Descrença na política

Gilberto Barbosa dos Santos

 

Dando sequência aos diálogos intermitentes que mantenho aqui com os meus leitores, pretendo hoje retomar as conversas mantidas com um transeunte sobre os rumos da nau política brasileira e, de quebra, o destino do orbe penapolense a partir de Outubro. Pois bem! O foco desta semana é a descrença que o brasileiro tem no mundo da política e os seres que pululam por esse universo. Conforme apontei na última reflexão publicada aqui na semana passada, as mudanças não devem ser perpetradas a partir do alto do trono numa espécie de beija-mão monárquico, mas sim pela base, isto é, onde realmente existem as possibilidades de transformações nos âmbitos socioeconômicos e políticos.

Até ai não é novidade para ninguém, além do que nenhum habitante da polis duvida que o poder não pertença de fato àqueles que o ocupam, mas sim da sociedade, portanto, ele emana do povo que é soberano, contudo, a tal soberania que o cidadão goza, pode ser manipulada e ai que reside à questão mais emblemática do mundo da política, seja em que esfera for: municipal, estadual ou nacional. Desta forma, as minhas abordagens não dizerem respeito somente à Penápolis, cuja disputa pelo principal cargo da cidade contém, até o momento, cinco candidatos – mesmo que haja disputa jurídica nos bastidores e isso é significativo e o eleitor tem o direito de saber realmente do que se trata e não como alguns querem abordar a problemática, numa espécie de rua de mão única.

Mas deixando a letra fria da lei com aqueles profissionais com qualidades e possuidores de méritos para avaliar hermeneuticamente e de maneira isenta o que chega até seus gabinetes, vamos nos concentrar não nos postulantes a tais cargos eletivos, mas sim naqueles que detêm o poder, ou seja, o eleitor de fato que não deve temer os ocupantes dos postos públicos, principalmente aqueles que, para continuarem ludibriando a boa fé do povo, mentem de forma descarada e ainda agridem verbalmente seus concorrentes. Muitos dirão que isso é coisa da política e não é de hoje que vem ocorrendo. Posso até concordar que os fatos se dão desta maneira, contudo, não posso aceitar, pois as disputas eleitorais devem-se pautar por apresentação de programas de governo e não projetos pessoais de poder escancarados nas verborragias: “sempre desejei ser prefeito da cidade!”. Penso que o anseio não pode ser do candidato e sim do cidadão querer vê-lo administrando o município e, neste sentido, o último pleito apresenta em números – contra os quais não se tem argumento – o percentual de rejeição de determinadas categorias e mercadorias de políticos, contudo, ai é outra coisa.

Sendo assim, interessa-nos aqui analisar o comportamento do cidadão eleitor, levando em conta vários fatores, inclusive alguns elementos apresentados pelo cientista política Bolívar Lamounier em seu artigo Reflexões sobre o futuro da política e da democracia que integra o livro Ciências Sociais na atualidade. Segundo ele, e ai eu concordo com tais admoestações, justamente por elas indicarem que o legislativo é visto com maus olhos por parte da população. Ora se isso é fato, e tendo a crer que sim, justamente pelas conversas e o que escuto dos mantras entoados pelos eleitores aqui e alhures, que ninguém fará nada pela população e os candidatos querem apenas legislar, governar em benefício próprio. Esses cânticos dos cânticos são de conhecimento de todos, entretanto, temos ai mais de 200 políticos e filiados às legendas partidárias buscando uma das 13 vagas na Câmara local e, quem sabe, se tornarem cabos eleitorais de postulantes às vagas no legislativo estadual e federal, além dos cargos nos Executivos.

Ora, se o legislativo nacional não goza de tanto apoio popular, por que muitos indivíduos querem uma vaguinha lá? Responder a essa pergunta requer dos meus leitores, compreensão de que há diversos caminhos, entre eles, o da própria vontade do cidadão em querer representar o seu semelhante, porém, se ainda não passou por um dos mais de 30 conselhos comunitários existentes em Penápolis, poderá ter uma visão distorcida da realidade, ou não, pois tudo depende, já que não é preciso ser integrante de tais organismos para saber os problemas que a coletividade enfrenta em seu cotidiano. Contudo, é preciso entender os limites de tais representatividades e o que se cobrar do representante no legislativo. Por exemplo, temos ai a CIP que é uma contribuição, todavia, como ela vem sendo paga, nos parece ser mais uma obrigação do que “contribuição” – essa é mais uma questão hermenêutica, entretanto, mexe com o bolso do cidadão que era contrário a essa taxa, mas, mesmo assim, com voto de minerva, foi empurrada goela abaixo do cidadão-eleitor chamando novamente a decidir sobre o futuro da polis.

Será que é por conta disso, além de outras mutretas que grassa o mundo da política nacional que o brasileiro está descrente desse universo? Claro que não é necessário um grande exercício de intelecção para responder tal interpelação, contudo, mesmo diante das respostas, o indivíduo continua escolhendo equivocamente seus representantes, talvez por conta daquilo que o filósofo alemão Friedrich Nietzsche disse certa vez que o mundo só pode ser entendido senão como fenômeno estético e, ao desdobrarmos essa observação à esfera brasileira, mesmo estando numa República que ainda guarda enormes resquícios monárquicos, sabemos que o indivíduo ainda adora uma bajulação, esteja ele no poder ou próximo dele e, quem está distante, confirma a política do beija-mão perpetrado pela Corte Imperial brasileira entre 1840 e 1889.

Como alterar essa situação com o nível de consciência política do brasileiro? Será que os debates devem passar pelo caráter ideológico daqueles que se põem a discutir os caminhos e as alternativas para solucionar o problema, conforme um aluno me cobrou certo dia? Claro que os argumentos, apresentados por aqueles que se colocam a compreender tais questões, não podem ser apresentados de chofre e de forma apressada, mesmo porque pode se incorrer em equívocos analíticos, principalmente em se tratando de referências metodológicas passando pelas esferas partidárias e o tal posicionamento de quem observa os dados, mesmo porque é muito comum o interlocutor taxar o pesquisador de direita, esquerda, centro-esquerda, extrema-direita e outros ismos, justamente como forma de posicionar o outro e desta maneira, defini-lo e impor um contra-argumento nunca escudado em dados, mas em colocações fortemente vinculadas a partidos e ideologias. Neste ponto, interessa-nos recorrer ao sociólogo Max Weber e seu ensaio Ciência e política: duas vocações [essa obra esta disponível gratuitamente no site http://www.libertarianismo.org/livros/mwcepdv.pdf]. Neste trabalho ele faz distinção entre o ser cientista e o ser político.

Diante do exposto, fica-nos um desafio: como acabar com a descrença da população na categoria política brasileira? Conscientização política e não ideologizada, mesmo sabendo que sempre nos posicionaremos, conforme nos aponta o sociólogo Florestan Fernandes, entretanto, faz-se necessário, antes conhecer um pouco mais e ai sim se posicionar num dos lados da pendenga política e indicar como se pretende ver melhorada a qualidade de vida da coletividade. Mas para se atingir esse nível de maturidade política, é preciso ousadia e muita educação política, contudo, esta, assim como princípios éticos e morais, deve começar no interior dos lares e somente depois externado junto à coletividade.

 

Gilberto Barbosa dos Santos, sociólogo, professor no ensino superior e médio em Penápolis. Pesquisador do Grupo Pensamento Conservador – UNESP e membro do Conselho Editorial e Científico da revista LEVS-UNESP. Escreve às quintas-feiras neste espaço: www.criticapontual.com.br. E-mail: gilbertobarsantos@bol.com.br, gilcriticapontual@gmail.com, e social@criticapontual.com.br.

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