Consequências do populismo econômico

Gilberto Barbosa dos Santos

 

Sem muitas delongas, começo a crônica de hoje com uma singela pergunta ao meu fiel leitor: o que é melhor, comprar e quitar a aquisição ou em suaves 24 prestações? O que se prefere, moeda forte criada pela vertente monetarista ou o gasto público sem, no entanto ter os recursos para tais despesas, mas escudada em princípios desenvolvimentistas? Claro que as respostas podem ser variadas, contudo, me parece que todas podem, em uníssono, apontar que o bem material a que se deseja, deve ser liquidado após ser adquirido, mas como fazer isso no Brasil? Eis a mais forte interpelação, ou beco sem saída, a que se vê submetido diariamente o consumidor, trabalhador e vendedor da única mercadoria que este tem à sua disposição: a capacidade de transformar objetos materiais em bens de consumo, ou como dizia Karl Marx (1818-1883), a força-de-trabalho, mercadoria especificamente humana.

De qualquer forma, o caminho a ser percorrido pelo indivíduo social não pode ser extinto nessa rua sem saída, mas sim construído em seu cotidiano. Todavia, para que esse processo seja edificado, sem legar muitos traumas para o futuro, faz-se necessária a compreensão do que se tem no presente. Em que sociedade se está? Naquela que se tem um acentuado viés senzaleiro, isto é, com fortes resquícios dos tempos em que se propalava ser adepto do liberalismo, a exemplo dos ventos que sopravam da Europa Oitocentista, no entanto, se mantinha na esfera privada o trabalho escravo, aquele no qual só restava ao cativo a labuta e o dorso que seria posteriormente castigado pelos golpes dos chicotes – para se pensar em Machado, foi-se o açoite mas se manteve as chibatadas desferidas pelos baixos salários que os trabalhadores recebem depois de estafantes jornadas. Diante desse relato, muitos dirão que não é bem assim! Mas então como é que é? Todos recebem o valor correto pelo esforço desprendido na transformação de objetos materiais em bens de consumo? Se se pensar desta forma, a educação acaba não sendo uma mercadoria que se dá valor pela sua representatividade! Se for assim, então está explicado por ela não é tão valorizada nas Terras descobertas por Pedro Alvares Cabral (1467-1520).

Então, chegando a essa conclusão, termino a reflexão por aqui, já que todos os caminhos, como diria João Guimarães Rosa (1908-1967), levam à taberna. Ainda não, já que existem coisas que podem ser analisadas sob o prisma das Ciências Sociais, como por exemplo, as consequências para o Brasil da ausência de investimentos na educação e outras áreas, como a Saúde e Saneamento Básico. Entretanto, não sei se é interessante tratar desses temas aqui, até por que, os leitores já estão cansados de falar, debater, explicar expondo seus pontos de vista sobre tais assuntos. Sendo assim, não há porque prosseguir nas linhas abaixo com essa assertiva, a não ser que eu tenha como escopo discorrer sobre os equívocos que uma sociedade corre ao investir em suas práticas assistencialistas, como é o caso da brasileira. Se eu pretendo me enveredar por esses caminhos, é preciso explicar que há uma diferença entre assistência e assistencialismo, sendo que o primeiro significa assistir, auxiliar, ajudar e esse é o dever do Estado e recebê-lo é direito do cidadão. O segundo, objetiva alienar o receptor em sua condição de miserabilidade, mas o faz de forma que o agente a quem é direcionado tal proposta de política pública não observa que, a cada medida recebida, é mantido refém duma condição ínfima enquanto sujeito histórico.

Posto isso, me parece que cabe aqui o retorno ao início de minha narrativa, isto é, no âmbito econômico. Para se quitar em sua totalidade um bem, é preciso ter recursos para tanto e de onde estes sairão? Claro que do próprio bolso do comprador que deverá tê-los recebido pela venda de uma mercadoria específica dada pela sua profissão, ou como diziam os antigos, de sua labuta cotidiana. No entanto, quando se pensa em trabalho, se observa no mesmo enquanto algo ruim e não uma necessidade do ser em si, antes mesmo de ser uma ação objetivadora da transformação do mundo em seu entorno. Na falta dessas ferramentas modificadoras, como por exemplo, a qualificação profissional, resta ao trabalhador vender a única coisa que tem: a sua capacidade de realizar trabalho, como dizia Marx e os adeptos de suas teorias. Todavia, o mercado global de trabalho está em constante mutação, mudanças que redefinem a existência humana e, através delas, o que hoje é fixo, amanhã nem mais será sentido pelo homem, no entanto, este permanecerá vivo, sem ter condições de gerar valor e, por conseguinte, como muitos imaginam, criando despesas para aqueles que produzem.

O exposto acima é fato ou apenas verborragia deste que compõe suas narrativas semanais aqui, caro leitor? Ao que tudo indica, não e, para compreendê-lo, se observa as reformas que pululam no Congresso Nacional, entre elas, a do Trabalho e Previdenciária, sem, no entanto dar prioridade à duas mais significativas quando o assunto é conter a sangria dos cofres públicos: a Tributária e a Política. Mas, por que será que essas duas últimas, embora façam parte do receituário político nacional há décadas, nunca saíram do papel, passando a figurar como moeda de troca entre governo e população? Em meu pequeno conhecimento em matéria tributária, penso que alterações nesse campo não significam redução arrecadatória, mas pode indicar uma racionalidade no fisco, isto é, quem tem mais e ganha mais, paga mais tributos, desde que os valores arrecadados sejam revertidos em prol da comunidade como um todo e não somente aqueles considerados pertencentes às camadas compostas por miseráveis. Mexer nesse ninho de vespeiro significa que o gasto público deve passar pelas mãos de burocratas vocacionados para isso, como diz Max Weber (1864-1920) em sua obra Parlamentarismo para uma Alemanha reordenada, mas o que se vislumbra é a formação duma casta de burocratas que não abandonou hábitos antigos que nos reportam ao Brasil antigo, aquele apontado pelo economista Armínio Fraga em recente entrevista a um jornal de circulação nacional.

Essa prática arcaica que é mantida em um país que se quer moderno, legou ao hoje nacional, figuras populistas e messiânicas que discursam contra o Capital e o capitalismo, mas na esfera privada se locupleta com integrantes da plutocracia brasileira para se enriquecer as expensas dos cofres públicos, e olha que as recentes investigações dos agentes policiais do Brasil apontam que os tentáculos desse pessoal avançaram sobre uma miríade de áreas, evidenciando que se propalava uma coisa, mas se fazia outra, ou seja, durante o dia satanizava-se o demônio e a noite participava do banquete com ele, numa simbiose que quebrou o país, de acordo com o Armínio Braga. Outro aspecto do populismo – forma de governar um determinado reduto no qual o gestor faz uso de diversos recursos para obter apoio popular, como por exemplo, propaganda pessoal personificada no que se diz ter feito e, portanto, se fará muito mais caso seja reeleito – é propalar ser o salvador da Pátria. Essa peculiaridade não se restringe ao universo da chamada esquerda, mas de todo político que quer chegar ao poder e ai vale-se de diversos chavões nacionalistas, entre eles.

Gilberto Barbosa dos Santos, Sociólogo/Cientista Político, editor do site www.criticapontual.com.br, professor no ensino superior e médio em Penápolis; pesquisador do Grupo Pensamento Conservador – UNESP e membro do Conselho Editorial e Científico da revista LEVS-UNESP; escreve às quintas-feiras nesse espaço: E-mail: gilbertobarsantos@bol.com.br, gilcriticapontual@gmail.com, e social@criticapontual.com.br.

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