feira com outra cara, bem diferente da que estamos acostumados a ver através de pessoas que almejam residir numa pátria em que político corrupto, surripiadores de merendas e do petróleo vão parar na cadeia. Por hoje é só pessoal.

 

Gilberto Barbosa dos Santos, sociólogo, professor no ensino superior e médio em Penápolis. Pesquisador do Grupo Pensamento Conservador – UNESP e membro do Conselho Editorial e Científico da revista LEVS-UNESP. Escreve às quintas-feiras neste espaço: www.criticapontual.com.br. E-mail: gilbertobarsantos@bol.com.br, gilcriticapontual@gmail.com, e gilberto_jinterior@hotmail.com .

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