Comportamento político do brasileiro

Gilberto Barbosa dos Santos

 

Hoje eu estava tentado a escrever sobre as questões inter-raciais e preconceituosas no Brasil do século XXI, principalmente no que diz respeito à herança senzaleira. O escopo teria primazia também como consequência da leitura que fiz duma matéria veiculada pela BBC Brasil sobre o tratamento que as mulheres descendentes de africanas recebem diariamente, inclusive uma delas, casada com um juiz foi confundida com uma prostituta – o conteúdo da informação está no disponível no site http://www.bbc.com/portuguese/brasil-36945718?SThisFB. Soma-se a essas informações, observações feitas pelos cientistas sociais Florestan Fernandes e Renato Ortiz. Dentro de suas respectivas abordagens, os dois intelectuais apontam que as consequências do escravismo foram significativas para as duas categorias que escudaram o sistema servil no Brasil, entretanto, ao elemento africano e aos seus descendentes restou pior parte da abolição: sofrer constantemente as sevícias físicas e psicológicas do que sobrou de um atroz capitalismo senzaleiro (http://www1.folha.uol.com.br/colunas/redesocial/2016/08/1797579-de-domestica-a-poeta-nunca-mais-vou-limpar-chao-em-casa-de-patroa.shtml?cmpid=compfb). Apesar de o assunto ser alvissareiro, optei por buscar outro caminho para chegar ao que poderia ser no presente o desdobramento de tais manifestações de uma sociedade, cujo povo não teve papel principal nas principais mudanças perpetradas no século XIX, logo após a chegada da Família Real ao país.

Sendo assim, me parece ser salutar, tentar, laconicamente, mesmo porque o espaço aqui não permite muitas digressões e, nem o tempo dos meus leitores possibilita isso, já que o corre-corre da modernidade – para alguns pós-modernidade – não deixa muita disposição para reflexões profundas sobre o Brasil de hoje com raízes em seu processo de formação, conforme nos apresenta Sérgio Buarque de Holanda em seus livros Visão do Paraíso e Raízes do Brasil. Mas de qualquer forma, entendo serem válidas as metas traçadas para o texto de hoje, qual seja, a de entender o comportamento político do brasileiro enquanto desdobramento dum Estado que não surge, a exemplo do que ocorreu nos EUA pós-independência, do desejo de sua população espalhadas em suas unidades federativas. É preciso ter claro que os preceitos que norteiam o nosso Estado Republicano é uma colcha de retalhos que mistura o federalismo norte-americano e os princípios republicanos franceses – voltarei a esse tempo em outro momento, para agora basta tratar a questão do Estado brasileiro como sendo refém de uma burocracia aristocratizada escravizada por uma categoria de plutocratas que esta enraizada desde a chegada da Corte lisboeta e personificada na reconfiguração da prática do “beija-mão” realizada por várias décadas pelos séquitos do Imperador que dava anuência a tais condutas dos cortesãos.

É significativo observar esse nascedouro político, cuja simbiose com a sociedade tem empobrecido as relações sociais no país, conforme pode ser visto a partir da quantidade alarmante de funcionários públicos envolvidos com a categoria política e setores privados da vida nacional, tendo como consequência a degradação do sistema estatal brasileiro que está mergulhado até o último fio de cabelo com ações corruptivas, sendo que o prejuízo é socializado por toda a sociedade e o lucro de tal enriquecimento fica para determinados segmentos atrelados a partidos políticos. Para compreender esse processo, busquei guarida em alguns pensadores e obras que podem esclarecer um quantum singular da ponta do iceberg que estagna a Nação e não a deixa avançar, como é o desejo de muitos dos brasileiros, contudo, vários desses, sem o saber de fato, reproduz o comportamento que vem desde a senzala dando novas roupagens à fala da casa-grande e seus apaniguados.

Sendo assim, recorro ao artigo Reflexões sobre o futuro da política e da democracia, texto do cientista social, Bolívar Lamounier, que integra o livro Ciências Sociais na atualidade: tempo e perspectiva. Em linhas gerais, nesse trabalho, o autor trabalha categorias como o populismo e seus seguidores que agridem as instituições, transformando-as em ferramentas para beneficio privado, conforme o que vem ocorrendo com os desdobramentos das investigações que a Política Federal e demais órgãos jurídicos realizam – e não adianta os asseclas dum determinado partido ficarem propalando isso e aquilo, que é golpe disso e daquilo, pois os fatos estão ai, contra os quais não há argumentos apenas verborragias eleitoreiras.

A grande questão que se coloca na agenda do dia, não é a culpa ou inocência, mesmo porque, para se sentenciar alguém é preciso provas e quem as produz são as autoridades constituídas por mérito e não conchavos palacianos e interesses ideológicos de acordo com o que temos notado, conforme a montanha corrupta vai sendo desfeita pelo trabalho da polícia e da Justiça, mas sim, como o país amanhecerá após essa noite para lá de escura da política nacional – e não se deve ater somente no plano federal, é preciso se atentar para o âmbito estadual, onde as merendas escolares desaparecem ou são superfaturadas e também nos âmbito municipal, em cujas paragens muitos dos prefeitos estão atolados até o pescoço com denúncias que minam todos os dias nas mesmas dos promotores públicos. Buscando novos elementos para escudar uma resposta aos meus leitores semanais, recorro ao pensador, tido por muitos como alinhado com o pensamento autoritário nacional, Oliveira Vianna, para quem, em linhas gerais, sem entender o processo formador, principalmente no que diz respeito às suas peculiaridades geográficas e étnicas, dificilmente se conseguirá uma uniformidade política que possibilite a construção dum Estado que contemplem os anseios de sua coletividade.

Para entender esse ponto, faz-se necessário aprofundar um pouco mais o histórico político do Brasil e, para tanto, eu recomento a leitura, entre outras, do livro História das ideias políticas no Brasil, do historiador Nelson Nogueira Saldanha – aos interessados, ele está disponível gratuitamente no site do Senado Federal (http://www2.senado.leg.br/bdsf/item/id/1052). Desta obra, para o meu objetivo aqui, cuja reflexão deverá ter desdobramentos nos próximos textos, destaco a epígrafe usada pelo autor que reporta o leitor a Tobias Barreto, para quem “o único meio de salvar e engrandecer o Brasil, é tratar de colocá-lo em condições de poder ele tirar de si de si mesmo, quero dizer, do seio de sua história, a direção que lhe convém. O destino de um povo, como o destino de um indivíduo, não se muda, nem se deixa acomodar ao capricho e ignorância daqueles que pretendem dirigi-lo”.

Enfim, diante do exposto, fica-me uma pergunta: como é o comportamento político do povo brasileiro? A resposta começa pela ausência de educação política, falta de cidadania, mesmo tendo os três direitos garantidos pela Constituição Federal de 1988 – pouco lida -, eles não são usufruídos em sua totalidade e, quando o indivíduo cônscio tenta coloca-los em prática, é comum ouvir de seus interlocutores que sempre foi assim, ou seja, nunca se exigiu o que lhe é de direito, mas pedir àqueles que estão no poder e em seus assentos com chicotes nas mãos, a exemplo do que faziam os escravagistas com os seus séquitos e escravos: Machado de Assis e José de Alencar, entre outros literatos Oitocentistas, apontaram esse nível de relação que descambou para o mundo da política e permanece até hoje.

 

Gilberto Barbosa dos Santos, sociólogo, professor no ensino superior e médio em Penápolis. Pesquisador do Grupo Pensamento Conservador – UNESP e membro do Conselho Editorial e Científico da revista LEVS-UNESP. Escreve às quintas-feiras neste espaço: www.criticapontual.com.br. E-mail: gilbertobarsantos@bol.com.br, gilcriticapontual@gmail.com, e social@criticapontual.com.br.

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